Dificuldades e avanços no acesso e no uso de serviços de saúde por mulheres trans e travestis no Brasil

Thiago Félix Pinheiro Paula Galdino Cardin de Carvalho Gabriel Nolasco Lorruan Alves dos Santos Maria Amélia de Sousa Mascena Veras Sobre os autores

RESUMO

Objetivo:

Compreender as narrativas de Mulheres Trans e Travestis (MTT) de quatro cidades brasileiras acerca do acesso e do uso de serviços de saúde.

Métodos:

Estudo qualitativo realizado no âmbito do projeto TransOdara, pesquisa transversal multicêntrica de métodos mistos, conduzida entre 2019 e 2021. São analisadas 52 entrevistas em profundidade com MTT em Manaus, Campo Grande, Porto Alegre e São Paulo. O tratamento analítico foi orientado pela hermenêutica filosófica.

Resultados:

Relatos de discriminação, estigmatização e patologização reafirmam as dificuldades enfrentadas por MTT na busca por cuidado com a saúde. A recorrência do desrespeito ao nome social/retificado revela obstáculos ao reconhecimento das identidades trans e, em alguns casos, a intenção de inibir a transexualidade-travestilidade. Outras dificuldades decorrem de ações que desconsideram as especificidades de saúde das MTT ou as condições sociais precárias que afetam algumas delas. No entanto, a partir de experiências de respeito e atendimento adequado, as participantes identificam uma mudança em curso, que se expressa em uma maior disponibilidade de serviços e na melhoria da assistência. Há uma expectativa de continuidade da ampliação de serviços, tecnologias e capacitação dos/as profissionais de saúde.

Conclusão:

A mudança identificada tem sido empreendida na interface das políticas públicas de saúde com o ativismo LGBT+ e a produção de conhecimento acerca das questões de saúde das MTT. Os avanços empreendidos, ainda que insuficientes para mudar o cenário da histórica exclusão vivida por elas nos serviços de saúde, apontam caminhos promissores na melhoria de suas condições de saúde.

Palavras-chave:
Mulheres trans; Travestis; Transexualidade; Transfobia; Serviços de saúde; Barreiras ao acesso aos cuidados de saúde

INTRODUÇÃO

Em diferentes partes do mundo, pessoas trans11Os autores do Manual de Cuidado (Standards of Care), produzido pela World Professional Association for Transgender Health’s (WPATH), em sua oitava versão (2022), utilizam o termo Transgender and Gender Diverse (TGD) para abranger a maior variedade global possível de pessoas com identidades e expressões de gênero que diferem do gênero atribuído a elas no nascimento1. Neste artigo, é priorizado o uso do termo trans, que tem sido utilizado no Brasil como categoria englobante dessas diferentes identidades e expressões de gênero2. enfrentam dificuldades na busca por cuidados em saúde, o que reforça as graves disparidades sociais expressas em formas interseccionais de discriminação, exclusão social e violência. Nos serviços de saúde, elas comumente vivem experiências de transfobia e estigmatização e se deparam com a falta de conhecimento e treinamento ou mesmo com recusas de atendimento por parte de profissionais da saúde11. Coleman E, Radix AE, Bouman WP, Brown GR, de Vries ALC, Deutsch MB, et al. Standards of care for the health of transgender and gender diverse people, version 8. Int J Transgend Health 2022; 23(Supp 1): S1-S259. https://doi.org/10.1080/26895269.2022.2100644
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. Experiências negativas prévias ou a antecipação de que essas podem ocorrer têm levado pessoas trans a evitarem buscar serviços de saúde33. Lerner JE, Robles G. Perceived barriers and facilitators to health care utilization in the United States for transgender people: a review of recent literature. J Health Care Poor Underserved 2017; 28(1): 127-52. https://doi.org/10.1353/hpu.2017.0014
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.

No Brasil, apesar da escassez de dados sobre as condições e necessidades de saúde da população trans, é possível identificar sua alta vulnerabilidade a diferentes agravos à saúde. Particularmente entre Mulheres Trans e Travestis (MTT), estudos têm registrado as taxas mais elevadas de infecção por HIV e sífilis44. Bastos FI, Bastos LS, Coutinho C, Toledo L, Mota JC, Velasco-De-Castro CA, et al. HIV, HCV, HBV, and syphilis among transgender women from Brazil: assessing different methods to adjust infection rates of a hard-to-reach, sparse population. Medicine (Baltimore) 2018; 97(1S Suppl 1): S16-S24. https://doi.org/10.1097/MD.0000000000009447
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5. Grinsztejn B, Jalil EM, Monteiro L, Velasque L, Moreira RI, Garcia ACF, et al. Unveiling of HIV dynamics among transgender women: a respondent-driven sampling study in Rio de Janeiro, Brazil. Lancet HIV 2017; 4(4): e169-e176. https://doi.org/10.1016/S2352-3018(17)30015-2
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-66. Veras MASM. Sexo em tempos de prevenção antirretroviral. In: Leite V, Terto Jr T, Parker V, eds. Dimensões sociais e políticas da prevenção. Rio de Janeiro: ABIA; 2020. p. 81-5., bem como altos índices de ansiedade, depressão, sofrimento psíquico, ideação e tentativa de suicídio77. Reis A, Sperandei S, Carvalho PGC, Pinheiro TF, Moura FD, Gomez JL, et al. A cross-sectional study of mental health and suicidality among trans women in São Paulo, Brazil. BMC Psychiatry 2021; 21(1): 557. https://doi.org/10.1186/s12888-021-03557-9
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,88. Chinazzo IR, Lobato MIR, Nardi HC, Koller SH, Saadeh A, Costa AB. Impacto do estresse de minoria em sintomas depressivos, ideação suicida e tentativa de suicídio em pessoas trans. Ciênc Saúde Coletiva 2021; 26(suppl 3): 5045-56. https://doi.org/10.1590/1413-812320212611.3.28532019
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.

Ações de cuidado em saúde direcionadas às MTT foram desenvolvidas a partir de iniciativas de ativistas no âmbito da epidemia de HIV/aids, como a Casa Brenda Lee99. Carrijo GG, Simpson K, Rasera EF, Prado MAM, Teixeira FB. Movimentos emaranhados: travestis, movimentos sociais e práticas acadêmicas. Rev Estud Fem 2019; 27(2): e54503. https://doi.org/10.1590/1806-9584-2019v27n254503
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, na década de 1980. Tais iniciativas foram importantes para o desenvolvimento da resposta governamental à epidemia, especialmente por meio do financiamento de Organizações Não Governamentais (ONGs) e de ações para populações específicas. Entretanto, foi apenas na década de 2000 que políticas públicas de saúde direcionadas a MTT começaram a ser formalizadas1010. Calazans GJ, Pinheiro TF, Ayres JRCM. Vulnerabilidade programática e cuidado público: Panorama das políticas de prevenção do HIV e da Aids voltadas para gays e outros HSH no Brasil. Sex Salud Soc (Rio J.). 2018; 29: 263-93. https://doi.org/10.1590/1984-6487.sess.2018.29.13.a
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.

A Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, formulada em 2011, propõe promover a equidade no Sistema Único de Saúde (SUS) perante a discriminação institucional por orientação sexual e identidade de gênero e as suas implicações no processo de saúde, adoecimento e cuidado. Entre seus objetivos, constam a ampliação do acesso aos serviços de saúde do SUS e a garantia de acesso ao processo transexualizador, regulamentado pelo Ministério da Saúde em 2008 e redefinido e ampliado em 20131111. Popadiuk GS, Oliveira DC, Signorelli MC. A Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros (LGBT) e o acesso ao Processo Transexualizador no Sistema Único de Saúde (SUS): avanços e desafios. Ciênc Saúde Colet 2017; 22(5): 1509-20. https://doi.org/10.1590/1413-81232017225.32782016
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.

A demanda por políticas públicas que promovam a devida atenção à saúde da população trans é crescente, já que os sistemas público e privado de saúde ainda não oferecem respostas suficientes a suas necessidades. É notória, nesse sentido, a escassez de serviços e de profissionais preparados para o atendimento a essa população1212. Carrara S, Hernandez JG, Uziel AP, Conceição GMS, Panjo H, Baldanzi ACO, et al. Body construction and health itineraries: a survey among travestis and trans people in Rio de Janeiro, Brazil. Cad Saude Publica 2019; 35(4): e00110618. https://doi.org/10.1590/0102-311X00110618
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. Adicionalmente, é restrito o acesso a informações acerca das opções disponíveis, mesmo quando se trata de serviços que trabalham especificamente com afirmação de gênero1313. Costa AB, Rosa Filho HT, Pase PF, Fontanari AMV, Catelan RF, Mueller A, et al. Healthcare needs of and access barriers for brazilian transgender and gender diverse people. J Immigr Minor Health 2018; 20(1): 115-23. https://doi.org/10.1007/s10903-016-0527-7
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As dificuldades no acesso e na permanência de pessoas trans nos serviços de saúde no Brasil derivam sobretudo da transfobia que encontram nesses espaços. Entre as MTT, é comum a queixa de que a abordagem dos/as profissionais de saúde, muitas vezes, se restringe a questões relativas às Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs)1414. Rossi TA, Brasil SA, Magno L, Veras MA, Pinheiro TF, Pereira M, et al. Conhecimentos, percepções e itinerários terapêuticos de travestis e mulheres trans no cuidado a infecções sexualmente transmissíveis em Salvador, Brasil. Sex Salud Soc (Rio J.). 2022; 38: e22304. https://doi.org/10.1590/1984-6487.sess.2022.38.e22304.a
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,1515. Nolasco GLP, Lopes ZA, Arruda DO. “Ela é boa de cuspir, maldita Geni!”: reflexões sobre violências contra os corpos dissidentes de travestis em Campo Grande/MS. Revista Ártemis 2020; 29(1): 205-21. https://doi.org/10.22478/ufpb.1807-8214.2020v29n1.47316
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, o que reforça a estigmatização. Contraditoriamente, não lhes é garantido o acesso adequado à prevenção e ao tratamento dessas infecções1313. Costa AB, Rosa Filho HT, Pase PF, Fontanari AMV, Catelan RF, Mueller A, et al. Healthcare needs of and access barriers for brazilian transgender and gender diverse people. J Immigr Minor Health 2018; 20(1): 115-23. https://doi.org/10.1007/s10903-016-0527-7
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. O acesso das MTT à PrEP, por exemplo, é restrito por várias barreiras1616. Wilson EC, Jalil EM, Castro C, Fernandez NM, Kamel L, Grinsztejn B. Barriers and facilitators to PrEP for transwomen in Brazil. Glob Public Health 2019; 14(2): 300-8. https://doi.org/10.1080/17441692.2018.1505933
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, apesar de constarem como população prioritária nas políticas de prevenção combinada ao HIV. A estigmatização também ocorre quando profissionais de saúde as julgam como promíscuas ou presumem que são sempre profissionais do sexo1717. Tagliamento G, Paiva V. Trans-specific health care: challenges in the context of new policies for transgender people. J Homosex 2016; 63(11): 1556-72. https://doi.org/10.1080/00918369.2016.1223359
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Diante dos avanços na visibilidade e no reconhecimento social da população trans no Brasil, Monteiro e Brigeiro1818. Monteiro S, Brigeiro M. Experiências de acesso de mulheres trans/travestis aos serviços de saúde: avanços, limites e tensões. Cad Saúde Pública 2019; 35(4): e00111318. https://doi.org/10.1590/0102-311x00111318
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observam que a discriminação relacionada à identidade de gênero não necessariamente impossibilita o acesso de MTT aos serviços. Para contornar as dificuldades encontradas nesses ambientes, elas recorrem a estratégias tais como a performance de uma intensa docilidade feminina e um refinamento dos modos típicos de classes médias ou a expressão de uma consciência de seus direitos como cidadãs e de conhecimento acerca do funcionamento e das regras das instituições públicas.

Com base nas recentes mudanças sociais que delineiam a relação da população trans com o sistema de saúde, este estudo tem o objetivo de compreender as narrativas de MTT de quatro cidades brasileiras a respeito do acesso e do uso de serviços de saúde. Para isso, investigam-se suas memórias e reflexões acerca das experiências na busca por cuidado em saúde.

MÉTODOS

Trata-se de estudo qualitativo, integrante do projeto TransOdara, pesquisa transversal multicêntrica de métodos mistos realizada entre 2019 e 2021. O projeto objetivou estimar as prevalências de sífilis e outras ISTs entre MTT, compreender os significados atribuídos por elas à sífilis e suas experiências relacionadas ao acesso e ao uso dos serviços de saúde. Para isso, utilizou a estratégia point of care junto aos serviços de saúde parceiros, de modo a integrar diagnóstico, tratamento e prevenção de um conjunto de ISTs no atendimento das participantes, além de estimular, apoiar e otimizar sua presença nesses espaços1919. Veras MASM, Pinheiro TF, Galan L, et al. TransOdara study: The challenge of integrating methods, settings and procedures during the COVID-19 pandemic in Brazil. Rev Bras Epidemiol. 2024; 27(Suppl 1): e240002.supl.1. https://doi.org/10.1590/1980-549720240002.supl.1
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.

Neste artigo, são analisadas 52 entrevistas em profundidade com MTT em seguimento no componente epidemiológico e/ou participantes de outras atividades do projeto em quatro cidades: Manaus, Campo Grande, Porto Alegre e São Paulo. O projeto TransOdara foi realizado também em Salvador – dados referentes ao acesso e uso de serviços nesse sítio, em particular, foram previamente publicados por Rossi et al.1414. Rossi TA, Brasil SA, Magno L, Veras MA, Pinheiro TF, Pereira M, et al. Conhecimentos, percepções e itinerários terapêuticos de travestis e mulheres trans no cuidado a infecções sexualmente transmissíveis em Salvador, Brasil. Sex Salud Soc (Rio J.). 2022; 38: e22304. https://doi.org/10.1590/1984-6487.sess.2022.38.e22304.a
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A seleção das participantes buscou garantir uma diversificação por categorias de idade, escolaridade, atuação profissional (i.e., profissionais do sexo versus outras ocupações) e diagnóstico atual ou prévio de sífilis. O roteiro das entrevistas, além da identificação sociodemográfica, abrangia questões relacionadas a condições de saúde, transição de gênero, experiências com ISTs, itinerários terapêuticos e relação com profissionais e serviços de saúde. As participantes foram contatadas por telefonema e/ou mensagens via aplicativos a partir das bases de dados provenientes de outras atividades do projeto. As entrevistas foram conduzidas por pesquisadores/as treinados/as e previamente familiarizados/as com o roteiro. Em alguns casos, entrevistada e entrevistador/a já se conheciam de atividade ou pesquisa anterior. Em Manaus, Campo Grande e São Paulo, as entrevistas foram realizadas presencialmente em espaço privativo nas instituições parceiras do projeto. Em Porto Alegre, foram realizadas via telefonema devido a restrições impostas pelo agravamento da pandemia de COVID-19. Uma ajuda de custo no valor de R$ 50,00 foi oferecida como ressarcimento para eventuais gastos relacionados à participação. As entrevistas foram gravadas em áudio, transcritas, revisadas e, posteriormente, categorizadas pelos autores.

O tratamento analítico foi orientado pelos princípios epistemológicos decorrentes da hermenêutica filosófica2020. Gadamer HG. Verdade e método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Petrópolis: Editora Vozes; 2008.. Nessa perspectiva, o processo interpretativo consiste em um diálogo entre as formas de discurso produzidas pelas participantes, a literatura acadêmica e os/as pesquisadores/as, que atuam como intérpretes na rearticulação de sentidos. A experiência dialógica de compreensão-interpretação é encarada como uma “fusão de horizontes”, na qual um horizonte é acomodado a outro.

O procedimento adotou os seguintes passos:

  1. a)

    leitura compreensiva das narrativas com propósito de impregnação, visão de conjunto e apreensão das particularidades;

  2. b)

    categorização dos temas;

  3. c)

    interpretação das experiências, percepções e reflexões das entrevistadas;

  4. d)

    articulação com a literatura; e

  5. e)

    síntese de sentidos acerca do acesso e uso dos serviços de saúde.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (CAAE 05585518.7.0000.5479 - Nº parecer: 3.126.815 - 30/01/2019), assim como pelas demais instituições participantes. As entrevistadas assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

RESULTADOS

A idade das participantes variou de 18 a 58 anos, com média de 34 anos. A maior parte se identificou como travesti (21/52) ou mulher trans (19/52). A maioria afirmou ser heterossexual (33/52); 6, bissexual/pansexual; 3, homossexual/gay/lésbica. Em termos de raça/cor, 25 se identificaram como parda, 12 como preta, 10 como branca, 1 como indígena e 1 como amarela. No que tange à escolaridade, 23 tinham Ensino Médio e as proporções de participantes com Ensino Superior (15/52) e com Ensino Fundamental (14/52) foram similares. A maioria possuía renda mensal de R$ 1.000,00 até R$ 2.000,00 (22/52), 6 possuíam renda menor que R$ 500,00 e 1 não possuía renda alguma. 18 participantes eram profissionais do sexo, 4 estudantes e 5 estavam desempregadas; das demais, a maior parte trabalhava como autônoma. A maioria morava em casa/apartamento próprio (16/52) ou alugado (15/52), 13 moravam com a família e 3 com amigos. A caracterização detalhada de cada participante é apresentada no Quadro 1.

Quadro 1
Caracterização sociodemográfica das participantes.

As narrativas das MTT entrevistadas demarcam uma expressiva polarização de suas experiências de acesso e de uso de serviços de saúde e seu uso. Por um lado, explicitam cenas de discriminação, estigmatização e patologização de suas identidades e modos de viver, evidenciando, assim, um processo histórico de transfobia institucional reproduzido nas posturas e ações dos/as profissionais de saúde, bem como na organização dos serviços. Por outro lado, apresentam experiências satisfatórias, caracterizadas pelo respeito e por atendimentos adequados. Nesses relatos, as participantes identificaram uma mudança em curso, expressa na ampliação da disponibilidade de serviços ofertados e na melhoria do atendimento a MTT.

Dificuldades no acesso e no uso de serviços de saúde

A transfobia é identificada em várias nuances da dinâmica social desenvolvida nos serviços, desde olhares direcionados a elas até ações explicitamente discriminatórias ou mesmo entraves na assistência. A discriminação é descrita como uma realidade já conhecida por entrevistadas de diferentes faixas etárias, raça/cor, escolaridade e atuação profissional. Elas percebem reações de estranhamento à sua presença e formas sutis de discriminação por parte de profissionais da saúde ou de demais usuários/as dos serviços. Além de constranger MTT, essas situações se tornam obstáculos à sua permanência nos serviços e afetam sua saúde, já que comprometem a efetividade do cuidado (Excertos 1-4, Quadro 2).

Quadro 2
Excertos selecionados das narrativas das participantes

São recorrentes os relatos de que profissionais da saúde e demais trabalhadores/as dos serviços persistem no uso do nome de registro, mesmo quando cientes de como as MTT gostariam de ser chamadas. As entrevistadas percebem que os/as profissionais têm dificuldade ou resistência à efetivação do ajuste dos nomes, pronomes e referências de gênero em documentos, sistemas e na comunicação estabelecida nos serviços. Em alguns casos, o desrespeito ao nome social/retificado e aos pronomes de sua preferência revela, além de obstáculos no reconhecimento das identidades trans, uma intenção de inibir ou punir a transexualidade-travestilidade (Excerto 5, Quadro 2).

Outras dificuldades podem ser impostas a partir de ações que desconsideram as especificidades das MTT atendidas nos serviços. As MTT relataram se sentir desrespeitadas e desassistidas ao receberem atendimentos formatados para pessoas cisgênero ou enquadrados ao sexo registrado ao nascimento. Inclusive, em alguns relatos é possível identificar indícios de abuso de poder e tentativas de subjugação por meio da imposição de determinadas condições de atendimento. Na mesma direção, tornam-se limitados ou mesmo ineficazes os atendimentos que desconsideram as condições sociais precárias que afetam a saúde e as possibilidades de cuidado de algumas MTT (Excertos 6 e 7, Quadro 2).

Ampliação de serviços e melhoria no atendimento

O relato de boas experiências em serviços de saúde aponta para iniciativas que buscam contrabalancear as iniquidades sociais e de saúde que atingem as MTT. A esse respeito, as entrevistadas destacam, como fatores decisivos para um bom atendimento, o respeito à identidade de gênero e a preparação da equipe profissional no cuidado dessa população. Tais critérios se mostram mais relevantes do que outras características, como a localização geográfica — o que faz, por exemplo, algumas MTT se deslocarem para bairros distantes de suas residências para receberem um atendimento adequado (Excertos 8 e 9, Quadro 2). Apesar da menção a serviços como Pronto Atendimento e Unidade Básica de Saúde, há um destacado reconhecimento do trabalho desenvolvido nos serviços especializados em ISTs/HIV/aids ou em transição de gênero, no que diz respeito aos critérios mencionados. Esse destaque não foi atribuído a categorias profissionais específicas.

A referência às experiências vividas nos serviços parceiros do projeto do qual deriva este estudo aponta para a relevância de estratégias utilizadas com propósito de:

  1. a)

    ampliar a divulgação dos serviços nas redes de MTT;

  2. b)

    viabilizar a ida aos serviços, especialmente daquelas para quem o custo com deslocamento pode ser impeditivo da busca por cuidado;

  3. c)

    otimizar a presença da usuária no serviço, expandindo as tecnologias ofertadas e mitigando a demora e a fragmentação das intervenções — problemas típicos do sistema de saúde, que, no caso de populações menos vinculadas aos serviços, podem ser decisivos para a não continuidade do cuidado (Excertos 10 e 11, Quadro 2).

As boas experiências marcam um contraponto às dificuldades que caracterizam a relação das pessoas trans com a assistência em saúde ao longo do tempo. Especialmente as entrevistadas mais velhas percebem avanços importantes quando se referem ao crescente reconhecimento do direito dessa população à saúde; à ampliação da produção de conhecimento e do debate a respeito de suas questões de saúde; à maior disponibilidade de serviços direcionados a elas e/ou atentos a suas especificidades; e à melhoria na capacitação de profissionais para o atendimento a essa população (Excertos 12-14, Quadro 2).

A expectativa das entrevistadas é de que haja uma tendência de ampliação dos serviços, dos horários de atendimento e da disponibilidade de tecnologias, assim como de melhoria no atendimento a pessoas trans (Excertos 15 e 16, Quadro 2). A ideia de capacitação ou qualificação dos/as profissionais de saúde está presente nas narrativas como parte fundamental da mudança em curso. Ela é apresentada tanto no sentido de promover posturas e ações mais respeitosas quanto no de melhorar o entendimento acerca da transexualidade-travestilidade e o conhecimento técnico necessário para atender as necessidades de saúde dessa população (Excertos 17-19, Quadro 2).

A mudança vislumbrada no acesso e uso dos serviços de saúde é endereçada, por fim, às questões estruturais que historicamente desencadeiam iniquidades sociais e em saúde, refletidas, por exemplo, na escassez de pessoas trans nas esferas de elaboração e condução das políticas e ações de saúde, de modo que o cuidado em saúde fica quase exclusivamente a cargo de pessoas cisgênero, em geral, referenciadas pela própria cisgeneridade (Excertos 20 e 21, Quadro 2).

DISCUSSÃO

A análise das dificuldades enfrentadas pelas MTT entrevistadas quanto ao acesso e ao uso dos serviços e ao seu uso reafirma o panorama presente na literatura, que mostra a abrangência das iniquidades de saúde, que derivam da transfobia estrutural, bem como seu impacto na saúde e na vida de MTT11. Coleman E, Radix AE, Bouman WP, Brown GR, de Vries ALC, Deutsch MB, et al. Standards of care for the health of transgender and gender diverse people, version 8. Int J Transgend Health 2022; 23(Supp 1): S1-S259. https://doi.org/10.1080/26895269.2022.2100644
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,33. Lerner JE, Robles G. Perceived barriers and facilitators to health care utilization in the United States for transgender people: a review of recent literature. J Health Care Poor Underserved 2017; 28(1): 127-52. https://doi.org/10.1353/hpu.2017.0014
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,1313. Costa AB, Rosa Filho HT, Pase PF, Fontanari AMV, Catelan RF, Mueller A, et al. Healthcare needs of and access barriers for brazilian transgender and gender diverse people. J Immigr Minor Health 2018; 20(1): 115-23. https://doi.org/10.1007/s10903-016-0527-7
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,2121. Rocon PC, Rodrigues A, Zamboni J, Pedrini MD. Dificuldades vividas por pessoas trans no acesso ao Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2016;21(8): 2517-26. https://doi.org/10.1590/1413-81232015218.14362015
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22. Benevides BG Dossiê assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2022. Brasília: Associação Nacional de Travestis e Transexuais; 2023.
-2323. Moraes AND, Silva GSN. Transvestites and humanized health care. Rev Abordagem Gestalt 2020; 26(2): 175-87. https://doi.org/10.18065/2020v26n2.5
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. Nesse sentido, é evidente uma contradição ético-prática, presente nos espaços de cuidado à saúde. Quando buscados por MTT, na expectativa de alívio ou prevenção de adoecimento, esses espaços, muitas vezes, se apresentam como ambientes hostis, que as repelem em vez de acolhê-las, aumentando sua vulnerabilidade a diferentes agravos.

Muitas dessas dificuldades são relacionadas especificamente à discriminação sexual e de gênero, embora as MTT também enfrentem obstáculos comuns a outros/as usuários/as do SUS, como filas, falhas na informação e ausência de médicos1818. Monteiro S, Brigeiro M. Experiências de acesso de mulheres trans/travestis aos serviços de saúde: avanços, limites e tensões. Cad Saúde Pública 2019; 35(4): e00111318. https://doi.org/10.1590/0102-311x00111318
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. A recorrência do desrespeito ao nome social/retificado e à identidade de gênero não apenas incorre na negação de direitos conquistados22A Portaria no 1.820, de 13 de agosto de 2009, do Ministério da Saúde, estabelece como direito, na rede de serviços de saúde, o atendimento humanizado, acolhedor, livre de qualquer discriminação, restrição ou negação em virtude de identidade de gênero, entre outras características. Resolve também que deve existir em todo documento da/o usuária/o um campo para se registrar o nome social independente do registro civil, sendo assegurado o uso do nome de preferência (Disponível em https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2009/prt1820_13_08_2009.html)., mas se torna um obstáculo na busca de serviços e causa abandonos de tratamentos1313. Costa AB, Rosa Filho HT, Pase PF, Fontanari AMV, Catelan RF, Mueller A, et al. Healthcare needs of and access barriers for brazilian transgender and gender diverse people. J Immigr Minor Health 2018; 20(1): 115-23. https://doi.org/10.1007/s10903-016-0527-7
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,1414. Rossi TA, Brasil SA, Magno L, Veras MA, Pinheiro TF, Pereira M, et al. Conhecimentos, percepções e itinerários terapêuticos de travestis e mulheres trans no cuidado a infecções sexualmente transmissíveis em Salvador, Brasil. Sex Salud Soc (Rio J.). 2022; 38: e22304. https://doi.org/10.1590/1984-6487.sess.2022.38.e22304.a
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,2121. Rocon PC, Rodrigues A, Zamboni J, Pedrini MD. Dificuldades vividas por pessoas trans no acesso ao Sistema Único de Saúde. Ciênc Saúde Colet 2016;21(8): 2517-26. https://doi.org/10.1590/1413-81232015218.14362015
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,2424. Lionço T. Atenção integral à saúde e diversidade sexual no Processo Transexualizador do SUS: avanços, impasses, desafios. Physis 2009; 19(1): 43-63. https://doi.org/10.1590/S0103-73312009000100004
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.

Os indícios de punição e subjugação, identificados nas posturas de profissionais de saúde descritas pelas entrevistadas, mostram como conflitos acerca das concepções de gênero e disputas no campo da moral sexual compõem a dinâmica social dos serviços de saúde. Assim, a presença de MTT nos serviços implica possíveis tensões e confrontos, o que as afasta dos serviços de saúde. A transfobia também pode ser identificada de forma sistêmica na escassez de formação e de competência dos/as profissionais de saúde para lidarem com as identidades, questões e necessidades de saúde específicas das pessoas trans1616. Wilson EC, Jalil EM, Castro C, Fernandez NM, Kamel L, Grinsztejn B. Barriers and facilitators to PrEP for transwomen in Brazil. Glob Public Health 2019; 14(2): 300-8. https://doi.org/10.1080/17441692.2018.1505933
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,2323. Moraes AND, Silva GSN. Transvestites and humanized health care. Rev Abordagem Gestalt 2020; 26(2): 175-87. https://doi.org/10.18065/2020v26n2.5
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. Consequentemente, é alimentado um círculo vicioso no qual se articulam as expressões sociais da transfobia, a escassez de políticas públicas que visem garantir os direitos de MTT e a pouca preparação de serviços e profissionais de saúde para atendê-las. Embora as dificuldades no acesso e no uso dos serviços possam se articular a outras dinâmicas sociais discriminatórias, como o racismo2525. Nogueira FJS, Leitão ESF, Silva ECS. Interseccionalidades na experiência de pessoas trans nos serviços de saúde. Rev Psicol Saúde 2021; 13(3): 35-50. https://doi.org/10.20435/pssa.v13i3.1243
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, as entrevistas não se ativeram a essa relação.

As boas experiências, por sua vez, revelam avanços na construção de uma assistência à saúde que respeite as expressões e especificidades das MTT e atenda de forma adequada às suas necessidades de cuidado. A percepção de que as possibilidades e condições de acesso e uso dos serviços de saúde estão mudando ainda é pouco referida na literatura e reflete o impacto da recente ampliação da disponibilidade de serviços oferecidos a MTT e da melhoria do atendimento na saúde e na vida dessa população.

Por um lado, a expectativa de que tais ampliações e melhorias sejam continuadas aponta que os avanços identificados ainda são insuficientes para mudar o cenário da histórica exclusão vivida por MTT nos serviços de saúde. Por outro, essa expectativa reafirma alguns caminhos que se mostram promissores. A referência ao bom atendimento recebido, especialmente nos serviços especializados em ISTs/HIV/aids, de transição de gênero e nos serviços parceiros desse projeto, endossa a relevância das estratégias adotadas nesses espaços com o intuito de combater a discriminação e oferecer ações direcionadas às especificidades de saúde das MTT e ao alívio das iniquidades sociais que as afetam.

A mudança identificada nessa direção tem sido empreendida na interface das políticas públicas de saúde com o ativismo LGBT+ e a produção de conhecimento acerca das questões de saúde dessa população. Resulta, portanto, do aumento de reconhecimento e visibilidade social das MTT no Brasil a partir de sua afirmação política1818. Monteiro S, Brigeiro M. Experiências de acesso de mulheres trans/travestis aos serviços de saúde: avanços, limites e tensões. Cad Saúde Pública 2019; 35(4): e00111318. https://doi.org/10.1590/0102-311x00111318
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, assim como da recente expansão do debate acadêmico relativo a esse grupo. Segundo Favero2626. Favero S. Por uma ética pajubariana: a potência epistemológica das travestis intelectuais. Equatorial 2020; 7(12): 1-22. https://doi.org/10.21680/2446-5674.2020v7n12ID18520
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, os “estudos trans”, que se propagaram no país nos anos 2000, ultrapassaram o foco na prostituição de MTT e abriram a discussão sobre saúde e clínica, especialmente nas disputas pela despatologização do gênero no âmbito dos guias diagnósticos. Com o transfeminismo33O transfeminismo consiste em uma linha de pensamento e de prática feminista fundamentada no processo de consciência política e resistência das pessoas trans, assim como no feminismo negro, principalmente nos conceitos de interseccionalidade e não hierarquia de opressões. Rediscute a subordinação morfológica do gênero ao sexo, que tem servido como justificativa para a opressão de pessoas cujos corpos não estão em conformidade com a norma binária homem/pênis e mulher/vagina28., houve uma atualização das formas de organização política dessa população para além da atuação em ONGs ou associações ligadas ao enfrentamento da epidemia de HIV/aids. Nesse sentido, a maior presença de MTT nas universidades produziu um importante deslocamento da posição de pesquisadas para a de pesquisadoras, junto com a reivindicação de reconhecimento epistemológico de suas cosmologias, incluindo suas noções de adoecimento e bem-estar. Em consonância, algumas entrevistadas enfatizam que a superação das dificuldades de MTT nos serviços de saúde está atrelada à necessidade de romper as barreiras que as excluem das esferas de elaboração e condução das políticas e ações de saúde, quase sempre referenciadas pela cisgeneridade.

Como o desenho deste estudo implicou o uso dos serviços pelas participantes, o relato das dificuldades enfrentadas pode ter sido atenuado frente à transposição de algumas possíveis barreiras de acesso. Além disso, apesar das estratégias de divulgação e de convite para participação, podem não ter sido incluídas MTT em situações mais extremas de vulnerabilidade, especialmente aquelas poucos inseridas em redes de sociabilidade ou residentes em áreas com menos infraestrutura (com carência de transporte público, internet etc.). Comparações entre os resultados por região não foram possíveis devido a especificidades na realização da pesquisa em cada sítio, especialmente no que diz respeito às adaptações necessárias ao enfrentamento da pandemia de COVID-19.

As narrativas analisadas mostram o entrecruzamento de dois movimentos opostos e conflitantes na relação das MTT com os serviços de saúde. Essa oposição ganha contornos mais acentuados diante da atual conjuntura política e social brasileira. O recrudescimento do conservadorismo nos últimos anos — com a escalada do fundamentalismo religioso no Estado e as ofensivas contra os estudos e o debate de gênero e sexualidade — resulta no aumento da transfobia em suas diferentes manifestações e no cerceamento da cidadania das pessoas trans2727. Silva ELS. Neoconservadorismo e ofensivas antigênero no Brasil: a mobilização da “Ideologia de Gênero” e a produção de LGBTfobias no Governo Bolsonaro. REBEH 2022; 4(14): 331-63. https://doi.org/10.31560/2595-3206.2021.14.12172
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. Em contrapartida, a retomada democrática pós-pandemia, com a eleição de MTT para cargos políticos e a reestruturação das políticas públicas de saúde e de Direitos Humanos, abre espaço para que os avanços conquistados ou em perspectiva sejam efetivados ampla e consistentemente, de modo a mudar, de fato, as condições de saúde das pessoas trans.

AGRADECIMENTOS:

Às mulheres trans e travestis que participaram do Estudo TransOdara e à equipe de profissionais do Ministério da Saúde – Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis (DCCI) e da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS).

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  • 1
    Os autores do Manual de Cuidado (Standards of Care), produzido pela World Professional Association for Transgender Health’s (WPATH), em sua oitava versão (2022), utilizam o termo Transgender and Gender Diverse (TGD) para abranger a maior variedade global possível de pessoas com identidades e expressões de gênero que diferem do gênero atribuído a elas no nascimento11. Coleman E, Radix AE, Bouman WP, Brown GR, de Vries ALC, Deutsch MB, et al. Standards of care for the health of transgender and gender diverse people, version 8. Int J Transgend Health 2022; 23(Supp 1): S1-S259. https://doi.org/10.1080/26895269.2022.2100644
    https://doi.org/10.1080/26895269.2022.21...
    . Neste artigo, é priorizado o uso do termo trans, que tem sido utilizado no Brasil como categoria englobante dessas diferentes identidades e expressões de gênero22. Carvalho M. “Travesti”, “mulher transexual”, “homem trans” e “não binário”: interseccionalidades de classe e geração na produção de identidades políticas. Cad Pagu 2018; 52: e185211. https://doi.org/10.1590/1809444920100520011
    https://doi.org/10.1590/1809444920100520...
    .
  • 2
    A Portaria no 1.820, de 13 de agosto de 2009, do Ministério da Saúde, estabelece como direito, na rede de serviços de saúde, o atendimento humanizado, acolhedor, livre de qualquer discriminação, restrição ou negação em virtude de identidade de gênero, entre outras características. Resolve também que deve existir em todo documento da/o usuária/o um campo para se registrar o nome social independente do registro civil, sendo assegurado o uso do nome de preferência (Disponível em https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2009/prt1820_13_08_2009.html).
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    O transfeminismo consiste em uma linha de pensamento e de prática feminista fundamentada no processo de consciência política e resistência das pessoas trans, assim como no feminismo negro, principalmente nos conceitos de interseccionalidade e não hierarquia de opressões. Rediscute a subordinação morfológica do gênero ao sexo, que tem servido como justificativa para a opressão de pessoas cujos corpos não estão em conformidade com a norma binária homem/pênis e mulher/vagina2828. Jesus JG. Transfeminismo: teorias e práticas. Rio de Janeiro: Metanoia; 2015..

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    29 Out 2023
  • Revisado
    17 Fev 2024
  • Aceito
    20 Fev 2024
Associação Brasileira de Pós -Graduação em Saúde Coletiva São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revbrepi@usp.br