Comentários à Carta ao Editor “Intervenções direcionadas à redução da taxa de cesarianas no Brasil”

Comments on the Letter to the Editor “Targeted interventions to reduce the rates of cesarean section births in Brazil”

Keila Cristina Mascarello Alicia Matijasevich Iná da Silva dos Santos Mariângela Freitas Silveira Sobre os autores

Recebemos com apreço o comentário “Intervenções direcionadas à redução da taxa de cesarianas no Brasil”, que contribui para a discussão do artigo de nossa autoria intitulado “Complicações puerperais precoces e tardias associadas à via de parto em uma coorte no Brasil”.

A redução nas taxas de cesarianas, sem indicação precisa, no Brasil e em outros países do mundo é um desafio para seus governos, principalmente quando consideramos os custos que envolvem esse procedimento e seus potenciais riscos para a saúde de recém-nascidos e parturientes/puérperas. Como bem explanado no comentário, as causas do aumento nas taxas de cesarianas são diversas e, muitas vezes, de difícil intervenção.

Estudo nacional de base hospitalar11. Domingues RM, Dias MA, Nakamura-Pereira M, Torres JA, d’Orsi E, Pereira AP, et al. Process of decision-making regarding the mode of birth in Brazil: from the initial preference of women to the final mode of birth. Cad Saúde Pública 2014; 30 (Supl. 1): S1-16. http://dx.doi.org/10.1590/0102-311X00105113
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mostrou que a decisão pelo parto cesárea por parte da mulher é construída durante o pré-natal. No início da gestação, 72,3% das primíparas tinham preferência pelo parto vaginal, porém 55,4% tiveram o nascimento de seu filho por via cirúrgica, mostrando que a decisão final quanto à via de parto está mais relacionada à assistência que a uma preferência da gestante.

O atual modelo de assistência ao parto no Brasil, especialmente na rede privada, não favorece o parto normal. Muitas vezes, o mesmo profissional que atende à mulher durante o pré-natal assiste ao parto, em meio a uma agenda sem tempo suficiente para uma assistência adequada, culminando em uma cesariana agendada e fora do trabalho de parto.

Rever esse modelo, implementando partos realizados por uma equipe hospitalar ou em casas de parto em regime de plantão, com profissionais capacitados e práticas baseadas em evidências científicas, incluindo enfermeiras obstétricas para assistência ao parto de risco habitual, poderia ser um dos caminhos, mas ainda encontra resistência. A Resolução Normativa nº 398/201622. Brasil. Resolução Normativa nº 398, de 5 de fevereiro de 2016. Dispõe sobre a Obrigatoriedade de Credenciamento de Enfermeiros Obstétricos e Obstetrizes por Operadoras de Planos Privados de Assistência à Saúde e Hospitais que Constituem suas Redes e sobre a Obrigatoriedade de os Médicos Entregarem a Nota de Orientação à Gestante. Diário Oficial da União [Internet] 2016 [acessado em 20 mar. 2019]. Disponível em: Disponível em: http://www.ans.gov.br/component/legislacao/?view=legislacao&task=TextoLei&format=raw&id=MzE5Mw==
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, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que dispõe sobre a obrigatoriedade de credenciamento de enfermeiras obstétricas e obstetrizes por operadoras de planos privados de assistência à saúde e hospitais que constituem suas redes, traz, em seu parágrafo único, que as operadoras deverão contratar e possibilitar a atuação de enfermeiras obstétricas “se, onde e quando viável”, inviabilizando que a normativa seja seguida na prática. Muitos avanços ocorreram desde a implementação da Rede Cegonha na rede pública de saúde, porém no setor privado ainda é um desafio.

Apesar de o cenário atual não ser o ideal, já vemos mudanças importantes após a implantação dos programas apresentados no comentário. Os percentuais de cesárea, que eram crescentes até o ano de 2014, tiveram, pela primeira vez, queda nos anos seguintes, passando de 57 para 55,5 e 55,4% nos anos de 2015 e 2016, respectivamente33. Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS. Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos - SINASC [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [acessado em 20 mar. 2019]. Disponível em: Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sinasc/cnv/nvuf.def
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REFERÊNCIAS

  • 1
    Domingues RM, Dias MA, Nakamura-Pereira M, Torres JA, d’Orsi E, Pereira AP, et al. Process of decision-making regarding the mode of birth in Brazil: from the initial preference of women to the final mode of birth. Cad Saúde Pública 2014; 30 (Supl. 1): S1-16. http://dx.doi.org/10.1590/0102-311X00105113
    » http://dx.doi.org/10.1590/0102-311X00105113
  • 2
    Brasil. Resolução Normativa nº 398, de 5 de fevereiro de 2016. Dispõe sobre a Obrigatoriedade de Credenciamento de Enfermeiros Obstétricos e Obstetrizes por Operadoras de Planos Privados de Assistência à Saúde e Hospitais que Constituem suas Redes e sobre a Obrigatoriedade de os Médicos Entregarem a Nota de Orientação à Gestante. Diário Oficial da União [Internet] 2016 [acessado em 20 mar. 2019]. Disponível em: Disponível em: http://www.ans.gov.br/component/legislacao/?view=legislacao&task=TextoLei&format=raw&id=MzE5Mw==
    » http://www.ans.gov.br/component/legislacao/?view=legislacao&task=TextoLei&format=raw&id=MzE5Mw==
  • 3
    Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS. Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos - SINASC [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [acessado em 20 mar. 2019]. Disponível em: Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sinasc/cnv/nvuf.def
    » http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sinasc/cnv/nvuf.def

  • Fonte de financiamento: Associação Brasileira de Saúde Coletiva, Wellcome Trust, Organização Mundial de Saúde, Programa de Apoio a Núcleos de Excelência, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Ministério da Saúde e Pastoral da Criança.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2019
  • Aceito
    02 Abr 2019
Associação Brasileira de Pós -Graduação em Saúde Coletiva São Paulo - SP - Brazil
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