A relação entre PIB per capita e os acidentes de transporte nos municípios brasileiros, em 2005, 2010 e 2015

Pedro Cisalpino Pinheiro Renato Azeredo Teixeira Antonio Luiz Pinho Ribeiro Deborah Carvalho Malta Sobre os autores

RESUMO:

Objetivo:

O artigo pretende analisar a relação entre o produto interno bruto (PIB) per capita e três variáveis relacionadas aos acidentes de transporte (AT) nos municípios brasileiros: a mortalidade por AT, as mortes por veículo e o número de veículos por pessoa.

Métodos:

As taxas de mortalidade por AT foram estimadas (2005, 2010 e 2015) por meio do estimador bayesiano empírico (EBE). A taxa de mortalidade por veículo foi também estimada pelo EBE. O número de veículos por pessoa foi baseado na razão entre a frota de automóveis e a população residente. Para os três anos em análise, estimamos um modelo de regressão linear entre o PIB per capita municipal e as três variáveis de interesse.

Resultados:

A distribuição das variáveis mostra que a relação entre o PIB e o número de veículos por pessoa se manteve crescente ao longo dos anos e foi sempre negativa, considerando-se as mortes por veículo. A taxa de mortalidade por AT apresentou distribuição próxima a um U invertido. Os coeficientes do modelo de regressão praticamente não variaram para a relação entre PIB e os veículos por habitante. O sinal para o modelo com a taxa de mortalidade por veículo manteve-se o mesmo (negativo), mas apresentou diminuição. A taxa mortalidade por AT, por sua vez, apresentou inversão do sinal em 2015.

Conclusão:

De modo similar ao observado nos países desenvolvidos, parece ter havido inversão na relação entre mortalidade por AT e PIB nos municípios brasileiros entre 2005 e 2015.

Palavras-chave
Mortalidade; Acidentes de transporte; Produto interno bruto; Cidades

INTRODUÇÃO

A ocorrência de óbitos por acidentes de transporte terrestre (ATT) é consequência tanto do número de veículos por pessoa como da fatalidade por veículo11. Kopits E, Cropper M. Traffic fatalities and economic growth. Accid Anal Prev 2005; 37(1): 169-78. https://doi.org/10.1016/j.aap.2004.04.006
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,22. van Beeck EF, Borsboom GJ, Mackenbach JP. Economic development and traffic accident mortality in the industrialized world, 1962-1990. Int J Epidemiol 2000; 29(3): 503-9. https://doi.org/10.1093/ije/29.3.503
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. Nesse sentido, depende, ao mesmo tempo, das taxas de motorização (veículos/pessoa) e da taxa de mortalidade por veículo (mortes/veículo)11. Kopits E, Cropper M. Traffic fatalities and economic growth. Accid Anal Prev 2005; 37(1): 169-78. https://doi.org/10.1016/j.aap.2004.04.006
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. Para baixos níveis de renda, a relação entre desenvolvimento econômico e taxa de mortalidade por ATT (mortes/pessoas) é positiva11. Kopits E, Cropper M. Traffic fatalities and economic growth. Accid Anal Prev 2005; 37(1): 169-78. https://doi.org/10.1016/j.aap.2004.04.006
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44. Bishai D, Quresh A, James P, Ghaffar A. National road casualties and economic development. Health Econ 2006; 15(1): 65-81. https://doi.org/10.1002/hec.1020
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Nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a relação transversal entre prosperidade e taxa de mortalidade por acidentes de transporte (AT) mudou entre 1960 e 199022. van Beeck EF, Borsboom GJ, Mackenbach JP. Economic development and traffic accident mortality in the industrialized world, 1962-1990. Int J Epidemiol 2000; 29(3): 503-9. https://doi.org/10.1093/ije/29.3.503
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. Depois de 1970, essa associação passou a ser negativa. O efeito protetivo da renda pode ser consequência de mecanismos de adaptação, como melhoria da infraestrutura e da assistência médica22. van Beeck EF, Borsboom GJ, Mackenbach JP. Economic development and traffic accident mortality in the industrialized world, 1962-1990. Int J Epidemiol 2000; 29(3): 503-9. https://doi.org/10.1093/ije/29.3.503
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. Noland55. Noland RB. Medical treatment and traffic fatality reductions in industrialized countries. Accid Anal Prev 2003; 35(6): 877-83. https://doi.org/10.1016/s0001-4575(02)00093-3
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aponta o avanço da tecnologia e dos tratamentos médicos como um dos fatores associados à redução da mortalidade por ATT após a década de 1970, nos países desenvolvidos. Na cidade de Monterrey (México), a implantação de novos pontos de saídas de ambulâncias diminuiu o tempo médio de resposta às emergências66. Arreola-Risa C, Mock CN, Lojero-Wheatly L, Cruz O, Garcia C, Canavati-Ayub F, et al. Low-Cost Improvements in Prehospital Trauma Care in a Latin American City. J Trauma 2000; 48(1): 119-24. https://doi.org/10.1097/00005373-200001000-00020
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.

Bishai et al.44. Bishai D, Quresh A, James P, Ghaffar A. National road casualties and economic development. Health Econ 2006; 15(1): 65-81. https://doi.org/10.1002/hec.1020
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apresentam, além da melhoria da assistência aos acidentados, outras linhas de argumentação que pretendem explicar a diferença entre desenvolvimento econômico e mortalidade por ATT entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento. Na primeira, o desenvolvimento econômico é entendido como pré-requisito para a implementação de capacidade institucional para regulação do sistema de transporte e responsabilização dos infratores. A segunda visão trata dos riscos competitivos. Ou seja, nos países em desenvolvimento o investimento estaria concentrado em prioridades (doenças infecciosas, riscos nutricionais etc.), negligenciando, em função da limitação de recursos, medidas para conter os riscos de transporte. Outra visão trata da composição da frota — para níveis elevados de renda a proporção dos usuários vulneráveis seria menor.

Os resultados de Bishai et al.44. Bishai D, Quresh A, James P, Ghaffar A. National road casualties and economic development. Health Econ 2006; 15(1): 65-81. https://doi.org/10.1002/hec.1020
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indicam que apenas os avanços tecnológicos e médicos seriam capazes de diminuir as taxas de mortalidade. No entanto, os autores observam que avanços institucionais, a mudança da composição da frota e a existência de riscos competitivos influenciam a ocorrência de acidentes e de ferimentos. Como a relação entre a ocorrência de acidentes e de feridos não apresentou associação com o aumento do produto interno bruto (PIB), os autores entendem que a principal causa por trás da menor mortalidade por acidentes de transporte nos países ricos seria a maior capacidade de cuidar das vítimas.

Para Paulozzi et al.33. Paulozzi LJ, Ryan GW, Espitia-Hardeman VE, Xi Y. Economic development's effect on road transport-related mortality among different types of road users: A cross-sectional international study. Accid Anal Prev 2007; 39(3): 606-17. https://doi.org/10.1016/j.aap.2006.10.007
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, o principal motivo da inversão da relação entre mortalidade por ATT e renda é a alteração da composição dos usuários de meios de transporte. O crescimento inicial e posterior declínio das taxas de mortalidade foram consequência das mudanças na proporção de usuários vulneráveis (motociclistas, ciclistas e pedestres). Os resultados de Paulozzi et al.33. Paulozzi LJ, Ryan GW, Espitia-Hardeman VE, Xi Y. Economic development's effect on road transport-related mortality among different types of road users: A cross-sectional international study. Accid Anal Prev 2007; 39(3): 606-17. https://doi.org/10.1016/j.aap.2006.10.007
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não indicam, para níveis mais elevados de renda, maior segurança nos deslocamentos.

A complexidade do PIB como variável explicativa tem relação com o fato de se tratar de uma proxy de outras medidas de difícil mensuração, como urbanização, composição da frota, disponibilidade de assistência e qualidade das vias44. Bishai D, Quresh A, James P, Ghaffar A. National road casualties and economic development. Health Econ 2006; 15(1): 65-81. https://doi.org/10.1002/hec.1020
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. Os modelos estimados por Bishai et al.44. Bishai D, Quresh A, James P, Ghaffar A. National road casualties and economic development. Health Econ 2006; 15(1): 65-81. https://doi.org/10.1002/hec.1020
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sugerem que esses fenômenos não medidos impactam a mortalidade por ATT em países ricos e pobres, bem como têm relação com a capacidade institucional dos sistemas de saúde e legal.

A dinâmica econômica de curto prazo também se relaciona com a taxa de mortalidade por ATT77. Law TH, Noland RB, Evans AW. Factors associated with the relationship between motorcycle deaths and economic growth. Accid Anal Prev 2009; 41(2): 234-40. https://doi.org/10.1016/j.aap.2008.11.005
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1010. Michas G, Micha R. Road traffic accidents in Greece: have we benefited from the financial crisis? J Epidemiol Community Health 2013; 67(10): 894. https://doi.org/10.1136/jech-2013-202827
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. Law et al.1111. Law TH, Umar RS, Zulkaurnain S, Kulanthayan S. Impact of the effect of economic crisis and the targeted motorcycle safety programme on motorcycle-related accidents, injuries and fatalities in Malaysia. Int J Inj Contr Saf Promot 2005; 12(1): 9-21. https://doi.org/10.1080/17457300512331339166
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, por exemplo, ao avaliarem o impacto de uma política pública que visava reduzir a mortalidade por acidente de motocicletas na Malásia, observaram que, além dos efeitos das medidas implementadas, a desaceleração econômica também impactou negativamente a mortalidade de motociclistas. O aquecimento da economia faz com que mais pessoas circulem com maior frequência e, consequentemente, há aumento da exposição ao risco. O inverso também é verdadeiro. Scuffham e Langley99. Scuffham PA, Langley JD. A model of traffic crashes in New Zealand. Accid Anal Prev 2002; 34(5): 673-87. https://doi.org/10.1016/s0001-4575(01)00067-7
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observam que, em curto prazo, o aumento do desemprego e a diminuição do PIB estavam associados à redução dos acidentes de transporte com vítimas fatais na Nova Zelândia. O Brasil, nos últimos anos, apresentou dinâmicas de crescimento econômico (2003–2008; 2009–2014) e recessão (2015 e 2016)1212. Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDS). Perspectivas Depec 2018: O Crescimento da Economia Brasileira 2018-2023. Brasil: BNDS; 2018.. É provável que essas dinâmicas também tenham afetado a circulação de pessoas e, consequentemente, a taxa de mortalidade por ATT.

Para Wegman1313. Wegman FCM. Legislation, regulation and enforcement to improve road safety in developing countries. World Bank Seminar on Road Safety, Washington, D.C., 1992., a segurança viária é atingida por meio de medidas capazes de adequar a infraestrutura, os veículos e a regulação do sistema de transporte às características dos usuários. Além da infraestrutura adequada, o autor defende que a segurança das vias depende de regras de trânsito, exigências veiculares, treinamento e educação dos motoristas, regulação e planejamento. De modo geral, principalmente nos países em desenvolvimento, a legislação e o sistema de regulação não conseguem atingir os objetivos propostos1313. Wegman FCM. Legislation, regulation and enforcement to improve road safety in developing countries. World Bank Seminar on Road Safety, Washington, D.C., 1992..

No Brasil, a capacidade institucional dos sistemas de saúde e de regulação do transporte, além da qualidade das vias, varia de modo substantivo entre os municípios. Naturalmente, essas diferenças influenciam a capacidade de fiscalização e regulação e, consequentemente, a segurança das cidades. Apesar de ser responsável pela gestão do trânsito em seu território, de acordo com a legislação, a maior parte dos municípios não está preparada para tal atribuição1414. Bavoso NC. O Sistema nacional de trânsito e os municípios de pequeno porte [dissertação de mestrado]. Belo Horizonte: Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); 2014..

O portal do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran)1515. Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Municipalização [Internet]. Brasília: Denatran; 2020 [acesso em 5 maio 2020]. Disponível em: https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/transito/conteudo-denatran/municipalizacao-denatran
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mostra que, em março de 2020, apenas 1.695 (30,4%) municípios possuíam a gestão de trânsito municipalizada. Segundo França e Jacques1616. França LCR, Jacques MAP. Avaliação da eficácia da gestão do trânsito em nível municipal. Brasília: Universidade de Brasília; 2007., as principais razões para a não integração dos municípios ao Sistema Nacional de Trânsito (SNT) são: falta de mão de obra qualificada para implementar e gerir o trânsito no município; falta de recursos para equipar e manter o órgão de trânsito; falta de avaliação sistemática da gestão dos órgãos já integrados ao SNT, capaz de indicar àqueles que ainda não aderiram a eficácia do processo de municipalização.

A taxa mortalidade por ATT no Brasil apresentou movimentos distintos nas últimas décadas. Entre 1990 e 2015, Ladeira et al.1717. Ladeira RM, Malta DC, Morais Neto OL, Montenegro MMS, Soares Filho AM, Vasconcelos CH, et al. Acidentes de transporte terrestre: estudo Carga Global de Doenças, Brasil e unidades federadas, 1990 e 2015. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(Supl. 1): 157-70. https://doi.org/10.1590/1980-5497201700050013
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observam que houve redução da mortalidade no Brasil. Por outro lado, o período entre 2000 e 2010 é marcado pelo aumento da mortalidade por ATT1818. Bachierri G, Barros AJD. Acidentes de trânsito no Brasil de 1998 a 2010: muitas mudanças e poucos resultados. Rev Saúde Pública 2011; 45(5): 949-63. https://doi.org/10.1590/S0034-89102011005000069
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2121. Carvalho CHR. Mortes por acidentes de transporte terrestre no Brasil: Análise dos sistemas de informação do Ministério da Saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); 2016. Texto para Discussão, No. 2212.. Nos anos mais recentes (2012 e 2013), a taxa de mortalidade por ATT diminuiu em relação a 20102121. Carvalho CHR. Mortes por acidentes de transporte terrestre no Brasil: Análise dos sistemas de informação do Ministério da Saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); 2016. Texto para Discussão, No. 2212.. A dinâmica regional é, no entanto, bastante distinta. Entre 2000 e 2010, os estados das regiões Norte e Nordeste estiveram entre aqueles com maior elevação da taxa de mortalidade por ATT, principalmente em função do aumento do número de mortes de motociclistas1919. Morais Neto OL, Montenegro MMS, Monteiro RA, Siqueira Júnior JB, Silva MMA, Lima CM, et al. Mortalidade por Acidentes de Transporte Terrestre no Brasil na última década: tendência e aglomerados de risco. Ciên Saúde Coletiva 2012; 17(9): 2223-36. https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000900002
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,2222. Martins ET, Boing AF, Peres MA. Mortalidade por acidentes de motocicleta no Brasil: análise de tendência temporal, 1996-2009. Rev Saúde Pública 2013; 47(5): 931-41. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2013047004227
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,2323. Pinheiro PC, Queiroz BL, Teixeira RA, Ribeiro ALP, Malta DC. A mortalidade feminina por acidentes de motocicleta nos municípios brasileiros, 2005, 2010 e 2015. Rev Bras Epidemiol 2020; 23(Supl. 1): E200010. https://doi.org/10.1590/1980-549720200010.supl.1
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.

A taxa de mortalidade de motociclistas aumentou de modo bastante expressivo, principalmente depois de 20001919. Morais Neto OL, Montenegro MMS, Monteiro RA, Siqueira Júnior JB, Silva MMA, Lima CM, et al. Mortalidade por Acidentes de Transporte Terrestre no Brasil na última década: tendência e aglomerados de risco. Ciên Saúde Coletiva 2012; 17(9): 2223-36. https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000900002
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,2020. Chandran A, Sousa TRV, Guo Y, Bishai D, Pechansky F, Vida no Trânsito Evaluation Team. Road Traffic Deaths in Brazil: Rising Trends in Pedestrian and Motorcycle Occupant Deaths. Traffic Inj Prev 2012; 13(Supl. 1): 11-6. https://doi.org/10.1080/15389588.2011.633289
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,2323. Pinheiro PC, Queiroz BL, Teixeira RA, Ribeiro ALP, Malta DC. A mortalidade feminina por acidentes de motocicleta nos municípios brasileiros, 2005, 2010 e 2015. Rev Bras Epidemiol 2020; 23(Supl. 1): E200010. https://doi.org/10.1590/1980-549720200010.supl.1
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. Diferentemente dos ATT de forma geral, Ladeira et al.1717. Ladeira RM, Malta DC, Morais Neto OL, Montenegro MMS, Soares Filho AM, Vasconcelos CH, et al. Acidentes de transporte terrestre: estudo Carga Global de Doenças, Brasil e unidades federadas, 1990 e 2015. Rev Bras Epidemiol 2017; 20(Supl. 1): 157-70. https://doi.org/10.1590/1980-5497201700050013
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apontam para o aumento da mortalidade de motociclistas entre 1990 e 2015. Naturalmente, há importante variação regional, com especial destaque para as regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte1919. Morais Neto OL, Montenegro MMS, Monteiro RA, Siqueira Júnior JB, Silva MMA, Lima CM, et al. Mortalidade por Acidentes de Transporte Terrestre no Brasil na última década: tendência e aglomerados de risco. Ciên Saúde Coletiva 2012; 17(9): 2223-36. https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000900002
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,2222. Martins ET, Boing AF, Peres MA. Mortalidade por acidentes de motocicleta no Brasil: análise de tendência temporal, 1996-2009. Rev Saúde Pública 2013; 47(5): 931-41. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2013047004227
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,2121. Carvalho CHR. Mortes por acidentes de transporte terrestre no Brasil: Análise dos sistemas de informação do Ministério da Saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); 2016. Texto para Discussão, No. 2212.,2424. Pinheiro PC, Queiroz BL. Análise espacial da mortalidade por acidentes de motocicleta nos municípios do Brasil. Ciên Saúde Coletiva 2020; 25(2): 683-92. https://doi.org/10.1590/1413-81232020252.14472018
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Nesse contexto, o objetivo do presente trabalho é analisar a associação entre o PIB dos municípios brasileiros, em três pontos no tempo (2005, 2010 e 2015), com a taxa mortalidade por AT (mortes/pessoas), com o número de veículos por pessoa (veículos/pessoas) e com a taxa de mortalidade por veículo (mortes/veículos). Dada a diversidade socioeconômica e institucional dos municípios, bem como as distintas dinâmicas de renda, espera-se que relação entre o PIB e as medidas de interesse seja, também, diferente. Os resultados podem contribuir para melhor conhecermos um fenômeno que, anualmente, mata e incapacita milhares de brasileiros e, assim, contarmos com um leque maior de instrumentos para a prevenção dessas mortes.

MÉTODOS

O número de óbitos por AT, por município, por ano, foi coletado do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM)2525. Brasil. Ministério da Saúde. Sistema de informação sobre mortalidade (SIM). Brasil: Ministério da Saúde; 2019.. A população municipal para 2005 e 2015 baseou-se em estimativas da Rede Interagencial de Informações para a Saúde (Ripsa)2626. Brasil. Ministério da Saúde. Estimativa da população por sexo e idade, 2005 e 2015. Brasil: Ministério da Saúde; 2018., e em 2010, no Censo de 20102727. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico de 2010. Brasil: IBGE; 2010.. A frota municipal de veículos, considerando-se todos os tipos, foi retirada da base de dados do Denatran2828. Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Frota de veículos [Internet]. Brasília: Denatran; 2019 [acessado 7 out. 2019]. Disponível em: http://www.denatran.gov.br/frota.htm
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, tendo como referência o mês de julho de cada um dos anos de interesse. Para o mesmo triênio (2005, 2010, 2015), o PIB municipal, por sua vez, foi extraído das estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)2929. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Sistema de contas nacionais: Brasil: ano de referência 2010. 3. ed. Rio de Janeiro: IBGE; 2016..

Os óbitos com idade e/ou município ignorados foram redistribuídos proporcionalmente. As taxas de mortalidade por AT foram construídas considerando-se, no numerador, a média móvel de três anos ao redor de cada ano base (2004–2006; 2009–2011; 2014–2016). Em seguida, essas taxas foram padronizadas pelo método direto, utilizando a população brasileira em 2010 como padrão. A última etapa foi a suavização dessas taxas com base no estimador bayesiano empírico (EBE)3030. Marshall RJ. Mapping disease and mortality rates using empirical Bayes estimators. J R Stat Soc Ser C Appl Stat 1991; 40(2): 283-94., adotando como estrutura de vizinhança os 15 municípios mais próximos em cada um dos anos analisados. O uso de um número fixo de vizinhos garante que cada observação conte com uma estrutura de vizinhança de mesmo tamanho das demais. A suavização bayesiana faz-se necessária em função da flutuação aleatória e dos pequenos números no denominador, que podem distorcer as estimativas de risco associado aos eventos de interesse3030. Marshall RJ. Mapping disease and mortality rates using empirical Bayes estimators. J R Stat Soc Ser C Appl Stat 1991; 40(2): 283-94.3232. Carvalho AXY, Silva GDM, Almeida Júnior GR, Albuquerque PHM. Taxas bayesianas para o mapeamento de homicídios nos municípios brasileiros. Cad Saúde Pública 2012; 28(7): 1249-62. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2012000700004
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O estimador bayesiano contrai as taxas observadas nos municípios pequenos em direção à média de seus vizinhos, de modo inversamente proporcional ao tamanho da população3030. Marshall RJ. Mapping disease and mortality rates using empirical Bayes estimators. J R Stat Soc Ser C Appl Stat 1991; 40(2): 283-94.3232. Carvalho AXY, Silva GDM, Almeida Júnior GR, Albuquerque PHM. Taxas bayesianas para o mapeamento de homicídios nos municípios brasileiros. Cad Saúde Pública 2012; 28(7): 1249-62. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2012000700004
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. Ou seja, municípios mais populosos apresentarão o estimador bayesiano mais próximo das taxas brutas. Por outro lado, nos municípios menores, mais sujeitos aos efeitos da flutuação aleatória e dos pequenos números no denominador, o EBE será mais próximo da média da taxa dos municípios vizinhos3030. Marshall RJ. Mapping disease and mortality rates using empirical Bayes estimators. J R Stat Soc Ser C Appl Stat 1991; 40(2): 283-94.3232. Carvalho AXY, Silva GDM, Almeida Júnior GR, Albuquerque PHM. Taxas bayesianas para o mapeamento de homicídios nos municípios brasileiros. Cad Saúde Pública 2012; 28(7): 1249-62. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2012000700004
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. Discussões mais aprofundadas sobre o método podem ser observadas em uma série de trabalhos3030. Marshall RJ. Mapping disease and mortality rates using empirical Bayes estimators. J R Stat Soc Ser C Appl Stat 1991; 40(2): 283-94.3434. Cavalini LT, Leon ACMP. Correção de sub-registros de óbitos e proporção de internações por causas mal definidas. Rev Saúde Pública 2007; 41(1): 85-93. https://doi.org/10.1590/S0034-89102007000100012
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200700...
.

A taxa de mortalidade por veículo — o número de óbitos dividido pelo tamanho da frota — foi também suavizada pelo EBE, com a mesma estrutura de vizinhança. Nesse caso, foi empregado o mesmo numerador da taxa de mortalidade por AT, descrito anteriormente. Naturalmente, a frota municipal também está sujeita aos mesmos problemas de flutuação aleatória e dos pequenos números no denominador, razão pela qual a suavização bayesiana se fez necessária. É conveniente ressaltar que, em 2005, 89 municípios não dispunham de informação sobre tamanho da frota na base de dados do Denatran2626. Brasil. Ministério da Saúde. Estimativa da população por sexo e idade, 2005 e 2015. Brasil: Ministério da Saúde; 2018., com grande concentração em Alagoas (81).

Uma vez estimadas as taxas de mortalidade por AT (mortes/população), a taxa de mortalidade por veículo (mortes/veículos) e a taxa de motorização (veículos/população) para cada ano, essas medidas foram utilizadas como variáveis dependentes em modelos de regressão linear por mínimos quadrados ordinários (MQO), com o PIB per capita como variável explicativa. A ideia é analisar, em diferentes pontos do tempo, a relação entre o PIB e cada uma das taxas de interesse. Alguns valores inverossímeis da taxa de mortalidade por veículo, muito provavelmente em função de problemas na qualidade da informação da frota, foram excluídos da análise usando-se como ponto de corte observações acima do 99,5 percentil. A maior parte das observações excluídas (82) era do ano de 2005 e apenas duas eram de 2010. Nenhuma observação foi excluída na análise de 2015.

RESULTADOS

Nos três anos analisados, a relação entre a taxa mortalidade por AT e o PIB apresentou distribuição em formato próximo a um U invertido (Figura 1). Ou seja, aparentemente, para níveis mais baixos do PIB, há relação positiva entre renda e taxa de mortalidade por ATT, até o meio da distribuição. Desse ponto em diante a renda municipal parece estar associada a níveis mais baixos de mortalidade. No entanto, nos três anos, há uma concentração de municípios de renda mais baixa, com alta taxa de mortalidade por AT. Em 2010 e 2015, essa concentração é maior que no primeiro ano da série. Esses municípios, quase que exclusivamente, são da região Nordeste. A Figura 1 mostra que municípios de renda mais alta, de modo geral, não figuram entre aqueles com taxa de mortalidade por AT mais elevada.

Figura 1
Taxas de mortalidade por acidentes de transporte (estimador bayesiano empírico — EBE) × PIB per capita, municípios do Brasil, ambos os sexos, 2005, 2010, 2015.

Outra característica regional na Figura 1 é uma concentração de municípios da região Centro-Oeste, entre os municípios com renda per capita mais alta e, ao mesmo tempo, com mortalidade elevada. Esse grupo pode ser observado em todos os anos, mas com maior nitidez em 2015. No alto da distribuição, principalmente a partir de 2010, os municípios com taxas de mortalidade mais elevada são, na maior parte dos casos, pertencentes às regiões Norte e Nordeste.

A Figura 2 mostra que, nos três anos analisados, o aumento da renda está associado à elevação no número de veículos por habitante. No início da distribuição, as taxas crescem de modo acelerado e, em seguida, passam a crescer em ritmo menos acentuado. Chamam atenção, também, alguns municípios de renda mais elevada que estão mais distantes da principal concentração de municípios, ou seja, que não figuram entre aqueles com maior taxa de motorização. Na Figura 2, não há clareza quanto a um padrão regional da relação entre o PIB e o número de veículos por habitante. Não houve grandes mudanças no padrão da relação entre PIB e a taxa de motorização entre 2005 e 2015.

Figura 2
Relação veículo por pessoas × PIB per capita, municípios do Brasil, 2005, 2010, 2015.

A análise da taxa de mortalidade por veículo e da renda municipal per capita mostra uma clara relação decrescente em todo o período analisado (Figura 3). Nos três anos, observa-se que níveis mais altos de renda estão associados a uma menor taxa de mortalidade por veículo. A Figura 3 sugere que houve melhora na qualidade da informação da frota ao longo do tempo, uma vez que o número de valores extremos em 2015 é menor que o observado em 2005 e em 2010.

Figura 3
Taxa bayesiana de mortalidade por veículo (mortes/veículos) × PIB per capita, municípios do Brasil, ambos os sexos, 2005, 2010, 2015.

A Figura 3 indica ainda que há uma concentração importante de municípios das regiões Nordeste e Norte entre aqueles com maior taxa de mortalidade por veículo e com renda mais baixa. Assim como na Figura 2, ao longo do tempo, não há sinais de alteração na relação entre PIB e a taxa de mortalidade por veículo nos municípios brasileiros.

A Tabela 1 apresenta, para cada um dos anos, os coeficientes da regressão estimada entre o PIB per capita e as três taxas estimadas (mortalidade, motorização, mortalidade por veículo) como variáveis dependentes. Como as Figuras 2 e 3 já sugerem, entre 2005 e 2015, o aumento do PIB estava associado à redução da taxa de mortalidade por veículo e ao aumento dos veículos por pessoa. Entre 2005 e 2015, o coeficiente estimado para a associação entre PIB e o número de veículos por habitante pouco variou, indicando associação positiva com significância estatística.

Tabela 1
Coeficientes de regressão (MQO) das três variáveis dependentes analisadas pelo PIB per capita municipal.

Considerando-se a taxa de mortalidade por veículo, a associação com o PIB mantém-se negativa, com significância estatística, ao longo do tempo. Há, no entanto, diminuição na magnitude do coeficiente. Em cada ano, o modelo indica diminuição do efeito protetivo na taxa de mortalidade por veículo associado ao aumento da renda. Cabe destacar que há sinais claros de melhora da qualidade da informação da frota de veículo ao longo do período, que podem ter influenciado as estimativas.

Quanto à taxa de mortalidade por AT, entre 2005 e 2010, houve diminuição do impacto na mortalidade associado ao aumento da renda, mas ele manteve-se positivo. Ou seja, tanto em 2005 como em 2010, o impacto associado ao aumento do PIB per capita municipal era de elevação da taxa de mortalidade por AT. Em 2015, no entanto, há inversão dessa relação. O modelo estimado aponta para uma relação negativa. Assim, em 2015, parece haver associação negativa entre o PIB e a taxa mortalidade por AT.

DISCUSSÃO

Os resultados da análise da relação entre a taxa de mortalidade por ATT nos municípios brasileiros e o PIB per capita mostram que, assim como nos países desenvolvidos11. Kopits E, Cropper M. Traffic fatalities and economic growth. Accid Anal Prev 2005; 37(1): 169-78. https://doi.org/10.1016/j.aap.2004.04.006
https://doi.org/10.1016/j.aap.2004.04.00...
44. Bishai D, Quresh A, James P, Ghaffar A. National road casualties and economic development. Health Econ 2006; 15(1): 65-81. https://doi.org/10.1002/hec.1020
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, parece ter havido inversão na relação transversal entre essas variáveis com o passar do tempo. Em 2005, o coeficiente era positivo e mais expressivo que em 2010 (também positivo) e, em 2015, torna-se negativo. No caso de veículos por habitante e mortalidade por veículo, o sentido da associação foi mantido ao longo dos anos, ainda que tenha havido diminuição da intensidade do efeito.

Analisando os países da OCDE, Van Beeck et al.22. van Beeck EF, Borsboom GJ, Mackenbach JP. Economic development and traffic accident mortality in the industrialized world, 1962-1990. Int J Epidemiol 2000; 29(3): 503-9. https://doi.org/10.1093/ije/29.3.503
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observaram a inversão da associação entre a taxa de mortalidade por AT e o PIB per capita, assim como a não alteração da relação considerando o número de veículos por pessoa e as mortes por veículo. A inversão do sentido da associação, segundo os autores, pode ser relacionada com a melhoria na infraestrutura e no cuidado dos acidentados. No Brasil, Carvalho2121. Carvalho CHR. Mortes por acidentes de transporte terrestre no Brasil: Análise dos sistemas de informação do Ministério da Saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); 2016. Texto para Discussão, No. 2212. destaca que as internações hospitalares por ATT aumentaram entre 2007 e 2014, mas, ao mesmo tempo, observou-se diminuição da mortalidade hospitalar — isto é, houve diminuição da mortalidade por ATT pós-internação. Isso, na visão do autor, permite inferir que houve melhora na estrutura e assistência aos acidentados. É possível que essa melhora tenha relação com a associação negativa entre PIB e a taxa de mortalidade por AT em 201522. van Beeck EF, Borsboom GJ, Mackenbach JP. Economic development and traffic accident mortality in the industrialized world, 1962-1990. Int J Epidemiol 2000; 29(3): 503-9. https://doi.org/10.1093/ije/29.3.503
https://doi.org/10.1093/ije/29.3.503...
,55. Noland RB. Medical treatment and traffic fatality reductions in industrialized countries. Accid Anal Prev 2003; 35(6): 877-83. https://doi.org/10.1016/s0001-4575(02)00093-3
https://doi.org/10.1016/s0001-4575(02)00...
,2121. Carvalho CHR. Mortes por acidentes de transporte terrestre no Brasil: Análise dos sistemas de informação do Ministério da Saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); 2016. Texto para Discussão, No. 2212..

É provável, também, que a mudança na composição da frota tenha influenciado a dinâmica de taxa de mortalidade por ATT33. Paulozzi LJ, Ryan GW, Espitia-Hardeman VE, Xi Y. Economic development's effect on road transport-related mortality among different types of road users: A cross-sectional international study. Accid Anal Prev 2007; 39(3): 606-17. https://doi.org/10.1016/j.aap.2006.10.007
https://doi.org/10.1016/j.aap.2006.10.00...
. Entre 2005 e 2010, houve expansão do tamanho relativo da frota de motocicletas e motonetas, que passou de 18,6 para 25%. Entre 2010 e 2015, a participação das motocicletas aumentou em ritmo mais lento, passando para 26,5%2828. Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Frota de veículos [Internet]. Brasília: Denatran; 2019 [acessado 7 out. 2019]. Disponível em: http://www.denatran.gov.br/frota.htm
http://www.denatran.gov.br/frota.htm...
. No entanto, essa dinâmica apresenta diferencias regionais. As motocicletas representam uma parcela importante da frota, principalmente nos estados das regiões Norte e Nordeste. Maranhão e Piauí (2015) são os de menor PIB per capita e, ao mesmo tempo, aqueles em que as motocicletas e motonetas representam a parcela mais expressiva da frota de veículos — respectivamente, 59,3 e 56,1%. No outro extremo, o Distrito Federal apresenta o maior PIB per capita e a menor frota de motocicletas (11,4%). O aumento da proporção de usuários vulneráveis consta entre as possíveis explicações da associação entre taxa de mortalidade por ATT e PIB33. Paulozzi LJ, Ryan GW, Espitia-Hardeman VE, Xi Y. Economic development's effect on road transport-related mortality among different types of road users: A cross-sectional international study. Accid Anal Prev 2007; 39(3): 606-17. https://doi.org/10.1016/j.aap.2006.10.007
https://doi.org/10.1016/j.aap.2006.10.00...
,44. Bishai D, Quresh A, James P, Ghaffar A. National road casualties and economic development. Health Econ 2006; 15(1): 65-81. https://doi.org/10.1002/hec.1020
https://doi.org/10.1002/hec.1020...
.

É possível que a associação negativa entre PIB per capita e a taxa mortalidade por AT identificada em 2015 tenha relação, também, com a desaceleração da atividade econômica observada em anos mais recentes. Em 2015 e 2016, houve retração do PIB no Brasil1212. Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDS). Perspectivas Depec 2018: O Crescimento da Economia Brasileira 2018-2023. Brasil: BNDS; 2018.. Períodos de desaceleração econômica são associados à diminuição da mortalidade por AT em diversos países77. Law TH, Noland RB, Evans AW. Factors associated with the relationship between motorcycle deaths and economic growth. Accid Anal Prev 2009; 41(2): 234-40. https://doi.org/10.1016/j.aap.2008.11.005
https://doi.org/10.1016/j.aap.2008.11.00...
1010. Michas G, Micha R. Road traffic accidents in Greece: have we benefited from the financial crisis? J Epidemiol Community Health 2013; 67(10): 894. https://doi.org/10.1136/jech-2013-202827
https://doi.org/10.1136/jech-2013-202827...
. Naturalmente, há variação regional nos indicadores de atividade econômica que influenciam as medidas analisadas.

Os diferenciais de mortalidade entre os municípios relacionam-se também com a capacidade de gerir e regular o sistema de transporte. Schmidt3535. Schmidt VV. Descentralização federativa e coordenação intergovernamental: um estudo sobre integração dos municípios brasileiros ao Sistema Nacional de Trânsito [tese de doutorado]. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo; 2013. observa que, no Brasil, a fiscalização e a punição destacam-se como viés preponderante para colocar em prática as normas de trânsito, em detrimento da conscientização e educação. Tal dominância, na visão da autora, prejudica a identificação por parte dos prefeitos da responsabilidade do município na implementação da política de trânsito. A execução de medidas de fiscalização impõe uma série de dificuldades aos municípios, como a inexistência de força policial e de um cadastro municipal de veículos e condutores3535. Schmidt VV. Descentralização federativa e coordenação intergovernamental: um estudo sobre integração dos municípios brasileiros ao Sistema Nacional de Trânsito [tese de doutorado]. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo; 2013.. Além da fiscalização e punição, a educação dos usuários e a qualidade das vias relacionam-se com o desenvolvimento econômico e a capacidade de investimento dos municípios e podem estar associadas aos resultados apresentados. Além disso, Schmidt3535. Schmidt VV. Descentralização federativa e coordenação intergovernamental: um estudo sobre integração dos municípios brasileiros ao Sistema Nacional de Trânsito [tese de doutorado]. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo; 2013. salienta que os prefeitos de municípios pequenos também arcam com o ônus político das eventuais punições às infrações de trânsito.

Souza et al.3636. Souza VR, Cavenaghi S, Alves JED, Magalhães MAFM. Análise espacial dos acidentes de trânsito com vítimas fatais: comparação entre o local de residência e de ocorrência do acidente no Rio de Janeiro. Rev Bras Estud Popul 2008; 25(2): 353-64. https://doi.org/10.1590/S0102-30982008000200010
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destacam a tendência de aumento das taxas de mortalidade em pequenos municípios e de redução nos municípios maiores e mais ricos, nas regiões Sul e Sudeste, nos últimos anos. Esse fenômeno poderia ser explicado por políticas regulatórias, melhor atenção às vítimas, maior investimento na melhoria das vias e segurança viária nessas regiões, aumentando a iniquidade na distribuição dos ATT no país.

Diferentes políticas públicas auxiliaram a redução das taxas de mortalidade por AT, como a implantação do Código de Trânsito Brasileiro3737. Brasil. Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997. Código de Trânsito Brasileiro. Diário Oficial da União 1997. em 1998, a Lei Seca3838. Brasil. Lei nº 11.705, de 19 de junho de 2008. Altera a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro, e a Lei nº 9.294, de 15 de julho de 1996, que dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, nos termos do § 4° do art. 220 da Constituição Federal, para inibir o consumo de bebida alcoólica por condutor de veículo automotor, e dá outras providências. Diário Oficial da União 2008., em 2008, e a Nova Lei Seca, em 20123939. Brasil. Lei nº 12.760, de 20 de dezembro de 2012. Altera a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro. Diário Oficial da União 2012., assim como medidas regulatórias relacionadas à segurança veicular4040. Wilhelm F, Garcia RL. Equipamentos de segurança veicular e a legislação brasileira. Rev Elet Cient UERGS 2018; 4(2): 283-98. https://doi.org/10.21674/2448-0479.42.283-298
https://doi.org/10.21674/2448-0479.42.28...
. A implementação do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), em 2003, a ampliação das Unidades de Pronto Atendimento (UPA), a ampliação do atendimento hospitalar das urgências, a criação de políticas de prevenção à violência4141. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 737, de 16/05/2001, publicada no DOU nº 96, Seção 1E de 18/05/2011, que institui a Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências. 2ᵃ ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2005. Série E, Legislação de Saúde., de promoção da saúde4242. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 687, de 30/03/2006, que institui a Política Nacional de Promoção da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. v. 7. Série Pactos pela Saúde 2006, Série B Textos Básicos de Saúde. e o Projeto Vida no Trânsito são iniciativas que contribuíram para a redução das taxas de morbimortalidade no trânsito1919. Morais Neto OL, Montenegro MMS, Monteiro RA, Siqueira Júnior JB, Silva MMA, Lima CM, et al. Mortalidade por Acidentes de Transporte Terrestre no Brasil na última década: tendência e aglomerados de risco. Ciên Saúde Coletiva 2012; 17(9): 2223-36. https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000900002
https://doi.org/10.1590/S1413-8123201200...
.

Entre os limites do estudo, destaca-se a melhoria dos dados do SIM em anos recentes, aprimorando a captação dos eventos e a redução das causas mal definidas. Isso pode afetar as tendências, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, que tiveram melhoras expressivas na captação de óbitos e redução de registros de causas mal definidas4343. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção da Saúde. Saúde Brasil 2018: uma análise de situação de saúde e das doenças e agravos crônicos: desafios e perspectivas. Brasília: Ministério da Saúde; 2019..

Separar os efeitos de curto e longo prazo da relação entre o PIB per capita e a mortalidade por AT no Brasil pode representar uma interessante agenda de pesquisa futura. Outros autores já haviam identificado a redução recente da mortalidade por AT em alguns estados da federação1919. Morais Neto OL, Montenegro MMS, Monteiro RA, Siqueira Júnior JB, Silva MMA, Lima CM, et al. Mortalidade por Acidentes de Transporte Terrestre no Brasil na última década: tendência e aglomerados de risco. Ciên Saúde Coletiva 2012; 17(9): 2223-36. https://doi.org/10.1590/S1413-81232012000900002
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,2121. Carvalho CHR. Mortes por acidentes de transporte terrestre no Brasil: Análise dos sistemas de informação do Ministério da Saúde. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); 2016. Texto para Discussão, No. 2212., bem como da mortalidade feminina por acidente de motocicleta, principalmente nas regiões Sul e Sudeste2323. Pinheiro PC, Queiroz BL, Teixeira RA, Ribeiro ALP, Malta DC. A mortalidade feminina por acidentes de motocicleta nos municípios brasileiros, 2005, 2010 e 2015. Rev Bras Epidemiol 2020; 23(Supl. 1): E200010. https://doi.org/10.1590/1980-549720200010.supl.1
https://doi.org/10.1590/1980-54972020001...
. É provável que, em anos mais recentes, os dois efeitos tenham atuado simultaneamente. Além disso, a utilização de outras variáveis para controlar os efeitos da associação entre as variáveis analisadas e a mortalidade por AT auxiliará na melhor compreensão dessa relação.

  • Fonte de financiamento: Projeto de Pequenas Áreas, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde (TED 148-2018).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    22 Jul 2020
  • Revisado
    04 Dez 2020
  • Aceito
    11 Dez 2020
  • Preprint
    15 Dez 2020
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