RESUMO
Objetivo:
Analisar a tendência temporal dos indicadores de qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase no Brasil, no período de 20 anos.
Métodos:
Trata-se de um estudo epidemiológico de tendência temporal, cujos dados foram extraídos do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). Foram construídos indicadores a partir do Manual Técnico-Operacional, que apresenta as Diretrizes para Vigilância, Atenção e Eliminação da Hanseníase como Problema de Saúde Pública do Ministério da Saúde. Para análise de tendência dos indicadores selecionados, utilizou-se o modelo de Prais-Winsten e calculou-se a Taxa de Incremento Anual (TIA).
Resultados:
Na série temporal de 20 anos aqui investigada, foram notificados no Brasil 732.959 casos de hanseníase. A tendência mostrou-se estacionária para cura de hanseníase entre os casos novos (β=-0,000; p=0,196; TIA=-0,2); casos de hanseníase em abandono de tratamento entre os casos novos (β=-0,001; p=0,147; TIA=-0,4); contatos examinados de casos novos de hanseníase (β=-0,001; p=0,112; TIA=1,6); casos novos de hanseníase com grau de incapacidade física avaliado no diagnóstico (β=-0,000; p=0,196; TIA=-0,2); e casos curados no ano com grau de incapacidade física avaliada (β=0,002; p=0,265; TIA=0,5); enquanto o indicador casos de recidiva entre os casos notificados no ano (β=0,019; p<0,001; TIA=0,5) apresentou tendência crescente.
Conclusão:
Com base na avaliação dos indicadores para mensurar a qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase, ficou evidente que o Brasil possui grandes desafios para sua execução plena, sendo necessárias melhorias na qualidade do serviço ofertado à população.
Palavras-chave:
Epidemiologia; Distribuição temporal; hanseníase; Indicadores de saúde; Saúde pública
INTRODUÇÃO
A hanseníase configura-se como um problema de saúde pública devido à sua magnitude e ao alto poder incapacitante, que afeta, sobretudo, populações vulneráveis e marginalizadas em países de média e baixa renda11. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Guia prático sobre a hanseníase [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited on Aug 14, 2023]. Available at: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_pratico_hanseniase.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco... . Mesmo em face de políticas e programas adotados pelo Ministério da Saúde para sua erradicação22. Costa MS, Silva Júnior PCB, Moura JPG, Pantoja PVN, Silva MP. Políticas para hanseníase: a evolução da gestão em saúde. Rev Enf 2015; 1(2): 104-8. https://doi.org/10.5935/2446-5682.20150018
https://doi.org/10.5935/2446-5682.201500... , a hanseníase continua com elevada prevalência no Brasil33. World Health Organization. Global leprosy (Hansen disease) update, 2021: moving towards interruption of transmission [Internet]. Geneva: WHO; 2022 [cited on Aug 14, 2023]. Available at: https://www.who.int/publications/i/item/who-wer9736-429-450
https://www.who.int/publications/i/item/... — que, em nível mundial, ocupa o segundo lugar em número de casos —, sendo caracterizada, portanto, como doença negligenciada com potencial de eliminação33. World Health Organization. Global leprosy (Hansen disease) update, 2021: moving towards interruption of transmission [Internet]. Geneva: WHO; 2022 [cited on Aug 14, 2023]. Available at: https://www.who.int/publications/i/item/who-wer9736-429-450
https://www.who.int/publications/i/item/... .
Em 2020 foram notificados 127.396 casos novos da doença no mundo. No continente americano, foram registrados 19.195 (15,1%); destes, 17.979 foram notificados no Brasil, o que corresponde a 93,6% do número de casos novos nas Américas44. World Health Organization. Global leprosy update, 2020: impact of COVID-19 on global leprosy control. Weekly Epidemiological Record 2021; 36: 421-44..
Na década de 1980, a Organização Mundial de Saúde (OMS) instituiu a poliquimioterapia (PQT) para o tratamento da hanseníase, visto que esta interrompe a transmissão e previne as deformidades, o que também foi adotado pelo Brasil55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Departamento de Atenção Básica. Legislação sobre o controle da hanseníase no Brasil [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2000 [cited on Nov 03, 2023] Available at: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2022/06/1236038/ms18.pdf
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2022/... . Nesse contexto, em 2002 o Ministério da Saúde propôs os indicadores operacionais para avaliação da qualidade de ações e serviços para redução e monitoramento da hanseníase66. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Departamento de Atenção Básica. Guia para o controle da hanseníase [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2002 [cited on Aug 14, 2023]. Available at: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_de_hanseniase.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco... . Em 2016, com a publicação das Diretrizes para Vigilância, Atenção e Eliminação da Hanseníase como Problema de Saúde Pública, os indicadores operacionais foram denominados indicadores para avaliar a qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase77. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Diretrizes para vigilância, atenção e eliminação da Hanseníase como problema de saúde pública: manual técnico-operacional [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [cited on Aug 14, 2023]. Available at: https://portal.saude.pe.gov.br/sites/portal.saude.pe.gov.br/files/diretrizes_para_._eliminacao_hanseniase_-_manual_-_3fev16_isbn_nucom_final_2.pdf
https://portal.saude.pe.gov.br/sites/por... .
Embora na literatura estejam disponíveis estudos sobre análises de tendências dos indicadores de hanseníase, esses têm focado em contextos locais e/ou regionais, não sendo encontradas publicações com abrangência nacional88. Souza CDF, Matos TS. Análise de tendência dos indicadores de monitoramento e avaliação da qualidade dos serviços de hanseníase em município prioritário do Nordeste brasileiro. Rev Bras Pesqui Saúde 2018; 19(4): 74-83.
9. Lima LV, Pavinati G, Silva IGP, Moura DRO, Gil NLM, Magnabosco GT. Temporal trend, distribution and spatial autocorrelation of leprosy in Brazil: ecological study, 2011 to 2021. Rev Bras Epidemiol 2022; 25: e220040. https://doi.org/10.1590/1980-549720220040
https://doi.org/10.1590/1980-54972022004... -1010. Barros ICA, Sousa CCM, Silva NRF, Mascarenhas MDM. Characterization of cases and epidemiological and operational indicators of leprosy: analysis of time series and spatial distribution, Piauí state, Brazil, 2007-2021. Epidemiol Serv Saúde 2024; 33: e2023090. https://doi.org/10.1590/S2237-96222024v33e2023090.en
https://doi.org/10.1590/S2237-96222024v3... . Adicionalmente, esses estudos avaliaram os indicadores em curtos intervalos temporais99. Lima LV, Pavinati G, Silva IGP, Moura DRO, Gil NLM, Magnabosco GT. Temporal trend, distribution and spatial autocorrelation of leprosy in Brazil: ecological study, 2011 to 2021. Rev Bras Epidemiol 2022; 25: e220040. https://doi.org/10.1590/1980-549720220040
https://doi.org/10.1590/1980-54972022004... ,1111. Anchieta JJS, Costa LMM, Campos LC, Vieira MR, Mota OS, Morais Neto OL, et al. Trend analysis of leprosy indicators in a hyperendemic Brazilian state, 2001–2015. Rev Saúde Pública 2019; 53: 61. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2019053000752
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2019... . Outra lacuna observada é a escassez de estudos de avaliação da qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase, visto que as pesquisas, em sua maioria, centraram-se nos indicadores epidemiológicos1111. Anchieta JJS, Costa LMM, Campos LC, Vieira MR, Mota OS, Morais Neto OL, et al. Trend analysis of leprosy indicators in a hyperendemic Brazilian state, 2001–2015. Rev Saúde Pública 2019; 53: 61. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2019053000752
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2019...
12. Souza CDF, Paiva JPS, Leal TC, Urashima GS. Hanseníase no Brasil no século XXI: análise dos indicadores epidemiológicos e operacionais utilizando regressão por pontos de inflexão. An Bras Dermatol 2020; 95(6): 743-7. https://doi.org/10.1016/j.abdp.2020.09.019
https://doi.org/10.1016/j.abdp.2020.09.0... -1313. Basso MEM, Andrade RF, Silva RLF. Trend of epidemiological indicators of leprosy in an endemic state of the Amazon region. Rev Gaucha Enferm 2021; 42: e20190520. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2021.20190520
https://doi.org/10.1590/1983-1447.2021.2... .
Dessa forma, estudos utilizando indicadores para avaliação da qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase em nível nacional permitem monitorar o impacto das políticas públicas já implementadas, fornecendo apoio aos gestores em saúde para planejamento, tomada de decisões e execução de programas ou melhorias que abarquem a temática da hanseníase no Brasil. Assim, o presente estudo objetivou analisar a tendência temporal dos indicadores de qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase no Brasil, no período de 20 anos.
MÉTODOS
Estudo epidemiológico de tendência temporal utilizando indicadores de avaliação da qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase no Brasil, em série histórica de 2001 a 2020.
Os dados foram obtidos no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) do Ministério da Saúde, coordenado pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS)1414. Brasil. Ministério da Saúde. Sistema de Informação de Agravos de Notificação. Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde. Acompanhamento dos dados de hanseníase – Brasil [Internet]. [cited on Nov 10, 2022]. Available at: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sinannet/cnv/hanswbr.def
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.... . Foram selecionadas as notificações com código A-30, pertencentes à categoria “hanseníase”, registradas no período selecionado e que haviam recebido a classificação de acordo com os critérios de Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (Décima Revisão), CID-101515. Organização Mundial da Saúde. Classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde – CID-10. São Paulo: Edusp; 1994..
Para avaliar a qualidade do atendimento dos serviços de saúde para a redução da hanseníase foram utilizados seis indicadores construídos a partir do Manual Técnico-Operacional, que apresenta as Diretrizes para Vigilância, Atenção e Eliminação da Hanseníase como Problema de Saúde Pública do Ministério da Saúde77. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Diretrizes para vigilância, atenção e eliminação da Hanseníase como problema de saúde pública: manual técnico-operacional [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [cited on Aug 14, 2023]. Available at: https://portal.saude.pe.gov.br/sites/portal.saude.pe.gov.br/files/diretrizes_para_._eliminacao_hanseniase_-_manual_-_3fev16_isbn_nucom_final_2.pdf
https://portal.saude.pe.gov.br/sites/por... (Quadro 1).
Indicadores utilizados para avaliar a qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase no Brasil77. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Diretrizes para vigilância, atenção e eliminação da Hanseníase como problema de saúde pública: manual técnico-operacional [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [cited on Aug 14, 2023]. Available at: https://portal.saude.pe.gov.br/sites/portal.saude.pe.gov.br/files/diretrizes_para_._eliminacao_hanseniase_-_manual_-_3fev16_isbn_nucom_final_2.pdf
https://portal.saude.pe.gov.br/sites/por... .
O banco de dados foi construído no software Microsoft Excel, por meio do qual foram calculadas as proporções. As análises estatísticas para avaliar a tendência temporal e a taxa TIA foram executadas no pacote estatístico Stata (versão 13.0).
Para análise de tendência dos indicadores de avaliação da qualidade do atendimento dos serviços de saúde para redução da hanseníase no Brasil, foi utilizado o teste de regressão linear de Prais-Winsten1616. Antunes JLF, Cardoso MRA. Uso da análise de séries temporais em estudos epidemiológicos. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24(3): 565-76. https://doi.org/5123/S1679-49742015000300024
https://doi.org/5123/S1679-4974201500030... . Foram consideradas como variáveis dependentes as proporções correspondentes a cada indicador avaliado, enquanto a variável independente correspondeu aos anos da série histórica.
Na análise de tendência, obteve-se o valor de β das proporções de cada indicador avaliado, referente à inclinação da reta. Utilizou-se a taxa de variação para classificar a tendência, sendo que: quando a taxa de variação é positiva, a série temporal é crescente; quando negativa, é decrescente; e é estacionária quando não há diferença significativa entre seu valor e zero. O nível de significância foi dado pela comparação entre o valor de p e o valor dado pela curva normal padrão, com Intervalo de Confiança (IC) de 95%. Considerou-se como significante, para todos os indicadores, aqueles cujo modelo estimado obteve valor de p<0,051717. Gonçalves ICM, Freitas RF, Aquino EC, Carneiro JA, Lessa AC. Mortality trend from falls in Brazilian older adults from 2000 to 2019. Rev Bras Epidemiol 2022; 25: e220031. https://doi.org/10.1590/1980-549720220031.2
https://doi.org/10.1590/1980-54972022003... .
A estimativa quantitativa da tendência é calculada pela seguinte equação:
Em que:β corresponde ao coeficiente angular formado na regressão linear.
Para o cálculo do IC das medidas do estudo, utilizou-se a seguinte fórmula:
Em que:t = valor em que a distribuição t de Student apresenta 19 graus de liberdade a um IC95% bicaudal;
EP = erro padrão da estimativa de β, fornecido pela análise de regressão.
Para todos os testes estatísticos realizados, foi adotado o nível de significância de 5%. Assim, foram considerados como significativos valores de p≤0,05.
Seguindo os critérios estabelecidos pela Resolução n° 466/20121818. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução no 466, de 12 de dezembro de 2012. Aprova diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos [Internet]. 2012 [cited on May 03, 2023]. Available at: https://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
https://conselho.saude.gov.br/resolucoes... e pela Resolução n° 510/20161919. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução no 510, de 07 de abril de 2016 [Internet]. 2016 [cited on May 03, 2023]. Available at: https://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2016/Reso510.pdf
https://conselho.saude.gov.br/resolucoes... do Conselho Nacional de Saúde para pesquisas envolvendo seres humanos, não necessitam ser registradas nem avaliadas pelo sistema de Comitês de Ética em Pesquisa (CEP)/Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) pesquisas que utilizem informações de acesso público, nos termos da Lei n° 12.5272020. Brasil. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei no 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei no 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências [Internet]. 2011 [cited on May 03, 2023]. Available at: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_a... , de 18 de novembro de 2011.
RESULTADOS
Na série temporal de 20 anos aqui investigada, foram notificados no Brasil, 732.959 casos de hanseníase. Nesse período, foram registrados 545.610 casos de cura, e a proporção total de cura de hanseníase entre os casos novos diagnosticados nos anos das coortes ao longo da série temporal de 2001 a 2020 foi de 84,49, sendo a menor proporção de cura ocorrida em 2019 e a maior em 2007. Considerando o indicador para avaliação da qualidade do serviço, todos os anos da série — com exceção de 2019, que foi classificado como precário — foram classificados como regular, apontando que, apesar dos esforços para controle e tratamento da hanseníase, estes ainda não são totalmente efetivos no Brasil (Tabela 1).
Qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução no Brasil, no período de 2001 a 2020.
Em relação ao abandono de tratamento, entre os casos novos diagnosticados nos anos das coortes, foram registrados 34.999 casos, cuja proporção de abandono ao longo dos 20 anos da série temporal foi de 5,42%. O ano que registrou o maior número de abandono foi 2019, com 1.971 casos, e o menor número foi registrado em 2011 (1.425). No que se refere ao parâmetro de qualidade do serviço de atenção à saúde para o indicador abandono de tratamento, todos os anos receberam a classificação bom. No período investigado, foram registrados 2.131.711 contatos de casos novos de hanseníase diagnosticados nos anos das coortes, dos quais 1.439.380 foram examinados, apresentando uma proporção de 67,5%. Entre 2001 e 2010, a qualidade do serviço de saúde, no que se refere ao indicador proporção de contatos examinados de casos novos de hanseníase diagnosticados nos anos das coortes, foi classificada como precária, e de 2011 até 2020 foram classificados como regulares, demonstrando, assim, a necessidade de aprimoramento dos serviços de vigilância em saúde (Tabela 1).
Ao longo dos 20 anos, foram registrados 30.873 casos de recidiva, cuja proporção, entre os casos notificados ao longo desses 20 anos, foi de 4,1. A maior proporção de recidiva foi registrada em 2018, e a menor em 2001. Em relação à proporção de casos novos de hanseníase com grau de incapacidade física avaliado no diagnóstico, foi possível observar uma média de 88,9% ao longo de 2001 a 2020, período no qual apenas os anos de 2006, 2009, 2010 e 2011 receberam uma classificação boa — os demais anos, para esse indicador, foram classificados como regular (Tabela 2).
Qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase no Brasil, no período de 2001 a 2020.
No que se refere à proporção de casos curados no ano com grau de incapacidade física avaliado entre os casos novos de hanseníase no período das coortes, a proporção média observada entre 2001 e 2019 foi de 67,8%, resultado considerado precário (Tabela 2).
Na análise de tendência temporal dos indicadores de qualidade do atendimento dos serviços de saúde para redução da hanseníase no Brasil, verificou-se tendência estacionária para os seguintes indicadores: proporção de cura de hanseníase entre os casos novos diagnosticados (TIA=-0,2; IC95%=-0,5-0,1); proporção de casos de hanseníase em abandono de tratamento entre os casos novos diagnosticados (TIA=-0,4; IC95%=-1,5-0,2); proporção de contatos examinados de casos novos de hanseníase diagnosticados (TIA=1,6; IC95%=-0,4-3,6); proporção de casos novos de hanseníase com grau de incapacidade física avaliado no diagnóstico (TIA=-0,2; IC95%=-0,5-0,1); e proporção de casos curados no ano com grau de incapacidade física avaliado entre os casos novos de hanseníase no período das coortes (TIA=0,5; IC95%=-0,4-1,5). Por outro lado, o indicador de proporção de casos de recidiva entre os casos notificados no ano (TIA=0,5; IC95%=-0,4-1,5) apresentou tendência crescente (Tabela 3).
Tendência temporal dos indicadores de avaliação da qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase no Brasil, no período de 2001 a 2020.
DISCUSSÃO
Os achados deste estudo apontam para a precariedade na qualidade da assistência a pessoas diagnosticadas com hanseníase, para sua capacidade em realizar vigilância, bem como para a efetividade das ações para detecção precoce de casos, estando aquém do que é recomendado pela OMS2121. Organização Mundial da Saúde. Rumo à zero hanseníase. Estratégia global para a hanseníase 2021-2030 [Internet]. Nova Deli: OMS, 2021 [cited on May 03, 2023]. Available at: https://www.who.int/pt/publications/i/item/9789290228509
https://www.who.int/pt/publications/i/it... .
A análise de tendência do indicador proporção de cura de hanseníase revelou-se insatisfatória no segmento das pessoas acometidas pela doença até a conclusão do tratamento e obtenção da cura. Estudo realizado no Maranhão entre 2002 e 2015, período próximo ao dos dados aqui apresentados, da mesma forma encontrou tendência estacionária desse indicador, ou seja, sem avanços para o número de casos curados2222. Anchieta JJS, Costa LMM, Campos LC, Vieira MR, Mota OS, Morais Neto OL, et al. Trend analysis of leprosy indicators in a hyperendemic Brazilian state, 2001–2015. Rev Saude Publica 2019; 53: 61. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2019053000752
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2019... . Machado2323. Machado RNR. Descentralização das ações de controle da hanseníase nos clusters de risco do Brasil [dissertação de mestrado]. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais; 2019., em série histórica de 2003 a 2015, analisando clusters de risco para hanseníase no Brasil, também observou tendência estacionária para a proporção de cura na maioria dos clusters, ou seja, em 14 dos 15 analisados. Nesse aspecto, destaca-se a importância do envolvimento dos profissionais de saúde no processo de adesão ao tratamento, bem como a necessidade de programas de educação em saúde para ampliar o conhecimento dos indivíduos com hanseníase sobre a doença, aumentando a proporção de casos curados, e possibilitando, assim, a interrupção da transmissão, bem como casos de incapacidades2323. Machado RNR. Descentralização das ações de controle da hanseníase nos clusters de risco do Brasil [dissertação de mestrado]. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais; 2019.,2424. Machado LMG, Santos ES, Cavaliero A, Steinmann P, Ignotti E. Spatio-temporal analysis of leprosy risks in a municipality in the state of Mato Grosso-Brazilian Amazon: results from the leprosy post-exposure prophylaxis program in Brazil. Infect Dis Poverty 2022; 11(1): 21. https://doi.org/10.1186/s40249-022-00943-7
https://doi.org/10.1186/s40249-022-00943... .
Investigou-se a tendência temporal do indicador proporção de casos de hanseníase em abandono de tratamento, que é inversamente proporcional à eficácia do programa de controle da hanseníase2525. Souza EA, Boigny RN, Ferreira AF, Alencar CH, Oliveira MLW, Ramos Júnior AN. Vulnerabilidade programática no controle da hanseníase: padrões na perspectiva de gênero no Estado da Bahia, Brasil. Cad Saúde Pública 2018; 34(1): e00196216. https://doi.org/10.1590/0102-311X00196216
https://doi.org/10.1590/0102-311X0019621... , e este apresentou tendência estacionária. Estudo realizado no Brasil no período de 2001 a 2015 relatou um aumento na proporção de abandono do tratamento da hanseníase2626. Felix Junior E, Santos VC, Paixão AS, Sampaio KCP, Anjos KF. Perfil epidemiológico da hanseníase no Brasil no período de 2001 a 2015. Revista Brasileira de Saúde Funcional 2018; 6(1): 60-9. https://doi.org/10.25194/rebrasf.v6i3.1010
https://doi.org/10.25194/rebrasf.v6i3.10... . Esses achados demonstram a baixa efetividade na estratégia de redução do abandono do tratamento2727. Lira KB, Leite JJG, Maia DCBSC, Freitas RMF, Feijão AR. Knowledge of the patients regarding leprosy and adherence to treatment. Braz J Infect Dis 2012; 16(5): 472-5. https://doi.org/10.1016/j.bjid.2012.04.002
https://doi.org/10.1016/j.bjid.2012.04.0... , que poderia resultar em dosagem subterapêutica, levando a resistência aos medicamentos e falha no tratamento2525. Souza EA, Boigny RN, Ferreira AF, Alencar CH, Oliveira MLW, Ramos Júnior AN. Vulnerabilidade programática no controle da hanseníase: padrões na perspectiva de gênero no Estado da Bahia, Brasil. Cad Saúde Pública 2018; 34(1): e00196216. https://doi.org/10.1590/0102-311X00196216
https://doi.org/10.1590/0102-311X0019621... ,2828. Moraes MO. Editorial commentary: Drug-resistance in leprosy: moving toward understanding the scope of the problem and how to tackle it. Clin Infect Dis 2016; 63(11): 1485-6. https://doi.org/10.1093/cid/ciw574
https://doi.org/10.1093/cid/ciw574... .
O indicador proporção de contatos examinados de casos novos de hanseníase diagnosticados apresentou tendência estacionária, sugerindo que a capacidade dos serviços em realizar a vigilância de casos novos de hanseníase, bem como sua detecção oportuna, ainda é considerada precária. Mesmo o indicador tendo apresentado, na segunda década, melhoria na classificação, passando de precário a regular, em 2020 a pandemia da COVID-19 possivelmente levou à queda na proporção, e o indicador voltou a ser classificado como precário. Na série histórica apresentada por Souza et al.2929. Souza EA, Ferreira AF, Pinto MSAP, Heukelbach J, Oliveira HX, Barbosa JC, et al. Desempenho da vigilância de contatos de casos de hanseníase: uma análise espaço-temporal no Estado da Bahia, Região Nordeste do Brasil. Cad Saúde Pública 2019; 35(9): e00209518. https://doi.org/10.1590/0102-311X00209518
https://doi.org/10.1590/0102-311X0020951... , com dados do estado da Bahia, a tendência observada entre 2003 e 2014 foi crescente, entretanto, mesmo em face dessa tendência, o indicador também foi classificado como precário. A abordagem do contato é importante para o controle da doença, uma vez que pode gerar aconselhamento e acompanhamento sistemático de longo prazo de indivíduos e famílias expostos ao risco de adoecimento, considerando as características de propagação da doença2929. Souza EA, Ferreira AF, Pinto MSAP, Heukelbach J, Oliveira HX, Barbosa JC, et al. Desempenho da vigilância de contatos de casos de hanseníase: uma análise espaço-temporal no Estado da Bahia, Região Nordeste do Brasil. Cad Saúde Pública 2019; 35(9): e00209518. https://doi.org/10.1590/0102-311X00209518
https://doi.org/10.1590/0102-311X0020951... .
Em relação ao indicador proporção de casos novos de hanseníase com grau de incapacidade física avaliado no diagnóstico, este apresentou tendência estacionária, mantendo padrão regular em todos os anos da série. No estado da Paraíba, esse indicador também apresentou tendência estacionária no período de 2001 a 2014, entretanto, sua classificação se manteve precária em toda a série, não ultrapassando 59%3030. Brito KKG, Andrade SSC, Santana EMF, Peixoto VB, Nogueira JA, Soares MJGO. Epidemiological analysis of leprosy in an endemic state of northeastern Brazil. Rev Gaúcha Enferm 2015; 36(spe): 24-30. https://doi.org/10.1590/19831447.2015.esp.55284
https://doi.org/10.1590/19831447.2015.es... . Já em Minas Gerais, estado pertencente à região com menor ocorrência da doença, embora o indicador tenha sido classificado como bom, ou seja, acima de 90%, no período de 2008 a 2018, sua tendência foi de queda3131. Lages DS, Kerr BM, Bueno IC, Niitsuma ENA, Vidal SL, Reis GCS, et al. Avaliação do grau de incapacidade física por hanseníase em Minas Gerais. In: Farias HPS, org. Educação, saúde e sociedade: investigações, desafios e perspectivas futuras. Rio de Janeiro: Epitaya; 2022. p. 151-60.. Dessa forma, é preciso destacar que a tendência e a classificação desse indicador apresentado neste estudo, com dados para o Brasil, escondem a grande variabilidade existente entre regiões do país. Nesse contexto, torna-se relevante monitorar a implementação dos programas de rastreamento ativo de casos de hanseníase, oportunizando o seu controle e a redução da proporção de casos com grau de incapacidade física no momento do diagnóstico3232. Souza MF, Vanderlei LCM, Frias PG. Assessment of the implementation of the Leprosy Control Program in Camaragibe, Pernambuco State, Brazil. Epidemiol Serv Saude 2017; 26(4): 817-34. https://doi.org/10.5123/S1679-49742017000400013
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201700... ,3333. Monteiro LD, Lopes LSO, Santos PR, Rodrigues ALM, Bastos WM, Barreto JA. Tendências da hanseníase após implementação de um projeto de intervenção em uma capital da Região Norte do Brasil, 2002-2016. Cad Saúde Pública 2018; 34(11): e00007818. https://doi.org/10.1590/0102-311X00007818
https://doi.org/10.1590/0102-311X0000781... .
O indicador proporção de casos curados no ano com grau de incapacidade física avaliado entre os casos novos de hanseníase é importante para examinar a eficácia da estratégia de controle da doença, uma vez que o diagnóstico e o tratamento precoces podem reduzir o risco de incapacidade física e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida dos pacientes3434. Silva JSR, Palmeira IP, Sá, AMM, Nogueira LMV, Ferreira AMR. Fatores sociodemográficos associados ao grau de incapacidade física na hanseníase. Rev Cuid 2018; 9(3): 2338-48.. Observou-se uma tendência estacionária desse indicador, que, durante todos os anos da série investigada, foi classificado como precário. Em Minas Gerais, em estudo realizado no período de 2008 a 2018, esse indicador recebeu uma classificação regular, mas sua tendência decrescente o fez atingir nível precário ao final da série3131. Lages DS, Kerr BM, Bueno IC, Niitsuma ENA, Vidal SL, Reis GCS, et al. Avaliação do grau de incapacidade física por hanseníase em Minas Gerais. In: Farias HPS, org. Educação, saúde e sociedade: investigações, desafios e perspectivas futuras. Rio de Janeiro: Epitaya; 2022. p. 151-60.. Esses achados indicam que há desafios persistentes na avaliação e no acompanhamento do paciente pós-cura para, caso haja incapacidade, propiciar assistência para sua reabilitação, de forma a garantir uma assistência integral, conforme preconizada pelo Sistema Único de Saúde (SUS), com base no cuidado e atendimento continuados1111. Anchieta JJS, Costa LMM, Campos LC, Vieira MR, Mota OS, Morais Neto OL, et al. Trend analysis of leprosy indicators in a hyperendemic Brazilian state, 2001–2015. Rev Saúde Pública 2019; 53: 61. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2019053000752
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2019... ,2525. Souza EA, Boigny RN, Ferreira AF, Alencar CH, Oliveira MLW, Ramos Júnior AN. Vulnerabilidade programática no controle da hanseníase: padrões na perspectiva de gênero no Estado da Bahia, Brasil. Cad Saúde Pública 2018; 34(1): e00196216. https://doi.org/10.1590/0102-311X00196216
https://doi.org/10.1590/0102-311X0019621... ,3333. Monteiro LD, Lopes LSO, Santos PR, Rodrigues ALM, Bastos WM, Barreto JA. Tendências da hanseníase após implementação de um projeto de intervenção em uma capital da Região Norte do Brasil, 2002-2016. Cad Saúde Pública 2018; 34(11): e00007818. https://doi.org/10.1590/0102-311X00007818
https://doi.org/10.1590/0102-311X0000781... .
No presente estudo, o indicador proporção de casos de recidiva entre os casos notificados no ano apresentou uma tendência crescente. Em estudo de série temporal de 2001 a 2014, realizado na Bahia, observou-se tendência crescente para esse indicador, apontando que de 2008 a 2014 houve aumento no número de municípios com notificação de casos de recidiva3535. Souza EA, Heukelbach J, Oliveira MLWDR, Ferreira AF, Sena Neto SA, Raposo MT, Ramos Júnior AN. Low performance of operational indicators for leprosy control in the state of Bahia: spatiotemporal patterns, 2001–2014. Rev Bras Epidemiol 2020; 23: e200019. https://doi.org/10.1590/1980-549720200019
https://doi.org/10.1590/1980-54972020001... . Vários são os fatores preditivos de recidiva em pacientes que tenham sido diagnosticados e curados, dentre os quais se destacam falha no tratamento; reinfecção, que se relaciona com as condições de moradia e hábitos de vida; e o modo de organização dos serviços de saúde. Além disso, outro fator que pode influenciar na recidiva é a falha dos profissionais ao distinguir recidivas de quadro reacional após alta77. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Diretrizes para vigilância, atenção e eliminação da Hanseníase como problema de saúde pública: manual técnico-operacional [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [cited on Aug 14, 2023]. Available at: https://portal.saude.pe.gov.br/sites/portal.saude.pe.gov.br/files/diretrizes_para_._eliminacao_hanseniase_-_manual_-_3fev16_isbn_nucom_final_2.pdf
https://portal.saude.pe.gov.br/sites/por... ,3636. Ferreira SMB, Ignotti E, Gamba MA. Factors associated to relapse of leprosy in Mato Grosso, Central-Western Brazil. Rev Saúde Pública 2011; 45(4): 756-64. https://doi.org/10.1590/s0034-89102011005000043
https://doi.org/10.1590/s0034-8910201100... . Nessa perspectiva, e considerando, ainda, a tendência crescente do indicador, observa-se a necessidade da criação e efetivação de estratégias que proporcionem a diminuição dos determinantes que contribuem para os casos de recidiva3737. Feitosa ALM, Dourado Júnior FW, Florêncio CMGD. Tendência temporal da hanseníase em uma região de saúde do Ceará, 2001 a 2015. Medicina (Ribeirão Preto) 2020; 53(4): 438-46. https://doi.org/10.11606/issn.2176-7262.v53i4p438-446
https://doi.org/10.11606/issn.2176-7262.... ,3838. Bona SH, Silva LOBV, Costa UA, Holanda AON, Campelo V. Recidivas de hanseníase em Centros de Referência de Teresina, Piauí, 2001-2008. Epidemiol Serv Saúde 2015; 24(4): 731-8. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000400015
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201500... . É importante que os serviços diferenciem recidiva das situações de reação reversa hansênica, insuficiência terapêutica e falência terapêutica. Os casos que não responderem ao tratamento proposto para os estados reacionais deverão ser encaminhados às unidades de referência para confirmação de recidiva3939. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Coordenação-Geral de Hanseníase e Doenças em Eliminação. Nota informativa no 51, de 15 de outubro de 2015. Nota Informativa sobre recidiva, insuficiência, falência e resistência medicamentosa na hanseníase [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2015 [cited on Feb 28, 2024]. Available at: https://www.saude.pr.gov.br/sites/default/arquivos_restritos/files/documento/2020-04/notainformativa51recidivaresisteinsuficienciamedicamentosanahanseniase.pdf
https://www.saude.pr.gov.br/sites/defaul... .
Em suma, o Brasil tem um longo caminho a percorrer até que seja possível a erradicação da hanseníase, visto que está entre os cinco países que não alcançaram a meta de controle proposta pela OMS, persistindo com níveis de elevada endemicidade4040. Luna IT, Beserra EP, Alves MDS, Pinheiro PNC. Adesão ao tratamento da Hanseníase: dificuldades inerentes aos portadores. Rev Bras Enferm 2010; 63(6): 983-90. https://doi.org/10.1590/S0034-71672010000600018
https://doi.org/10.1590/S0034-7167201000... . O número elevado e constante de novos casos é um verdadeiro desafio para a eliminação da hanseníase, pois contribui para que haja novos casos através de contatos domiciliares4141. Blok DJ, De Vlas SJ, Richardus JH. Global elimination of leprosy by 2020: are we on track? Parasit Vectors 2015; 8: 548. https://doi.org/10.1186/s13071-015-1143-4
https://doi.org/10.1186/s13071-015-1143-... ,4242. Pescarini JM, Strina A, Nery JS, Skalinski LM, Andrade KVF, Penna MLF, et al. Socioeconomic risk markers of leprosy in high-burden countries: a systematic review and meta-analysis. PLoS Negl Trop Dis 2018; 12(7): e0006622. https://doi.org/10.1371/journal.pntd.0006622
https://doi.org/10.1371/journal.pntd.000... . Ademais, como foi demonstrado neste estudo, os exames de contato, assim como os demais indicadores propostos pela estratégia de enfrentamento da hanseníase, não têm sido alcançados. Além disso, a alta incidência da doença está intimamente ligada a uma determinação social. Dessa maneira, países endêmicos, como o Brasil, deveriam incorporar a erradicação da pobreza como constituinte da sua política de saúde. As ações tomadas dentro do setor da saúde são consideradas insuficientes para atingir a grande gama de necessidades dos despossuídos social e economicamente77. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Diretrizes para vigilância, atenção e eliminação da Hanseníase como problema de saúde pública: manual técnico-operacional [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [cited on Aug 14, 2023]. Available at: https://portal.saude.pe.gov.br/sites/portal.saude.pe.gov.br/files/diretrizes_para_._eliminacao_hanseniase_-_manual_-_3fev16_isbn_nucom_final_2.pdf
https://portal.saude.pe.gov.br/sites/por... ,2121. Organização Mundial da Saúde. Rumo à zero hanseníase. Estratégia global para a hanseníase 2021-2030 [Internet]. Nova Deli: OMS, 2021 [cited on May 03, 2023]. Available at: https://www.who.int/pt/publications/i/item/9789290228509
https://www.who.int/pt/publications/i/it... ,4343. Silvestre MPSA, Lima LNGC. Hanseníase: considerações sobre o desenvolvimento e contribuição (institucional) de instrumento diagnóstico para vigilância epidemiológica. Rev Pan-Amaz Saude 2016; 7: 93-8. https://doi.org/10.5123/s2176-62232016000500010
https://doi.org/10.5123/s2176-6223201600... ,4444. Jesus ILR, Montagner MI, Montagner MA, Alves SMC, Delduque MC. Hanseníase e vulnerabilidade: uma revisão de escopo. Ciênc Saúde Coletiva 2023; 28(1): 143-54. https://doi.org/10.1590/1413-81232023281.09722022
https://doi.org/10.1590/1413-81232023281... .
Embora os resultados tenham apontado para a necessidade na melhoria da qualidade do atendimento dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase, é importante destacar algumas limitações deste estudo. Devido ao desenho epidemiológico empregado, há o impedimento da observação e análise da qualidade da assistência em hanseníase prestada no contexto específico dos municípios brasileiros99. Lima LV, Pavinati G, Silva IGP, Moura DRO, Gil NLM, Magnabosco GT. Temporal trend, distribution and spatial autocorrelation of leprosy in Brazil: ecological study, 2011 to 2021. Rev Bras Epidemiol 2022; 25: e220040. https://doi.org/10.1590/1980-549720220040
https://doi.org/10.1590/1980-54972022004... .
Também se deve levar em conta as limitações advindas do uso de dados secundários do DATASUS, considerando lacunas no preenchimento, além da possibilidade de subnotificação e falhas no fluxo de dados consolidados no sistema. No entanto, seu uso permite o acesso a um registro nacional, que inclui uma população final expressiva, importante para a avaliação epidemiológica de doenças negligenciadas, podendo subsidiar a avaliação por gestores e profissionais, além de auxiliar na tomada de decisão e na revisão de políticas públicas e ações de saúde1717. Gonçalves ICM, Freitas RF, Aquino EC, Carneiro JA, Lessa AC. Mortality trend from falls in Brazilian older adults from 2000 to 2019. Rev Bras Epidemiol 2022; 25: e220031. https://doi.org/10.1590/1980-549720220031.2
https://doi.org/10.1590/1980-54972022003... ,4545. Batista JFC, Oliveira MR, Pereira DLM, Matos MLSS, Souza IT, Menezes MO. Spatial distribution and temporal trends of AIDS in Brazil and regions between 2005 and 2020. Rev Bras Epidemiol 2023; 26: e230002. https://doi.org/10.1590/1980-549720230002
https://doi.org/10.1590/1980-54972023000... .
Além disso, a análise temporal dos indicadores de efetividade das medidas preventivas e o alcance de suas metas de eliminação da hanseníase no Brasil em uma série de 20 anos permitem avaliar a qualidade dos serviços de atenção à saúde no desenvolvimento de ações de controle, no sentido de gerar evidências que possibilitem a adoção de ações para superar questões operacionais do controle.
Ademais, é importante que sejam realizadas novas análises com estratificação, segundo regiões, para que essas políticas possam ser adaptadas às realidades específicas de cada região do Brasil, dado que a prevalência da doença é heterogênea em todo o país. Devido à grande extensão territorial e à distribuição desigual de recursos, essa adaptação é fundamental para garantir a efetividade das ações de saúde.
Finalmente, considerando o atual quadro da hanseníase no Brasil, é importante que os compromissos propostos pela OMS para a eliminação da doença se configurem em um norte para as ações e políticas implementadas no país, assumindo os desafios de superação do atraso no diagnóstico, tratamento, acompanhamento dos casos e busca ativa dos contatos, com investimentos financeiros que permitam a formação adequada dos profissionais, melhorando a qualidade dos serviços de atenção à saúde para redução da hanseníase no Brasil.
AGRADECIMENTOS
Ao Programa de Apoio à Iniciação Científica da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (PAIC/FAPEAM), pela concessão da bolsa de Iniciação Científica ao acadêmico Gabriel da Silva Mártires, no âmbito do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica da Universidade Federal do Amazonas (PIBIC/UFAM), Edital 026/2022.
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- Fonte de financiamento: nenhuma.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
01 Jul 2024 - Data do Fascículo
2024
Histórico
- Recebido
05 Dez 2023 - Revisado
19 Mar 2024 - Aceito
26 Mar 2024