RESUMO
Introdução:
No âmbito da atual política de prevenção do HIV/AIDS é necessário reconhecer a importância do preservativo masculino e discutir seus limites. Esse artigo objetivou investigar o uso do preservativo masculino no Brasil e elaborar reflexões críticas sobre o papel do mesmo no novo contexto da prevenção do HIV/AIDS.
Métodos:
Revisão narrativa sobre o uso do preservativo masculino no Brasil em diferentes grupos populacionais e fatores associados ao uso, por meio de buscas realizadas entre março e abril de 2013, utilizando-se descritores em inglês categorizados na base PubMed. Incluíram-se também documentos provenientes de inquéritos nacionais que orientam a vigilância epidemiológica e comportamental do Ministério da Saúde.
Resultados:
Incluí-se 40 artigos e 3 relatórios para caracterizar a produção de conhecimentos e outros 11 estudos de intervenção para promoção do uso de preservativos. Observou-se que: 1) apesar do aumento de estudos nacionais, estes apresentam baixa regularidade; 2) há poucos estudos sobre fatores associados ao uso de preservativo entre os grupos nos quais a epidemia se concentra, como homens que fazem sexo com homens (HSH), trabalhadoras sexuais (TS), usuários de drogas (UD) e travestis e transexuais (TT), e concentração entre adolescentes e mulheres; 3) combinação de intervenções mostrou-se mais efetiva do que uma só.
Discussão:
A reflexão e discussão do uso do preservativo no âmbito das novas tecnologias de prevenção devem não só enfatizar a importância do mesmo, mas também considerar o papel do prazer e do sexo nas intervenções combinadas, além do potencial de redução do risco de infecção por HIV.
Palavras-chave:
Preservativos; HIV; Síndrome de Imunodeficiência Adquirida; Prevenção de doenças; Prevalência; Brasil
INTRODUÇÃO
O preservativo masculino tem desempenhado um papel fundamental na luta contra o HIV/AIDS em várias partes do mundo e também no Brasil11. Paiva V VG, França Junior I, Lopes F. Uso de preservativos: pesquisa nacional MS/IBOPE, Brasil 2003. Disponível em http://www.usp.br/nepaidsabia/images/ BIBLIOTECA/_MIGRAR/artigo_preservativo.pdf (Acessado em 20 de dezembro de 2013).
http://www.usp.br/nepaidsabia/images/ BI... . No início da epidemia, eram distribuídos em momentos especiais como Carnaval e o "Dia Mundial de Luta Contra AIDS", ou através de projetos de pesquisa. Em 1994, inicia-se a distribuição ampla e sistemática, e a compra da maior parte de preservativos masculinos e géis lubrificantes pelo Sistema Único de Saúde22. Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de DST, AIDS e Hepatites Virais. Por que usar a camisinha. Disponível em http://www.aids.gov.br/pagina/porque-usar (Acessado em 12 de dezembro de 2013).
http://www.aids.gov.br/pagina/porque-usa... 33. Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de DST, AIDS e Hepatites Virais. Insumos de prevenção. Disponível em http://www.aids.gov.br/pagina/insumos-deprevencao (Acessado em 12 de dezembro de 2013).
http://www.aids.gov.br/pagina/insumos-de... , coordenado pelo Programa Nacional de DST/AIDS (PN), hoje Departamento de DST/AIDS/HIV e Hepatites Virais (DDAHV) do Ministério da Saúde.
Nos últimos 35 anos, o campo da prevenção do HIV tem passado por várias transformações. Hoje, discute-se que a prevenção efetiva ao HIV requer uma combinação de estratégias de intervenção comportamentais, biomédicas e estruturais. Sabe-se que uma única estratégia de prevenção não será suficiente para o controle das múltiplas epidemias do HIV no mundo e no Brasil. E, no contexto global, há uma imensa expectativa e aposta nas chamadas "novas tecnologias de prevenção" ou "tecnologias biomédicas" de prevenção (circuncisão, microbicidas, profilaxia pós-exposição - PEP, profilaxia pré-exposição - PrEP), além das estratégias comportamentais (como soro-posicionamento, soro-adaptação e outras modalidades de acordo entre parceiros sexuais)44. Padian NS, Buve A, Balkus J, Serwadda D, Cates W, Jr. Biomedical interventions to prevent HIV infection: evidence, challenges, and way forward. Lancet 2008; 372(9638): 585-99. 77. Celum C, Hallett TB, Baeten JM. HIV-1 prevention with ART and PrEP: mathematical modeling insights into resistance, effectiveness, and public health impact. J Infect Dis 2013; 208(2): 189-91.. Paralelamente, o país vive um contexto de aumento da prevalência de HIV entre os mais jovens, principalmente entre homens que fazem sexo com homens (HSH)88. Szwarcwald CL, Andrade CL, Pascom AR, Fazito E, Pereira GF, Penha IT. HIV-related risky practices among Brazilian young men, 2007. Cad Saude Publica 2011; 27 Suppl 1: S19-26.; prevalências elevadas de HIV em alguns grupos populacionais em contextos de vulnerabilidade (HSH, trabalhadoras sexuais - TS, usuários de drogas - UD, travestis e transexuais - TT)99. Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AD, Mello MB, Guimaraes MD, et al. HIV among MSM in Brazil. AIDS 2012; 26: 000-00 12 12. Brasil. Ministério da Justiça. Perfil dos usuários de crack e/ou similares no Brasil. Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas; 2013chamados hoje de populações-chave1313. World Health Organization (WHO). Consolidated guidelines on HIV prevention, diagnosis, treatment and care for key populations. Geneva: World Health Organization; 2014., e tendência de redução do uso regular do preservativo1414. Brasil. Pesquisa de Conhecimentos, Atitudes e Práticas na População Brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011..
Assim, faz-se necessário reconhecer a importância do preservativo masculino no âmbito da política de prevenção do HIV/AIDS, mas também discutir seus limites.
Esse artigo objetivou investigar o uso do preservativo masculino no Brasil e elaborar reflexões críticas sobre o papel do mesmo no novo contexto da prevenção do HIV/AIDS.
METODOLOGIA
Realizou-se uma revisão narrativa da literatura1515. Cordeiro AM, Oliveira GMd, Rentería JM, Guimarães CA. Revisão sistemática: uma revisão narrativa. Rev Col Bras Cir 2007; 34: 428-31. 1616. Rother E. Revisão sistemática X revisão narrativa. Acta Paulista de Enfermagem 2007; 20(2): 2. sobre o uso do preservativo masculino no Brasil como estratégia de prevenção do HIV/AIDS em diferentes grupos populacionais, assim como os fatores associados ao uso, e intervenções para a promoção do uso do preservativo masculino. Para elaboração de uma busca de documentos mais organizada que garantisse, ao mesmo tempo, sensibilidade (inclusão do maior número possível dos documentos) e especificidade (exclusão dos documentos não relacionados aos objetivos de estudo) ao processo, utilizamos descritores em inglês previamente definidos e categorizados na base de dados do PubMed (MeSH Terms) e unitermos utilizados por autores em publicações, identificados nas leituras exploratórias sobre a temática (Quadro 1). Foram feitas leituras do título e dos resumos de estudos quantitativos que abordaram como desfecho o uso do preservativo nas mais diversas formas. As buscas foram realizadas entre março e abril de 2013 e dos trabalhos encontrados, mantivemos os artigos com texto completo, publicados no período entre 2000 a 2013.
Incluímos também documentos provenientes de inquéritos nacionais que orientam a vigilância epidemiológica e comportamental do DDAHV que abordaram como um dos desfechos o uso do preservativo, como as pesquisas sobre "Comportamento Sexual e Percepções da População Brasileira sobre HIV/AIDS" realizadas em 1998 e 2005, em uma amostra representativa da população brasileira de 16 a 65 anos pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP)1717. Berquó E, Barbosa RM, Lima LP; Grupo de Estudos em População, Sexualidade e AIDS. [Trends in condom use: Brazil 1998 and 2005]. Rev Saude Publica 2008; 42 Suppl 1: 34-44.; as Pesquisas de Conhecimentos, Atitudes e Práticas relacionada às DST e AIDS (PCAP), inquéritos domiciliares realizados em 2004 e 2008 e representativo da população brasileira de 15 a 64 anos1414. Brasil. Pesquisa de Conhecimentos, Atitudes e Práticas na População Brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 1818. Pascom ARP, Ferraz DAS, Arruda MR, Brito I. Conhecimento e práticas sexuais de risco associados ao HIV na população brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Tempus Actas em Saúde Coletiva. 2010; 4(2): 101-12. 1919. Pascom AR, Szwarcwald CL. Sex inequalities in HIV-related practices in the Brazilian population aged 15 to 64 years old, 2008. Cadernos de saude publica 2011; 27 Suppl 1: S27-35., as pesquisas entre conscritos do exército brasileiro88. Szwarcwald CL, Andrade CL, Pascom AR, Fazito E, Pereira GF, Penha IT. HIV-related risky practices among Brazilian young men, 2007. Cad Saude Publica 2011; 27 Suppl 1: S19-26. 2020. Szwarcwald CL, de Carvalho MF, Barbosa Junior A, Barreira D, Speranza FA, de Castilho EA. Temporal trends of HIVrelated risk behavior among Brazilian military conscripts, 1997-2002. Clinics (Sao Paulo) 2005; 60(5): 367-74. e as pesquisas de monitoramento de populações-chave para a epidemia99. Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AD, Mello MB, Guimaraes MD, et al. HIV among MSM in Brazil. AIDS 2012; 26: 000-00 1212. Brasil. Ministério da Justiça. Perfil dos usuários de crack e/ou similares no Brasil. Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas; 2013 2121. Rocha GM, Kerr LR, de Brito AM, Dourado I, Guimaraes MD. Unprotected receptive anal intercourse among men who have sex with men in Brazil. AIDS and Behav 2013;17(4):1288-95. 2222. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, AIDS e Hepatites virais. Taxas de prevalência de HIV e sífilis e conhecimento, atitudes e práticas de risco relacionadas às infecções sexualmente transmissíveis no grupo das mulheres profissionais do sexo, no Brasil (RDS-PS)- Anexo VIII. Brasília: Ministério da Saúde; 2009..
As informações sobre as características da produção científica sobre o uso do preservativo masculino foram organizadas na Tabela 1. Os fatores associados ao uso do preservativo foram organizados por grupo populacional e tipo de prática sexual na Tabela 2. Nas Tabelas 3 e 4, sumarizaram-se os dados de estudos sobre o efeito de intervenções combinadas e únicas para a promoção do uso do preservativo. Foram excluídos:
estudos que não relataram as proporções de uso de preservativo (mesmo se relataram mudanças de atitudes e conhecimentos) e
se nenhum componente de intervenção foi executado no Brasil.
RESULTADOS
Um total de 40 artigos88. Szwarcwald CL, Andrade CL, Pascom AR, Fazito E, Pereira GF, Penha IT. HIV-related risky practices among Brazilian young men, 2007. Cad Saude Publica 2011; 27 Suppl 1: S19-26. 99. Kerr LR, Mota RS, Kendall C, Pinho AD, Mello MB, Guimaraes MD, et al. HIV among MSM in Brazil. AIDS 2012; 26: 000-00 1111. Bertoni N, Singer M, Silva CM, Clair S, Malta M, Bastos FI. Knowledge of AIDS and HIV transmission among drug users in Rio de Janeiro, Brazil. Harm Reduct J 2011; 8: 5. 1717. Berquó E, Barbosa RM, Lima LP; Grupo de Estudos em População, Sexualidade e AIDS. [Trends in condom use: Brazil 1998 and 2005]. Rev Saude Publica 2008; 42 Suppl 1: 34-44. 2121. Rocha GM, Kerr LR, de Brito AM, Dourado I, Guimaraes MD. Unprotected receptive anal intercourse among men who have sex with men in Brazil. AIDS and Behav 2013;17(4):1288-95. 2323. Calazans G, Araujo TW, Venturi G, Franca Junior I. Factors associated with condom use among youth aged 15-24 years in Brazil in 2003. AIDS 2005; 19 Suppl 4: S42-50. 5454. Villarinho L, Bezerra I, Lacerda R, Latorre Md Mdo R, Paiva V, Stall R, et al. [Vulnerability to HIV and AIDS of short route truck drivers, Brazil]. Rev Saude Publica 2002; 36(4 Suppl): 61-7. (Tabela 1) e 3 relatórios do DDAHV foram incluídos neste artigo para caracterizar a produção de conhecimentos sobre o uso do preservativo masculino no Brasil e fatores associados. Os relatórios não foram incluídos na Tabela 1, mas as informações sobre uso do preservativo no relatório da PCAP1414. Brasil. Pesquisa de Conhecimentos, Atitudes e Práticas na População Brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011., no estudo nacional sobre usuários de crack1212. Brasil. Ministério da Justiça. Perfil dos usuários de crack e/ou similares no Brasil. Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas; 2013, e no estudo RDS-TS2222. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, AIDS e Hepatites virais. Taxas de prevalência de HIV e sífilis e conhecimento, atitudes e práticas de risco relacionadas às infecções sexualmente transmissíveis no grupo das mulheres profissionais do sexo, no Brasil (RDS-PS)- Anexo VIII. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. foram descritas. Estudos do tipo intervenção para incentivar o uso de preservativos também foram identificados: intervenções combinadas- 5 estudos88. Szwarcwald CL, Andrade CL, Pascom AR, Fazito E, Pereira GF, Penha IT. HIV-related risky practices among Brazilian young men, 2007. Cad Saude Publica 2011; 27 Suppl 1: S19-26. 2020. Szwarcwald CL, de Carvalho MF, Barbosa Junior A, Barreira D, Speranza FA, de Castilho EA. Temporal trends of HIVrelated risk behavior among Brazilian military conscripts, 1997-2002. Clinics (Sao Paulo) 2005; 60(5): 367-74. (Tabela 3), e intervenção única- 8 estudos5353. Viana FJ, Faundes A, de Mello MB, de Sousa MH. Factors associated with safe sex among public school students in Minas Gerais, Brazil. Cad Saude Publica 2007; 23(1): 43-51. 5757. Sampaio M, Brites C, Stall R, Hudes ES, Hearst N. Reducing AIDS Risk Among Men Who Have Sex with Men in Salvador, Brazil. AIDS Behav 2002; 6(2): :173-81. 5959. Andrade HH, Mello MB, Sousa MH, Makuch MY, Bertoni N, Faundes A. Changes in sexual behavior following a sex education program in Brazilian public schools. Cad Saude Publica 2009; 25(5): 1168-76. 6464. Colosio R, Fernandes MI, Bergamaschi DP, Scarcelli IR, Lopes IC, Hearst N. [HIV prevention using the operative group approach among men who have sex with men in Sao Paulo, Brazil]. Cad Saude Publica 2007; 23(4): 949-59. (Tabela 4).
CARACTERÍSTICAS DA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTOS SOBRE O USO DO PRESERVATIVO MASCULINO
Uma leitura crítica sobre a produção de conhecimentos acerca do uso do preservativo no Brasil nos últimos 13 anos nos informa que:
estudos nacionais apresentaram variação substancial com relação às medidas adotadas em relação ao uso do preservativo seja: na caracterização dos diferentes tipos de parcerias sexuais (casuais, eventuais, fixos, estáveis, etc.); na investigação das práticas sexuais (vaginal, anal, receptiva, insertiva, etc.); e nos intervalos de tempo investigados (última relação, últimos 3, 6 ou 12 meses anteriores à pesquisa, etc.). Algumas medidas de uso são investigadas junto a grupos específicos, mas não em todos; o que, de forma geral, dificulta a comparação entre os resultados dos diferentes estudos;
os estudos sobre fatores associados ao uso do preservativo entre as populações nas quais a epidemia se concentra no Brasil, como HSH, UD e TS, datam de 2009;
há concentração de estudos entre adolescentes;
dentre as propostas de intervenções efetivas para incentivar o uso de preservativos, identificou-se que a combinação de intervenções mostrou-se mais efetiva do que a concentração em uma prática específica; há necessidade, no entanto, de mais estudos para compreender e produzir evidências sobre como atuam efetivamente estas intervenções para aumentar o uso e a adesão ao preservativo (Tabelas 3 e 4);
os inquéritos nacionais investigando a população geral (CEBRAP e PCAP) ocorreram nos anos de 1998, 2004, 2005 e 2008; os inquéritos com conscritos ocorreram de 19972000, 2002 e o último recorte em 2007. E os estudos com populações específicas (HSH,TS,UD), um inquérito para cada população entre 2008-2009. Ou seja, nos últimos quatro anos não há praticamente estudos sobre o uso do preservativo masculino promovidas e/ou financiadas pelo DDAHV.
O QUE SE SABE SOBRE O USO DO PRESERVATIVO MASCULINO E OS FATORES ASSOCIADOS A ESTE USO
As taxas de uso do preservativo diferem substancialmente entre os inquéritos nacionais. Os realizados pelo CEBRAP indicaram: aumento de 19,1% (1998) para 33,1% (2005), na proporção de uso nas relações com parceria estável nos 12 meses anteriores à entrevista; menor taxa de uso de preservativo entre indivíduos com escolaridade superior em contraste com a taxa de uso entre aqueles com escolaridade secundária; associação entre iniciação sexual entre 15 e 16 anos de idade e diminuição do uso de preservativo, principalmente entre aqueles que se iniciaram antes dos 14 anos; aumento do uso de preservativos na iniciação sexual, entre aqueles com 16 a 19 anos, comparando-se dados coletados em 1998 e 20051717. Berquó E, Barbosa RM, Lima LP; Grupo de Estudos em População, Sexualidade e AIDS. [Trends in condom use: Brazil 1998 and 2005]. Rev Saude Publica 2008; 42 Suppl 1: 34-44.. Já nos dados da PCAP, observou-se tendência de queda no uso do preservativo na última relação sexual dos últimos 12 meses comparando-se os anos do estudo (38,4 versus 36,8%), apesar do conhecimento sobre o uso do preservativo ter se mantido alto em 2004 e 2008; maiores proporções de uso entre os mais jovens, e aumento no uso do preservativo entre eles na primeira relação sexual, comparando-se as diferentes versões da PCAP (53,2 versus 60,9%)1414. Brasil. Pesquisa de Conhecimentos, Atitudes e Práticas na População Brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011..
Os estudos analisados destacam um conjunto diversificado de fatores associados ao uso do preservativo masculino entre uma variedade de grupos populacionais. Com relação à população geral, os dados da PCAP indicam associações entre uso regular de preservativo (em todas as relações sexuais dos últimos 12 meses) e: ser homem; idade de 15 a 24 anos, ter recebido preservativos de graça; e não coabitar com um parceiro1414. Brasil. Pesquisa de Conhecimentos, Atitudes e Práticas na População Brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 1818. Pascom ARP, Ferraz DAS, Arruda MR, Brito I. Conhecimento e práticas sexuais de risco associados ao HIV na população brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Tempus Actas em Saúde Coletiva. 2010; 4(2): 101-12. 1919. Pascom AR, Szwarcwald CL. Sex inequalities in HIV-related practices in the Brazilian population aged 15 to 64 years old, 2008. Cadernos de saude publica 2011; 27 Suppl 1: S27-35.. Importante notar que diversos estudos mostram que há maior dificuldade em manter o uso de preservativos no contexto de relações consideradas estáveis pelos parceiros envolvidos2323. Calazans G, Araujo TW, Venturi G, Franca Junior I. Factors associated with condom use among youth aged 15-24 years in Brazil in 2003. AIDS 2005; 19 Suppl 4: S42-50. 6565. Jimenez AL, Gotlieb SL, Hardy E, Zaneveld LJ. [Prevention of sexually transmitted diseases in women: association with socioeconomic and demographic variables]. Cad Saude Publica 2001; 17(1): 55-62. 6666. Hearst N, Chen S. Condom promotion for AIDS prevention in the developing world: is it working? Studies in family planning. 2004; 35(1): 39-47..
Há controvérsia, no entanto, com relação às associações entre uso de preservativo e status socioeconômico (SES). Enquanto Martins et al.4040. Martins LB, da Costa-Paiva LH, Osis MJ, de Sousa MH, Pinto-Neto AM, Tadini V. [Factors associated with condom use and knowledge about STD/AIDS among teenagers in public and private schools in Sao Paulo, Brazil]. Cad Saude Publica 2006; 22(2): 315-23. encontraram associação entre o uso de preservativos com SES mais baixo, Juarez et al.3838. Juarez F, LeGrand T. Factors influencing boys' age at first intercourse and condom use in the Shantytowns of Recife, Brazil. Stud Fam Plann 2005; 36(1): 57-70. indicaram que status sócio econômico mais alto esteve positivamente associado com o uso de preservativos entre adolescentes do sexo masculino. No que diz respeito à religião, Berquó et al.1717. Berquó E, Barbosa RM, Lima LP; Grupo de Estudos em População, Sexualidade e AIDS. [Trends in condom use: Brazil 1998 and 2005]. Rev Saude Publica 2008; 42 Suppl 1: 34-44. encontraram maior adesão ao preservativo entre os brasileiros que não estavam vinculados a qualquer religião, enquanto Viana et al.5353. Viana FJ, Faundes A, de Mello MB, de Sousa MH. Factors associated with safe sex among public school students in Minas Gerais, Brazil. Cad Saude Publica 2007; 23(1): 43-51.relataram maior adesão, embora não significativamente maior, entre estudantes católicos em comparação com estudantes que se identificaram como evangélicos, ou como tendo outra, ou nenhuma afiliação religiosa (Tabela 2).
Ao considerar os grupos nos quais a epidemia se concentra, os HSH usam mais frequentemente preservativos quando comparados aos heterossexuais1414. Brasil. Pesquisa de Conhecimentos, Atitudes e Práticas na População Brasileira de 15 a 64 anos, 2008. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.. E, recentemente, estudos de monitoramento da epidemia em populações chaves, com técnica amostral dirigida pelo participante (o Respondent Driven Sampling - RDS), foram usados para se obter informações mais detalhadas sobre HIV/AIDS entre HSH, e indicaram 47% de relato de sexo anal desprotegido, e associação entre sexo anal receptivo desprotegido nos seis meses anteriores ao estudo com: viver com um parceiro masculino; usar drogas ilícitas; ter parceiros estáveis ou ter parceiros comerciais estáveis e casuais; relações sexuais apenas com parceiros masculinos; relato de que nenhum ou poucos amigos incentivaram o uso do preservativo; identidade homossexual/gay/HSH; e se considerar em risco elevado ou moderado para a infecção pelo HIV2121. Rocha GM, Kerr LR, de Brito AM, Dourado I, Guimaraes MD. Unprotected receptive anal intercourse among men who have sex with men in Brazil. AIDS and Behav 2013;17(4):1288-95.. No relatório do estudo das TS com RDS, a proporção de uso regular (em todas as relações sexuais) do preservativo masculino com parceiros fixos na prática do sexo vaginal e anal foi de 21,4% e 29,4% respectivamente. E com clientes na prática do sexo vaginal e anal foi 69,7% e 64%, respectivamente2222. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, AIDS e Hepatites virais. Taxas de prevalência de HIV e sífilis e conhecimento, atitudes e práticas de risco relacionadas às infecções sexualmente transmissíveis no grupo das mulheres profissionais do sexo, no Brasil (RDS-PS)- Anexo VIII. Brasília: Ministério da Saúde; 2009..
Estudos sobre TS concentram-se nas mulheres, e poucos identificam fatores associados ao uso do preservativo. A maioria descreve a proporção de uso em diferentes situações, ou faz referência ao não uso do preservativo como fator de risco para a infecção pelo HIV. Estudo com RDS indicou que o não uso do preservativo na negociação com clientes como importante fator de risco para o HIV2525. Dal Pogetto MR, Marcelino LD, Carvalhaes MA, Rall VL, Silva MG, Parada CM. Characteristics of a population of sex workers and their association with the presence of sexually transmitted diseases. Rev Esc Enfermagem USP 2012; 46(4): 877-83. 2626. Damacena GN, Szwarcwald CL, de Souza Junior PR, Dourado I. Risk factors associated with HIV prevalence among female sex workers in 10 Brazilian cities. J Acquir Immune Defic Syndr 2011; 57 Suppl 3: S144-52. 5151. Trevisol FS, Silva MV. HIV frequency among female sex workers in Imbituba, Santa Catarina, Brazil. Braz J Infect Dis 2005; 9(6): 500-5..
Com relação aos usuários de drogas, aproximadamente 40% relataram nunca usar preservativo, aumentando para 60% quando estavam sob o efeito de substâncias psicoativas1111. Bertoni N, Singer M, Silva CM, Clair S, Malta M, Bastos FI. Knowledge of AIDS and HIV transmission among drug users in Rio de Janeiro, Brazil. Harm Reduct J 2011; 8: 5.. Mas, não há publicações recentes sobre usuários de drogas injetáveis, ao menos estudos indexados. O inquérito mais recente financiado pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD) do Ministério da Justiça entre usuários de crack e/ou similares nas 26 capitais brasileiras e no Distrito Federal ocorreu entre 2011 e 2013. Nesse estudo, mais de um terço (39,5%) dos usuários de crack/similares no Brasil informaram não ter usado o preservativo em nenhuma das relações sexuais vaginais no mês anterior à entrevista1212. Brasil. Ministério da Justiça. Perfil dos usuários de crack e/ou similares no Brasil. Brasília: Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas; 2013.
Finalmente, considerando os estudos com adolescentes, identifica-se incremento no uso de preservativos comparando-se 1998 a 20054444. Paiva V, Calazans G, Venturi G, Dias R; Grupo de Estudos em População, Sexualidade e AIDS. [Age and condom use at first sexual intercourse of Brazilian adolescents]. Rev Saude Publica 2008; 42 Suppl 1: 45-53.., e relatos mais frequentes de uso do preservativo no âmbito de relações sexuais com parceiros casuais (80%) quando comparados aos parceiros fixos (40%)2323. Calazans G, Araujo TW, Venturi G, Franca Junior I. Factors associated with condom use among youth aged 15-24 years in Brazil in 2003. AIDS 2005; 19 Suppl 4: S42-50.. O mais recente artigo entre jovens conscritos do exército brasileiro realizado em 2007 indicou uso regular do preservativo em parcerias fixas e casuais em torno de 40% e 50% nos anos de 1999, 2000, 2002, e 2007. E trouxe preocupações pela observação da diminuição do uso regular de preservativos nas relações com parcerias fixas e casuais entre os anos de 2002 (48,5%) e 2007 (43,1%), especialmente entre aqueles com menos escolaridade; pelo incremento no indicador composto de comportamento de risco (média do número de parceiros no ano anterior, ponderada pela proporção do não uso de preservativos de acordo com o tipo de parceiro); e pela menor proporção de uso de preservativos entre os jovens HSH88. Szwarcwald CL, Andrade CL, Pascom AR, Fazito E, Pereira GF, Penha IT. HIV-related risky practices among Brazilian young men, 2007. Cad Saude Publica 2011; 27 Suppl 1: S19-26..
PRINCIPAIS ACHADOS DOS ESTUDOS DE INTERVENÇÃO: O QUE FUNCIONA PARA PROMOVER O USO DO PRESERVATIVO
Foram identificadas propostas de intervenções que se mostraram efetivas para incentivar o uso de preservativos (Tabelas 3 e 4)2929. Diaz M, Mello MB, Sousa MH, Cabral F, Castro e Silva R, Campos M, et al. Outcomes of three different models for sex education and citizenship programs concerning knowledge, attitudes, and behavior of Brazilian adolescents. Cad Saude Publica 2005; 21(2): 589-97. 5353. Viana FJ, Faundes A, de Mello MB, de Sousa MH. Factors associated with safe sex among public school students in Minas Gerais, Brazil. Cad Saude Publica 2007; 23(1): 43-51. 5555. Lippman SA, Donini A, Diaz J, Chinaglia M, Reingold A, Kerrigan D. Social-environmental factors and protective sexual behavior among sex workers: the Encontros intervention in Brazil. Am J Public Health 2010; 100 Suppl 1: S216-23. 5858. Pechansky F, Bassani DG, Diemen L, Kessler F, Leukefeld CG, Surratt HL, et al. Using thought mapping and structured stories to decrease HIV risk behaviors among cocaine injectors and crack smokers in the South of Brazil. Rev Bras Psiquiatr 2007; 29(3): 233-40. 6060. Magnani RJ, Gaffikin L, de Aquino EM, Seiber EE, Almeida MC, Lipovsek V. Impact of an integrated adolescent reproductive health program in Brazil. Stud Fam Plann 2001; 32(3): 230-43. 6464. Colosio R, Fernandes MI, Bergamaschi DP, Scarcelli IR, Lopes IC, Hearst N. [HIV prevention using the operative group approach among men who have sex with men in Sao Paulo, Brazil]. Cad Saude Publica 2007; 23(4): 949-59.. Estas incluem combinação de intervenções para aumentar a adesão ao preservativo, e grupos de apoio para discutir seu uso e sua negociação. A combinação de intervenções mostrou-se mais efetiva do que se concentrar em uma prática específica (Tabela 3). Participar em grupos de apoio, que discutem estratégias para promover o uso e mobilizar a negociação do preservativo, tem sido apontado como fator importante para aumentar a aceitabilidade e a confiança das mulheres na incorporação do preservativo em suas relações. No entanto, há pouca evidência de como atuam efetivamente estas intervenções para aumentar a adesão ao preservativo.
DISCUSSÃO
Antes de apresentarmos as principais considerações sobre a literatura revisada, ressaltamos que não se pretendeu esgotar a produção de conhecimentos sobre o uso do preservativo no Brasil. Além disso, enfrentam-se limites, tais como o recorte temporal na seleção dos artigos, os critérios de seleção escolhidos e um número limitado de estudos de intervenção.
O exame dos artigos identificados aqui permite destacar três pontos centrais sobre o uso do preservativo masculino no âmbito da política de prevenção do HIV/AIDS para a reflexão e o aprimoramento da prevenção do HIV no Brasil:
Seja qual for o modelo de prevenção de DST/HIV/AIDS que o Brasil adote em um futuro próximo, é necessário uma maior regularidade nos estudos nacionais que avaliem indicadores de prevenção incluindo o uso do preservativo masculino. E um esforço conjunto entre governo, academia e sociedade civil para assegurar a regularidade necessária no desenvolvimento desses estudos, objetivando o estabelecimento de uma política de monitoramento desses indicadores, assim como a padronização das medidas adotadas nos estudos assegurando comparabilidade entre os mesmos. Como já apontado anteriormente em uma revisão sistemática dos estudos que estimaram a prevalência do HIV em TS, UD e HSH no Brasil, comissionada pelo antigo PN em 20086767. Mello MB, Malta M, Pascom AR, Linhares Y. Revisão sistemática de estudos com HSH, UDI e TS no Brasil:1998-2008. Brasília: Departamento Nacional de DST/AIDS. Ministério da Saúde; 2008. 6868. Malta M, Magnanini MM, Mello MB, Pascom AR, Linhares Y, Bastos FI. HIV prevalence among female sex workers, drug users and men who have sex with men in Brazil: a systematic review and meta-analysis. BMC Public Health 2010; 10: 317., a falta de padronização dos indicadores de uso do preservativo masculino entre os diferentes estudos dificultou a comparação efetiva entre eles. Além disto, nestes documentos e em acordo com as recomendações do relatório da UNAIDS sobre os indicadores
UNGASS6969. United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). Monitoring the Declaration of Commitment on HIV/ AIDS: guidelines on construction of core indicators; 2008 reporting. UNAIDS. Geneva.2008., recomenda-se que "estudos futuros e, em especial, os sistemas nacionais de vigilância comportamental com populações de TS, HSH e UDI deveriam incorporar, ao menos, os indicadores UNGASS de uso de preservativo masculinos, para permitir o monitoramento consistente de comportamentos sexuais de risco dessas populações e a efetividade das ações de prevenção na adoção de comportamentos de menor risco";
neste mesmo esforço conjunto, é necessário assegurar que, a partir de todos os estudos realizados no âmbito das políticas de prevenção do HIV/AIDS no Brasil, sejam realizadas e publicadas análises sobre os fatores associados ao uso do preservativo masculino tanto na população geral quanto entre os grupos nos quais a epidemia se concentra no Brasil, como fizeram os estudos de RDS entre HSH e TS;
a política de prevenção, baseada na promoção do uso de preservativos, deve basear-se numa combinação de intervenções, que inclua a participação em grupos de apoio que discutam estratégias para promover o uso, e mobilizar a negociação do preservativo. É importante, no entanto, o desenvolvimento de estudos que contribuam para compreender e produzir evidências sobre como atuam efetivamente estas intervenções para aumentar o uso e a adesão ao preservativo. Destacamos, a seguir, alguns pontos adicionais para consideração de novas perspectivas na política nacional de prevenção e promoção do uso do preservativo.
Outras considerações para pensar o futuro da prevenção do HIV/AIDS no Brasil devem levar em conta que os dados que indicam redução ou eventual estabilização no uso do preservativo masculino, trazem uma diversidade de questões à política nacional de prevenção. Seria possível obter maior proporção do uso do preservativo masculino? A literatura acadêmica e a mídia internacional fizeram referência, desde o final dos anos 1990, ao que se convencionou chamar de "fadiga do preservativo" ou "fadiga da prevenção7070. Adam BD, Husbands W, Murray J, Maxwell J. AIDS optimism, condom fatigue, or self-esteem? Explaining unsafe sex among gay and bisexual men. J Sex Res 2005; 42(3): 238-48. 7272. James SK. Condom Fatigue Or Prevention Fatigue? 2010. Disponível em http://ezinearticles.com/?CondomFatigue-Or-Prevention-Fatigue?&id=5196308 (Acessado em 12 de Janeiro de 2014).
http://ezinearticles.com/?CondomFatigue-... além da falta de contatos dos mais jovens com a AIDS, a redução dos processos de intervenção, mudanças na forma de busca de parceiros (mundo virtual), como causas explicativas do aumento de casos de AIDS em cidades e países onde havia ocorrido, anteriormente, declínio ou estabilização da epidemia.
O surgimento de novas biotecnologias de prevenção (circuncisão, microbicidas, PEP, PrEP), além das estratégias comportamentais (como soro-posicionamento, soro-adaptação e outras modalidades de acordo entre parceiros sexuais) coloca em questão se o preservativo será, para todos e em todas as situações, o método de prevenção mais adequado. Coloca-se também em questão se a medida de uso consistente ou uso regular do preservativo, caracterizado pelo uso com todos os tipos de parceiros, fixos/estáveis, casuais ou eventuais, em todas as relações sexuais nos últimos 3, 6, 12 meses, que tem sido utilizada nas pesquisas de vigilância comportamental, mostra-se como a mais adequada para se referir a práticas preventivas seguras ou adequadas. Isso tendo em vista que as pessoas poderiam referir não ter usado preservativo em determinada relação sexual, mas nem por isso ter se exposto ao vírus, em função de outras modalidades de prevenção terem sido adotadas. Há a necessidade de que estudos futuros busquem novas formas de mensurar a adoção de uma combinação de estratégias de prevenção, que inclua o uso do preservativo e o julgamento de quanto este é considerado o método mais adequado.
A combinação de estratégias de incentivo ao uso do preservativo, que articula a promoção da reflexão e da possibilidade de apropriação, pelos sujeitos, dos condicionantes sociais do uso dos métodos de prevenção parece ser mais efetiva. Nesse sentido, as novas abordagens, ao reconhecer tais condicionantes sociais associados a uma medida de prevenção que incide nas práticas sexuais, devem trazer a questão do sexo e do prazer para a cena de promoção do uso e da adesão ao preservativo, seja no contexto de relações afetivas, hetero ou homossexuais, em que os valores atribuídos à confiança, à fidelidade e ao amor contrastam com os riscos de uma doença a ser prevenida, seja no contexto das relações heterossexuais em que há expectativas em relação à reprodução como destacado no artigo de Villela e Barbosa7373. Villela WV, Barbosa RM. Prevenção da transmissão heterossexual do HIV entre mulheres: é possível pensar estratégias sem considerar suas demandas reprodutivas? Rev Bras Epidemiol 2015; n.esp HIV: 131-42., e por Everett et al.7474. Everett SA, Warren CW, Santelli JS, Kann L, Collins JL, Kolbe LJ. Use of birth control pills, condoms, and withdrawal among U.S. high school students. J Adolesc Health 2000; 27(2): 112-8.; ou ainda no contexto das relações homossexuais em que se atribui valor ao contato com o esperma e os fluidos do parceiro, como sinal de aceitação e intimidade como destacado no artigo de Terto Jr7575. Terto Jr. V. Diferentes prevenções geram diferentes escolhas? Reflexões para a prevenção de HIV/AIDS em homens que fazem sexo com homens e outras populações vulneráveis. Rev Bras Epidemiol 2015; n.esp HIV: 156-68.. E é necessário reconhecer diversas causas de ordem afetivo-normativa que implicam em barreiras à adoção do preservativo como método regular de prevenção.
Em relação à dificuldade em manter o uso de preservativos no contexto de relações consideradas estáveis pelos parceiros envolvidos, algumas estratégias de prevenção recentemente adotadas, de caráter biomédico ou comportamental, buscam dar conta de tal desafio. Como é o caso do tratamento como prevenção7676. Dabis F. Test and treat all as soon as possible. Lancet Glob Health 2014; 2(1): e2-e3., em que parceiros sorodiferentes abandonam o uso do preservativo tendo em vista a proteção conferida pelo tratamento antirretroviral. Ou, ainda, das estratégias de soro-adaptação7777. McConnell JJ, Bragg L, Shiboski S, Grant RM. Sexual seroadaptation: lessons for prevention and sex research from a cohort of HIV-positive men who have sex with men. PloS One 2010; 5(1): e8831. que têm sido adotadas por comunidades gays internacionais como alternativa para a redução dos riscos de infecção. Tudo isto nos leva a crer que devemos considerar com limites a possibilidade de ampliação da proporção de pessoas que usam o preservativo de forma regular. Para algumas pessoas e alguns contextos relacionais, é possível que outras estratégias de prevenção mostrem-se mais adequadas e, assim, mais efetivas.
AGRADECIMENTOS
As autoras agradecem ao Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) (Alexandre Grangeiro), Instituto de Saúde da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES/SP) (Projeto CTA Mais) e Departamento Nacional de DST, AIDS e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, com a participação do Centro de Referência e Treinamento em DST e AIDS da SES/SP, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e Fiocruz-Brasília (Dulce Ferraz). A participação de Sarah MacCarthy neste artigo foi possível com o apoio do projeto "HIV and Other Infectious Consequences of Substance Abuse" (T32DA13911-12), da Lifespan/ Tufts/Brown Center for AIDS Research (P30AI042853) e do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NIAID/EUA).
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- Fonte de financiamento: nenhuma.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
Set 2015
Histórico
- Recebido
30 Jan 2014 - Revisado
07 Jan 2015 - Aceito
27 Jan 2015