Fatores sociodemográficos e capacidade funcional de idosos acometidos por acidente vascular encefálico

Michelinne Oliveira Machado Dutra Alexsandro Silva Coura Inacia Sátiro Xavier de França Bertha Cruz Enders Mayara Araújo Rocha Sobre os autores

RESUMO:

Introdução:

Doenças próprias da velhice têm apresentado crescente prevalência na sociedade. Dentre elas, destaca-se o acidente vascular encefálico, que pode ser conceituado como a interrupção do suprimento sanguíneo cerebral, devido a um extravasamento ou obstrução do vaso sanguíneo provocado por coágulos.

Objetivo:

Verificar as associações entre os fatores sociodemográficos e a capacidade funcional de idosos acometidos por acidente vascular encefálico.

Métodos:

Estudo epidemiológico, transversal e quantitativo, com amostra de 118 idosos com plegias por acidente vascular encefálico, cadastrados em uma das unidades da Estratégia de Saúde da Família de Campina Grande, Paraíba, Brasil. Os dados foram coletados por meio de entrevistas domiciliares. Foram utilizados dois questionários, um para avaliação das variáveis sociodemográficas e, um segundo, denominado Índice de Barthel, destinado à avaliação da capacidade funcional dos sujeitos com relação às atividades de vida diária. A análise foi realizada utilizando-se o programa estatístico SPSS.

Resultados:

Houve predomínio de sujeitos do sexo feminino, viúvos, analfabetos funcionais e com renda familiar de até um salário-mínimo. A média de idade foi de 65 anos (± 9,63). A consistência interna do Índice de Barthel foi satisfatória, com valores do coeficiente alfa de Cronbach na ordem de 0,897 a 0,918. A correlação total de itens corrigidos foi superior a 0,4 e o alfa de Cronbach com item deletado também foi superior a 0,8. As atividades nas quais se verificou maior dificuldade de realização foram micção e evacuação. Verificou-se associação entre a capacidade funcional e a raça, a faixa etária e a escolaridade.

Conclusão:

Constatou-se que os fatores sociodemográficos podem interferir na capacidade funcional de idosos acometidos por acidente vascular encefálico. Nesse sentido, acredita-se que este trabalho possa ter contribuído para a reflexão sobre essa problemática, auxiliando, dessa forma, na promoção do acesso de tais pessoas aos programas assistenciais de saúde.

Palavras-chave:
Idoso; Acidente vascular encefálico; Avaliação geriátrica; Pessoas com deficiência; Atividades cotidianas; Fatores socioeconômicos

INTRODUÇÃO

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)11. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e Pesquisas. Informação demográfica e socioeconômica. Síntese de indicadores sociais 2001-2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br (Acessado em 10 de maio de 2015).
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, a população brasileira encontra-se em um processo de reestruturação demográfica, apresentando diminuição nas taxas de fecundidade, redução da mortalidade e consequente elevação da expectativa de vida.

No Brasil, a população idosa, que, entre 1990 (7,2%) e 2010 (10%), apresentava crescimento, terá magnitude de crescimento a partir de 2020, passando de 28,3 milhões (13,7%) para 52 milhões (23,8%) em 2040, o que representa quase um quarto de todos os habitantes do país22. Mendes AC, Sá DA, Miranda MD, Lyra TM, Tavares RA. Assistência pública de saúde no contexto da transição demográfica brasileira: exigências atuais e futuras. Cad Saúde Pública 2012; 28(5): 955-64..

Por consequência, doenças próprias da velhice têm mostrado uma crescente prevalência na sociedade33. Veras R. Population aging today: demands, challenges and innovations. Rev Saúde Pública 2009; 43(3): 548-54., dentre elas destaca-se o acidente vascular encefálico (AVE), que pode ser conceituado como a interrupção do suprimento sanguíneo cerebral, em função de um extravasamento ou uma obstrução do vaso sanguíneo, provocado por coágulos44. World Health Organization (WHO). The atlas of heart disease and stroke. Geneva: WHO; 2011. Disponível em: http://www.world-heart-federation.org/fileadmin/user_upload/images/CVD_Health/Global_CVD_Atlas.pdf (Acessado em 24 de julho de 2015).
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. Entre os idosos, o AVE tem elevada incidência, com seu pico compreendido entre a sexta e a sétima década de vida55. Oliveira AR, Araújo TL, Costa AG, Morais HC, Silva VM, Lopes MV. Avaliação de pacientes com acidente vascular cerebral acompanhados por programas de assistência domiciliária. Rev Esc Enferm USP 2013; 47(5): 1143-9.,66. Lima ML, Santos JL, Sawada NO, Lima LA. Qualidade de vida de indivíduos com acidente vascular cerebral e seus cuidadores em uma cidade do triângulo mineiro. Rev Bras Epidemiol 2014; 17(2): 453-64.. No mundo, configura-se como a segunda causa de óbito em adultos e a primeira de incapacidade funcional para as atividades de vida diária44. World Health Organization (WHO). The atlas of heart disease and stroke. Geneva: WHO; 2011. Disponível em: http://www.world-heart-federation.org/fileadmin/user_upload/images/CVD_Health/Global_CVD_Atlas.pdf (Acessado em 24 de julho de 2015).
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Dados procedentes de um estudo prospectivo brasileiro apontam incidência anual de 108 casos por 100 mil habitantes, taxa de fatalidade aos 30 dias de 18,5% e aos 12 meses de 30,9%, sendo o índice de recorrência após um episódio do AVE de 15,9%. Aproximadamente um ano após o primeiro AVE, a independência física (para 66% dos sobreviventes) e a ocupação (para 75% dos sobreviventes) são os domínios mais afetados77. Brasil. Diretrizes de atenção à reabilitação da pessoa com acidente vascular cerebral. Brasília, DF: Secretária de Atenção à Saúde; 2013..

A sequela observada com maior frequência após o AVE é a motora88. Pinter MM, Brainin M. Rehabilitation after stroke in older people. Maturitas 2012; 71(2): 104-8.. Cerca de 85,2% dos sobreviventes apresenta algum grau de comprometimento motor. Em decorrência das sequelas, os sujeitos, na maioria das vezes, exibem comprometimento da capacidade para executar atividades básicas de vida diária, tais como alimentar-se, vestir-se, arrumar-se, tomar banho, usar o banheiro e deambular55. Oliveira AR, Araújo TL, Costa AG, Morais HC, Silva VM, Lopes MV. Avaliação de pacientes com acidente vascular cerebral acompanhados por programas de assistência domiciliária. Rev Esc Enferm USP 2013; 47(5): 1143-9..

Portanto, como consequências do AVE, pode-se observar prejuízo na capacidade funcional dos sobreviventes99. Costa FA, Silva DL, Rocha VM. Severidade clínica e funcionalidade de pacientes hemiplégicos pós-AVC agudo atendidos nos serviços públicos de fisioterapia de Natal (RN). Ciênc Saúde Coletiva 2011; 16 (1): 1341-8.,1010. Ferri CP, Schoenborn C, Kalra L, Acosta D, Guerra M, Huang Y, et al. Prevalence of stroke and related burden among older people living in Latin America, India and China. J Neurol Neurosurgery Psych 2011; 82(10): 1074-82.,1111. Raju RS, Sarma PS, Pandian JD. Psychosocial problems, quality of life, and functional independence among Indian stroke survivors. Stroke 2010; 41(12): 2932-7.. Nesse sentido, a capacidade funcional compreende a aptidão em manter as habilidades físicas e mentais para condução autônoma e independente da vida1212. Alves LC, Leite IC, Machado CJ. Factors associated with functional disability of elderly in Brazil: a multilevel analysis. Rev Saúde Pública 2010; 44(3): 468-78.. Dessa forma, a capacidade funcional mostra-se relevante no planejamento e na implementação de políticas inovadoras destinadas aos cuidados de idosos, voltadas à qualidade de vida.

Desse modo, a capacidade funcional pode ser avaliada por meio da dificuldade de o sujeito realizar as suas atividades de vida diária, as quais compreendem as atividades básicas da vida diária (ABVDs), bem como as atividades instrumentais da vida diária (AIVDs). As atividades de vida diária são definidas como atividades de autocuidado, por exemplo, alimentar-se ou usar o banheiro. Portanto, são indispensáveis para a manutenção da vida com qualidade55. Oliveira AR, Araújo TL, Costa AG, Morais HC, Silva VM, Lopes MV. Avaliação de pacientes com acidente vascular cerebral acompanhados por programas de assistência domiciliária. Rev Esc Enferm USP 2013; 47(5): 1143-9..

A presente pesquisa possibilitará o exercício da assistência à saúde de idosos acometidos por um AVE, bem como a elaboração e a adequação de políticas públicas de saúde voltadas para essa população, com ênfase no autocuidado.

Acreditando-se na premissa de que os fatores sociodemográficos podem interferir no nível de capacidade de os sujeitos realizarem ABVDs, objetivou-se verificar as associações entre os fatores sociodemográficos e a capacidade funcional de idosos acometidos por AVE.

MÉTODOS

Estudo do tipo epidemiológico, de corte transversal, com abordagem quantitativa, realizado em 2015, na cidade de Campina Grande, Paraíba, Brasil.

A população foi composta por idosos acometidos por AVE, adscritos às unidades da Estratégia de Saúde da Família (ESF) do município campinense. A amostra foi constituída por 118 idosos com plegias por AVE, cadastrados em alguma das 64 unidades da ESF da zona urbana existentes na cidade. Salienta-se que não foi realizado cálculo amostral, apenas um censo populacional. Nesse sentido, os 118 idosos com plegias (monoplegia, paraplegia, tetraplegia, triplegia ou hemiplegia) por AVE foram incluídos na pesquisa, pois atenderam aos critérios de inclusão: ter idade maior ou igual a 60 anos e ter sido diagnosticado clinicamente com AVE.

Em 2010, a cidade de Campina Grande tinha uma população estimada em 400.000 habitantes, sendo 42.817 idosos, ou seja, 10,7% dela. No âmbito da Atenção Primária à Saúde (APS), o município possui 64 unidades da ESF, contemplando 85 equipes de Saúde da Família, o que equivale a uma cobertura de 77% da população, bem como três equipes do Programa Agentes Comunitários de Saúde (PACS)11. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Estudos e Pesquisas. Informação demográfica e socioeconômica. Síntese de indicadores sociais 2001-2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br (Acessado em 10 de maio de 2015).
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Os dados foram obtidos por meio de visitas domiciliares, com acompanhamento do Agente Comunitário de Saúde (ACS) da ESF, responsável por cada microárea. Foram realizadas duas visitas: uma para estabelecer contato, explicar a pesquisa e obter a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido dos participantes. Nesse encontro, foi agendada uma segunda visita ao idoso que concordou em participar para aplicação dos questionários I e II.

O questionário I foi utilizado para a investigação das variáveis sociodemográficas, enquanto o II (Índice de Barthel) foi aplicado para avaliar a capacidade funcional dos participantes para as ABVDs: fazer a higiene, levantar-se da cama, vestir-se, alimentar-se, controlar bexiga e intestino, caminhar, subir escadas, utilizar banheiro, sentar-se numa cadeira e banhar-se. Cada item continha perguntas que receberam pontuação 5, 10 ou 15, conforme independência ou necessidade de ajuda para executar a atividade. O resultado global obedeceu a uma escala crescente que varia de 0 a 100 pontos. A pontuação igual a 100 significa total independência; 60 I − 100, leve dependência; 40 I − 60, moderada dependência; 20 I − 40, grave dependência e < 20, total dependência1313. Moura MJ, Fernanda A, Martins AM, Campos OM. Validation of the Barthel Index in elderly patients attended in outpatient clinics, in Brazil. Acta Paul Enferm 2010; 23(2): 218-23..

Os dados coletados foram analisados por meio do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20.0 para o sistema operacional Windows, considerando significância estatística de 0,05. Para os dados sociodemográficos e os escores do Índice de Barthel, foram calculadas: frequências, médias e desvio padrão; para verificar a consistência interna do questionário Índice de Barthel, utilizou-se o coeficiente alfa de Cronbach; para analisar as associações entre os dados dos fatores sociodemográficos e da capacidade funcional para as ABVDs, compararam-se as proporções de frequência por meio dos testes do χ2 e de Fisher.

Na realização dos testes, efetuou-se dicotomização das variáveis. Desse modo, os itens do Índice de Barthel foram considerados da seguinte maneira: dependente = nível de incapacidade moderado, grave ou total; independente = nível de incapacidade leve ou total capacidade funcional.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba. Somente depois da aprovação, iniciou-se a coleta de dados, sendo respeitados os direitos de sigilo, privacidade e recusa, em qualquer momento da investigação, sem qualquer tipo de ônus.

RESULTADOS

PERFIL SOCIODEMOGRÁFICO

Na Tabela 1 são apresentados os dados sociodemográficos relativos à amostra. A maioria dos participantes é do sexo feminino, com uma proporção de 1,07 mulheres para cada homem. Entre os 118 sujeitos, a idade variou entre 60 e 103 anos, com média de 65 anos (± 9,63); a maioria declarou-se não branca (64,4%); com credo religioso (96,6%); com até três anos de escolaridade (80,5%); sem companheiro (61,1%) e com renda per capita de até dois salários-mínimos (79,7%).

Tabela 1:
Perfil sociodemográfico dos idosos acometidos por acidente vascular encefálico, Campina Grande, Paraíba, 2015 (n = 118).

TESTE DE CONSISTÊNCIA INTERNA DO ÍNDICE DE BARTHEL

A consistência interna do questionário denominado Índice de Barthel foi analisada por meio do coeficiente de Cronbach, conforme a Tabela 2. Verificou-se satisfatória confiabilidade com alfa de Cronbach total de 0,917. A correlação total de itens corrigidos foi superior a 0,4 e do alfa de Cronbach com item deletado foi superior a 0,8.

Tabela 2:
Índice de Barthel testado com o coeficiente alfa de Cronbach total, correlação total de itens corrigidos e alfa com item deletado, Campina Grande, Paraíba, 2015.

CAPACIDADE FUNCIONAL PARA AS ATIVIDADES BÁSICAS DE VIDA DIÁRIA

As frequências da capacidade funcional para as atividades básicas de vida diária estão apresentadas na Tabela 3. Em termos percentuais, as atividades nas quais se verificou maior dificuldade de realização foram micção (73,8%) e evacuação (66,9%), enquanto que as maiores independências foram constatadas nas atividades de subir e descer escadas (44,1%) e lavar-se (39%).

Tabela 3:
Frequências de capacidade funcional dos idosos acometidos por acidente vascular encefálico, Campina Grande, Paraíba, 2015 (n = 118).

Conforme apresentado na Figura 1, 37,3% (n = 44) dos participantes classificaram-se com grau variando de moderado para total dependência.

Figura 1:
Distribuição dos escores médios de capacidade funcional dos idosos acometidos por acidente vascular encefálico, Campina Grande, Paraíba, 2015.

RELAÇÃO ENTRE OS FATORES SOCIODEMOGRÁFICOS E A CAPACIDADE FUNCIONAL

Na Tabela 4, notou-se que a raça (p = 0,027), a faixa etária (p = 0,001) e a escolaridade (p = 0,041) são fatores sociodemográficos que estão associados com a capacidade funcional de idosos com plegias por AVE.

Tabela 4:
Associações entre os fatores sociodemográficos e a capacidade funcional dos idosos acometidos por acidente vascular encefálico, Campina Grande, Paraíba, 2015 (n = 118).

DISCUSSÃO

Entre os participantes do presente estudo houve predomínio do sexo feminino. Tal constatação se difere do estudo realizado em diferentes serviços de saúde do município de Campinas, no estado de São Paulo, que utilizou amostra de conveniência e avaliou a variável sexo entre os idosos com AVE, concluindo que eram predominantemente do sexo masculino1414. Cruz KC, Diogo MJ. Evaluation of functional capacity in elders with encephalic vascular accident. Acta Paul Enferm 2009; 22(5): 666-72.. Esse fato pode ser explicado pela diferença entre as seleções das amostras dos estudos, visto que as relações existentes na literatura indicam que as mulheres são normalmente mais dependentes nas atividades de vida diária do que os homens, embora elas possuam uma maior expectativa de vida de baixa qualidade55. Oliveira AR, Araújo TL, Costa AG, Morais HC, Silva VM, Lopes MV. Avaliação de pacientes com acidente vascular cerebral acompanhados por programas de assistência domiciliária. Rev Esc Enferm USP 2013; 47(5): 1143-9.,1212. Alves LC, Leite IC, Machado CJ. Factors associated with functional disability of elderly in Brazil: a multilevel analysis. Rev Saúde Pública 2010; 44(3): 468-78..

No que se refere à idade, tem-se que a maioria dos participantes afirma idade média de 65 anos (± 9,63). Outro estudo, realizado em Natal, no estado do Rio Grande do Norte99. Costa FA, Silva DL, Rocha VM. Severidade clínica e funcionalidade de pacientes hemiplégicos pós-AVC agudo atendidos nos serviços públicos de fisioterapia de Natal (RN). Ciênc Saúde Coletiva 2011; 16 (1): 1341-8., cujo objetivo foi avaliar a capacidade funcional de indivíduos hemiplégicos após AVE, enfatizou que tal doença exibe maior incidência em pessoas com idade avançada, período da vida em que se podem constatar grandes taxas de óbito e sequelas.

Ainda de acordo com as demais variáveis sociais, a maioria dos sujeitos se declarou sem companheiro, com baixa escolaridade e baixa renda familiar. Tais resultados são preocupantes, uma vez que as consequências do AVE se estendem além da mobilidade, interferindo nas habilidades físicas e mentais dos sujeitos1010. Ferri CP, Schoenborn C, Kalra L, Acosta D, Guerra M, Huang Y, et al. Prevalence of stroke and related burden among older people living in Latin America, India and China. J Neurol Neurosurgery Psych 2011; 82(10): 1074-82.. Trata-se muitas vezes de um idoso dependente, que se torna parcial ou completamente dependente de outras pessoas, função essa exercida primordialmente pelo cônjuge, em busca de satisfazerem suas necessidades básicas1414. Cruz KC, Diogo MJ. Evaluation of functional capacity in elders with encephalic vascular accident. Acta Paul Enferm 2009; 22(5): 666-72..

No que concerne às frequências da capacidade funcional para as atividades de vida diária, constatou-se que as atividades nas quais se verificou maior dificuldade de realização foram micção e evacuação. Esse fato se diverge do resultado encontrado em um estudo realizado no Rio Grande do Sul, no qual todos os participantes apresentavam continência intestinal normal, bem como pouco mais da metade tinha continência normal da micção1515. Rizzetti DA, Trevisan CM. Avaliação da capacidade funcional em pacientes portadores de seqüelas de AVC participantes do projeto de hidrocinesioterapia aplicada às patologias neurológicas do idoso. Rev Cent Cienc Saúde 2008; 34(1-2): 32-6.. Dificuldades nas eliminações provocam comprometimento da capacidade funcional, bem como podem causar situação de constrangimento para os indivíduos, ocasionando, em vários casos, o isolamento social1616. Moraes EN. Atenção à saúde do idoso: Aspectos conceituais. Brasília, DF: Organização Pan-Americana da Saúde; 2012..

Em relação à capacidade funcional, notou-se considerável frequência dos graus de dependência leve e independente. Estudo sobre a capacidade funcional de idosos, após AVE isquêmico, realizado na cidade de Fortaleza, no estado do Ceará, obteve resultado semelhante. Isso, portanto, requer dos cuidadores auxílio para realização das atividades de vida diária em busca de manter a capacidade funcional dos idosos de acordo com as características individuais de cada situação, constituindo uma das mais importantes atribuições dos profissionais de saúde e cuidadores leigos1717. Vieira CP, Fialho AV, Almeida PC, Moreira TM. Idosos com Acidente Vascular Encefálico isquêmico: caracterização sociodemográfica e funcional. Rev Rene 2012; 13(3): 522-30..

Ainda no que concerne à capacidade funcional, outro estudo conduzido utilizando a escala de Katz e Lawton, com o intuito de avaliar a habilidade funcional dos indivíduos com incapacidades decorrentes de AVE, concluiu que a maioria dos idosos acometidos por AVE realiza suas atividades de vida diária de forma independente e autônoma1616. Moraes EN. Atenção à saúde do idoso: Aspectos conceituais. Brasília, DF: Organização Pan-Americana da Saúde; 2012.. Fato que sugere a realização de uma análise mais apurada em relação à forma de mensuração de cada escala, na busca de comparação dos resultados obtidos.

No tocante à associação entre os fatores sociodemográficos e a capacidade funcional de idosos com plegias por AVE, observou-se resultado significativo nas variáveis faixa etária, raça e escolaridade. Tal resultado foi corroborado pelo estudo sobre a avaliação da capacidade funcional em idosos com AVE, que constatou a idade como inversamente proporcional à medida da independência funcional, ou seja, quanto maior a idade, menor a capacidade funcional apresentada pelos idosos1414. Cruz KC, Diogo MJ. Evaluation of functional capacity in elders with encephalic vascular accident. Acta Paul Enferm 2009; 22(5): 666-72..

Com relação à raça, foi predominante a parda. Em estudo na cidade de Montes Claros, no estado de Minas Gerais, sobre a capacidade funcional em idosos e os fatores associados à incapacidade, constatou-se maior incidência de incapacidades nos idosos autodeclarados pardos1818. Barbosa RB, Almeida JM, Barbosa MR, Barbosa LA. Avaliação da Capacidade funcional de idosos e fatores associados. Ciênc Saúde Coletiva 2014; 19(8): 3317-25.. Esses achados poderiam ser constituídos pelas diferenças nas condições socioeconômicas entre etnias, o que, em tese, favoreceria o perfil de morbidade dessa população, com consequente interferência na capacidade funcional desses sujeitos.

Com relação à escolaridade, uma pesquisa aplicada em idosos da zona urbana de São Paulo observou associação de escolaridade com declínio funcional de idosos1919. Ferreira PC, Tavares DM, Rodrigues RA. Características sociodemográficas, capacidade funcional e morbidades entre idosos com e sem declínio cognitivo. Acta Paul Enferm 2011; 24(1): 29-35.. A baixa escolaridade tem apresentado relação com a elevação da incidência de AVE, sobretudo quando associada aos fatores socioeconômicos e à limitação à informação, primordialmente por impedir o conhecimento no que concerne à saúde e adesão ao tratamento, bem como manutenção de hábitos saudáveis, ao passo que um nível de escolaridade mais elevado converge para maior longevidade e melhor manutenção dos estilos de vida relacionados às doenças cardiovasculares2020. Brito ES, Pantarotto RF, Costa LR. A hipertensão arterial sistêmica como fator de risco ao acidente vascular encefálico (AVE). J Health Sci Inst 2011; 29(4): 265-8..

CONCLUSÕES

Os dados analisados permitem constatar que a maioria dos idosos acometidos por AVE em Campina Grande são mulheres, com baixa escolaridade e renda, com credo religioso e sem companheiro. Ainda que os participantes tenham apresentado incapacidades em algumas variáveis, a amostra foi classificada com grau leve de dependência. Constatou-se associação entre raça, faixa etária e escolaridade com a capacidade de realizar ABVDs. Assim, conclui-se que os fatores sociodemográficos podem interferir na capacidade funcional de idosos acometidos por AVE.

Como limitações do estudo pode-se apontar a impossibilidade de determinar a direcionalidade das associações, visto tratar-se de um estudo transversal. Ressalta-se que a escassez de estudos semelhantes, no tocante à abordagem e aos instrumentos utilizados, impossibilitou uma comparação mais acurada dos dados obtidos.

Nesse sentido, acredita-se que este trabalho contribuiu para a reflexão sobre essa problemática, auxiliando, dessa forma, na promoção do acesso de tais pessoas aos programas assistenciais desenvolvidos pela ESF, na melhoria das condições de vida e saúde, bem como na reprodutibilidade, por outros estudos, do método utilizado.

REFERÊNCIAS

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  • Fonte de financiamento: nenhuma

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    18 Ago 2015
  • Aceito
    31 Maio 2016
Associação Brasileira de Pós -Graduação em Saúde Coletiva São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revbrepi@usp.br