Inquérito Nacional de Cobertura Vacinal e sua importância em meio aos desafios

Márcia de Cantuária Tauil Laylla Ribeiro Macedo Ana Goretti Kalume Maranhão Sobre os autores

Com o objetivo de organizar a política nacional de vacinação no Brasil, o Ministério da Saúde (MS) instituiu o Programa Nacional de Imunizações (PNI), em 1973, que normatizou as ações a serem desenvolvidas pelos três entes federativos, de forma hierarquizada e descentralizada, atendendo às diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), e visando, dessa forma, ao controle, à eliminação e/ou à erradicação de doenças imunopreveníveis.11 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Programa Nacional de Imunizações (PNI): 40 anos [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2013, 091 [citado em 8 de agosto de 2019]. 236 p. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/programa_nacional_imunizacoes_pni40.pdf
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Nesses mais de 50 anos de existência, o PNI obteve importantes resultados, destacando-se o alcance de altas coberturas vacinais, que contribuíram para redução progressiva e eliminação de doenças que acometiam e matavam os brasileiros, especialmente a população infantil.22 Domingues CMAS, Maranhão AGK, Teixeira AM, Fantinato FFS, Domingues RAS. The Brazilian National Immunization Program: 46 years of achievements and challenges. Cad. Saúde Pública. 2020;36(Sup 2):e00222919. Entretanto, desde 2016, o PNI tem enfrentado dificuldades que têm se refletido na queda significativa das coberturas, motivadas por uma série de fatores, tais como a hesitação vacinal, movimentos antivacinas, diminuição de circulação de doenças imunopreveníveis, entre outros, que se acentuaram durante a pandemia de covid-19, a partir de 2020.22 Domingues CMAS, Maranhão AGK, Teixeira AM, Fantinato FFS, Domingues RAS. The Brazilian National Immunization Program: 46 years of achievements and challenges. Cad. Saúde Pública. 2020;36(Sup 2):e00222919.,33 CONASS. A queda da imunização no Brasil. Disponível em: https://www.conass.org.br/queda-da-imunizacao-no-brasil/. Acesso em: 19 abr. 2024.
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Historicamente, por limitações relacionadas aos sistemas oficiais de informação, os dados de cobertura vacinal nacionais muitas vezes divergiram dos dados de cobertura registrados por alguns estados e municípios, o que levou o MS a realizar inquéritos populacionais periódicos. Esses levantamentos, obtidos por meio de inquéritos domiciliares, tinham por objetivo conhecer a cobertura vacinal do esquema completo nas crianças, além de comparar seus resultados com os dados administrativos oriundos do sistema de informação de imunização, obtendo-se, assim, informações mais fidedignas sobre a vacinação no país, fundamentais para o planejamento e execução de ações mais efetivas nessa área.44 Mota E. Inquérito domiciliar de cobertura vacinal: a perspectiva do estudo de desigualdades sociais. Rev Bras. Epidemiologia. 2008:11(supl1):125-8.

Esses inquéritos vacinais, além de fornecerem estimativas mais precisas das coberturas na população infantil, oferecem informações importantes sobre os fatores relacionados ao acesso aos serviços de vacinação, bem como a cerca do perfil socioeconômico dos vacinados, não disponíveis nos sistemas oficiais de informação. O último Inquérito Nacional de Cobertura Vacinal (INCV 2020), realizado em 2020, incluiu uma coorte de crianças nascidas nos anos de 2017 e 2018, em todas as capitais brasileiras, no Distrito Federal e em 12 municípios do interior. Nesse levantamento, além dos dados relativos à cobertura vacinal, investigou-se o conhecimento dos fatores subjacentes à hesitação vacinal, o que constituiu um avanço, se comparado ao inquérito anterior, realizado em 2007.55 CEALAG. Inquérito de Cobertura e Hesitação Vacinal nas Capitais Brasileiras, Distrito Federal e em 12 Municípios do Interior, em Crianças nascidas em 2017-2018 e Residentes em Áreas Urbanas. Disponível em: https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv2023/. Acesso em: 19 abr. 2024.
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As informações geradas pelo INCV 2020 permitiram identificar as múltiplas condições que têm contribuído para a diminuição das coberturas vacinais no país, tais como o desconhecimento das famílias sobre a importância da imunização, as desigualdades sociais que permeiam esse contexto, o desabastecimento parcial de alguns produtos, além dos problemas operacionais para a execução da vacinação, incluindo desde o adequado registro dos dados até a dificuldade de acesso às unidades de saúde.55 CEALAG. Inquérito de Cobertura e Hesitação Vacinal nas Capitais Brasileiras, Distrito Federal e em 12 Municípios do Interior, em Crianças nascidas em 2017-2018 e Residentes em Áreas Urbanas. Disponível em: https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv2023/. Acesso em: 19 abr. 2024.
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Entre os principais resultados do INCV 2020, destacam-se as seguintes evidências: (i) 30% das doses anotadas na caderneta de vacinação não estavam registradas no Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI); (ii) ao menos 1% das crianças acompanhadas no inquérito não foram vacinadas; as coberturas pelo esquema vacinal completo foram menores que 75% em todas as capitais e no Distrito Federal; e (iii) as vacinas com mais de uma dose perderam cobertura progressivamente, com diferenças entre estratos socioeconômicos, associadas aos estratos mais altos em algumas cidades e aos mais baixos em outras.

Espera-se que os resultados deste estudo possibilitem ao MS traçar novas estratégias com vistas a resgatar a história de sucesso do PNI, que permitiu o alcance das elevadas coberturas para todas as vacinas do Calendário Nacional de Vacinação (CNV), em especial entre as crianças.55 CEALAG. Inquérito de Cobertura e Hesitação Vacinal nas Capitais Brasileiras, Distrito Federal e em 12 Municípios do Interior, em Crianças nascidas em 2017-2018 e Residentes em Áreas Urbanas. Disponível em: https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv2023/. Acesso em: 19 abr. 2024.
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,66 Barata RB, Franca AP, Guibu IA, Vasconcellos MTL, Moraes JC, Grupo ICV, et al. National Vaccine Coverage Survey 2020: methods and operational aspects. Rev Bras Epidemiol. 2023;26:e230031.

Ressalta-se que o PNI, como componente de uma política pública de abrangência nacional, tem demonstrado elevado impacto na redução das doenças imunopreveníveis sob vigilância no Brasil.22 Domingues CMAS, Maranhão AGK, Teixeira AM, Fantinato FFS, Domingues RAS. The Brazilian National Immunization Program: 46 years of achievements and challenges. Cad. Saúde Pública. 2020;36(Sup 2):e00222919. No entanto, torna-se necessário o alinhamento das estratégias e procedimentos técnicos e operacionais com o conjunto de parceiros, nos estados e municípios, visando à preservação das conquistas alcançadas, principalmente quanto à eliminação de doenças, tais como poliomielite, rubéola congênita, febre amarela urbana, entre outras. Nesse aspecto, é imperioso priorizar a identificação de medidas voltadas à promoção da homogeneidade de coberturas vacinais entre os diversos municípios.

Vale lembrar que o PNI recomenda o monitoramento do indicador de cobertura vacinal em todos os municípios do país. Nesse contexto, os serviços de saúde devem identificar as crianças com esquema em atraso e realizar a busca ativa, sendo a Estratégia Saúde da Família (ESF) protagonista nessa atividade. Dessa forma, a vacinação de doenças com elevada carga de morbimortalidade deve ser priorizada, como as pneumonias e meningites, bem como aquelas para as quais há potencial de ocorrência de surtos, como sarampo, difteria, coqueluche e pólio. Portanto, deve-se buscar aplicar todas as vacinas do CNV na mesma visita, respeitando-se a idade correta e a recomendação de simultaneidade para cada produto.77 Brasil. Ministério da Saúde. Manual de normas e Procedimentos para Vacinação. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Ministério da Saúde 2014. p. 176. ISBN 978-85-334-2164-6.

Diante disso, é fundamental que o MS fomente ainda mais estudos que avaliem o impacto da vacinação na redução da carga de doenças imunopreveníveis no território brasileiro, como uma importante ferramenta de direcionamento para a reestruturação do CNV e para o fortalecimento das ações de promoção da imunização no país.

Referências bibliográficas

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    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Programa Nacional de Imunizações (PNI): 40 anos [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2013, 091 [citado em 8 de agosto de 2019]. 236 p. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/programa_nacional_imunizacoes_pni40.pdf
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  • 2
    Domingues CMAS, Maranhão AGK, Teixeira AM, Fantinato FFS, Domingues RAS. The Brazilian National Immunization Program: 46 years of achievements and challenges. Cad. Saúde Pública. 2020;36(Sup 2):e00222919.
  • 3
    CONASS. A queda da imunização no Brasil. Disponível em: https://www.conass.org.br/queda-da-imunizacao-no-brasil/ Acesso em: 19 abr. 2024.
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  • 4
    Mota E. Inquérito domiciliar de cobertura vacinal: a perspectiva do estudo de desigualdades sociais. Rev Bras. Epidemiologia. 2008:11(supl1):125-8.
  • 5
    CEALAG. Inquérito de Cobertura e Hesitação Vacinal nas Capitais Brasileiras, Distrito Federal e em 12 Municípios do Interior, em Crianças nascidas em 2017-2018 e Residentes em Áreas Urbanas. Disponível em: https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv2023/. Acesso em: 19 abr. 2024.
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  • 6
    Barata RB, Franca AP, Guibu IA, Vasconcellos MTL, Moraes JC, Grupo ICV, et al. National Vaccine Coverage Survey 2020: methods and operational aspects. Rev Bras Epidemiol. 2023;26:e230031.
  • 7
    Brasil. Ministério da Saúde. Manual de normas e Procedimentos para Vacinação. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Ministério da Saúde 2014. p. 176. ISBN 978-85-334-2164-6.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024
Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente - Ministério da Saúde do Brasil Brasília - Distrito Federal - Brazil
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