RESUMO
Introdução:
O aplicativo para smartphone AtestaDO foi desenvolvido para auxiliar o médico na certificação da causa de morte. Neste estudo se propõe avaliar a aceitabilidade desse aplicativo.
Métodos:
Médicos foram convidados para participar de reuniões sobre certificação correta da causa da morte e avaliar o aplicativo em três etapas dessas reuniões, realizadas em Natal e em dois grandes hospitais de Belo Horizonte.
Resultados:
Em Natal, 82% dos 38 médicos participantes tinham mais de 20 anos de graduação, e em Belo Horizonte, mais de 67% dos 58 médicos tinham menos de 5 anos de graduação. As seções “Interface do aplicativo”, “Como atestar as causas de morte”, “Prática com exercícios” e “Outras informações para o médico” foram bem avaliadas por mais de 50% dos médicos de Belo Horizonte. Em Natal, todas as seções foram bem avaliadas por pelo menos 80% dos médicos. Mais de 70% dos participantes de Natal e da segunda etapa de Belo Horizonte usariam o aplicativo para preencher a causa de morte. A probabilidade de usar o AtestaDO para dar aulas sobre preenchimento da Declaração de Óbito foi de 83% para médicos de Natal, mas inferior a 60% em Belo Horizonte. Nas três etapas, a maioria dos médicos recomendaria o uso do aplicativo para outros colegas.
Conclusão:
A avaliação do aplicativo AtestaDO mostrou boa aceitabilidade. Espera-se que o uso dessa ferramenta permita alcançar melhorias na certificação médica da causa do óbito.
Palavras-chave:
Aplicativos móveis; Causas de morte; Declaração de Óbito; Mortalidade; Estudos de avaliação; Smartphone
INTRODUÇÃO
Dados de mortalidade são importantes ferramentas para subsidiar o planejamento e a gestão em saúde. No Brasil, o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) é universal e bem consolidado, com a certificação por médicos das causas de morte na Declaração de Óbito (DO). No entanto, a qualidade dessa informação não é uniforme entre os estados, com alta proporção de causas não informativas classificadas como causas garbage (CG)11. Naghavi M, Makela S, Foreman K, O'Brien J, Pourmalek F, Lozano R. Algorithms for enhancing public health utility of national causes-of-death data. Popul Health Metr. 2010;8:9. https://doi.org/10.1186/1478-7954-8-9
https://doi.org/10.1186/1478-7954-8-9... , registradas no SIM como causa básica de morte.
A CG pode ser decorrente de preenchimento inadequado da DO por médicos, incluindo não distinção entre a causa básica da morte e o evento terminal22. Degani AT, Patel RM, Smith BE, Grimsley E. The effect of student training on accuracy of completion of death certificates. Med Educ Online. 2009;14:17. https://doi.org/10.3885/meo.2009.Res00315
https://doi.org/10.3885/meo.2009.Res0031... . Entre os fatores relacionados a essa baixa precisão tem sido apontada a falta de treinamento sobre preenchimento da DO33. Rampatige R, Mikkelsen L, Hernandez B, Riley I, Lopez AD. Hospital cause-of-death statistics: what should we make of them? Bull World Health Organ. 2014;92(1):3-3A. http://dx.doi.org/10.2471/BLT.13.134106
http://dx.doi.org/10.2471/BLT.13.134106... ), (44. Silva PHA, Lima ASD, Medeiros ACM, Bento BM, Silva RJS, Freire FD, et al. Avaliação do conhecimento de médicos professores, residentes e estudantes de medicina acerca da Declaração de Óbito. Rev Bras Educ Méd. 2016;40(2):183-88. http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v40n2e01532014
http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v... , que pode ser melhorada com iniciativas educacionais55. Myers KA, Farquhar DRE. Improving the accuracy of death Certification. CMAJ. 1998;158(10):1317-23.), (66. Lakkireddy DR, Basarakodu KR, Vacek JL, Kondur AK, Ramachandruni SK, Esterbrooks DJ, et al. Improving death certificate completion: a trial of two training interventions. J Gen Intern Med. 2007;22(4):544-8. https://doi.org/10.1007/s11606-006-0071-6
https://doi.org/10.1007/s11606-006-0071-... . No Brasil, várias iniciativas tem sido desenvolvidas, como cursos e oficinas de capacitação de médicos em hospitais e distribuição de manuais de instrução77. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Federal de Medicina. Centro Brasileiro de Classificação de Doenças. A declaração de óbito: documento necessário e importante. Brasília, DF; 2009.), (88. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Manual de instruções para o preenchimento da Declaração de Óbito. Brasília, DF; 2011., com o objetivo de conscientizar esses profissionais sobre a importância do preenchimento da DO para a saúde pública44. Silva PHA, Lima ASD, Medeiros ACM, Bento BM, Silva RJS, Freire FD, et al. Avaliação do conhecimento de médicos professores, residentes e estudantes de medicina acerca da Declaração de Óbito. Rev Bras Educ Méd. 2016;40(2):183-88. http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v40n2e01532014
http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v... ), (99. Lucena L, Cagliari GHB, Tanaka J, Bonamigo EL. Declaração de óbito: preenchimento pelo corpo clínico de um hospital universitário. Rev bioét (Impr.). 2014;22(2):318-24. http://dx.doi.org/10.1590/1983-80422014222013
http://dx.doi.org/10.1590/1983-804220142... ), (1010. Mendonça FM, Drumond E, Cardoso AMP. Problemas no preenchimento da Declaração de Óbito: estudo exploratório. Rev Bras Estud Popul. 2010;27(2):285-95. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-30982010000200004
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-30982010... . Apesar dessas intervenções, um terço dos óbitos permanece com CG como causa básica de óbito1111. França EB, Passos VMA, Malta DC, Duncan BB, Ribeiro ALP, Guimarães MDC, et al. Cause-specific mortality for 249 causes in Brazil and states during 1990-2015: a systematic analysis for the global burden of disease study 2015. Popul Health Metr. 2017;15:39. https://doi.org/10.1186/s12963-017-0156-y
https://doi.org/10.1186/s12963-017-0156-... .
Treinamentos presenciais para todos médicos representam um grande desafio no Brasil, devido ao número de profissionais e extensão territorial do país. Em 2016, uma equipe de especialistas do Ministério da Saúde (MS) analisou alternativas custo-efetivas para capacitar médicos em certificação de causa de morte. Na ocasião discutiu-se uma proposta de aplicativo para smartphone, o AtestaDO, desenvolvido em parceria com a Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com suporte da Vital Strategies e da Universidade de Melbourne, pela Fundação Bloomberg. Esta proposta se insere em uma iniciativa ampla de intervenção, o projeto Dados para Saúde, que teve como objetivo melhorar as estatísticas sobre causas de morte. A iniciativa tem se mostrado de grande relevância por sensibilizar médicos, codificadores e gestores sobre a necessidade de adotar rotinas para o preenchimento correto da DO1212. Soares Filho AM, Nóbrega AA, Lobo AP, Silveira AC, Zoca BO, Cunha CC, et al. Melhoria da qualidade de informação em saúde na percepção de técnicos que colaboram na construção coletiva do livro Saúde Brasil. In: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde. Saúde Brasil 2017: uma análise da situação de saúde e os desafios para o alcance dos objetivos de desenvolvimento sustentável. Brasília, DF; 2018. p. 387-415..
A proposta do AtestaDO é impactar a qualidade das causas de morte certificadas pelo médico. Nesse sentido, este estudo teve como objetivo avaliar a aceitabilidade do aplicativo como ferramenta para auxiliar o médico na certificação da causa de morte.
MÉTODOS
O aplicativo foi desenvolvido para ambiente móbile, executável nas plataformas Android e iOS, compatíveis com tablets e smartphones. Disponível para download na Play Store e na Apple Store, pode ser usado no modo off-line, garantindo acesso rápido e prático ao seu conteúdo informativo. O software e seu suporte técnico contínuo são fornecidos pelo MS.
Uma versão preliminar do AtestaDO foi desenvolvida a partir do último manual do MS e do Conselho Federal de Medicina (CFM) sobre o preenchimento da DO77. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Federal de Medicina. Centro Brasileiro de Classificação de Doenças. A declaração de óbito: documento necessário e importante. Brasília, DF; 2009.. Equipes de médicos do MS e da UFMG realizaram sucessivas pesquisas avaliativas e consequentes alterações do conteúdo e formato do aplicativo, que resultaram em versão final Beta 0.3.0, apresentada em reunião nacional do projeto em outubro de 2017 e disponibilizada para download gratuito em lojas de aplicativos on-line. A realização dos estudos avaliativos com elaboração subsequente das diversas versões do aplicativo seguiu uma proposta de pesquisa-ação, cujo método prevê que pesquisadores e participantes representativos da situação ou do problema estejam envolvidos de modo cooperativo e colaborativo de forma a criar espaços intersetoriais para ampliar o conhecimento acerca do objeto trabalhado1313. Thiollent M. Metodologia da pesquisa-ação. 16a ed. São Paulo, Cortez. 2008..
O AtestaDO apresenta um menu interativo inicial, estruturado em seis grandes seções: 1) Como atestar as causas da morte; 2) Conceitos importantes; 3) Prática com exercícios; 4) Outras informações para o médico; 5) Perguntas e respostas; e 6) Referências legais, normativas e bibliográficas. Na seção 3, o aplicativo apresenta um tutorial para preenchimento correto da DO e casos clínicos de diferentes especialidades médicas, incluindo opção para preencher causas de óbito e um sistema de validação de resposta do usuário.
A avaliação da aceitabilidade do aplicativo entre médicos de hospitais foi realizada pela UFMG em três etapas, em 2016 e 2017. Após cada etapa, a equipe responsável pelo estudo avaliativo sugeriu adaptações à equipe do MS responsável pelo desenvolvimento do aplicativo (Figura 1).
A primeira etapa, identificada como Natal, ocorreu em novembro de 2016, em Encontro Nacional organizado pelo MS para profissionais dos serviços de saúde e pesquisadores, com foco em propostas para melhorar a qualidade da informação sobre causas de morte. Na ocasião, todos os médicos foram convidados para participar de reunião específica, coordenada pela UFMG, com o objetivo de avaliar a primeira versão do aplicativo (beta 0.0.7).
Nas etapas seguintes, médicos de hospitais selecionados foram convidados para reunião de capacitação em certificação da causa de morte utilizando o AtestaDO. Na segunda etapa, identificada como BH_1, a avaliação foi realizada em dois grandes hospitais públicos, em abril e maio de 2017 (versões 0.1.7 e 0.1.8 - Android e 0.1.6 iOS). A partir dessa etapa, a equipe do MS iniciou o desenvolvimento do design gráfico, melhorando a interface do aplicativo. Na terceira etapa (BH_2), uma versão final (beta 0.3.0) foi testada em hospital de grande porte de Belo Horizonte, em dezembro de 2017.
Inicialmente, todos os médicos participantes foram informados sobre a pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), garantindo-se a confidencialidade das informações. Em seguida, preencheram um breve questionário sobre perfil profissional e avaliaram casos clínicos de óbitos hospitalares (10 em Natal e 5 em Belo Horizonte), com seção da DO sobre preenchimento das causas de morte. Após finalizarem os casos analisados, houve uma sessão de treinamento para download e uso do aplicativo AtestaDO11 Devido a problemas de conectividade, houve dificuldade em baixar versões preliminares. A fim de minimizar esta dificuldade, sugeriu-se aos participantes da última avaliação (BH_2) baixar e instalar o aplicativo após a oficina, em ambiente com acesso à internet.. Foi então realizado novo teste, que consistiu em certificar a causa de morte dos mesmos casos anteriores. Devido ao tempo limitado para o treinamento, na etapa BH_2 os médicos foram convidados a responder novo teste em até uma semana após a reunião.
Um breve questionário sobre aceitabilidade também foi aplicado. Solicitou-se que os participantes classificassem a relevância das seções do aplicativo em uma escala de 1 (não é boa) a 5 (excelente), e avaliassem sua funcionalidade, sua contribuição no preenchimento da DO e a probabilidade de uso para este preenchimento ou para ministrar aulas, indicando se recomendariam o AtestaDO aos colegas. Havia ainda questões que avaliaram os meios de acesso ao aplicativo e o tempo despendido na leitura e no uso. Duas questões abertas foram inseridas, permitindo aos participantes sugerir melhorias no aplicativo. Na etapa BH_2 foi verificado se os participantes já tinham acessado o AtestaDO, uma vez que naquele momento o aplicativo já estava disponível para download gratuito.
Devido às sucessivas melhorias das versões do aplicativo, os questionários de avaliação aplicados aos médicos foram readequados a cada etapa, razão pela qual não são apresentados resultados para todas as questões em todas etapas.
O estudo foi aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG) e do Hospital Metropolitano Odilon Behrens (HMOB).
RESULTADOS
As três etapas de avaliação contaram com a participação de 96 médicos. Em Natal (etapa 1), dos 46 médicos presentes na reunião, 8 não conseguiram acessar o AtestaDO devido a problemas de internet local para download inicial do aplicativo. Na etapa BH_1, de 44 participantes, 34 conseguiram acessar o aplicativo e responderam ao questionário de avaliação. Na última etapa (BH_2), 61 médicos compareceram à reunião, mas apenas 24 seguiram a orientação de fazer download do aplicativo após a oficina e participaram desta pesquisa (Figura 1).
Em Natal, 82% dos médicos tinham mais de 20 anos de graduação. Nas duas oficinas de Belo Horizonte, mais de dois terços dos participantes se graduaram há menos de 5 anos e, em sua maioria, eram médicos residentes. Em relação às especialidades, em Natal constatou-se maior proporção de epidemiologistas/sanitaristas e pediatras (26,3% cada). Por outro lado, na oficina BH_1, 65% dos participantes eram da clínica médica, e na oficina BH_2, 38% eram profissionais de medicina comunitária e familiar. O principal local de exercício profissional informado nas oficinas BH_1 e BH_2 foi o hospital, enquanto em Natal 63% dos participantes informaram outro local (Tabela 1).
Mais da metade dos participantes das três etapas informaram já ter preenchido uma DO. Nas oficinas BH_1 e BH_2, entretanto, 41% e 25% dos médicos, respectivamente, relataram nunca ter completado uma DO. Mais de 90% dos médicos de Natal haviam assistido a palestra ou aula sobre preenchimento da DO (a maioria na própria instituição em que trabalha) e 97% já haviam acessado e lido o manual do MS e CFM para preenchimento da DO. Em Belo Horizonte (BH_1), 56% dos médicos já tinham assistido a uma palestra ou aula sobre preenchimento da DO (50% na graduação), mas apenas 38% dos participantes afirmaram ter acessado o manual. Na etapa BH_2, 96% dos médicos relataram ter assistido a palestra ou aula sobre preenchimento da DO (75% na graduação) e 58% tiveram acesso ao manual, dos quais somente 50% relataram já tê-lo lido (Tabela 2).
Cerca de dois terços dos participantes acessaram o aplicativo por meio do download em smartphones. O conteúdo do AtestaDO foi lido em um período de 5 a 10 minutos (BH_1, 26,5% dos participantes) ou 15 a 30 minutos (BH_2, 42% dos participantes) (Tabela 3).
Acesso ao aplicativo AtestaDO por médicos participantes das oficinas de avaliação realizadas em Natal e Belo Horizonte.
Em relação à aceitabilidade do AtestaDO, as seções foram mais bem avaliadas nas oficinas de Natal e BH_2. “Interface do aplicativo” foi bem avaliada nas três oficinas por mais de 82% dos médicos. Em Natal, todas as seções foram bem avaliadas por pelo menos 80% dos médicos, exceto a “Contribuição no preenchimento das causas de óbito” (63%). As seções do aplicativo “Como atestar as causas de morte” e “Outras informações para o médico” foram bem avaliadas, com notas 4 ou 5, por mais de 50% dos médicos. A seção “Prática com exercícios” obteve escores de 4 ou 5 entre 80,6% dos participantes de Natal. No entanto, em Belo Horizonte as proporções para estes escores foram menores, 48,5% e 63,6% em BH_1 e BH_2, respectivamente. As seções “Conceitos importantes” e “Perguntas e respostas”, adicionadas ao aplicativo a partir de 2017, foram bem avaliadas por mais da metade dos médicos de Belo Horizonte. A seção “Referências legais, normativas e bibliográficas” foi bem avaliada nas oficinas de Natal (80,8%) e BH_2 (73,7%), mas na oficina BH_1 este percentual foi de 34,8% (Tabela 4).
A contribuição do aplicativo para atribuir a causa de morte foi avaliada por mais da metade dos médicos com pontuação 4 ou 5. Mais de 70% dos participantes das etapas Natal e BH_2 possivelmente usariam o aplicativo para preencher a causa de morte na DO. No entanto, apenas 46% dos usuários da etapa BH_1 provavelmente usariam o aplicativo para esta finalidade. A probabilidade de usar o AtestaDO para dar aulas foi de 83% em Natal e 42% e 59% em Belo Horizonte (BH_1 e BH_2, respectivamente). Nas três etapas, a maioria dos médicos recomendaria o uso do aplicativo para outros colegas (Tabela 4).
Nas perguntas para relato aberto, foi sempre sugerido um aplicativo com funcionalidade interativa, em que os médicos pudessem incluir dados de uma DO real. Além disso, foi proposta a inserção de imagens dos campos da DO, revisão dos casos, apresentação de links para conteúdos técnicos e normativos, para o seletor de causa básica e inclusão de dicionário de termos médicos.
DISCUSSÃO
Os resultados deste estudo indicam boa aceitabilidade do aplicativo AtestaDO e o sucesso da proposta de pesquisa-ação, em que os avaliadores e os profissionais responsáveis pelo desenvolvimento do aplicativo estavam envolvidos de modo cooperativo e colaborativo, com alteração do formato e conteúdo do aplicativo após cada estudo avaliativo.
Uma das vantagens do AtestaDO é seu uso em smartphones, cada vez mais utilizados para comunicação, atendimento e acompanhamento de pacientes, pesquisas e buscas na internet, educação médica, incluindo aplicativos para a medicina1414. Boruff JT, Storie D. Mobile devices in medicine: a survey of how medical students, residents, and faculty use smartphones and other mobile devices to find information. J Med Lib Assoc. 2014;102(1):22-30. http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.1.006
http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.... ), (1515. Ozdalga E, Ozdalga A, Ahuja N. The smartphone in medicine: a review of current and potential use among physicians and students. J Med Internet Res. 2012;14(5):e128. http://dx.doi.org/10.2196/jmir.1994
http://dx.doi.org/10.2196/jmir.1994... . Assim, espera-se uma ampla utilização de aplicativos por profissionais médicos1414. Boruff JT, Storie D. Mobile devices in medicine: a survey of how medical students, residents, and faculty use smartphones and other mobile devices to find information. J Med Lib Assoc. 2014;102(1):22-30. http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.1.006
http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.... . Payne et al. (1616. Payne KFB, Wharrad H, Watts K. Smartphone and medical related app use among medical students and junior doctors in the United Kingdom (UK): a regional survey. BMC Med Inform Decis Mak. 2012;12:121. http://dx.doi.org/10.1186/1472-6947-12-121
http://dx.doi.org/10.1186/1472-6947-12-1... verificaram que 75% dos médicos juniores possuíam aplicativos relacionados à medicina instalados no smartphone. Esses aplicativos são mais frequentemente utilizados por alunos de graduação, médicos residentes1414. Boruff JT, Storie D. Mobile devices in medicine: a survey of how medical students, residents, and faculty use smartphones and other mobile devices to find information. J Med Lib Assoc. 2014;102(1):22-30. http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.1.006
http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.... ou médicos mais jovens1717. Patel RK, Sayers AE, Patrick NL, Hughes K, Armitage J, Hunter IA. A UK perspective on smartphone use amongst doctors within the surgical profession. Annals of Medicine and Surgery 2015;4:107-112. https://doi.org/10.1016/j.amsu.2015.03.004
https://doi.org/10.1016/j.amsu.2015.03.0... .
Diversos estudos apontam que estratégias educativas como oficinas, intervenções educacionais, seminários, tutoriais on-line e instrutivos aumentaram a precisão da causa de morte ou proporcionaram a melhora global na certificação das causas de morte22. Degani AT, Patel RM, Smith BE, Grimsley E. The effect of student training on accuracy of completion of death certificates. Med Educ Online. 2009;14:17. https://doi.org/10.3885/meo.2009.Res00315
https://doi.org/10.3885/meo.2009.Res0031... ), (55. Myers KA, Farquhar DRE. Improving the accuracy of death Certification. CMAJ. 1998;158(10):1317-23.), (66. Lakkireddy DR, Basarakodu KR, Vacek JL, Kondur AK, Ramachandruni SK, Esterbrooks DJ, et al. Improving death certificate completion: a trial of two training interventions. J Gen Intern Med. 2007;22(4):544-8. https://doi.org/10.1007/s11606-006-0071-6
https://doi.org/10.1007/s11606-006-0071-... ), (1818. McAllum C, St George I, White G. Death certification and doctors' dilemmas: a qualitative study of GPs' perspectives. Br J Gen Pract. 2005;55:677-83.)- (2020. Abós R, Pérez G, Rovira E, Canela J, Domènech J, Bardina JR. Programa piloto para la mejora de la certificación de las causas de muerte en atención primaria en Cataluña. Gac Sanit. 2006;20(6):450-6.. Mas apesar de várias iniciativas anteriores realizadas pelo MS para melhorar o preenchimento da DO, como treinamentos e cursos de capacitação de médicos, além do manual elaborado em parceria com o CFM7, pesquisas brasileiras têm revelado que a qualidade do preenchimento da DO no país ainda necessita melhorar. França et al. (1111. França EB, Passos VMA, Malta DC, Duncan BB, Ribeiro ALP, Guimarães MDC, et al. Cause-specific mortality for 249 causes in Brazil and states during 1990-2015: a systematic analysis for the global burden of disease study 2015. Popul Health Metr. 2017;15:39. https://doi.org/10.1186/s12963-017-0156-y
https://doi.org/10.1186/s12963-017-0156-... ) verificaram que a proporção de códigos garbage declarados como causa de morte permanecia elevada em 2014, em torno de 33%. Em Belém, verificou-se que 71,5% das certificações médicas apresentaram algum tipo de erro, como preenchimento sequencial incorreto das causas de morte. Segundo Silva et al. (2121. Silva JAC, Yamaki VN, Oliveira JPS, Teixeira RKC, Santos FAF, Hosoume VSN. Commitment in the completion of the medical death certification. Evaluation in Belém, Pará, Brazil in 2010. Rev Assoc Med Bras. 2013;59(4):335-40. http://dx.doi.org/10.1016/j.ramb.2013.03.001
http://dx.doi.org/10.1016/j.ramb.2013.03... , isso se relaciona à carência de informação específica nos currículos de graduação e na educação médica continuada.
Neste estudo, a avaliação da aceitabilidade do AtestaDO foi realizada com três públicos distintos. A oficina em Natal contou com a presença de representantes das diferentes regiões do país, por se tratar de um encontro nacional promovido pelo MS. Os médicos tinham maior tempo de graduação e eram, em sua maioria, epidemiologistas, sanitaristas e pediatras. Nas oficinas realizadas em Belo Horizonte, eram em geral jovens médicos residentes, com menos de 5 anos de graduação, e clínicos ou médicos de família.
Esses diferentes perfis estão refletidos nos resultados da avaliação. Em Natal, observou-se maior percentual de médicos que já haviam assistido a uma aula ou palestra sobre preenchimento da DO, com experiência anterior nesse ato e com prévio acesso e leitura do manual para preenchimento da DO (97,4%). Nas oficinas de Belo Horizonte, pelo menos 25% dos participantes relataram nunca ter preenchido uma DO, e um baixo percentual de médicos relatou ter lido o manual citado, coincidindo com resultados de pesquisa realizada em Joaçaba (SC)9. Em outro estudo realizado anteriormente em Belo Horizonte, 75% de 18 médicos entrevistados não conheciam o manual, mas 60% declararam ter recebido instruções sobre preenchimento da DO durante a graduação e 27% afirmaram receber orientações durante a residência médica1010. Mendonça FM, Drumond E, Cardoso AMP. Problemas no preenchimento da Declaração de Óbito: estudo exploratório. Rev Bras Estud Popul. 2010;27(2):285-95. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-30982010000200004
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-30982010... .
As melhores avaliações ocorreram em Natal, BH_2 e BH_1, nesta ordem, coincidindo com a melhor conectividade para o download do aplicativo. Esse resultado também pode decorrer dos diferentes perfis de médicos nas etapas de avaliação. Em Natal, os médicos já tinham experiência com preenchimento da DO, eram envolvidos em atividades de saúde pública e estavam cientes da importância da qualidade de informação sobre mortalidade. Em Belo Horizonte, os médicos eram mais jovens, com menor experiência no preenchimento de DO e provavelmente maior capacidade crítica na utilização de aplicativos, pela experiência anterior com esse tipo de recurso. Por ser este público jovem o que mais utiliza aplicativos para smartphone1414. Boruff JT, Storie D. Mobile devices in medicine: a survey of how medical students, residents, and faculty use smartphones and other mobile devices to find information. J Med Lib Assoc. 2014;102(1):22-30. http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.1.006
http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.... ), (1717. Patel RK, Sayers AE, Patrick NL, Hughes K, Armitage J, Hunter IA. A UK perspective on smartphone use amongst doctors within the surgical profession. Annals of Medicine and Surgery 2015;4:107-112. https://doi.org/10.1016/j.amsu.2015.03.004
https://doi.org/10.1016/j.amsu.2015.03.0... e também o que tem menor conhecimento sobre preenchimento de DO, a disponibilização do AtestaDO possibilitaria maior acesso às instruções. Introduzir o uso do aplicativo nos programas de residência médica, já no início das atividades, mediante resolução da Comissão Nacional de Residência Médica, poderia ser um bom incentivo nesse sentido.
O item mais bem avaliado nas três oficinas foi a interface do aplicativo. Segundo Boruff e Storie1414. Boruff JT, Storie D. Mobile devices in medicine: a survey of how medical students, residents, and faculty use smartphones and other mobile devices to find information. J Med Lib Assoc. 2014;102(1):22-30. http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.1.006
http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.... , uma interface utilizável e acesso off-line a informações de um aplicativo foram considerados facilitadores para acessar os recursos de um smartphone, funcionalidades presentes no AtestaDO. Na versão mais atualizada utilizada na oficina BH_2, os próximos itens avaliados com maior pontuação foram “Perguntas e respostas” e “Conceitos importantes”, que podem estar respondendo a uma demanda do público constituído por médicos jovens. A seção “Prática com exercícios” foi muito bem avaliada em Natal, mas não na etapa BH _ 2, possivelmente devido ao perfil deste público, descrito anteriormente. A pior avaliação do aplicativo, em BH_1, provavelmente se deveu ao uso da versão intermediária do aplicativo e ao problema de conectividade. Conforme Boruff e Storie1414. Boruff JT, Storie D. Mobile devices in medicine: a survey of how medical students, residents, and faculty use smartphones and other mobile devices to find information. J Med Lib Assoc. 2014;102(1):22-30. http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.1.006
http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.... , acesso à rede wi-fi no hospital ou clínica é reconhecido como um limitador para o uso de dispositivos móveis.
A baixa adesão para avaliar e responder o questionário na última avaliação (BH_2) pode ter influenciado os resultados. Esta taxa de retorno, no entanto, foi melhor que a encontrada em outros estudos que investigaram o uso de dispositivos móveis por médicos, estudantes e residentes1414. Boruff JT, Storie D. Mobile devices in medicine: a survey of how medical students, residents, and faculty use smartphones and other mobile devices to find information. J Med Lib Assoc. 2014;102(1):22-30. http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.1.006
http://dx.doi.org/10.3163/1536-5050.102.... ), (1616. Payne KFB, Wharrad H, Watts K. Smartphone and medical related app use among medical students and junior doctors in the United Kingdom (UK): a regional survey. BMC Med Inform Decis Mak. 2012;12:121. http://dx.doi.org/10.1186/1472-6947-12-121
http://dx.doi.org/10.1186/1472-6947-12-1... . Outra limitação levantada pelos participantes foi o tempo, considerado insuficiente para analisar melhor o aplicativo.
É importante destacar a estruturação do grupo coordenador no desenvolvimento do aplicativo. Este grupo contribuiu para melhorar o desempenho do AtestaDO em diversas avaliações realizadas com o MS, que incluíram diretrizes para o preenchimento correto da DO, orientações para especificar a causa básica de morte frente aos códigos garbage, revisão final do conteúdo (texto), definição do layout e da estrutura de tópicos, bem como a revisão de casos clínicos e inserção do tutorial.
Em todas as oficinas enfatizou-se a sugestão de fazer o aplicativo ser mais interativo, aspecto inserido na última versão do AtestaDO (0.3.6, disponibilizada em 2018) com a integração do Iris1212. Soares Filho AM, Nóbrega AA, Lobo AP, Silveira AC, Zoca BO, Cunha CC, et al. Melhoria da qualidade de informação em saúde na percepção de técnicos que colaboram na construção coletiva do livro Saúde Brasil. In: Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde. Saúde Brasil 2017: uma análise da situação de saúde e os desafios para o alcance dos objetivos de desenvolvimento sustentável. Brasília, DF; 2018. p. 387-415.), (2222. Iris Institute. Iris User Reference Manual V5.6.0S1 [Internet]; 2018 [citado em 15 maio 2019]. Disponível em: http://bit.ly/2Lm11jt
http://bit.ly/2Lm11jt... )- (2525. Harteloh P. The automated coding of causes of death in the Netherlands. Epidemol Int J. 2017;1(1):000102., um sistema automático para codificar as causas declaradas pelo médico na DO e selecionar a causa básica da morte. Trata-se do resultado do esforço colaborativo envolvendo várias instituições de diversos países, incluindo o Instituto Alemão de Documentação Médica e Informação e o Centro Nacional de Estatísticas em Saúde. Esse sistema pode ser utilizado em vários idiomas, desde que seja criado um dicionário de termos diagnósticos. No modo de entrada de texto, o usuário insere as causas de morte em texto livre, e um dicionário de termos incluído no Iris traduz essas informações em códigos da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde - 10ª Revisão (CID-10). Dessa forma, na última versão do aplicativo os exercícios práticos passaram a ser interativos e, após o preenchimento das causas de morte, o médico passa a ter conhecimento da qualidade do preenchimento.
A boa aceitabilidade do aplicativo está também refletida no número de instalações realizadas. O AtestaDO foi instalado em aproximadamente 32 mil dispositivos no período de março de 2017 a maio de 2019, segundo o MS. Essa iniciativa está sendo utilizada por outros países da América Latina, que também desenvolveram seus aplicativos baseados no AtestaDO.
Além de desenvolver esse aplicativo, o MS vem realizando outras ações para melhorar a qualidade da informação, como a proposta de implantar o Iris na codificação de causas e seleção da causa básica de morte, possibilitando comparabilidade internacional. Entre outras iniciativas do projeto Dados para Saúde, foram realizados cerca de 70 treinamentos presenciais para mais de 2 mil médicos, entre junho de 2017 e janeiro de 2019, nos quais o AtestaDO foi apresentado e utilizado em exercícios práticos.
CONCLUSÃO
A avaliação do aplicativo AtestaDO mostrou boa aceitabilidade. Os resultados apontam que o AtestaDO apresenta um potencial significativo para impactar a qualidade das causas de morte certificadas pelo médico, pois constitui complemento e alternativa para o treinamento presencial de médicos. Trata-se de uma iniciativa sustentável de longo prazo, disponibilizada gratuitamente aos médicos em várias plataformas de aplicativos, além de ser possível seu uso off-line. Dessa forma, seu aprimoramento merece continuidade, com atualizações constantemente disponibilizadas, como a versão mais recente, que apresenta maior interatividade com a integração do Iris.
Agradecimentos
Os autores agradecem aos médicos que concordaram em participar das reuniões de avaliação, e à Eleonora Gehlen Walcher pelas sugestões.
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- Fonte de Financiamento: Vital Strategies como parte da Iniciativa Dados para a Saúde da Fundação Bloomberg Philanthropies (Projeto 23998 Fundep/UFMG).
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
28 Nov 2019 - Data do Fascículo
2019
Histórico
- Recebido
12 Jun 2019 - Revisado
04 Ago 2019 - Aceito
06 Ago 2019