Fatores ligados aos serviços de saúde determinam o aleitamento materno na primeira hora de vida no Distrito Federal, Brasil, 2011

Naíza Nayla Bandeira de Sá Muriel Bauermann Gubert Wallace dos Santos Leonor Maria Pacheco Santos Sobre os autores

RESUMO:

Objetivo:

Identificar os fatores associados ao aleitamento materno na primeira hora de vida.

Métodos:

Estudo transversal, realizado junto às mães e crianças menores de um ano de idade, que compareceram à segunda etapa da campanha de poliomielite no Distrito Federal, Brasil, em 2011. A amostra estudada foi de 1.027 pares (mães e filhos). Considerou-se como variável dependente o aleitamento materno na primeira hora de vida e, como variáveis independentes, as características sociodemográficas da mãe, assistência ao pré-natal, parto e puerpério, referência à violência física, verbal e negligência no momento do parto e saúde da criança. As razões de prevalência (RP), brutas e ajustadas, foram utilizadas como medida de associação, calculadas por regressão de Poisson.

Resultados:

Foi encontrada prevalência de 77,3% de aleitamento materno na primeira hora de vida. Não ter realizado pré-natal de forma adequada (RP = 0,72), ter feito parto cesáreo (RP = 0,88) e mãe e filho não permanecerem em alojamento conjunto após o parto (RP = 0,28) foram fatores que interferiram negativamente no aleitamento materno na primeira hora. Nenhuma característica materna e da criança esteve associada ao aleitamento materno na primeira hora.

Conclusão:

Fatores ligados aos serviços de saúde, como assistência ao pré-natal, tipo de parto e alojamento conjunto, interferiram no aleitamento materno na primeira hora, indicando que as práticas dos serviços e dos profissionais de saúde foram os principais determinantes do aleitamento materno na primeira hora.

Palavras-chave:
Aleitamento materno; Vacinação em massa; Serviços de saúde; Saúde materno-infantil; Cuidado pré-natal; Alojamento conjunto

INTRODUÇÃO

A Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza que imediatamente após o parto deve ser oportunizado à mãe e à criança o contato pele a pele entre ambos, sendo esse o período em que as mães devem ser orientadas quanto ao reconhecimento do momento em que seus filhos estão prontos para mamar pela primeira vez11. Children's Rights & Emergency Relief Organization (UNICEF), World Health Organization (WHO). Baby-friendly hospital initiative: revised, updated and expanded for integrated care. Section 4, Hospital self-appraisal and monitoring. Geneva: UNICEF/WHO; 2009.,22. World Health Organization (WHO). Maternal, newborn, child and adolescent health approved by the WHO Guidelines Review Committee. Handbook for guideline development. Geneva: WHO; 2012..

O aleitamento materno (AM) garante às crianças os nutrientes necessários para o seu crescimento e desenvolvimento saudável e seus benefícios podem ser observados além da primeira infância. Estudo recente realizado em Pelotas, Rio Grande do Sul, apontou que crianças que mamaram durante 12 ou mais meses apresentaram maior coeficiente de inteligência, escolaridade e renda aos 30 anos de idade, em relação às crianças que mamaram por menos de um mês33. Victora CG, Horta BL, Mola CL, Quevedo L, Pinheiro RT, Gigante DP, et al. Association between breastfeeding and intelligence, educational attainment, and income at 30 years of age: a prospective birth cohort study from Brazil. Lancet 2015; 3(4): 199-205..

O início precoce do AM, na primeira hora de vida, proporciona ao recém-nascido benefícios imunológicos, psicossociais, fortalecimento do vínculo materno-infantil44. World Health Organization (WHO). Global strategy for infant and young child feeding. A joint WHO/UNICEF statement. Geneve: WHO; 2003., além de aumentar a probabilidade da criança receber o colostro, que é altamente nutritivo, de fácil digestão e apresenta propriedades imunológicas substanciais para essa fase da vida55. Children's Rights & Emergency Relief Organization (UNICEF), World Health Organization (WHO). Baby-friendly hospital initiative: revised, updated and expanded for integrated care. Section 3, Breastfeeding promotion and support in a baby-friendly hospital: a 20-hour course for maternity staff. Geneve: WHO; 2009.. Desta forma, o aleitamento materno na primeira hora de vida (AMPH) é considerado como um importante fator de proteção para a mortalidade neonatal66. Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MIC, Pérez-Escamilla R. Breastfeeding during the first hour of life and neonatal mortality. J Pediatr 2013; 89(2): 131-6.. Os principais achados de um estudo conduzido em Gana, África, nos anos de 2003 a 2004, apontaram que 16,3% dos óbitos neonatais poderiam ser evitados se a amamentação iniciasse no primeiro dia de vida e 22,3% se o aleitamento materno fosse realizado na primeira hora de vida77. Edmond KM, Zandoh C, Quigley MA, Amenga-Etego S, Owusu-Agyei S, Kirkwood BR. Delayed breastfeeding initiation increases risk of neonatal mortality. Pediatrics 2006; 117(3): 380-6..

Revisão sistemática de literatura, realizada por Esteves et al.88. Esteves TMB, Daumas RP, Oliveira MIC, Andrade CAF, Leite IC. Fatores associados à amamentação na primeira hora de vida: revisão sistemática. Rev Saúde Pública 2014; 48(4): 697-703., indicou que a prevalência de AMPH variou de 11,4% em uma província na Arábia Saudita99. El-Gilany AH, Sarraf B, Al-Wehady A. Factors associated with timely initiation of breastfeeding in Al- Hassa province, Saudi Arabia. East Mediterr Health J 2012; 18(3): 250-4. a 83,3% no Sri Lanka1010. Senarath U, Siriwardena I, Godakandage SS, Jayawickrama H, Fernando DN, Dibley MJ. Determinants of breastfeeding practices: an analysis of the Sri Lanka Demographic and Health Survey 2006-2007. Matern Child Nutr 2012; 8(3): 315-29.. Dados da II Pesquisa de prevalência de aleitamento materno nas capitais brasileiras e Distrito Federal (DF) apontaram que 67,7% das crianças mamaram na primeira hora de vida nas capitais brasileiras em 20081111. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília: Ministério da Saúde; 2009.. A Pesquisa Nascer no Brasil, realizada nas cinco macrorregiões do país, no período de 2011 a 2012, encontrou prevalência de 50,4% de AMPH entre os recém-nascidos na região Centro-Oeste1212. Moreira MEL, Gama SGN, Pereira APE, Silva AAM, Lansky S, Pinheiro RS, et al. Práticas de atenção hospitalar ao recém-nascido saudável no Brasil. Cad Saúde Pública 2014; 30(Suppl 1): 128-39..

A equipe de saúde tem o papel de ajudar e apoiar o par mãe e filho para que o AMPH ocorra de forma adequada11. Children's Rights & Emergency Relief Organization (UNICEF), World Health Organization (WHO). Baby-friendly hospital initiative: revised, updated and expanded for integrated care. Section 4, Hospital self-appraisal and monitoring. Geneva: UNICEF/WHO; 2009.,22. World Health Organization (WHO). Maternal, newborn, child and adolescent health approved by the WHO Guidelines Review Committee. Handbook for guideline development. Geneva: WHO; 2012.. A literatura tem indicado que as práticas dos profissionais de saúde88. Esteves TMB, Daumas RP, Oliveira MIC, Andrade CAF, Leite IC. Fatores associados à amamentação na primeira hora de vida: revisão sistemática. Rev Saúde Pública 2014; 48(4): 697-703.,1313. Patel A, Badhoniya N, Khadse S, Senarath U, Agho KE, Dibley MJ, et al. Infant and young child feeding indicators and determinants of poor feeding practices in India: secondary data analysis of National Family Health Survey 2005-06. Food Nutr Bull 2010; 31(2): 314-33.,1414. Oliveira MI, Silva KS, Gomes Junior SC, Fonseca VM. Delivering rapid HIV tests results after delivery: a threat to breastfeeding at birth. Rev Saúde Pública 2010; 44(1): 60-9.,1515. Will TK, Arndt JG, Torres GG, Andrade JR, Pereira TSS, Molina MCB. Fatores de proteção para a amamentação na primeira hora de vida. Rev Bras Promoc Saúde 2013; 26(2): 274-80.,1616. Adugna DT. Women's perception and risk factors for delayed initiation of breastfeeding in Arba Minch Zuria, Southern Ethiopia. Int Breastfeed J 2014; 9: 8.,1717. Setegn T, Gerbaba M, Belachew T. Determinants of timely initiation of breasftfeeding among mothers in Goba Woreda, South East Ethiopia: a cross sectional study. BMC Public Health 2011; 11: 217.,1818. Vieira TO, Vieira GO, Giugliani ER, Mendes CM, Martins CC, Silva LR. Determinants of breastfeeding initiation within the first hour of life in a Brazilian population: cross-sectional study. BMC Public Health 2010; 10: 760., bem como a organização e gestão dos serviços de saúde, são determinantes para o início precoce da amamentação1212. Moreira MEL, Gama SGN, Pereira APE, Silva AAM, Lansky S, Pinheiro RS, et al. Práticas de atenção hospitalar ao recém-nascido saudável no Brasil. Cad Saúde Pública 2014; 30(Suppl 1): 128-39.. Mães que fizeram o pré-natal1313. Patel A, Badhoniya N, Khadse S, Senarath U, Agho KE, Dibley MJ, et al. Infant and young child feeding indicators and determinants of poor feeding practices in India: secondary data analysis of National Family Health Survey 2005-06. Food Nutr Bull 2010; 31(2): 314-33., que foram aconselhadas durante o pré-natal sobre AM1818. Vieira TO, Vieira GO, Giugliani ER, Mendes CM, Martins CC, Silva LR. Determinants of breastfeeding initiation within the first hour of life in a Brazilian population: cross-sectional study. BMC Public Health 2010; 10: 760. e que receberam auxílio dos profissionais de saúde no pós-parto para o AM foram mais propensas a amamentar seus filhos na primeira hora1616. Adugna DT. Women's perception and risk factors for delayed initiation of breastfeeding in Arba Minch Zuria, Southern Ethiopia. Int Breastfeed J 2014; 9: 8.,1717. Setegn T, Gerbaba M, Belachew T. Determinants of timely initiation of breasftfeeding among mothers in Goba Woreda, South East Ethiopia: a cross sectional study. BMC Public Health 2011; 11: 217.. No que se refere aos serviços de saúde, foram indicados como fatores protetores para o aleitamento na primeira hora de vida: permitir acompanhante no parto, ter parto financiado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e nascer em hospitais que tenham o título Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC)1212. Moreira MEL, Gama SGN, Pereira APE, Silva AAM, Lansky S, Pinheiro RS, et al. Práticas de atenção hospitalar ao recém-nascido saudável no Brasil. Cad Saúde Pública 2014; 30(Suppl 1): 128-39..

Poucos estudos investigaram os fatores associados ao AMPH para a população brasileira1515. Will TK, Arndt JG, Torres GG, Andrade JR, Pereira TSS, Molina MCB. Fatores de proteção para a amamentação na primeira hora de vida. Rev Bras Promoc Saúde 2013; 26(2): 274-80.,1818. Vieira TO, Vieira GO, Giugliani ER, Mendes CM, Martins CC, Silva LR. Determinants of breastfeeding initiation within the first hour of life in a Brazilian population: cross-sectional study. BMC Public Health 2010; 10: 760.,1919. Pereira CRVR, Fonseca VM, Oliveira MIC, Souza IEO, Mello RR. Avaliação de fatores que interferem na amamentação na primeira hora de vida. Rev Bras Epidemiol 2013; 16(2): 525-34.,2020. Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MIC, Vasconcelos AGG. Fatores associados à amamentação na primeira hora de vida. Rev Saúde Pública 2011; 45(1): 69-78.,2121. Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MIC, Leal MC, Carvalho MS. Fatores que interferem no tempo entre o nascimento e a primeira mamada. Cad Saúde Pública 2008; 24(11): 2681-94.,2222. Silveira RB, Albernaz E, Zuccheto LM. Fatores associados ao início da amamentação em uma cidade do sul do Brasil. Rev Bras Saúde Mater Infant 2008; 8(1): 35-43. e nenhum na região Centro Oeste. Desta forma, este estudo objetivou conhecer a prevalência de aleitamento materno na primeira hora de vida, bem como os fatores que interferiram nessa prática no DF, capital do país, em 2011.

MÉTODOS

DESENHO DO ESTUDO

Trata-se de um estudo do tipo transversal, realizado em agosto de 2011, durante a segunda etapa da campanha de poliomielite no DF. Os sujeitos de pesquisa foram pares de mães e seus filhos, com idade entre 0 e 12 meses, que compareceram às unidades de saúde selecionadas conforme o planejamento amostral.

A amostra aplicada foi por conglomerado, com seleção em dois estágios e probabilidade proporcional ao tamanho do conglomerado. Para o cálculo do tamanho da amostra considerou-se a prevalência conservadora de 50%, em razão dos diversos indicadores investigados, além do nível de confiança de 95% e do erro amostral máximo de 4%. O cálculo resultou em um tamanho amostral de 1.170 pares mãe e filho, já levando em conta uma perda amostral de até 30% e corrigindo o efeito do plano amostral (EPA) igual a 1,5.

A seleção do primeiro estágio amostral (postos de vacinação) foi realizada de forma que houvesse a representatividade de todas as regiões administrativas (RA) do DF que possuíssem, em seu território, postos de vacinação elegíveis para participar do inquérito:

  1. estar localizado em perímetro urbano;

  2. ser posto fixo; e

  3. dispor dos dados da campanha de multivacinação realizada em junho de 2010 no DF.

A seleção de postos elegíveis resultou em um total de 25 postos de vacinação a serem pesquisados, distribuídos em 21 das 30 RA que o DF possuía em 2011.

O segundo estágio referiu-se à seleção sistemática dos pares mãe e filho na fila de vacinação, na data da pesquisa. Calculou-se o intervalo amostral para cada unidade de coleta selecionada, de acordo com a estimativa de comparecimento baseada no número de crianças vacinadas naquela unidade na campanha do ano anterior. O intervalo pré-determinado variou de 1:2 até 1:10 crianças, para atingir a meta amostral em cada posto de vacinação. A equipe de coordenação monitorou, durante todo o Dia D, a obtenção do tamanho amostral em cada unidade de coleta. Nos casos em que se constatou uma procura por vacinação menor do que o esperado, diminuiu-se o intervalo de seleção para atingir a meta amostral em intervalos menores aos pré-determinados, o que ocorreu em 9 dos 25 postos de vacinação (36,0%), contudo, preservaram-se os critérios de inclusão e aleatoriedade da amostra.

Os pares mãe e filho elegíveis para esta pesquisa foram aqueles cuja criança tinha idade inferior a um ano e estava acompanhada pela mãe; deviam ser residentes na RA em que o posto de vacinação estava localizado; não apresentar doença ou imobilização que interferisse na aferição do peso e estatura de ambos; não ser gêmeo e nem filho adotivo. Se a mãe elegível estivesse com mais de um filho menor de um ano, o mais velho era o selecionado para participar do estudo. Para a análise, foram excluídos 143 pares mãe e filho com dados inconsistentes ou sem informação sobre o AMPH, restando 1.027 pares para o estudo.

O fator de ponderação foi calculado conforme o número de crianças menores de um ano de idade vacinadas na segunda etapa da campanha de poliomielite no DF, utilizando-se os dados fornecidos pela Secretaria de Saúde do DF, além do desenho da amostra, tendo os postos de saúde como unidade primária de amostragem. A cobertura da segunda etapa da campanha de vacinação contra poliomielite, na faixa etária de crianças menores de 12 meses no DF, realizada em 2011, momento em que os dados deste estudo foram coletados, foi igual a 97,9%, variando de 67,1% na RA Asa Norte a 151,1% na RA Lago Norte2323. Governo do Distrito Federal. Secretaria de Estado de Saúde. Relatório estatístico da Secretaria de Estado de saúde do Distrito Federal e Hospital Universitário de Brasília. Brasília: Secretaria de Estado de Saúde; 2011.. A alta cobertura contribui para reduzir o viés de seleção nesse tipo de estratégia de coleta de dados2424. Santos LM, Paes-Sousa R, Silva Junior JB, Victora CG. National Immunization Day: a strategy to monitor health and nutrition indicators. Bull World Health Organ 2008; 86(6): 474-9..

COLETA DE DADOS

Para a coleta de dados foi utilizado um formulário testado previamente, adaptado da Chamada Neonatal realizada nas Regiões da Amazônia Legal e Nordeste brasileiros2525. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Ciência e Tecnologia. Avaliação da atenção ao pré-natal, ao parto e aos menores de um ano na Amazônia Legal e no Nordeste, Brasil, 2010. Brasília: Ministério da Saúde; 2013., aplicado à mãe da criança, acrescido de um módulo sobre violência no parto2626. Souza KJ. Violência institucional na atenção obstétrica: proposta de modelo preditivo para depressão pós-parto [dissertação de mestrado]. Brasília: Universidade de Brasília; 2014.. O formulário foi preenchido digitalmente pelos entrevistadores, que foram estudantes ou profissionais da área da saúde, com a utilização de um Personal Digital Assistant (PDA). A pesquisa investigou vários fatores relacionados ao pré-natal, parto, saúde da mulher e criança. No presente estudo foram utilizadas as questões sobre as características sociodemográficas da mãe (idade, escolaridade e raça/cor materna); assistência ao pré-natal (pré-natal adequado e avaliação da usuária sobre a qualidade da assistência ao pré-natal), assistência ao parto (tipo de serviço de realização do parto, tipo de parto, presença de acompanhante no pré-parto, parto e no pós-parto, violência durante o parto e avaliação da usuária sobre a qualidade da assistência ao parto) e assistência ao puerpério (alojamento conjunto e aleitamento materno na primeira hora de vida); saúde da criança e suas características (sexo da criança, peso ao nascer, idade gestacional e índice de Apgar no 5º minuto).

CLASSIFICAÇÃO DAS VARIÁVEIS DE ESTUDO

O aleitamento materno na primeira hora de vida, variável dependente deste estudo, foi respondido pela mãe por meio da pergunta: "A criança foi colocada no peito para mamar na primeira hora de vida, logo após o parto?", sendo a resposta classificada em "não" ou "sim".

A idade da mãe foi classificada em quatro faixas etárias: 14 a 19, 20 a 29, 30 a 34 e ≥ 35 anos de idade. A escolaridade materna foi classificada em três níveis: 0 a 8, 9 a 11 e ≥ 12 anos de anos de estudo. A cor da pele foi classificada em três categorias: branca, negra ou amarela/indígena, considerada proxy da situação socioeconômica.

A conformidade da assistência prestada no pré-natal foi classificada conforme modelo proposto por Leal et al.2727. Leal MC, Theme-Filha MM, Moura EC, Cecatti JG, Santos LMP. Atenção ao pré-natal e parto em mulheres usuárias do sistema público de saúde residentes na Amazônia Legal e no Nordeste, Brasil 2010. Rev Bras Saúde Mater Infant 2015; 15(1): 91-104., que tiveram como base os indicadores de processo do Programa Nacional de Humanização do Pré-natal (PHPN). Desta forma, a assistência pré-natal foi classificada em duas categorias. Considerou-se o pré-natal adequado quando a mulher atendeu aos 11 critérios estabelecidos, sendo estes:

  1. ter iniciado no primeiro trimestre gestacional;

  2. ter realizado seis ou mais consultas;

  3. peso aferido em todas as consultas;

  4. pressão arterial sistêmica aferida em todas as consultas;

  5. realizou análise de urina;

  6. realizou hemograma;

  7. realizou glicemia;

  8. fez teste para sífilis e recebeu o resultado em até 15 dias;

  9. fez teste para a síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) e recebeu o resultado em até 15 dias;

  10. foi orientada sobre aleitamento materno; e

  11. recebeu orientação sobre o local para a realização do parto.

O pré-natal foi inadequado na ausência de qualquer um desses cuidados. A avaliação da usuária da qualidade do pré-natal e do parto foi classificada em: muito boa/boa; satisfatória; ou ruim/muito ruim. O tipo de parto foi categorizado, conforme a via de parto, em duas categorias: vaginal ou cesáreo.

Os indicadores de violência na relação parturiente e profissionais de saúde foram analisados segundo método utilizado por Souza2626. Souza KJ. Violência institucional na atenção obstétrica: proposta de modelo preditivo para depressão pós-parto [dissertação de mestrado]. Brasília: Universidade de Brasília; 2014.. Considerou-se violência física quando a entrevistada respondeu sim a uma das questões: Na hora do parto algum profissional:

  • Fez o exame do toque de forma dolorosa?;

  • Bateu em você?;

  • Te empurrou?;

  • Te amarrou?

A violência verbal foi identificada quando a parturiente respondeu sim para qualquer uma das perguntas: Na hora do parto algum profissional:

  • Gritou com você?;

  • Disse algo parecido com: não chora não! Ano que vem você estará aqui de novo?;

  • Na hora de fazer você não chorou, nem chamou a mamãe. Por que está chorando agora?;

  • Se gritar eu paro o que estou fazendo e não vou te atender mais?;

  • Se ficar gritando vai fazer mal para o seu neném. Ele vai nascer surdo?

Enquanto a negligência foi identificada quando as mulheres responderam sim a uma das questões: algum profissional de saúde:

  • Deixou de oferecer alívio para a sua dor?;

  • Negou atendimento?; e

  • Não te informou sobre procedimentos aos quais você estava sendo submetida?

Quando a entrevistada respondeu não para todas as questões de cada um dos blocos (violência verbal, física e negligência), categorizou-se como "não".

No que se refere às características das crianças, foram consideradas como baixo peso crianças com peso ao nascer < 2.500 g; a idade gestacional foi classificada em três categorias: pré-termo, quando a criança nasceu antes da 37a semana de gestação; a termo, considerado quando a criança nasceu entre a 37a e 41a semana de gestação; pós-termo, no caso do nascimento ter ocorrido após a 42a de gestação2828. Ballard JL, Khoury JC, Weding K, Wang L, Eilers-Ealsman BL, Lipp R. New Ballard Score, expanded to include extremely premature infants. J Pediatr 1991; 119(3): 417-23.. O índice de Apgar no 5º minuto foi classificado em duas categorias: 8 a 10 (sem asfixia) e menor que 8 (com asfixia em algum grau)2929. Apgar V. A proposal for a new method of evaluation of the newborn infant. Curr Res Anesth Analg 1953; 32(4): 260-7..

ANÁLISE DE DADOS

Todas as estimativas apresentadas foram calculadas com os pesos pós-estratificação. Inicialmente, calculou-se a distribuição da população segundo as variáveis estudadas com intervalo de confiança de 95% (IC95%). A prevalência de AMPH foi calculada segundo as características sociodemográficas da mãe, da assistência ao pré-natal, parto e puerpério, referência à violência física, verbal e negligência no momento do parto e da saúde da criança.

Posteriormente, foram calculadas para todas as variáveis do estudo as razões de prevalência (RP), brutas e ajustadas, para todas as variáveis do modelo, de AMPH por regressão log-linear de Poisson considerando-se IC95% e p < 0,05. Para o cálculo das razões ajustadas considerou-se AMPH como variável dependente e todas as demais variáveis como independentes, tendo como categoria de referência a de maior proteção para a amamentação na primeira hora de vida. As análises dos dados foram realizadas com auxílio do software estatístico Stata versão 12.0, utilizando-se comandos survey que consideram a complexidade amostral.

ASPECTOS ÉTICOS

A pesquisa "Chamada Neonatal: diagnóstico das condições de saúde e da linha de cuidado à saúde da população materno infantil no Distrito Federal (DF)" foi aprovada pelo Comitê de ética da Universidade de Brasília com o protocolo nº 130/10 de 9 de fevereiro de 2011. Todas as mães participantes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Do total de 1.027 entrevistadas, 77,3% amamentaram na primeira hora de vida. A maioria da amostra não fez o pré-natal de forma adequada (78,4%), porém avaliou a qualidade do seu pré-natal como boa e muito boa (85,9%). No que se refere ao atendimento ao parto, 61,5% dos partos foram cesáreos. A violência verbal por parte dos profissionais de saúde no momento no parto foi referida por 17,8% das parturientes, seguida da violência física (17,3%) e negligência (16,7%); por outro lado, 80,0% das mulheres classificaram a qualidade do atendimento ao parto como boa e muito boa. Quanto às características das crianças menores de 1 ano de idade, 91,8% nasceram com peso maior ou igual a 2.500 g e a maioria nasceu a termo (80,7%) (Tabela 1). Todas as mulheres que foram classificadas como tendo realizado o pré-natal adequado praticaram AMPH. A prevalência de AMPH também foi significativamente maior entre mulheres que tiveram parto vaginal (84,4%), que permaneceram em alojamento conjunto com seus filhos no pós-parto (83,8%) e entre as de menor escolaridade (82,0%). Crianças que nasceram com peso maior ou igual a 2.500 g tiveram maior prevalência de AMPH, assim como aquelas com presença de acompanhante no pós-parto. Após o ajuste para todas as variáveis do estudo, observou-se que não ter realizado o pré-natal de forma adequada e ter feito parto cesáreo diminuíram a probabilidade de AMPH em 28 e 12%, respectivamente. Mãe e filho não permanecerem em alojamento conjunto após o parto reduziu em 72% a probabilidade de AMPH (Tabela 2).

Tabela 1:
Características sociodemográficas da mãe, da assistência ao pré-natal, parto, puerpério, referência à violência no momento do parto e saúde da criança. Distrito Federal, Brasil, 2011.
Tabela 2:
Prevalência e razão de prevalência do aleitamento materno na primeira hora de vida segundo características sociodemográficas da mãe, da assistência ao pré-natal, parto, puerpério, referência à violência no momento do parto e saúde da criança. Distrito Federal, Brasil, 2011.

DISCUSSÃO

Neste estudo, os fatores que interferiram negativamente no AM na primeira hora de vida, após o ajuste para todas as variáveis do modelo, referem-se à prestação da assistência ao pré-natal (não ter realizado pré-natal de forma adequada), ao parto (ter feito parto cesáreo) e ao puerpério (mãe e filho não permanecerem em alojamento conjunto após o parto).

A prevalência de AMPH encontrada neste estudo para o DF (77,3%) está acima da prevalência encontrada para o Brasil, para a região Centro-Oeste e para o DF em estudos anteriores. A II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno, realizada em 2008, apontou que 67,7%, do total de crianças mamaram na primeira hora de vida, sendo que no DF a prevalência observada foi 72,5%3030. Venancio SI, Escuder MML, Saldiva SRDM, Giugliani ERJ. A prática do aleitamento materno nas capitais brasileiras e Distrito Federal: situação atual e avanços. J Pediatr 2010; 86(4): 317-24.. Dados de 2006 da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) demonstraram que 43,0%, das crianças mamaram na primeira hora de vida no Brasil, já na região Centro-Oeste, essa prevalência foi igual a 39,7%. Entretanto, a comparação dos dados deste estudo com a PNDS é limitada, uma vez que as faixas etárias das crianças incluídas nas duas pesquisas são diferentes3131. Brasil. Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher - PNDS 2006. Brasília: Ministério da Saúde; 2008..

Das mulheres entrevistadas nesta pesquisa, 21,6% não realizaram o pré-natal de forma adequada, segundo os critérios do PHPN, entretanto, 85,9% das entrevistadas avaliaram a qualidade da assistência recebida durante o pré-natal como muito boa ou boa. Leal et al.2727. Leal MC, Theme-Filha MM, Moura EC, Cecatti JG, Santos LMP. Atenção ao pré-natal e parto em mulheres usuárias do sistema público de saúde residentes na Amazônia Legal e no Nordeste, Brasil 2010. Rev Bras Saúde Mater Infant 2015; 15(1): 91-104., em estudo realizado na Amazônia Legal e no Nordeste, apontaram que apenas 3,4% das entrevistadas tiveram acesso a um pré-natal classificado como adequado. Em pesquisa no Rio de Janeiro, Domingues et al.3232. Domingues RMSM, Hartz ZMA, Dias MAB, Leal MC. Avaliação da adequação da assistência pré-natal na rede SUS do Município do Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saúde Pública 2012; 28(3): 425-37. verificaram adequação de pré-natal em apenas 38,5% das grávidas investigadas. A diferença encontrada entre os estudos pode ser explicada, em parte, por diferenças amostrais, de acesso aos serviços de saúde e por diferentes critérios para classificação de assistência pré-natal adequada ou não. No que se refere ao grau de satisfação da assistência recebida durante o pré-natal, sabe-se que ele é influenciado pela expectativa de atendimento que cada indivíduo possui, o que na maioria das vezes não reflete a qualidade da assistência recebida, entretanto, é considerado um importante indicador para o controle social3333. Espiridião MA, Trad LAB. Avaliação de satisfação de usuários: considerações teórico-conceituais. Cad Saúde Pública 2006; 22(6): 1267-76.. A literatura tem apontado que a satisfação das mulheres com a qualidade do atendimento pré-natal está relacionada ao número de consultas realizadas3434. Vieira SM, Bock LF, Zocche DA, Pessota CU. Percepção das puérperas sobre a assistência prestada pela equipe de saúde no pré-natal. Texto Contexto Enferm 2011; 20(Esp): 255-62., bem como a comunicação eficiente, a atenção, a confiança e o respeito dos profissionais de saúde para com elas3535. Queiroz MVO, Jorge MSB, Marques JF, Cavalcante AM, Moreira KAP. Indicadores de qualidade da assistência ao nascimento baseados na satisfação de puérperas. Texto Contexto Enferm 2007; 16(3): 479-87..

Todas as entrevistadas classificadas como tendo realizado pré-natal adequado amamentaram na primeira hora de vida. O acesso a consultas médicas durante o pré-natal tem sido apontado na literatura como fator protetor para o AMPH1313. Patel A, Badhoniya N, Khadse S, Senarath U, Agho KE, Dibley MJ, et al. Infant and young child feeding indicators and determinants of poor feeding practices in India: secondary data analysis of National Family Health Survey 2005-06. Food Nutr Bull 2010; 31(2): 314-33.,3636. Mihrshahi S, Kabir I, Roy SK, Agho KE, Senarath U, Dibley MJ, et al. Determinants of infant and young child feeding practices in Bangladesh: secondary data analysis of Demographic and Health Survey 2004. Food Nutr Bull 2010; 31(2): 295-313.. Dados da PNDS de Uganda, realizado em 2006, apontaram que as mulheres que buscaram atendimento pré-natal tiveram maior probabilidade de AMPH (6 a 7%) quando comparadas às que referiram não buscar atendimento durante o pré-natal3737. Bbaale E. Determinants of early initiation, exclusiveness, and duration of breastfeeding in Uganda. J Health Popul Nutr 2014; 32(2): 249-60.. Estudo transversal conduzido no Rio de Janeiro indicou que fazer o pré-natal foi um fator protetor para a não AMPH (RP = 0,23)1919. Pereira CRVR, Fonseca VM, Oliveira MIC, Souza IEO, Mello RR. Avaliação de fatores que interferem na amamentação na primeira hora de vida. Rev Bras Epidemiol 2013; 16(2): 525-34..

Diversos estudos têm apontado que os profissionais de saúde, por meio de suas práticas e ações, exercem influência tanto no início do aleitamento materno, quanto na sua duração3838. Regan J, Thompson A, DeFranco E. The influence of mode of delivery on breastfeeding initiation in women with a prior cesarean delivery: a population-based study. Breastfeed Med 2013; 8(2): 181-6.,3939. Holbrook KE, White MC, Heyman MB, Wojcicki J. Maternal sociodemografic characteristics and the use of the Iowa Infant Attitude Feeding Scale to describe breastfeeding initiation and duration in a population of urban, Latina mothers: a prospective cohort study. Int Breastfeed J 2013; 8(1): 7-14.. Ser orientada sobre aleitamento materno por profissionais de saúde logo após o parto aumentou a chance da mulher amamentar na primeira hora de vida1717. Setegn T, Gerbaba M, Belachew T. Determinants of timely initiation of breasftfeeding among mothers in Goba Woreda, South East Ethiopia: a cross sectional study. BMC Public Health 2011; 11: 217.. Boccolini et al.2020. Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MIC, Vasconcelos AGG. Fatores associados à amamentação na primeira hora de vida. Rev Saúde Pública 2011; 45(1): 69-78. constataram que as mães têm pouco ou nenhum poder de decisão sobre a amamentação de seus filhos na primeira hora de vida, ficando limitadas às práticas dos profissionais envolvidos no parto e às rotinas institucionais vigentes nas maternidades. Realizar procedimentos hospitalares inadequados em recém-nascidos saudáveis, como aspiração de vias aéreas e gástricas imediatamente após o parto55. Children's Rights & Emergency Relief Organization (UNICEF), World Health Organization (WHO). Baby-friendly hospital initiative: revised, updated and expanded for integrated care. Section 3, Breastfeeding promotion and support in a baby-friendly hospital: a 20-hour course for maternity staff. Geneve: WHO; 2009. e fornecer alimentos pré-lácteos para a criança99. El-Gilany AH, Sarraf B, Al-Wehady A. Factors associated with timely initiation of breastfeeding in Al- Hassa province, Saudi Arabia. East Mediterr Health J 2012; 18(3): 250-4. também têm sido apontados na literatura como fatores que podem interferir no início do AM, o que reforça a importância da recomendação da OMS que preconiza que a mãe e o filho não devem ser separados na sala de parto, exceto se existir um motivo de saúde que justifique tal ação11. Children's Rights & Emergency Relief Organization (UNICEF), World Health Organization (WHO). Baby-friendly hospital initiative: revised, updated and expanded for integrated care. Section 4, Hospital self-appraisal and monitoring. Geneva: UNICEF/WHO; 2009.. A prática profissional no momento do parto, desta forma, torna-se crucial para o AMPH.

O parto cesáreo também foi fator relacionado à menor prevalência de AM na primeira hora. Boccolini et al.2020. Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MIC, Vasconcelos AGG. Fatores associados à amamentação na primeira hora de vida. Rev Saúde Pública 2011; 45(1): 69-78. verificaram essa mesma tendência no Rio de Janeiro. A cesariana influencia no adiamento da primeira mamada4040. Zanardo V, Svegliado G, Cavallin F, Giustardi A, Cosmi E, Litta P, et al. Elective cesarean delivery: does it have a negative effect on breastfeeding? Birth 2010; 37(4): 275-79.?,4141. Domingues RMSM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Torres JA, D'Orsi E, Pereira APE, et al. Processo de decisão pelo tipo de parto no Brasil: da preferência inicial das mulheres à via de parto final. Cad Saúde Pública 2014; 30(Suppl 1):101-16. por diversos fatores, dentre eles os relacionados à anestesia e ao próprio procedimento cirúrgico2020. Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MIC, Vasconcelos AGG. Fatores associados à amamentação na primeira hora de vida. Rev Saúde Pública 2011; 45(1): 69-78.. A prevalência de parto cesáreo neste estudo foi elevada (61,5%), maior do que a observada no Brasil (55,4%)4141. Domingues RMSM, Dias MAB, Nakamura-Pereira M, Torres JA, D'Orsi E, Pereira APE, et al. Processo de decisão pelo tipo de parto no Brasil: da preferência inicial das mulheres à via de parto final. Cad Saúde Pública 2014; 30(Suppl 1):101-16., o que aponta para a necessidade de revisão das práticas profissionais em relação à eleição da cesariana como procedimento de rotina, uma vez que, em 2008, o Brasil contribuiu com 15% do total de cesarianas desnecessárias ocorridas no mundo4242. Gibbons L, Belizán JM, Lauer JA, Betrán AP, Merialdi M, Althabe F. World Health Report. Health systems financing. The global numbers and costs of additionally needed and unnecessary caesarean sections performed per year: overuse as a barrier to universal coverage. Geneve; 2010..

A prevalência do AMPH foi maior entre os pares mães e filhos que permaneceram em alojamento conjunto (AC) (83,8%), mantendo a associação (RP = 0,28) mesmo após o ajuste para todas as variáveis do estudo. O alojamento conjunto é um ambiente hospitalar que permite a convivência do binômio mãe e filho durante todo o tempo4343. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 1016, de 26 de agosto de 1993. Normas básicas de alojamento conjunto. Brasília: Diário Oficial da União.. Diversos estudos têm apontado a importância do AC no ato de amamentar, fornecendo maior segurança à mãe em relação à pega e posição correta para a amamentação, autonomia para entender e cuidar da criança, além de proporcionar maior interação entre as puérperas e os profissionais de saúde, que podem aproveitar esse ambiente para abordar temas indispensáveis para a maior eficácia do AM4444. Beck AMO, Assunção KO, Barbosa LR, Gomes E. Influência do ambiente hospitalar nos aspectos relacionados ao aleitamento materno. Rev Soc Bras Fonoaudiol 2012; 17(4): 464-8.,4545. Rodrigues AP, Padoin SMM, Guido LA, Lopes LLD. Fatores do pré-natal e do puerpério que interferem na autoeficácia em amamentação. Esc Anna Nery 2014; 18(2): 257-61.. Revisão sistemática Cochrane constatou que a prevalência de AM exclusivo, até o quarto dia antes da alta hospitalar, foi maior entre as mulheres que permaneceram em AC do que entre as que ficaram separadas de seus filhos4646. Jaafar SH , Lee KS , Ho JJ. Separate care for new mother and infant versus rooming-in for increasing the duration of breastfeeding. Cochrane Database Syst Rev 2012; CD006641..

Embora neste estudo a violência física, verbal e negligência relatadas pela mulher durante o parto não tenham sido associadas ao AMPH, esses são fatores importantes a serem considerados em outros estudos, uma vez que as práticas dos profissionais de saúde foram associadas ao início precoce do AM. É necessário proporcionar cuidado e ambiente adequados à saúde da mulher, que no momento do parto se encontra mais vulnerável física e emocionalmente, priorizando a humanização do parto e colocando a mulher como sujeito da atenção, que muitas vezes fica centralizada somente no recém-nascido e à mercê das práticas dos profissionais de saúde4747. D'Orsi E, Brüggemann OM, Diniz CSG, Aguiar JM, Gusman CR, Torres TA, et al. Desigualdades sociais e satisfação das mulheres com o atendimento ao parto no Brasil: estudo nacional de base hospitalar. Cad Saúde Pública 2014; 30(Suppl 1): 154-68,4848. Aquino EML. Para reinventar o parto e o nascimento no Brasil: de volta ao futuro. Cad Saúde Pública 2014; 30 (Suppl): S8-10.. Alguns autores sugeriram que experiências estressantes no parto podem retardar o início da amamentação4949. Foster DA, McLachalan HL. Breastfeeding initiation and birth setting practices: a review of the literature. J Midwifery Womens Health 2007; 52(3): 273-80., entretanto, nenhum desses estudos investigou a existência de associação entre violência no parto e AMPH, sendo o presente artigo pioneiro ao investigar essa associação. Torna-se, desta forma, necessária a realização de novas pesquisas para que esse fator seja melhor elucidado.

CONCLUSÃO

A realização de pesquisas durante a campanha de vacinação tem sido uma estratégia amplamente utilizada no Brasil, uma vez que apresenta como principais vantagens a obtenção de dados de forma rápida, custo relativamente baixo, mobilização e envolvimento dos gestores locais1111. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília: Ministério da Saúde; 2009.,2424. Santos LM, Paes-Sousa R, Silva Junior JB, Victora CG. National Immunization Day: a strategy to monitor health and nutrition indicators. Bull World Health Organ 2008; 86(6): 474-9.,2727. Leal MC, Theme-Filha MM, Moura EC, Cecatti JG, Santos LMP. Atenção ao pré-natal e parto em mulheres usuárias do sistema público de saúde residentes na Amazônia Legal e no Nordeste, Brasil 2010. Rev Bras Saúde Mater Infant 2015; 15(1): 91-104.. Entretanto, esse tipo de pesquisa somente pode ser realizada se o Programa Nacional de Imunização mantiver a continuidade do "dia D" nas campanhas de vacinação.

No que se refere às principais limitações deste estudo, pode-se citar o fato da Chamada DF não ter tido como principal objeto de investigação os fatores associados ao AMPH, o que limitou a inclusão de outras informações importantes e que poderiam estar associadas a esse desfecho, como: se a mãe teve ajuda para colocar a criança no peito, se o AM ocorreu ainda na sala de parto, se foram realizados procedimentos hospitalares inadequados em recém nascidos saudáveis, como aspiração de vias aéreas e faringe, dentre outros aspectos, além da não inclusão da população residente em áreas rurais do DF.

As práticas dos serviços e dos profissionais de saúde, em todas as etapas da atenção integral à saúde do binômio mãe e filho, são determinantes para o AMPH. É necessário que seja oportunizado às mulheres assistência adequada ao pré-natal, parto e puerpério, para que essas, empoderadas, assumam papel ativo e sejam protagonistas nas decisões referentes à sua saúde e de seus filhos durante a internação para o parto. Os achados deste estudo podem subsidiar melhorias no planejamento e na gestão dos serviços de saúde a fim de promover o AM desde a primeira hora de vida.

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  • Fonte de financiamento: Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2016

Histórico

  • Recebido
    29 Maio 2015
  • Aceito
    10 Set 2015
Associação Brasileira de Pós -Graduação em Saúde Coletiva São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revbrepi@usp.br