RESUMO:
Objetivo:
Investigar a polifarmácia em idosos residentes na área urbana de Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, estimando a prevalência e os fatores a ela associados.
Métodos:
Foi realizado um estudo transversal de base populacional em uma amostra de 1.705 idosos, entre 2009 e 2010. A variável dependente foi polifarmácia (definida como “uso de cinco ou mais medicamentos”). Utilizaram-se variáveis sociodemográficas, uso de serviços de saúde e autoavaliação de saúde como exploratórias. Foram estimadas razões de prevalência (RP) por meio de análise multivariada utilizando-se da regressão de Poisson.
Resultados:
A média do uso de medicamentos por idosos foi de 3,8 (variando entre 0 e 28). A prevalência de polifarmácia foi de 32%, com intervalo de confiança de 95% (IC95%) 29,8 - 34,3. As características que apresentaram associação positiva com polifarmácia foram: sexo feminino (RP = 1,27; IC95% 1,03 - 1,57), aumento da idade (RP = 1,38; IC95% 1,08 - 1,77), autoavaliação de saúde negativa (RP = 1,99; IC95% 1,59 - 2,48) e realização de consulta médica nos últimos 3 meses anteriores à entrevista (RP = 1,89; IC95% 1,53 - 2,32). Os grupos de medicamentos mais utilizados pelos idosos na polifarmácia foram os indicados para o sistema cardiovascular, trato alimentar e metabolismo e sistema nervoso.
Conclusão:
O padrão de uso de medicamentos por idosos está dentro da média nacional. A prevalência de polifarmácia e as características a ela associadas foram semelhantes aos achados em outras regiões do Brasil.
Palavras-chave:
Polimedicação; Uso de medicamentos; Idosos; Estudos transversais; Farmacoepidemiologia; Envelhecimento
INTRODUÇÃO
Durante o século XX foram observadas significativas alterações nos perfis demográfico e de morbimortalidade em todas as regiões do mundo, ainda que com diferentes magnitudes11. Yunes J. A dinâmica populacional dos países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Rev Saúde Pública 1971; 5: 129-50.. Reduziram-se a fecundidade e a mortalidade por doenças infecciosas e registrou-se aumento da expectativa de vida e das mortes por doenças crônicas22. Veras R. Envelhecimento populacional contemporâneo: demandas, desafios e inovações. Rev Saúde Pública 2009; 43(3).. No Brasil, a população idosa passou de 4,7%, em 1960, para 10,8%, em 2010, o que, em números absolutos, representa um acréscimo, nesse período, de 3,3 milhões33. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Departamento de Estatísticas de População. VII Recenseamento Geral do Brasil. Censo Demográfico de 1960. Brasil: IBGE; 1960. Série Nacional, v. I. [Internet]. Disponível em: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/68/cd_1960_v1_br.pdf (Acessado em: dezembro de 2013).
http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizac... de idosos para cerca de 20,5 milhões de pessoas44. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Sinopse dos Resultados do Censo 2010. Distribuição da população por sexo, segundo os grupos de idade. Brasil: IBGE; 2010. [Internet]. Disponível em: http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse/webservice/ (Acessado em: dezembro de 2013).
http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse... .
Esses contextos epidemiológico e demográfico têm levado a tratamentos farmacológicos de longa duração55. Wyles H, Rehman HU. Inappropriate polypharmacy in the elderly. European J Intern Med 16(5): 311-3. (s.d.), ao maior uso de medicamentos e à maior ocorrência de polifarmácia, uso de múltiplos medicamentos simultaneamente55. Wyles H, Rehman HU. Inappropriate polypharmacy in the elderly. European J Intern Med 16(5): 311-3. (s.d.),66. Fulton MM, Allen ER. Polypharmacy in the elderly: a literature review. J Am Acad Nurse Pract 2005 Apr; 17(4): 123-32.. Tais situações são mais comuns entre idosos, naqueles que apresentam maior prevalência de doenças crônicas e que utilizam mais os serviços de saúde22. Veras R. Envelhecimento populacional contemporâneo: demandas, desafios e inovações. Rev Saúde Pública 2009; 43(3).,77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905.,88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43..
O elevado número de fármacos prescritos e a maior carga de doenças aumentam também a probabilidade de consumo desnecessário de medicamentos99. Gorard DA. Escalating polypharmacy. QJM 2006 Nov; 99(11): 797-800., cujas combinações farmacológicas representam potenciais perigos de reações adversas e interações medicamentosas, contraindicadas ao seu estado clínico1010. Tulner LR, Kuper IMJA, Frankfort SV, van Campen JPCM, Koks CHW, Brandies DPM, et al. Discrepancies in Reported Drug Use in Geriatric Outpatients: Relevance to Adverse Events and Drug-Drug Interactions. Am J Geriatr Pharmacother 2009 Apr; 7(2): 93-104., podendo elevar o risco de iatrogenias55. Wyles H, Rehman HU. Inappropriate polypharmacy in the elderly. European J Intern Med 16(5): 311-3. (s.d.),99. Gorard DA. Escalating polypharmacy. QJM 2006 Nov; 99(11): 797-800., hospitalizações1111. Passarelli MCG, Jacob W, Figueras A. Adverse drug reactions in an elderly hospitalised population - Inappropriate prescription is a leading cause. Drugs Aging 2005; 22(9): 767-77. e até mesmo de óbito1010. Tulner LR, Kuper IMJA, Frankfort SV, van Campen JPCM, Koks CHW, Brandies DPM, et al. Discrepancies in Reported Drug Use in Geriatric Outpatients: Relevance to Adverse Events and Drug-Drug Interactions. Am J Geriatr Pharmacother 2009 Apr; 7(2): 93-104.. Nesse mesmo contexto, os estudos têm demonstrado que as variações fisiológicas relativas ao envelhecimento tendem a alterar expressivamente a farmacocinética e a farmacodinâmica dos medicamentos1212. Martins GA, Acurcio FA, Franceschini SCC, Priore SE, Ribeiro AQ. Uso de medicamentos potencialmente inadequados entre idosos do Município de Viçosa, Minas Gerais, Brasil: um inquérito de base populacional. Cad Saúde Pública 2015; 31: 2401-12.,1313. Silva RD, Schmidt OF, Silva SD. Polifarmácia em geriatria. Polypharmacy in geriatrics. Rev AMRIGS 2012; 56(2): 164-74.. Em razão disso, pessoas idosas apresentam maior sensibilidade aos efeitos terapêuticos e adversos dos fármacos, o que em muitos casos pode causar mais dano do que benefício12,14,15.
No Brasil, alguns estudos de base populacional descreveram a prevalência de polifarmácia na população idosa (variando entre 25 e 36%) e sua associação positiva com sexo feminino77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905.,88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27.,1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103.,1616. Flores LM, Mengue SS. Uso de medicamentos por idosos em região do sul do Brasil. Rev Saúde Pública 2005; 39: 924-9.,1717. Linjakumpu T, Hartikainen S, Klaukka T, Veijola J, Kivela SL, Isoaho R. Use of medications and polypharmacy are increasing among the elderly. J Clin Epidemiol 2002 Aug; 55(8): 809-17., idade igual ou superior a 75 anos88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27.,1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103.,1717. Linjakumpu T, Hartikainen S, Klaukka T, Veijola J, Kivela SL, Isoaho R. Use of medications and polypharmacy are increasing among the elderly. J Clin Epidemiol 2002 Aug; 55(8): 809-17.,1818. Veehof LJG, Stewart RE, Haaijer-Ruskamp FM, Meyboom-de Jong B. The development of polypharmacy. A longitudinal study. Family Practice 2000 Jun; 17(3): 261-7., baixa escolaridade77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27., viuvez1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103.,1717. Linjakumpu T, Hartikainen S, Klaukka T, Veijola J, Kivela SL, Isoaho R. Use of medications and polypharmacy are increasing among the elderly. J Clin Epidemiol 2002 Aug; 55(8): 809-17., autoavaliação de saúde regular77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27. ou negativa88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103.,1717. Linjakumpu T, Hartikainen S, Klaukka T, Veijola J, Kivela SL, Isoaho R. Use of medications and polypharmacy are increasing among the elderly. J Clin Epidemiol 2002 Aug; 55(8): 809-17., viver com companheiro88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27., possuir plano de saúde privado88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27. e hospitalização nos 12 meses anteriores à entrevista88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.. Assim, investigar a ocorrência de polifarmácia e seus fatores associados é essencial para subsidiar ações que promovam o uso racional de medicamentos e que garantam maior segurança à farmacoterapia utilizada pela população idosa. Sendo assim, o objetivo deste estudo foi investigar a polifarmácia em idosos de uma capital do sul do Brasil, estimando a prevalência e os fatores a ela associados.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo transversal, de base populacional, realizado no município de Florianópolis, capital do estado de Santa Catarina, Brasil. Em 2009, o município possuía 408.163 habitantes, dos quais 10,8% com idade igual ou superior a 60 anos. A expectativa de vida ao nascer no município, em 2010, era de 77,4 anos1919. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 2013. [Internet]. Disponível em: http://www.atlasbrasil.org.br/2013/pt/perfil_m/florianopolis_sc#idh (Acessado em: 30 de julho de 2016).
http://www.atlasbrasil.org.br/2013/pt/pe... .
O presente estudo fez parte do Epifloripa Idoso 2009/2010, um inquérito de base populacional que investigou as condições de saúde de idosos de ambos os sexos (pessoas com 60 anos de idade ou mais) em Florianópolis, entre os meses de setembro de 2009 e junho de 2010. Maiores detalhes sobre o estudo encontram-se em Confortim et al.2020. Confortin SC, Schneider IJC, Antes DL, Cembranel F, Ono LM, Marques LP, et al. Condições de vida e saúde de idosos: resultados do estudo de coorte EpiFloripa Idoso. Epidemiol Serv Saúde 2017; 26(2): 305-17..
O cálculo do tamanho da amostra foi realizado no programa Epi-Info, versão 6.04. Consideraram-se como população de referência 44.460 idosos, prevalência desconhecida de 50%, nível de confiança igual a 95%, erro amostral de 4% e efeito de delineamento (deff) de 2. Para compensar eventuais perdas previstas e para o controle de fatores de confusão foram acrescidos 20 e 15%, respectivamente, resultando em uma amostra mínima de 1.599 idosos. Devido à disponibilidade financeira e com o objetivo de aumentar o seu poder, a amostra foi ampliada para 1.911 idosos.
O processo de amostragem foi por conglomerados em dois estágios, sendo a unidade primária de amostragem o setor censitário e a secundária, o domicílio. Utilizou-se a malha territorial municipal oriunda do censo de 2000 e estratificaram-se os 420 setores urbanos residenciais do município segundo decis da média de renda do chefe da família. Foram sorteados para compor o presente estudo, oito setores em cada decil de renda. A partir da definição dos setores, realizou-se a atualização do número de domicílios particulares permanentes (DOMPPU) dos mesmos, já que a contagem mais recente datava do censo de 2000. Verificou-se grande variação de DOMPPU por setor (de 61 a 725), assim, realizou-se o agrupamento das unidades com menos de 150 domicílios e a divisão dos setores que possuíam mais de 500 DOMPPU. As fusões respeitaram o decil de renda e a proximidade geográfica. Após esse procedimento, o coeficiente de variação de domicílios por setor foi reduzido a 35,2% e obtiveram-se 83 setores censitários compostos por 22.846 domicílios.
Todas as pessoas com idade igual ou superior a 60 anos residentes nos domicílios sorteados eram potenciais participantes do estudo. Não foram incluídos no estudo os idosos institucionalizados (em asilos, hospitais ou presídios). Nos casos em que o idoso não teve condições de responder ao questionário, isso foi feito pelo seu responsável, com exceção da variável autoavaliação de saúde. Considerou-se perda o idoso não localizado em seu domicílio após quatro tentativas, sendo pelo menos uma visita no final de semana e outra noturna, e recusa quando o idoso se negou a participar do estudo. Os dados foram obtidos por meio de entrevistas, utilizando como instrumento de coleta de dados um questionário padronizado aplicado pessoalmente por uma entrevistadora previamente treinada e utilizando o Personal Digital Assistant (PDA). O controle de qualidade dos dados foi realizado semanalmente, por telefone, com a aplicação de um questionário reduzido em 10% da amostra. A reprodutibilidade de questões utilizadas no estudo foi considerada satisfatória, com valores de kappa entre 0,6 e 0,9 para variáveis selecionadas, tais como diabetes, número de dentes, tabagismo, plano de saúde e cor da pele autorreferida.
Foram coletadas informações sobre o uso de medicamentos nos 30 dias anteriores à entrevista. Solicitou-se ao entrevistado que apresentasse à entrevistadora todas as bulas, caixas, blísteres ou receitas de medicamentos utilizados nos últimos 30 dias, sendo registrados os seus nomes comerciais e a dosagem. Na inexistência desses itens, registrou-se a informação referida pelo entrevistado2121. Aziz MM, Calvo MCM, d'Orsi E. Medicamentos prescritos aos idosos em uma capital do Sul do Brasil e a Relação Municipal de Medicamentos. Cad Saúde Pública 2012; 28: 52-64..
A polifarmácia — considerada como o “uso concomitante de cinco ou mais medicamentos”66. Fulton MM, Allen ER. Polypharmacy in the elderly: a literature review. J Am Acad Nurse Pract 2005 Apr; 17(4): 123-32.,77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905.,88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,99. Gorard DA. Escalating polypharmacy. QJM 2006 Nov; 99(11): 797-800.,1616. Flores LM, Mengue SS. Uso de medicamentos por idosos em região do sul do Brasil. Rev Saúde Pública 2005; 39: 924-9.,1717. Linjakumpu T, Hartikainen S, Klaukka T, Veijola J, Kivela SL, Isoaho R. Use of medications and polypharmacy are increasing among the elderly. J Clin Epidemiol 2002 Aug; 55(8): 809-17.,1818. Veehof LJG, Stewart RE, Haaijer-Ruskamp FM, Meyboom-de Jong B. The development of polypharmacy. A longitudinal study. Family Practice 2000 Jun; 17(3): 261-7.,2222. Viktil KK, Blix HS, Moger TA, Reikvam A. Polypharmacy as commonly defined is an indicator of limited value in the assessment of drug-related problems. Brit J Clin Pharmacol 2007; 63(2): 187-95.,2323. Silveira EA, Dalastra L, Pagotto V. Polypharmacy, chronic diseases and nutritional markers in community-dwelling older. Rev Bras Epidemiol 2014; 17: 818-29. — consumida nos últimos 30 dias prévios à entrevista foi definida como variável dependente. Os medicamentos foram classificados de acordo com a classe farmacológica ou grupo químico (nível 3) da Anatomical Therapeutic Chemical (ATC), criado pela World Health Organization Collaborating Centre for Drug Statistics Methodology.
As variáveis independentes analisadas foram: sexo, idade (60 a 69; 70 a 79 e 80 anos ou mais), escolaridade (0 a 4; 5 a 8; 9 a 11 e 12 anos de estudo ou mais), autopercepção de saúde (positiva (boa ou muito boa) e negativa (regular, ruim ou muito ruim)), renda per capita em quartis (renda foi o somatório de todos os ganhos incluindo salário, aposentadoria e pensão recebidos no último mês), consulta médica nos últimos 3 meses (sim e não), posse de plano de saúde privado (sim e não) e hospitalização nos últimos 6 meses (sim e não).
Para testar a associação entre o desfecho e as variáveis independentes foram realizadas análises brutas e multivariáveis por meio de regressão de Poisson. Estimaram-se razões de prevalência (RP) com seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%). Foi utilizado o método stepwise-forward para a inclusão das variáveis no modelo múltiplo. O critério de inclusão foi p < 0,200 na análise ajustada. O critério de manutenção das variáveis no modelo final foi p < 0,05. As análises foram realizadas no programa Stata 9.0, utilizando-se do comando svy para considerar o efeito de delineamento e os pesos amostrais.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina, sob protocolo de nº 352/2008.
RESULTADOS
Foram entrevistados 1.705 idosos, sendo a taxa de resposta igual a 89,2 (n = 206 perdas/recusas, sendo 3 perdas por motivo de hospitalização do idoso), não afetando os resultados. O controle de qualidade verificou que a reprodutibilidade de algumas questões utilizadas no estudo foi considerada satisfatória, com valores de kappa entre 0,6 e 0,9 para as variáveis selecionadas, sendo que a maioria apresentou concordância boa a excelente.
A maior parte da amostra foi do sexo feminino (63,9%), com idade entre 60 e 69 anos (50,1%) e apresentava até 8 anos de estudo (63,0%). Em relação às consultas, 72% dos idosos relataram ter realizado consulta médica nos últimos 3 meses e 7,9% foram internados nos últimos 6 meses. Além disso, quase dois terços (63,8%) dos idosos possuíam plano de saúde privado.
A média do uso de medicamentos nos 30 dias prévios às entrevistas foi de 3,8 (variando entre 0 e 28). A prevalência de polifarmácia foi de 32,0% (IC95% 29,8 - 34,3), sendo mais elevada em mulheres, em pessoas com 80 anos de idade ou mais, com autoavaliação negativa de sua saúde, que tiveram consulta médica nos últimos 3 meses, que foram hospitalizados nos 6 meses anteriores à entrevista; e menos elevada em idosos que possuíam maior escolaridade (12 anos de estudo ou mais) (Tabela 1).
Na análise bruta, a prevalência de polifarmácia foi associada ao sexo feminino, ao aumento da idade (70 a 79 anos, IC95% 1,15 - 1,68; 80 anos ou mais, IC95% 1,22 - 2,02), à autoavaliação de saúde negativa, à consulta médica nos últimos 3 meses e à internação hospitalar nos últimos 6 meses (Tabela 2).
Na análise ajustada, permaneceram associados ao desfecho o sexo feminino (RP = 1,27; IC95% 1,03 - 1,57), os mais idosos (70 a 79 anos, RP = 1,26; IC95% 1,06 - 1,49; 80 anos ou mais, RP = 1,38; IC95% 1,08 - 1,77), a autoavaliação negativa de saúde (RP = 1,99; IC95% 1,59 - 2,48) e a consulta médica nos últimos 3 meses (RP = 1,89; IC95% 1,53 - 2,32) (Tabela 2).
Os grupos de medicamentos mais utilizados pelos idosos na prática de polifarmácia, de acordo com a classificação farmacológica ou grupo químico (nível 3) da ATC, foram os indicados para o sistema cardiovascular, trato alimentar e metabolismo e sistema nervoso.
DISCUSSÃO
Os resultados do presente estudo demonstram que o padrão de uso de medicamentos em Florianópolis está dentro da média nacional77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905.,88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27.,1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103.,1616. Flores LM, Mengue SS. Uso de medicamentos por idosos em região do sul do Brasil. Rev Saúde Pública 2005; 39: 924-9.. Isso pode ser explicado por estudos que mostram que quanto maior a utilização de serviços de saúde88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27.,2424. Loyola Filho AI, Uchoa E, Firmo JOA, Lima-Costa MF. Estudo de base populacional sobre o consumo de medicamentos entre idosos: Projeto Bambuí. Cad Saúde Pública 2005; 21: 545-53.,2525. Loyola Filho AI, Uchoa E, Lima-Costa MF. Estudo epidemiológico de base populacional sobre uso de medicamentos entre idosos na Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Pública 2006; 22: 2657-67., maior o uso de medicamentos. Outro fator que pode explicar tal fenômeno é a repetição de receitas decorrente da falha na atenção à saúde do idoso, como, por exemplo, ser atendido em momentos distintos por diferentes especialistas e demais profissionais de saúde. No entanto, as implicações advindas desse consumo precisam ser reavaliadas quanto ao seu risco/benefício e frequentemente monitoradas. Lembrando que a prática de polifarmácia muitas vezes se faz necessária para os idosos, especialmente quando se tem indicação clara, é bem tolerada e tem boa relação custo-eficácia.
A prevalência de polifarmácia em Florianópolis (32,0%) assemelha-se à encontrada em alguns municípios como São Paulo (36%)1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27., Porto Alegre (27%)1616. Flores LM, Mengue SS. Uso de medicamentos por idosos em região do sul do Brasil. Rev Saúde Pública 2005; 39: 924-9., Tubarão (28,8%)77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905. e Rio de Janeiro (32,7%)88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43. cujos estudos empregaram a mesma definição para o desfecho (uso de cinco ou mais medicamentos). O uso concomitante de vários medicamentos pelos idosos contribui significativamente para o surgimento de reações adversas. Estima-se que o risco de reações adversas aumente exponencialmente, em torno de 50%, quando se faz uso de 5 medicamentos e ultrapasse 95% quando se utiliza 8 ou mais55. Wyles H, Rehman HU. Inappropriate polypharmacy in the elderly. European J Intern Med 16(5): 311-3. (s.d.),66. Fulton MM, Allen ER. Polypharmacy in the elderly: a literature review. J Am Acad Nurse Pract 2005 Apr; 17(4): 123-32.. Em alguns casos, tais reações adversas apresentam graves consequências, que poderiam ser minimizadas pelo monitoramento adequado quanto à adesão, prescrição, dose e período de tratamento corretos. Neste estudo, a polifarmácia também esteve associada às hospitalizações (55%), sugerindo um pior estado de saúde88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27.. No Canadá, estima-se que uma em cada cinco admissões hospitalares de idosos deve-se à polifarmácia associada a iatrogenias55. Wyles H, Rehman HU. Inappropriate polypharmacy in the elderly. European J Intern Med 16(5): 311-3. (s.d.).
A análise entre polifarmácia e características sociodemográficas revelou associação com sexo feminino77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905.,88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27.,1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103.,1616. Flores LM, Mengue SS. Uso de medicamentos por idosos em região do sul do Brasil. Rev Saúde Pública 2005; 39: 924-9.,1717. Linjakumpu T, Hartikainen S, Klaukka T, Veijola J, Kivela SL, Isoaho R. Use of medications and polypharmacy are increasing among the elderly. J Clin Epidemiol 2002 Aug; 55(8): 809-17. e idade superior a 80 anos1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103.,1717. Linjakumpu T, Hartikainen S, Klaukka T, Veijola J, Kivela SL, Isoaho R. Use of medications and polypharmacy are increasing among the elderly. J Clin Epidemiol 2002 Aug; 55(8): 809-17.. Independente das variáveis socioeconômicas, estudos relacionaram maior prevalência de polifarmácia no sexo feminino77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27.,1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103.,1616. Flores LM, Mengue SS. Uso de medicamentos por idosos em região do sul do Brasil. Rev Saúde Pública 2005; 39: 924-9.,2323. Silveira EA, Dalastra L, Pagotto V. Polypharmacy, chronic diseases and nutritional markers in community-dwelling older. Rev Bras Epidemiol 2014; 17: 818-29.,2626. Flores VB, Benvegnú LA. Perfil de utilização de medicamentos em idosos da zona urbana de Santa Rosa, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saúde Pública 2008; 24: 1439-46.,2727. Rozenfeld S. Prevalência, fatores associados e mau uso de medicamentos entre os idosos: uma revisão. Cad Saúde Pública 2003; 19: 717-24.; as hipóteses para esse cenário é que as mulheres têm maior expectativa de vida do que os homens e por isso convivem por mais tempo com processos crônicos; são mais afetadas por problemas de saúde não fatais e por possuírem maior consciência sobre sua saúde, expressam mais sinais e sintomas para os profissionais de saúde, resultando muitas vezes em prescrições2424. Loyola Filho AI, Uchoa E, Firmo JOA, Lima-Costa MF. Estudo de base populacional sobre o consumo de medicamentos entre idosos: Projeto Bambuí. Cad Saúde Pública 2005; 21: 545-53.,2525. Loyola Filho AI, Uchoa E, Lima-Costa MF. Estudo epidemiológico de base populacional sobre uso de medicamentos entre idosos na Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Pública 2006; 22: 2657-67.; são as responsáveis pela família e por isso mais familiarizadas com os medicamentos e são mais assistidas por políticas de saúde, ficando assim mais sujeitas à medicalização2525. Loyola Filho AI, Uchoa E, Lima-Costa MF. Estudo epidemiológico de base populacional sobre uso de medicamentos entre idosos na Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Pública 2006; 22: 2657-67.,2626. Flores VB, Benvegnú LA. Perfil de utilização de medicamentos em idosos da zona urbana de Santa Rosa, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saúde Pública 2008; 24: 1439-46.,2727. Rozenfeld S. Prevalência, fatores associados e mau uso de medicamentos entre os idosos: uma revisão. Cad Saúde Pública 2003; 19: 717-24., corroborando os resultados deste estudo. Quanto à relação da polifarmácia com a idade, pode estar associada ao aumento/gravidade das doenças nos mais idosos, bem como à maior utilização de serviços de saúde por esse grupo etário, do que propriamente por razão do envelhecimento pela idade, essas têm sido as hipóteses mais aceitáveis.
De acordo com Santos et al.1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103., Linjakumpu et al.1717. Linjakumpu T, Hartikainen S, Klaukka T, Veijola J, Kivela SL, Isoaho R. Use of medications and polypharmacy are increasing among the elderly. J Clin Epidemiol 2002 Aug; 55(8): 809-17., Rozenfeld et al.88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43., Silveira et al.2323. Silveira EA, Dalastra L, Pagotto V. Polypharmacy, chronic diseases and nutritional markers in community-dwelling older. Rev Bras Epidemiol 2014; 17: 818-29. e Loyola et al.2525. Loyola Filho AI, Uchoa E, Lima-Costa MF. Estudo epidemiológico de base populacional sobre uso de medicamentos entre idosos na Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Pública 2006; 22: 2657-67., pior autoavaliação de saúde é frequentemente relacionada à polifarmácia, conforme também se observou no presente estudo. Essa relação é esperada, pois idosos que se percebem doentes procuram solucionar seus problemas por meio da procura dos serviços de saúde, recebendo prescrições medicamentosas, ou até mesmo se automedicando2525. Loyola Filho AI, Uchoa E, Lima-Costa MF. Estudo epidemiológico de base populacional sobre uso de medicamentos entre idosos na Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Pública 2006; 22: 2657-67.. Essa variável (de caráter subjetivo) não foi considerada nos idosos que tiveram seus questionários respondidos por seus informantes.
Em relação aos serviços de saúde, evidenciou-se forte associação da realização de consultas médicas com a prática de polifarmácia, o que comprova o maior acesso da população aos serviços de saúde, de maneira similar ao observado em Tubarão77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905., Porto Alegre1616. Flores LM, Mengue SS. Uso de medicamentos por idosos em região do sul do Brasil. Rev Saúde Pública 2005; 39: 924-9., Rio de Janeiro88. Rozenfeld S, Fonseca MJM, Acurcio FA. Drug utilization and polypharmacy among the elderly: a survey in Rio de Janeiro City, Brazil. Rev Panamericana Salud Pública 2008; 23: 34-43., Bambuí2424. Loyola Filho AI, Uchoa E, Firmo JOA, Lima-Costa MF. Estudo de base populacional sobre o consumo de medicamentos entre idosos: Projeto Bambuí. Cad Saúde Pública 2005; 21: 545-53., Santa Rosa2626. Flores VB, Benvegnú LA. Perfil de utilização de medicamentos em idosos da zona urbana de Santa Rosa, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saúde Pública 2008; 24: 1439-46., e na região metropolitana de Belo Horizonte2525. Loyola Filho AI, Uchoa E, Lima-Costa MF. Estudo epidemiológico de base populacional sobre uso de medicamentos entre idosos na Região Metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Pública 2006; 22: 2657-67., reforçando a importância do medicamento na atenção à saúde e a necessidade de garantir à pessoa idosa uma assistência farmacêutica eficaz e de qualidade, a fim de reduzir ao máximo as possíveis complicações decorrentes da prática de polifarmácia. Embora a exposição à polifarmácia não seja sinônimo de uso inadequado, o caráter lucrativo dos serviços privados, a abordagem ideológica e a interação dos médicos com a indústria farmacêutica podem explicar a qualidade e a quantidade de medicamentos impróprios consumidos por idosos, bem como o modelo de atenção à saúde, que tem no medicamento sua principal forma de intervenção1313. Silva RD, Schmidt OF, Silva SD. Polifarmácia em geriatria. Polypharmacy in geriatrics. Rev AMRIGS 2012; 56(2): 164-74.,2727. Rozenfeld S. Prevalência, fatores associados e mau uso de medicamentos entre os idosos: uma revisão. Cad Saúde Pública 2003; 19: 717-24..
Os grupos de medicamentos mais utilizados na prática de polifarmácia77. Galato D, Silva ES, Tiburcio LS. Estudo de utilização de medicamentos em idosos residentes em uma cidade do sul de Santa Catarina (Brasil): um olhar sobre a polimedicação. Ciênc Saúde Coletiva 2010; 15: 2899-905.,1414. Carvalho MFC, Romano-Lieber NS, Bergsten-Mendes G, Secoli SR, Ribeiro E, Lebrão ML, et al. Polifarmácia entre idosos do Município de São Paulo - Estudo SABE. Rev Bras Epidemiol 2012; 15: 817-27.,1515. Santos TRA, Lima DM, Nakatani AYK, Pereira LV, Leal GS, Amaral RG. Consumo de medicamentos por idosos, Goiânia, Brasil. Rev Saúde Pública 2013; 47: 94-103.,1717. Linjakumpu T, Hartikainen S, Klaukka T, Veijola J, Kivela SL, Isoaho R. Use of medications and polypharmacy are increasing among the elderly. J Clin Epidemiol 2002 Aug; 55(8): 809-17. refletem a alta prevalência de doenças cardiovasculares e diabetes entre a população idosa, assim como quadros de insônia, ansiedade e estados confusionais2121. Aziz MM, Calvo MCM, d'Orsi E. Medicamentos prescritos aos idosos em uma capital do Sul do Brasil e a Relação Municipal de Medicamentos. Cad Saúde Pública 2012; 28: 52-64., confirmando os resultados deste estudo, no qual os grupos de medicamentos de ação no sistema cardiovascular, trato alimentar e metabolismo e sistema nervoso foram também os mais utilizados por essa população. Contudo, é importante que as políticas públicas de fornecimento de medicamentos estejam atentas às peculiaridades que envolvem o organismo envelhecido para que o acesso aos grupos de medicamentos mais utilizados se dê de maneira segura e eficaz, considerando que aqueles que atuam no sistema nervoso central são os que mais causam efeitos adversos.
Entre as limitações do presente estudo podemos citar a dificuldade de estabelecer uma relação de causa-efeito com o desenho de estudo transversal e as medidas autorreferidas. A fim de minimizar um possível viés de memória, a estratégia utilizada foi a adoção de procedimentos padronizados por parte dos entrevistadores durante a coleta de dados, tais como a solicitação de receita, embalagem ou bula do medicamento de uso referido2121. Aziz MM, Calvo MCM, d'Orsi E. Medicamentos prescritos aos idosos em uma capital do Sul do Brasil e a Relação Municipal de Medicamentos. Cad Saúde Pública 2012; 28: 52-64..
Podemos destacar como pontos fortes desta pesquisa o seu tamanho de amostra, o fato de ser de base populacional e o rigor na coleta de dados. Em relação aos medicamentos, é importante ressaltar a abrangência e elevada completitude das informações coletadas sobre eles, devido ao cuidado nos procedimentos de coleta e análise dos dados. Por não ser objeto deste estudo, a automedicação não foi contemplada na análise.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O padrão de uso de medicamentos por idosos do município de Florianópolis está dentro da média nacional. A prevalência de polifarmácia e as características a ela associadas foram semelhantes aos achados em outras regiões do Brasil, sugerindo que há certa uniformidade na prática de polifarmácia e nos seus determinantes, entre distintas populações. Eventualmente, a falta de protocolos clínicos e o fácil acesso aos medicamentos, tanto pelo Sistema Único de Saúde (SUS) quanto pelas farmácias privadas, podem contribuir para a prática de polifarmácia na população idosa.
Esse hábito muitas vezes se faz necessário, já que uma grande proporção de idosos é portadora de múltiplas comorbidades e requer o uso de vários medicamentos para controlá-las e prevenir seus agravos. Tal prática não indica necessariamente que a prescrição e/ou o uso de medicamentos estejam incorretos, mas que uma abordagem mais criteriosa e o monitoramento desse perfil de idosos se fazem necessários.
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- Fonte de financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sob processo nº 569834/2008 2.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
Apr-Jun 2017
Histórico
- Recebido
17 Maio 2016 - Aceito
28 Nov 2016