Avaliação do acompanhamento de pacientes adultos com hipertensão arterial e ou diabetes melito pela Estratégia Saúde da Família e identificação de fatores associados, Cambé-PR, Brasil, 2012

Assessment of the follow-up of adult patients with arterial hypertension and/or diabetes mellitus by the Family Health Strategy and identification of associated factors in the city of Cambé, Brazil, 2012

Evaluación del acompañamiento de pacientes adultos con hipertensión arterial y/o diabetes mellitus por la Estrategíade Salud de la Familia e identificación de factores asociados. Cambé-PR, Brasil, 2012

Bárbara Radigonda Regina Kazue Tanno de Souza Luiz Cordoni Junior Ana Maria Rigo Silva Sobre os autores

Resumo

OBJETIVO:

avaliar o acompanhamento de adultos com hipertensão arterial e ou diabetes pelas equipes de Saúde da Família e identificar fatores associados, na cidade de Cambé-PR, Brasil, em 2012.

MÉTODOS:

pesquisa avaliativa de análise documental, calculando-se os indicadores de cobertura e concentração de visita domiciliar, consulta médica e de enfermagem.

RESULTADOS:

dos 687 indivíduos com hipertensão e ou diabetes, 386 tinham registro da condição nas unidades básicas; a cobertura de consulta médica (69,2%) foi regular, as de consulta de enfermagem (1,5%) e visita domiciliar (12,2%) foram críticas; a concentração revelou-se crítica em visitas domiciliares, consultas de enfermagem e consultas médicas aos grupos de alto risco; as coberturas de consulta médica foram mais elevadas em mulheres, indivíduos de menor escolaridade e que utilizavam unidades básicas de saúde (p<0,05), sem distinção conforme o risco cardiovascular.

CONCLUSÃO:

o acompanhamento pelas equipes não atende ao padrão assistencial estabelecido para os grupos programáticos analisados.

Palavras-chave:
Avaliação em Saúde; Estratégia Saúde da Família; Diabetes Mellitus; Hipertensão

Abstract

OBJECTIVE:

to assess the follow-up of adults with arterial hypertension and/or diabetes by the Family Health teams and identify associated factors in the city of Cambé-PR, Brazil, in 2012.

METHODS:

evaluation research using document analysis with calculation of the following indicators: coverage and concentration of household visits, medical consultation, and nursing consultation.

RESULTS:

386 of the 687 individuals with hypertension or diabetes had records of their condition at the Primary Healthcare Units; medical consultation coverage (69.2%) was regular, while nursing consultation (1.5%) and household visit (12.2%) indices were critical; concentration was critical for household visits, nursing consultations, and medical consultations for high-risk groups; medical consultation coverage was higher among women, those with lower schooling, and those attending Primary Healthcare Units (p<0.05), but did not differ with regard to cardiovascular risk.

CONCLUSION:

follow-up by the teams does not meet the healthcare standard set for the programmatic groups analyzed.

Key words:
Health Evaluation; Family Health Strategy; Diabetes Mellitus; Hypertension

Resumen

OBJETIVO:

evaluar el acompañamiento de adultos con hipertensión arterial y/o diabetes por los equipos de Salud de la Familia e identificar factores asociados, en la ciudad Cambé-PR, Brasil, el 2012.

MÉTODOS:

investigación evaluativa de análisis documental, se calcularon los indicadores de cobertura y concentración de visita domiciliaria, consulta médica y de enfermería.

RESULTADOS:

de los 687 individuos con hipertensión y/o diabetes, 386 tenían registro de esta condición en las unidades básicas; la cobertura de consulta médica (69,2%) fue regular, las de consulta de enfermería (1,5%) y visita domiciliaria (12,2%) fueron críticas; la concentración se reveló crítica en visitas domiciliarias, consultas de enfermería y médicas en los grupos de alto riesgo; las coberturas de consulta médica fueron más altas en mujeres, individuos de menor escolaridad y que utilizaban unidades básicas de salud (p<0,05) sin diferencias con respecto al riesgo cardiovascular.

CONCLUSIÓN:

el acompañamiento por los equipos no atiende el padrón asistencial establecidopara los grupos programáticos analizados.

Palabras-clave:
Evaluación em Salud; Estrategia de Salud Familiar; Diabetes Mellitus; Hipertensión

Introdução

As doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) são as principais causas de morte no mundo. Entre as políticas de enfrentamento das doenças e agravos crônicos, as direcionadas às doenças cardiovasculares são prioridades de Saúde Pública,11. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situações de Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. (Série B. Textos Básicos de Saúde),22. Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde da família. Brasília: Organização Pan Americana da Saúde; 2012. por serem a primeira causa de mortes e de hospitalizações pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Historicamente, no país, a organização de serviços voltados para a redução da morbimortalidade por essas causas tem se pautado na identificação e no acompanhamento das pessoas com hipertensão arterial sistêmica (HAS) e ou diabetes melito (DM),22. Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde da família. Brasília: Organização Pan Americana da Saúde; 2012.,33. Schaiber LB, Mendes-Gonçalves RB. Necessidades de saúde e atenção primária. In: Schaiber LB, Nemes MIB, Mendes-Gonçalves RB. Saúde do adulto: programas e ações na unidade básica. São Paulo: Hucitec; 2000. p. 29-47. (Saúde em Debate, 96); (Série Didática, 3). tendo em vista a alta prevalência desses agravos na população adulta. A Pesquisa Nacional de Saúde, realizada em 2012, estimou que 21,4% dos indivíduos com 18 anos ou mais de idade têm diagnóstico médico de HAS e 6,2% de DM.44. Andrade SSA, Stopa SR, Brito AS, Chueri PS, Szwarcwald CL, Malta DC. Prevalência de hipertensão arterial autorreferida na população brasileira: análise da Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Epidemiol Serv Saude. 2015 jun;24(2): 297-304.,55. Iser BPM, Stopa SR, Chueiri PS, Szwarcwald CL, Malta DC, Monteiro HOC, et al. Prevalência de diabetes autorreferido no Brasil: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Epidemiol Serv Saude. 2015 jun;24(2):305-14.

O acompanhamento de pessoas com diagnóstico de HAS e DM deve ser realizado, prioritariamente, pela Atenção Primária à Saúde (APS). A APS é considerada a porta de entrada para o sistema de saúde, por constituir nível próprio de atendimento,33. Schaiber LB, Mendes-Gonçalves RB. Necessidades de saúde e atenção primária. In: Schaiber LB, Nemes MIB, Mendes-Gonçalves RB. Saúde do adulto: programas e ações na unidade básica. São Paulo: Hucitec; 2000. p. 29-47. (Saúde em Debate, 96); (Série Didática, 3). com a estruturação do serviço na lógica programática, na integralidade e longitudinalidade do cuidado e na coordenação das ações e serviços de saúde.66. Ministério da Saúde (BR). A organização do cuidado às pessoas com hipertensão arterial sistêmica em serviços de atenção primária à saúde. Porto Alegre: Hospital Nossa Senhora da Conceição; 2011.

A Estratégia Saúde da Família (ESF), com notória expansão no Brasil a partir do ano 2000, pauta-se na atuação sob essa lógica programática e na ruptura dos modelos de atenção fragmentados, aproximando o sistema de saúde da população.22. Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde da família. Brasília: Organização Pan Americana da Saúde; 2012. O acompanhamento periódico de indivíduos com DM e ou HA, mediante ações de prevenção, identificação, manejo e controle desses agravos e suas complicações, tem como maior objetivo evitar internações hospitalares e reduzir a mortalidade por doenças cardiovasculares.77. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Diabetes Mellitus. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. (Cadernos de Atenção Básica, n. 16); (Série A. Normas e Manuais Técnicos). Estudo prospectivo realizado no município de Salvador, estado da Bahia, entre 2003 e 2005, observou que adultos com HAS acompanhados pela ESF apresentaram reduções significativas em seus níveis pressóricos.88. Araujo JC, Guimarães AC. Controle da hipertensão arterial em uma unidade de saúde da família. Rev Saude Publica. 2007 jun;41(3):368-74.

Apesar de já estabelecido o padrão assistencial para atendimento a pacientes com HAS e DM pela APS, com definição de metas terapêuticas de acordo com o perfil de risco cardiovascular e de cobertura da população adscrita pelas equipes da ESF, ainda se observa baixo percentual de acompanhamento desses pacientes por essas equipes.99. Malfatti CRM, Assunção AN. Hipertensão arterial e diabetes na Estratégia de Saúde da Família: uma análise da frequência de acompanhamento pelas equipes de Saúde da Família. Cienc Saude Coletiva. 2011; 16 Suppl 1:S1383-8. Diante desse cenário, avaliar as intervenções voltadas ao controle da HAS e do DM é primordial para detectar os atuais desafios para o aprimoramento da APS na abordagem das doenças cardiovasculares, no contexto do controle das DCNT.

O presente estudo teve como objetivos avaliar o acompanhamento de adultos com hipertensão arterial sistêmica e ou diabetes melito pelas equipes da Estratégia Saúde da Família, e identificar fatores associados, na cidade de Cambé, estado do Paraná, Brasil, no ano de 2012.

Métodos

Trata-se de uma pesquisa avaliativa de base normativa, com abordagem de processo, por meio da análise documental e emissão de um juízo sobre ações de acompanhamento das pessoas com HAS e ou DM, em sua comparação com padrões previamente estabelecidos. Segundo Avedis Donabedian, no componente 'processo' dessa avaliação, analisam-se as atividades desenvolvidas entre os profissionais de saúde e os pacientes e sua atualização ao conhecimento técnico-científico vigente.1010. Donabedian A. Evaluating the quality of medical care. Milbank Q. 2005 Dec; 83(4):691-729.

O estudo foi realizado no município de Cambé, cuja população residente em 2010 era de 93.733 habitantes, distribuídos em sua maioria (98,0%) na área urbana.1111. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [citado 2011 out 10]. Disponível em: Disponível em: http://www.censo2010.ibge.gov.br
http://www.censo2010.ibge.gov.br...
O município está localizado na região norte do estado do Paraná, Brasil, e integra a região metropolitana de Londrina. Em 2013, Cambé contava com a ESF instalada em 24 unidades de saúde, distribuídas entre as 13 unidades básicas de saúde (UBS) das cinco regiões municipais, correspondendo a uma cobertura de 87,4% da população pela estratégia. O município foi selecionado para este estudo pelas facilidades de abranger a totalidade de sua área urbana, relativa estabilidade da população residente e baixo índice de verticalização residencial - fatores facilitadores da coleta de dados populacionais disponíveis, atualizados para fins de amostragem -, além do interesse e apoio demonstrados pelo poder público municipal, por meio da Secretaria Municipal de Saúde Pública.

A seleção dos participantes da pesquisa partiu de um estudo de base populacional sobre fatores determinantes de doenças cardiovasculares no Paraná, denominado VigiCardio,1212. Souza RKT, Bortoletto MSS, Loch MR, González AD, Matsuo T, Cabrera MAS, et al. Prevalência de fatores de risco cardiovascular em pessoas com 40 anos ou mais de idade, em Cambé, Paraná (2011): estudo de base populacional. Epidemiol Serv Saude. 2013 jul-set;22(3):435-44. realizado com uma amostra representativa de indivíduos adultos (40 anos ou mais) e idosos residentes em todos os setores censitários da área urbana de Cambé. Detalhes do processo de amostragem estão descritos em publicação anterior.1212. Souza RKT, Bortoletto MSS, Loch MR, González AD, Matsuo T, Cabrera MAS, et al. Prevalência de fatores de risco cardiovascular em pessoas com 40 anos ou mais de idade, em Cambé, Paraná (2011): estudo de base populacional. Epidemiol Serv Saude. 2013 jul-set;22(3):435-44.

Dos 1.180 indivíduos entrevistados no estudo de base populacional supracitado, foram selecionados os 668 com HAS e ou DM, segundo os critérios do VigiCardio,1212. Souza RKT, Bortoletto MSS, Loch MR, González AD, Matsuo T, Cabrera MAS, et al. Prevalência de fatores de risco cardiovascular em pessoas com 40 anos ou mais de idade, em Cambé, Paraná (2011): estudo de base populacional. Epidemiol Serv Saude. 2013 jul-set;22(3):435-44. residentes na área de cobertura da ESF. Desses 668, foram excluídos 220 (36,3%) cujo diagnóstico não estava registrado no prontuário, na Ficha A do Sistema de Informação da Atenção Básica (ficha de cadastramento das famílias atendidas pela ESF/SIAB) ou no Sistema de Cadastramento e Acompanhamento de Hipertensos e Diabéticos (SIS-Hiperdia) da UBS da área de abrangência à qual pertenciam. Também foram excluídos 7 (1,0%) idos a óbito e 55 (8,0%) que mudaram de endereço no período entre a coleta de dados do VigiCardio (primeiro semestre de 2011) e a realização desta análise documental (último trimestre de 2012), pois não eram passíveis de acompanhamento (Figura 1).

Figura 1
- Composição inicial da população de estudo no município de Cambé, Paraná, 2012

Para caracterização da população de estudo, foram utilizadas informações levantadas pelo VigiCardio:

  1. a) Utilização dos serviços de saúde (somente plano de saúde; UBS; nenhum)

  2. b) Dados sociodemográficos

  3. - sexo (masculino; feminino)

  4. - faixa etária (em anos: 40 a 59; 60 ou mais)

  5. - escolaridade (em anos: 0 a 7; 8 ou mais)

  6. - classe econômica (com base na classificação da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa [ABEP]:1313. Associação Brasileira das Empresas de Pesquisas. Critério de classificação econômica [Internet]. São Paulo: Associação Brasileira das Empresas de Pesquisas; 2008.[citado 2014 jul 17]. Disponível em: Disponível em: http://www.abep.org/criterio-brasil
    http://www.abep.org/criterio-brasil...
    A+B; C+D+E)

  7. - situação conjugal (com companheiro; sem companheiro)

  8. - exerce algum trabalho remunerado (sim; não)

  9. c) Atual situação de saúde

  10. - risco cardiovascular individual1414. Framingham Heart Study. Coronary Heart Disease (10-years risk) [Internet]. Framingham: Framingham Heart Study; 1998.[citado 2012 out 26]. Disponível em: https://www.framinghamheartstudy.org/risk-functions/coronary-heart-disease/10-year-risk.php.
    https://www.framinghamheartstudy.org/ris...
    (baixo risco; risco moderado; alto risco)

  11. - autopercepção de saúde (muito boa/boa; regular/ruim/muito ruim).

As atividades contempladas para avaliação do acompanhamento foram: (i) visita domiciliar, realizada pelo agente comunitário de saúde (ACS), (ii) consulta médica e (iii) de enfermagem. As informações sobre essas atividades foram obtidas dos registros da Ficha B do SIAB (fichas de acompanhamento dos indivíduos pelos ACS) e de prontuário das UBS de abrangência, referentes ao endereço dos indivíduos participantes. Foram levantados registros dos 12 meses anteriores à coleta - à exceção da visita domiciliar, para a qual se estabeleceu o período de 11 meses, pois eram fichas do ano anterior e já estavam arquivadas ou haviam sido descartadas. Considerou-se visita domiciliar realizada pelo ACS aquela cujos campos da Ficha B do SIAB estavam preenchidos; como consulta de enfermagem, considerou-se todo registro do prontuário realizado por enfermeiro cuja assinatura e carimbo estavam presentes; e como consulta médica, todos os registros médicos do prontuário, inclusive daquelas realizadas no domicílio.

A partir do levantamento de dados de prontuário e da Ficha B, foram calculados indicadores de cobertura e concentração para hipertensão e ou diabetes. A cobertura de consulta médica e de enfermagem foi calculada pela razão entre o número de pessoas que apresentaram pelo menos um registro da atividade nos últimos 12 meses e a população total do estudo, multiplicada por 100. A concentração de consultas (médica ou de enfermagem) foi calculada pela razão entre o número de pessoas que apresentaram a quantidade recomendada de consultas nos últimos 12 meses (segundo risco cardiovascular individual e diagnóstico) e o total de indivíduos com o risco e diagnóstico correspondente, multiplicada por 100 (Figura 2). Considerando-se que indivíduos com HAS e DM devem ter tanto a Ficha B-HA (para hipertensão) como a Ficha B-DIA (para diabetes melito) preenchidas, foram analisadas ambas as fichas para contemplar o indicador de visita domiciliar. A unidade de análise desse indicador foi a Ficha B do SIAB, e o total esperado de fichas B (Ficha B-HA, n=369; Ficha B-DIA, n=81) constituiu o denominador no cálculo do indicador (Figura 2). Não foi necessário realizar esse procedimento metodológico para os demais indicadores - consulta médica e de enfermagem -, uma vez que os dados foram obtidos do prontuário das UBS.

Figura 2
- Matriz de indicadores para avaliação do acompanhamento de adultos com hipertensão e ou diabetes pelas unidades básicas de saúde

Como referencial teórico, foram considerados os parâmetros de acompanhamento preconizados pelo Ministério da Saúde,77. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Diabetes Mellitus. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. (Cadernos de Atenção Básica, n. 16); (Série A. Normas e Manuais Técnicos).,1515. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Hipertensão arterial sistêmica para o Sistema Único de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. (Cadernos de Atenção Básica; 16); (Série A. Normas e Manuais Técnicos). vigentes à época da realização da pesquisa. Construiu-se uma matriz de indicadores, cujos resultados foram comparados ao padrão estabelecido pelo consenso dos pesquisadores e julgados de acordo com os percentuais obtidos, tendo como referência a seguinte escala de valores: excelente (90 a 100%); satisfatório (70 a 89%); regular (50 a 69%); ou crítico (<50%) (Figura 2). Os autores têm consciência de que os critérios e normas utilizados para definir um julgamento são influenciados pelos grupos que os definem, isto é, dependem do conhecimento prévio, da expectativa e dos valores dos avaliadores.1616. Alves CKA, Natal S, Felisberto E, Samico I. Interpretação e análise das informações: o uso de matrizes, critérios, indicadores e padrões. In: Samico I, Feliberto E, Figueiró AC, Frias PG, organizadores. Avaliação em saúde: bases conceituais e operacionais. Rio de Janeiro: MedBook; 2010. p. 89-107.

A concentração-padrão das consultas médicas e de enfermagem para os indivíduos com DM foi de pelo menos três registros. O padrão para pessoas com HAS foi estabelecido conforme o risco cardiovascular individual, calculado pelo escore de Framingham,1414. Framingham Heart Study. Coronary Heart Disease (10-years risk) [Internet]. Framingham: Framingham Heart Study; 1998.[citado 2012 out 26]. Disponível em: https://www.framinghamheartstudy.org/risk-functions/coronary-heart-disease/10-year-risk.php.
https://www.framinghamheartstudy.org/ris...
a partir de dados levantados do banco do VigiCardio: sexo; idade; condição de diabetes; tabagismo; pressão arterial; low density lipoproteins (LDL) e high density lipoproteins (HDL); e taxa de colesterol (Figura 2).

Na análise de associação, foi selecionado como desfecho o indicador 'cobertura de consulta médica', dado seu papel nuclear na definição do projeto terapêutico e no acompanhamento das pessoas com HAS e ou DM.

Os dados foram duplamente digitados em plataforma do software Epi Info 2010, versão 3.5.2 (Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, Estados Unidos da América [EUA]), possibilitando a comparação e correção de inconsistências. A análise dos fatores associados à cobertura de consulta médica foi realizada com o auxílio do software Statistical Package for the Social Sciences SPSS(r), versão 19.0, para Windows (SPSS Inc., Chicago, EUA). Na análise bruta, calculou-se a razão entre as taxas de cobertura e respectivo intervalo de confiança de 95% (IC95%) por meio da regressão múltipla de Poisson. Considerando-se a característica exploratória do estudo, todas as variáveis que apresentaram valor de p<0,20 na análise bruta pelo teste de Wald foram incluídas no modelo ajustado, por meio da regressão múltipla de Poisson, respeitando-se os pressupostos da normalidade dos dados e a análise de resíduos. Foram consideradas estatisticamente significativas as associações que apresentaram valor de p<0,05 para o teste de Wald da análise ajustada.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo seres humanos: Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) no 07831212.9.0000.5231. Todos os participantes do projeto VigiCardio1212. Souza RKT, Bortoletto MSS, Loch MR, González AD, Matsuo T, Cabrera MAS, et al. Prevalência de fatores de risco cardiovascular em pessoas com 40 anos ou mais de idade, em Cambé, Paraná (2011): estudo de base populacional. Epidemiol Serv Saude. 2013 jul-set;22(3):435-44. assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A coleta de dados junto às UBS foi autorizada pela Secretaria Municipal de Saúde Pública de Cambé.

Resultados

Entre os 386 indivíduos incluídos no presente estudo, 288 (74,6%) eram portadores de HAS, 12 (3,1%) de DM e 86 (22,3%) de ambas as condições. Quanto às principais características desses indivíduos, a maioria era do sexo feminino, na faixa etária de 40 a 59 anos, com até sete anos de escolaridade, vivendo com companheiro e pertencente à classe econômica C, D ou E. Além disso, 55,7% não trabalhavam, 58,0% consideravam sua saúde regular, ruim ou muito ruim, 94,0% utilizavam a UBS como fonte regular de cuidado e 81,0% apresentavam risco cardiovascular individual moderado ou baixo. Para este estudo avaliativo, que considerou o registro da condição de HAS e ou DM em prontuário e ou Ficha A e ou SIS-Hiperdia da UBS, dos 386 indivíduos identificados, 305 (79,0%) apresentaram registro de HAS em pelo menos um dos documentos, 17 (4,4%) o registro de DM e 64 (16,6%) o registro de ambas condições (Tabela 1).

Tabela 1
- Caracterização das pessoas com diabetes e ou hipertensão (n=386) no município de Cambé, Paraná, 2012

Para a maioria dos indivíduos (72,8%), foi verificado pelo menos um registro de uma das atividades analisadas. Porém, a se considerar cada atividade isoladamente, observou-se cobertura crítica de visita domiciliar, pois somente 12,2% das fichas B-HA e 12,3% das fichas B-DIA apresentaram pelo menos um registro de visita do ACS. Quanto à concentração dessa atividade, o julgamento também foi crítico, visto que apenas 5,7% das fichas B-HA e 6,2% das fichas B-DIA apresentaram pelo menos quatro registros de visita domiciliar no período analisado (Figura 3).

Figura 3
- Resultados dos indicadores de avaliação do acompanhamento de adultos com hipertensão e ou diabetes pelas unidades básicas de saúde no município de Cambé, Paraná, 2012

Na avaliação da consulta de enfermagem, todos os indicadores apresentaram resultados críticos. Somente em 1,5% dos prontuários dos indivíduos que apresentaram HAS e ou DM, constava pelo menos um registro dessa atividade nos últimos 12 meses; e desses, apenas um apresentou número adequado de consulta, de acordo com o risco cardiovascular individual (Figura 3).

A cobertura de consulta médica apresentou-se regular: em 69,2% dos prontuários dos pacientes estudados, constava pelo menos um registro nos últimos 12 meses. A concentração de consultas médicas de acordo com o risco foi crítica nos grupos classificados com alto risco cardiovascular e diabetes, 11,8% e 35,3%, respectivamente; e regular para aqueles de baixo risco e risco moderado, e com ambas as condições: 67,5% e 57,0%, e 53,1%, respectivamente (Figura 3).

A Tabela 2 apresenta a análise bruta e ajustada dos fatores associados à ocorrência de consulta médica no período estudado. Na análise bruta, a proporção de indivíduos que realizaram pelo menos uma consulta médica nos últimos 12 meses foi significativamente mais elevada entre mulheres, indivíduos com sete ou menos anos de escolaridade, pertencentes à classe econômica C, D ou E e que utilizavam, predominantemente, a UBS como recurso no cuidado a sua saúde. Na análise ajustada, as variáveis 'sexo' (razão entre taxas de cobertura de 1,17; IC95% 1,00;1,36), escolaridade (razão entre taxas de 1,32; IC95% 1,06;1,64) e utilização dos serviços de saúde (razão entre taxas de 20,15; IC95% 5,08;79,9) permaneceram independentemente associadas à cobertura de consulta médica.

Tabela 2
- Análise bruta e ajustada das razões entre taxas de cobertura de consulta médica pela atenção básica às pessoas com hipertensão e ou diabetes (n=386) no município de Cambé, Paraná, 2012

Discussão

O presente estudo mostrou baixa cobertura do acompanhamento das pessoas com hipertensão arterial sistêmica - HAS - e ou diabetes melito - DM - residentes nas áreas atendidas pela Estratégia Saúde da Família - ESF - no município de Cambé, onde a cobertura e a concentração de visita domiciliar e de consulta de enfermagem foram críticas, assim como a concentração de consultas médicas para os grupos de alto risco cardiovascular. Desse modo, a possibilidade de associação entre o risco cardiovascular individual e a cobertura do acompanhamento não foi considerada. Tais resultados sugerem dificuldade na cobertura integral do acompanhamento dos indivíduos com HAS e ou DM no âmbito da Atenção Primária à Saúde - APS -, já observada em outros municípios com elevada cobertura da ESF.1717. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: hipertensão arterial sistêmica. Brasília: Ministério da Saúde; 2013. (Cadernos de Atenção Básica, n. 37). Nesse sentido, cabe lembrar a meta populacional ideal de 3.000 pessoas atendidas por cada equipe de Saúde da Família, conforme orienta a Política Nacional de Atenção Básica - PNAB.1818. Brasil. Portaria nº 2488/11, de 26 de outubro de 2011. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Diário Oficial da União da República Federativa do Brasil, Brasília (DF), 2011 out 26; Seção 1:48.

Considerando-se que o ponto de partida da presente avaliação foi um estudo de base populacional, o fato de apenas 46,4% dos 606 casos com HAS e ou DM terem algum registro de acompanhamento chama a atenção para a factibilidade das metas de cobertura desses agravos pela APS. O baixo alcance das ações preconizadas indica que a adscrição do território de atuação da ESF não se traduz, necessariamente, na garantia de atendimento universal das demandas de saúde.99. Malfatti CRM, Assunção AN. Hipertensão arterial e diabetes na Estratégia de Saúde da Família: uma análise da frequência de acompanhamento pelas equipes de Saúde da Família. Cienc Saude Coletiva. 2011; 16 Suppl 1:S1383-8. Confirma-se, portanto, a insuficiência do estabelecimento de metas exclusivamente com base no quantitativo de residentes em determinada área. Para que uma avaliação do alcance de uma estratégia de ação seja indutora de mudanças, é fundamental o estabelecimento de metas atingíveis. Frente a essa questão, pode-se cogitar a necessidade de readequação estrutural e das práticas adotadas na rede básica, para que estejam em consonância com as necessidades de saúde da população.

O nível crítico do preenchimento da Ficha B das visitas domiciliares do agente comunitário de saúde - ACS - revela a não utilização do sistema conforme sua concepção original, qual seja: apoiar o processo de vigilância, o planejamento e a execução das ações pelos profissionais da equipe,1919. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. O trabalho do agente comunitário de saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. (Série F. Comunicação e Educação em Saúde). bem como propiciar aos gestores o acompanhamento da situação de saúde.2020. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Políticas e Saúde. Departamento de Atenção Básica. SIAB: manual do sistema de informação de atenção básica. Brasília: Ministério da Saúde; 2000. Em outras localidades do Brasil, também foram evidenciadas a parcialidade no preenchimento desses relatórios, a falta de qualidade dos dados,2121. Rodrigues RM, Andrade ERAS, Freitas GCR, Espinola JM. Sistema de informação da atenção básica: uma avaliaçäo qualitativa da base estadual do SIAB da Paraiba. Divulg Saude Debate. 2000 dez; 20:61-6. o reduzido manuseio das fichas B do SIAB pelos ACS2222. Marcolino JS, Scochi MJ. Informações em saúde: o uso do SIAB pelos profissionais das Equipes de Saúde da Família. Rev Gauch Enferm. 2010 jun; 31(2):314-20. e o uso de registros informais por esses agentes.2222. Marcolino JS, Scochi MJ. Informações em saúde: o uso do SIAB pelos profissionais das Equipes de Saúde da Família. Rev Gauch Enferm. 2010 jun; 31(2):314-20.,2323. Sousa LB, Souza RKT, Scochi MJ. Hipertensão arterial e saúde da família: atenção aos portadores em município de pequeno porte na região Sul do Brasil. Arq Bras Cardiol. 2006 out; 87(4):496-503. Pode-se considerar que a baixa frequência de preenchimento da Ficha B e o possível uso de registros informais refletem o processo de trabalho das equipes da ESF, não alinhado com o princípio da vigilância em saúde, um dos pilares da estratégia.2424. Baptista EKK, Marcon SS, Souza RKT. Avaliação da cobertura assistencial das equipes de saúde da família às pessoas que faleceram por doenças cerebrovasculares em Maringá, Paraná, Brasil. Cad Saude Publica. 2008 jan; 24(1):225-9. Ademais, essa situação sugere lacunas na longitudinalidade, compreendida como uma característica central da APS que, possivelmente, não estaria sendo contemplada, dada a rápida expansão da ESF no país.99. Malfatti CRM, Assunção AN. Hipertensão arterial e diabetes na Estratégia de Saúde da Família: uma análise da frequência de acompanhamento pelas equipes de Saúde da Família. Cienc Saude Coletiva. 2011; 16 Suppl 1:S1383-8.

O nível crítico da cobertura de consulta de enfermagem (1,5%) é concordante com o observado em estudo realizado no ano de 2008, sobre os dados de prontuários de pessoas com DM usuárias de uma Unidade Básica Distrital de Saúde de Ribeirão Preto-SP.2525. Silva ASB, Santos MA, Teixeira CRS, Damasceno MMC, Camilo J, Zanetti ML. Avaliação da atenção em diabetes mellitus em uma unidade básica distrital de saúde. Texto & Contexto Enferm. 2011 jul-set; 20(3):512-8. Apesar de essa atividade integrar a prática desses profissionais, na perspectiva da concretização de um modelo assistencial adequado às necessidades de saúde da população,2626. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução n° 159, de 19 de abril de 1993. Dispõe sobre a Consulta de Enfermagem [Internet]. Brasília: Conselho Federal de Enfermagem; 1993[citado 2014 jul 19]. Disponível em: Disponível em: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-1591993_4241.html
http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-15...
os resultados encontrados por este estudo sugerem que a consulta de enfermagem não faz parte do trabalho cotidiano do enfermeiro, no contexto da atividade programática aos indivíduos com HAS e ou DM.

De acordo com outro estudo, entre as dificuldades mencionadas para a não realização da consulta pelos enfermeiros, encontram-se a alta demanda de usuários dos serviços de atenção básica, descrença da população no profissional enfermeiro e falta de espaço físico.2727. Santos SMR, Jesus MCP, Amaral AMM, Costa DMN, Arcanjo RA. A consulta de enfermagem no contexto da atenção básica de saúde, Juiz de Fora, Minas Gerais. Texto & Contexto Enferm. 2008; 17(1):124-30. O acúmulo de funções assumidas por esse profissional, a falta de aperfeiçoamento para essa atividade e a falsa compreensão pela população de que a consulta é atividade exclusiva do médico - fortalecida pela pouca divulgação do procedimento - também são obstáculos a interferir na realização da consulta pelo enfermeiro.2828. Mendonça FF, Bazzo D. Percepções da consulta de enfermagem sob a ótica dos enfermeiros e usuários de uma unidade básica de saúde. SaBios (Campo Mourão. Online). 2013; 8(1):53-61. Também cabe destacar que a ausência de registro não expressa necessariamente a omissão desse profissional no processo de atendimento. É possível que essa situação decorra, principalmente, da ausência de sistematização na atenção e da desvalorização de sua função pelas equipes do trabalho interdisciplinar, este que, pela própria lógica programática, supõe a definição das responsabilidades de cada integrante.2323. Sousa LB, Souza RKT, Scochi MJ. Hipertensão arterial e saúde da família: atenção aos portadores em município de pequeno porte na região Sul do Brasil. Arq Bras Cardiol. 2006 out; 87(4):496-503.

Parte da dificuldade em atingir a cobertura e a concentração satisfatórias das atividades analisadas pode resultar da organização do modelo de atenção,22. Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde da família. Brasília: Organização Pan Americana da Saúde; 2012. sugerindo a ideia de que a maioria dos usuários busca espontaneamente o atendimento. Essa hipótese pôde ser verificada na análise dos fatores associados à cobertura de consulta médica: a maioria de pessoas atendidas por essas atividades constituiu-se de mulheres, indivíduos com baixa escolaridade e que utilizam predominantemente a UBS, semelhante ao perfil da população que procura os serviços públicos de saúde e já foi observada em outro estudo.2929. Bastos GAN, Duca GFD, Hallal PC, Santos IS. Utilização de serviços médicos no sistema público de saúde no Sul do Brasil. Rev Saude Publica. 2011 jun;45(3):475-84. Corrobora tal aspecto a ausência do atendimento de acordo com a classificação de risco, confirmada pelo maior número de consultas a indivíduos portadores de HAS com risco moderado e baixo, sugerindo dificuldades de efetivação de condutas padronizadas,2323. Sousa LB, Souza RKT, Scochi MJ. Hipertensão arterial e saúde da família: atenção aos portadores em município de pequeno porte na região Sul do Brasil. Arq Bras Cardiol. 2006 out; 87(4):496-503. como a programação da periodicidade e o cumprimento de parâmetros definidos para o cuidado.1717. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: hipertensão arterial sistêmica. Brasília: Ministério da Saúde; 2013. (Cadernos de Atenção Básica, n. 37).

A consulta médica é atividade essencial do acompanhamento. Ela permite reavaliar o tratamento, os valores pressóricos, motivar a capacidade de autocuidado e encaminhar o paciente para outros profissionais de saúde quando necessário.1717. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: hipertensão arterial sistêmica. Brasília: Ministério da Saúde; 2013. (Cadernos de Atenção Básica, n. 37). Entretanto, a maior cobertura da consulta médica, aliada à deficiência de registros na Ficha B e da consulta de enfermagem, aponta que o modelo de organização assistencial mantém-se centrado na consulta médica e, consequentemente, direcionado para responder à demanda espontânea. Tal situação sugere dificuldades na implementação de mudanças no processo de trabalho e fortalece a necessidade da educação permanente dos trabalhadores da Saúde, orientada pelo princípio da atuação interdisciplinar e da vigilância em saúde, e pela valorização dos sistemas de informações instituídos, de tal forma que os registros disponíveis permitam a produção de indicadores confiáveis.

O presente estudo avaliou o processo de acompanhamento por meio da consulta aos documentos disponíveis e identificou algumas limitações a serem consideradas. Uma delas foi a impossibilidade de classificação do risco cardiovascular para a totalidade dos indivíduos, dada a adesão parcial à realização de exames laboratoriais no estudo VigiCardio, da ordem de 18,0%.1212. Souza RKT, Bortoletto MSS, Loch MR, González AD, Matsuo T, Cabrera MAS, et al. Prevalência de fatores de risco cardiovascular em pessoas com 40 anos ou mais de idade, em Cambé, Paraná (2011): estudo de base populacional. Epidemiol Serv Saude. 2013 jul-set;22(3):435-44. A população selecionada para a presente avaliação concentrou pouco mais dessa proporção - 19,5% -, possivelmente pelo fato de contemplar apenas indivíduos atendidos pelo serviço, com maior facilidade de acesso aos exames periódicos. Outra limitação do estudo residiu nas fontes de análise, restritas aos documentos institucionalizados, uma vez que a qualidade do registro nos prontuários da atenção básica é precária,3030. Vasconcellos MM, Gribel EB, Moraes IHS. Registros em saúde: avaliação da qualidade do prontuário do paciente na atenção básica, Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saude Publica. 2008; 24 Suppl 1:S173-82. havendo a possibilidade de sub-registro das atividades realizadas e ou registros em documentos informais.

O estudo permitiu identificar algumas questões ou temas merecedores de maior aprofundamento em pesquisas futuras, mais além da análise documental. Entre esses temas, pode-se destacar o acesso aos cuidados primários, a dinâmica de trabalho do ACS, a percepção do enfermeiro sobre a consulta de enfermagem, a estrutura da UBS e o trabalho interdisciplinar, ampliado com a inserção dos profissionais do Núcleo de Apoio à Saúde da Família - NASF.

De acordo com os dados apresentados, conclui-se que o processo de acompanhamento de pacientes com hipertensão arterial sistêmica e ou diabetes melito pelas equipes da Estratégia Saúde da Família não atende o padrão assistencial estabelecido aos grupos programáticos analisados. Para o aprimoramento dessas atividades, com vistas à promoção, prevenção e cumprimento das metas, reveste-se da maior importância a incorporação da prática avaliativa no serviço de Atenção Básica - incluído o monitoramento dos indicadores de desempenho de cada equipe de Saúde da Família -, com destaque para o acompanhamento das condições crônicas, entre as quais o diabetes e a hipertensão.

Agradecimentos

Ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Estadual de Londrina.

À Secretaria Municipal de Saúde Pública de Cambé.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) do Ministério da Educação.

E à equipe de pesquisadores do projeto VigiCardio.

Referências

  • 1
    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situações de Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. (Série B. Textos Básicos de Saúde)
  • 2
    Mendes EV. O cuidado das condições crônicas na atenção primária à saúde: o imperativo da consolidação da estratégia da saúde da família. Brasília: Organização Pan Americana da Saúde; 2012.
  • 3
    Schaiber LB, Mendes-Gonçalves RB. Necessidades de saúde e atenção primária. In: Schaiber LB, Nemes MIB, Mendes-Gonçalves RB. Saúde do adulto: programas e ações na unidade básica. São Paulo: Hucitec; 2000. p. 29-47. (Saúde em Debate, 96); (Série Didática, 3).
  • 4
    Andrade SSA, Stopa SR, Brito AS, Chueri PS, Szwarcwald CL, Malta DC. Prevalência de hipertensão arterial autorreferida na população brasileira: análise da Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Epidemiol Serv Saude. 2015 jun;24(2): 297-304.
  • 5
    Iser BPM, Stopa SR, Chueiri PS, Szwarcwald CL, Malta DC, Monteiro HOC, et al. Prevalência de diabetes autorreferido no Brasil: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Epidemiol Serv Saude. 2015 jun;24(2):305-14.
  • 6
    Ministério da Saúde (BR). A organização do cuidado às pessoas com hipertensão arterial sistêmica em serviços de atenção primária à saúde. Porto Alegre: Hospital Nossa Senhora da Conceição; 2011.
  • 7
    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Diabetes Mellitus. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. (Cadernos de Atenção Básica, n. 16); (Série A. Normas e Manuais Técnicos).
  • 8
    Araujo JC, Guimarães AC. Controle da hipertensão arterial em uma unidade de saúde da família. Rev Saude Publica. 2007 jun;41(3):368-74.
  • 9
    Malfatti CRM, Assunção AN. Hipertensão arterial e diabetes na Estratégia de Saúde da Família: uma análise da frequência de acompanhamento pelas equipes de Saúde da Família. Cienc Saude Coletiva. 2011; 16 Suppl 1:S1383-8.
  • 10
    Donabedian A. Evaluating the quality of medical care. Milbank Q. 2005 Dec; 83(4):691-729.
  • 11
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [citado 2011 out 10]. Disponível em: Disponível em: http://www.censo2010.ibge.gov.br
    » http://www.censo2010.ibge.gov.br
  • 12
    Souza RKT, Bortoletto MSS, Loch MR, González AD, Matsuo T, Cabrera MAS, et al. Prevalência de fatores de risco cardiovascular em pessoas com 40 anos ou mais de idade, em Cambé, Paraná (2011): estudo de base populacional. Epidemiol Serv Saude. 2013 jul-set;22(3):435-44.
  • 13
    Associação Brasileira das Empresas de Pesquisas. Critério de classificação econômica [Internet]. São Paulo: Associação Brasileira das Empresas de Pesquisas; 2008.[citado 2014 jul 17]. Disponível em: Disponível em: http://www.abep.org/criterio-brasil
    » http://www.abep.org/criterio-brasil
  • 14
    Framingham Heart Study. Coronary Heart Disease (10-years risk) [Internet]. Framingham: Framingham Heart Study; 1998.[citado 2012 out 26]. Disponível em: https://www.framinghamheartstudy.org/risk-functions/coronary-heart-disease/10-year-risk.php
    » https://www.framinghamheartstudy.org/risk-functions/coronary-heart-disease/10-year-risk.php
  • 15
    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Hipertensão arterial sistêmica para o Sistema Único de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. (Cadernos de Atenção Básica; 16); (Série A. Normas e Manuais Técnicos).
  • 16
    Alves CKA, Natal S, Felisberto E, Samico I. Interpretação e análise das informações: o uso de matrizes, critérios, indicadores e padrões. In: Samico I, Feliberto E, Figueiró AC, Frias PG, organizadores. Avaliação em saúde: bases conceituais e operacionais. Rio de Janeiro: MedBook; 2010. p. 89-107.
  • 17
    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: hipertensão arterial sistêmica. Brasília: Ministério da Saúde; 2013. (Cadernos de Atenção Básica, n. 37).
  • 18
    Brasil. Portaria nº 2488/11, de 26 de outubro de 2011. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Diário Oficial da União da República Federativa do Brasil, Brasília (DF), 2011 out 26; Seção 1:48.
  • 19
    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. O trabalho do agente comunitário de saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. (Série F. Comunicação e Educação em Saúde).
  • 20
    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Políticas e Saúde. Departamento de Atenção Básica. SIAB: manual do sistema de informação de atenção básica. Brasília: Ministério da Saúde; 2000.
  • 21
    Rodrigues RM, Andrade ERAS, Freitas GCR, Espinola JM. Sistema de informação da atenção básica: uma avaliaçäo qualitativa da base estadual do SIAB da Paraiba. Divulg Saude Debate. 2000 dez; 20:61-6.
  • 22
    Marcolino JS, Scochi MJ. Informações em saúde: o uso do SIAB pelos profissionais das Equipes de Saúde da Família. Rev Gauch Enferm. 2010 jun; 31(2):314-20.
  • 23
    Sousa LB, Souza RKT, Scochi MJ. Hipertensão arterial e saúde da família: atenção aos portadores em município de pequeno porte na região Sul do Brasil. Arq Bras Cardiol. 2006 out; 87(4):496-503.
  • 24
    Baptista EKK, Marcon SS, Souza RKT. Avaliação da cobertura assistencial das equipes de saúde da família às pessoas que faleceram por doenças cerebrovasculares em Maringá, Paraná, Brasil. Cad Saude Publica. 2008 jan; 24(1):225-9.
  • 25
    Silva ASB, Santos MA, Teixeira CRS, Damasceno MMC, Camilo J, Zanetti ML. Avaliação da atenção em diabetes mellitus em uma unidade básica distrital de saúde. Texto & Contexto Enferm. 2011 jul-set; 20(3):512-8.
  • 26
    Conselho Federal de Enfermagem. Resolução n° 159, de 19 de abril de 1993. Dispõe sobre a Consulta de Enfermagem [Internet]. Brasília: Conselho Federal de Enfermagem; 1993[citado 2014 jul 19]. Disponível em: Disponível em: http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-1591993_4241.html
    » http://www.cofen.gov.br/resoluo-cofen-1591993_4241.html
  • 27
    Santos SMR, Jesus MCP, Amaral AMM, Costa DMN, Arcanjo RA. A consulta de enfermagem no contexto da atenção básica de saúde, Juiz de Fora, Minas Gerais. Texto & Contexto Enferm. 2008; 17(1):124-30.
  • 28
    Mendonça FF, Bazzo D. Percepções da consulta de enfermagem sob a ótica dos enfermeiros e usuários de uma unidade básica de saúde. SaBios (Campo Mourão. Online). 2013; 8(1):53-61.
  • 29
    Bastos GAN, Duca GFD, Hallal PC, Santos IS. Utilização de serviços médicos no sistema público de saúde no Sul do Brasil. Rev Saude Publica. 2011 jun;45(3):475-84.
  • 30
    Vasconcellos MM, Gribel EB, Moraes IHS. Registros em saúde: avaliação da qualidade do prontuário do paciente na atenção básica, Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saude Publica. 2008; 24 Suppl 1:S173-82.

  • 5
    * Artigo elaborado a partir da dissertação de Mestrado intitulada 'Avaliação da atenção às pessoas com hipertensão e ou diabetes no município de Cambé-PR", apresentada por Bárbara Radigonda junto ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Estadual de Londrina em fevereiro de 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    05 Maio 2015
  • Aceito
    03 Jan 2016
Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente - Ministério da Saúde do Brasil Brasília - Distrito Federal - Brazil
E-mail: ress.svs@gmail.com