Oportunidade vacinal em crianças de até 6 meses, nascidas em 2017 e 2018 no município de Londrina: inquérito de base populacional

Heloísa Dias Brites Ana Paula França José Cássio de Moraes Grupo ICV 2020Sobre os autores Adriana Ilha da Silva Alberto Novaes Ramos Jr. Ana Paula França Andrea de Nazaré Marvão Oliveira Antonio Fernando Boing Carla Magda Allan Santos Domingues Consuelo Silva de Oliveira Ethel Leonor Noia Maciel Ione Aquemi Guibu Isabelle Ribeiro Barbosa Mirabal Jaqueline Caracas Barbosa Jaqueline Costa Lima José Cássio de Moraes Karin Regina Luhm Karlla Antonieta Amorim Caetano Luisa Helena de Oliveira Lima Maria Bernadete de Cerqueira Antunes Maria da Gloria Teixeira Maria Denise de Castro Teixeira Maria Fernanda de Sousa Oliveira Borges Rejane Christine de Sousa Queiroz Ricardo Queiroz Gurgel Rita Barradas Barata Roberta Nogueira Calandrini de Azevedo Sandra Maria do Valle Leone de Oliveira Sheila Araújo Teles Silvana Granado Nogueira da Gama Sotero Serrate Mengue Taynãna César Simões Valdir Nascimento Wildo Navegantes de Araújo Sobre os autores

RESUMO

Objetivo

Avaliar a oportunidade vacinal em crianças nascidas vivas em Londrina, com até 6 meses de idade, e a relação do estrato socioeconômico com a regularidade das vacinas.

Método

Estudo de inquérito populacional baseado em uma coorte retrospectiva de nascidos em 2017 e 2018, que identificou vacinas não administradas nas sessões determinadas. A regularidade vacinal foi comparada entre os estratos socioeconômicos pelo teste qui-quadrado de Pearson.

Resultados

Em 456 carteiras de vacinação, a proporção de oportunidades de vacinação não recuperadas para as doses ao nascer, aos 2, 4 e 6 meses foi de 5,0% (IC95% 3,1;7,5), 4,5% (IC95% 2,8;6,9), 7,2% (IC95% 5,0;10,2) e 2,1% (IC95% 1,0;4,0), respectivamente. Não houve diferença estatística entre os estratos na regularidade vacinal.

Conclusão

Foram observadas oportunidades perdidas de vacinação em todas as idades. O estrato socioeconômico não influenciou a regularidade vacinal.

Palavras-chave
Imunização; Cobertura Vacinal; Programas de Imunização; Inquéritos Epidemiológicos

Contribuições do estudo

Principais resultados

Excluindo-se as doses ao nascer, mais de 80% das crianças receberam as doses previstas na mesma sessão para cada idade. Não houve diferença estatística entre os estratos socioeconômicos na relação com a regularidade vacinal.

Implicações para os serviços

Estratégias de combate à hesitação vacinal são essenciais, bem como a capacitação dos profissionais de saúde para aplicação de todas as doses indicadas para determinada sessão.

Perspectivas

Estudos futuros que investiguem os motivos da necessidade de mais de uma sessão para completar o esquema vacinal infantil em Londrina e das oportunidades perdidas de vacinação trarão melhor direcionamento para as ações públicas.

Palavras-chave
Imunização; Cobertura Vacinal; Programas de Imunização; Inquéritos Epidemiológicos

INTRODUÇÃO

No Brasil, nos últimos dez anos, observou-se uma queda na cobertura vacinal, principalmente no calendário infantil.11 Sato AP. Qual é a importância da hesitação vacinal na queda da cobertura vacinal no Brasil? Rev Saude Publica. 2018;52:96. doi: 10.11606/s1518-8787.2018052001199.
https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2018...
A inclusão de novas vacinas no calendário de rotina tornou o Programa Nacional de Imunizações (PNI) mais complexo nas últimas duas décadas, gerando desafios, como manter altas coberturas vacinais,22 Domingues CMAS, Teixeira MAS. Coberturas vacinais e doenças imunopreveníveis no Brasil no período 1982-2012: avanços e desafios do Programa Nacional de Imunizações. Epidemiol Serv Saude. 2013;22:9-27. principalmente para doses que devem ser aplicadas na mesma sessão. Esta é definida por um período organizado e previamente planejado em que os serviços de imunização são oferecidos à população.33 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014. Durante uma sessão, as vacinas são administradas por profissionais de saúde, e ela pode ser de rotina, como parte de um calendário regular de imunizações, ou parte de campanhas de vacinação.33 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014. Nesse contexto, é possível analisar as oportunidades perdidas de vacinação, as quais são definidas, segundo a Organização Mundial da Saúde, como a não administração parcial ou total de doses vacinais indicadas em situações oportunas em qualquer contato do indivíduo elegível com o sistema de saúde, representando um desafio persistente e significativo para a saúde pública global,44 Fernandes AS, Moreira EB, Muniz JR, Dutra LD. Oportunidades perdidas para vacinação de crianças: uma revisão integrativa da literatura. Braz J Health Rev. 2021;4(6):29207-24. doi: 10.34119/bjhrv4n6-451.
https://doi.org/10.34119/bjhrv4n6-451...
podendo a oportunidade ser considerada recuperada, quando tais vacinas são aplicadas posteriormente, ou não recuperada. Apesar da disponibilidade de vacinas eficazes e seguras, muitas pessoas que têm contato com os serviços de saúde não recebem as imunizações recomendadas, o que contribui para coberturas vacinais abaixo do ideal e para a reemergência de doenças imunopreveníveis.11 Sato AP. Qual é a importância da hesitação vacinal na queda da cobertura vacinal no Brasil? Rev Saude Publica. 2018;52:96. doi: 10.11606/s1518-8787.2018052001199.
https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2018...
,44 Fernandes AS, Moreira EB, Muniz JR, Dutra LD. Oportunidades perdidas para vacinação de crianças: uma revisão integrativa da literatura. Braz J Health Rev. 2021;4(6):29207-24. doi: 10.34119/bjhrv4n6-451.
https://doi.org/10.34119/bjhrv4n6-451...
,55 Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS – Ministério da Saúde [cited 2022 Apr 7]. Available from: https://datasus.saude.gov.br/.
https://datasus.saude.gov.br/...
Entre 2015 e 2020, o Brasil registrou uma queda significativa nas taxas de cobertura vacinal para diversas doenças.55 Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS – Ministério da Saúde [cited 2022 Apr 7]. Available from: https://datasus.saude.gov.br/.
https://datasus.saude.gov.br/...
A vacina contra a poliomielite, por exemplo, alcançou apenas 75,9% de cobertura em 2020, sendo a meta estabelecida pelo PNI de 95%.55 Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS – Ministério da Saúde [cited 2022 Apr 7]. Available from: https://datasus.saude.gov.br/.
https://datasus.saude.gov.br/...
Essa baixa adesão reflete não apenas a hesitação vacinal, mas também as oportunidades perdidas durante o contato das crianças com os serviços de saúde. 44 Fernandes AS, Moreira EB, Muniz JR, Dutra LD. Oportunidades perdidas para vacinação de crianças: uma revisão integrativa da literatura. Braz J Health Rev. 2021;4(6):29207-24. doi: 10.34119/bjhrv4n6-451.
https://doi.org/10.34119/bjhrv4n6-451...

Apesar de elas serem obstáculos importantes para o cumprimento do calendário vacinal infantil, ainda há poucos estudos epidemiológicos que se debruçam sobre as oportunidades perdidas de vacinação nos últimos anos no país.44 Fernandes AS, Moreira EB, Muniz JR, Dutra LD. Oportunidades perdidas para vacinação de crianças: uma revisão integrativa da literatura. Braz J Health Rev. 2021;4(6):29207-24. doi: 10.34119/bjhrv4n6-451.
https://doi.org/10.34119/bjhrv4n6-451...
Nesse contexto, na América Latina, uma revisão sistemática apontou taxas de perdas entre 5% e 37%.66 Tampi M, Silva W, Pereira B. Revisão sistemática sobre a redução das oportunidades perdidas para vacinação na América Latina. Rev Panam Salud Publica [Internet]. 2022;46. doi: 10.26633/RPSP.2022.65. No país, um estudo realizado em Recife mostrou que quase 40% das carteiras de vacinação apresentavam atraso vacinal como consequência direta dessas oportunidades perdidas.77 Barros MGM, Santos MC da S, Bertolini RPT, Netto VBP, Andrade MS. Perda de oportunidade de vacinação: aspectos relacionados à atuação da atenção primária em Recife, Pernambuco, 2012. Epidemiol Serv Saúde. 2015;24(4):701-10. doi: 10.5123/S1679-49742015000400012.
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201500...
Esse contexto aponta para uma necessidade urgente de estudos nas cidades brasileiras para melhor compreensão das perdas vacinais no país. Por isso, este estudo se dedica a avaliar a oportunidade vacinal em crianças nascidas vivas em Londrina, com até 6 meses de idade, e a relação do estrato socioeconômico com a regularidade das vacinas.

MÉTODOS

Trata-se de inquérito de base populacional baseado em coorte retrospectiva, realizada de outubro de 2021 a janeiro de 2022, que verificou o cumprimento do calendário vacinal do PNI e os fatores associados à regularidade de vacinação. Os dados foram obtidos do Inquérito Nacional de Vacinação.88 Barata RB, França AP, Guibu IA, Vasconcellos MT, Moraes JC. Inquérito Nacional de Cobertura Vacinal 2020: métodos e aspectos operacionais. Rev Bras Epidemiol. 2023;26. doi: 10.1590/1980-549720230031.2.
https://doi.org/10.1590/1980-54972023003...

A população do estudo foi composta por crianças nascidas em 2017 e 2018 residentes do município de Londrina, localizado na região norte do Paraná, onde a população residente estimada é de 575.377 habitantes e a densidade demográfica municipal é de 306,52 hab./km22 Domingues CMAS, Teixeira MAS. Coberturas vacinais e doenças imunopreveníveis no Brasil no período 1982-2012: avanços e desafios do Programa Nacional de Imunizações. Epidemiol Serv Saude. 2013;22:9-27..

A lista dos recém-nascidos de Londrina foi georreferenciada por setor censitário. Na primeira etapa, os setores foram divididos em quatro estratos (A, B, C e D – sendo A o de melhor e D o de pior condição socioeconômica), segundo dados socioeconômicos do Censo Demográfico de 2010. Para a construção dos estratos socioeconômicos, foram utilizados três indicadores: renda média dos responsáveis pelas famílias, proporção de responsáveis alfabetizados e proporção dos responsáveis com renda mensal superior a 20 salários mínimos. Assim, utilizando-se uma análise de cluster, todos os setores censitários foram classificados em quatro estratos, de acordo com a combinação desses três indicadores (Tabela 1). Estabelecidos os estratos socioeconômicos, foi identificado o número de nascidos vivos da coorte de 2017 e 2018 potencialmente residentes em cada setor censitário, e estes setores foram agregados em conglomerados contendo pelo menos 56 a 65 nascidos vivos cada um, de modo a se obter uma amostra representativa em cada um dos estratos e facilitar o trabalho de campo. O cálculo do tamanho da amostra foi feito a partir de uma cobertura estimada de 70%, com erro de estimativa de 5%, nível de confiança de 95%, poder do teste de 80% e efeito do desenho de 1,4, por conta do arranjo em conglomerados.

Tabela 1
Características dos estratos socioeconômicos da população do município de Londrina, para nascidos entre 2017 e 2018 (n = 456)

Em cada um dos estratos se formaram conglomerados de acordo com o número de nascidos vivos de cada setor. A unidade de interesse para a análise foi o estrato socioeconômico, mas, para evitar a possível interferência das características dos serviços de saúde em diferentes bairros da cidade, optou-se por realizar o sorteio sistemático de conglomerados, de modo a termos uma amostra representativa das diferentes áreas em cada um dos estratos.

No caso de Londrina, em cada um dos estratos foram sorteados quatro conglomerados e entrevistadas 28 a 29 crianças neles residentes e que pertencessem às coortes de nascimento de 2017 ou 2018. Em cada domicílio, apenas uma criança foi incluída.

O questionário completo da pesquisa foi composto por nove blocos; porém, para este artigo, foram analisadas variáveis relacionadas às características da família (estrato socioeconômico, nível de consumo familiar, renda mensal familiar e programa de transferência de renda) e do processo de vacinação (coincidência de datas das vacinas recomendadas ao nascer, aos 2, 4 e 6 meses, e atraso vacinal em qualquer vacina prevista até os 6 meses). O nível de consumo das famílias foi definido segundo critério da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa.99 Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. Critério de classificação econômica Brasil [Internet]. 2019 [cited 2023 May 17]. Available from: https://www.abep.org/criterio-brasil.
https://www.abep.org/criterio-brasil...

Para verificação das doses aplicadas, foi obtido o registro fotográfico da caderneta de vacinação; para a criança que não tinha caderneta disponível, buscou-se a ficha espelho no Sistema de Informações do PNI, e, quando esta não foi encontrada, a criança foi considerada não vacinada.

Foi realizada a junção de diferentes vacinas voltadas para a prevenção das mesmas doenças (por exemplo, vacina tríplice bacteriana [difteria, tétano e pertússis, DTP], tetravalente, pentavalente ou hexavalente para as respectivas doenças), a fim de serem somadas as doses aplicadas pelo setor público e por serviços privados.1010 Moraes JC, et al. Inquérito de cobertura e hesitação vacinal nas capitais brasileiras, Distrito Federal e em 12 municípios do interior, em crianças nascidas em 2017-2018 e residentes nas áreas urbanas. Relatório final, processo CNPQ 404131/2019-0. São Paulo: 2023. Available from: https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv2023/.
https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv...

Variáveis de estudo

A coincidência entre as datas de aplicação das doses foi definida quando vacinas previstas para uma mesma sessão, de acordo com a idade recomendada no calendário do PNI, para as doses ao nascer, 2, 4 e 6 meses foram aplicadas no mesmo dia. Foram consideradas, segundo o PNI, as seguintes vacinas:

  1. a) Ao nascer: BCG e hepatite B (HepB);

  2. b) Dois meses: difteria, tétano, pertússis, HepB e Haemophilus influenzae B (penta), poliomielite 1, 2 e 3 inativada (VIP), rotavírus humano (VRH) e pneumocócica 10-valente (Pneumo-10);

  3. c) Quatro meses: penta, VIP, VRH e pneumo 10;

  4. d) Seis meses: penta e VIP.

Quando não houve coincidência entre as datas de aplicação das vacinas (oportunidade perdida), verificou-se se as doses foram aplicadas posteriormente (oportunidade recuperada) ou se não foram aplicadas (oportunidade não recuperada). Crianças que não receberam nenhuma vacina foram consideradas como vacinação ausente.

Considerando-se os pesos amostrais e o delineamento do estudo, foi utilizado o software Stata versão 17, no módulo survey analysis, para estimar a proporção de crianças com doses com datas coincidentes, com oportunidades recuperadas e a ausência de uma ou mais doses. A precisão dessas estimativas foi feita pelos intervalos de confiança de 95% (IC95%) e, para medir associações com o estrato socioeconômico, o teste qui-quadrado de Pearson, adotando-se nível de significância de 5%.

Posteriormente, para analisar as oportunidades não recuperadas e a vacinação ausente, os dados foram analisados no Microsoft Excel, e as associações medidas pelo teste exato de Fisher, no aplicativo OpenEpi, versão 3.01.1111 Dean AG, Sullivan KM, Soe MM. OpenEpi: Open Source Epidemiologic Statistics for Public Health, Version 3.01 [Internet] 2013/04/06. Available from: https://www.openepi.com/Menu/OE_Menu.htm.
https://www.openepi.com/Menu/OE_Menu.htm...

O estudo foi aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, sob parecer no 3.366.818, em 4 de junho de 2019, com Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE) 4306919.5.0000.5030; e da Irmandade da Santa Casa de São Paulo, sob parecer no 4.380.019, em 4 de novembro de 2020, com CAAE 39412020.0.0000.5479.

RESULTADOS

Os dados das cadernetas de 456 crianças foram analisados e, nos estratos socioeconômicos A, B, C e D, havia, respectivamente, 115, 114, 113 e 114 crianças, e não se verificou perda amostral. Com relação às vacinas previstas ao nascer, 6,5% (IC95% 3,5;11,5) receberam BCG e HepB na mesma data, e houve 78,8% (IC95% 68,6;86,3) de oportunidades recuperadas. Neste caso, a HepB foi aplicada antes da vacina BCG em 98,6% (IC95% 96,9;99,6) das carteiras analisadas; 5,0% (IC95% 3,1;7,5) das crianças tiveram oportunidades não recuperadas, sendo a HepB a vacina de menor cobertura, ausente em 86,4% (IC95% 65,0;97,0). E 4,2% (IC95% 2,5;6,4) das crianças não receberam nenhuma das duas doses.

A proporção de crianças com doses coincidentes ao nascer foi maior entre as do estrato socioeconômico D (14,1%, IC95% 6,1;29,2), e as de oportunidades recuperadas, entre as do estrato A (85,0%, IC95% 68,2;93,6). O estrato B apresentou a maior proporção de doses perdidas (18,8%, IC95% 7,0;41,4), porém, não houve diferença estatística (p=0,180) (Tabela 2).

Tabela 2
Tabela 2 – Proporções (%) e intervalos de confiança de 95% (IC95) das carteiras de vacinação com oportunidades recuperadas, datas das doses coincidentes ou doses ausentes referentes às vacinas aplicadas ao nascer, por estrato socioeconômico,em Londrina, nascidos em 2017 e 2018 (n = 456)

Por seu turno, em relação às doses previstas para serem aplicadas aos 2 meses, 83,1% (IC95% 67,9;92.0) receberam todas as vacinas na mesma sessão, e 11,0% (IC95% 3,2;31,2) tiveram oportunidades recuperadas (Tabela 3). A VRH foi a vacina com maior proporção de oportunidade recuperada (48,5%, com IC95% 30,8;66,46). Ainda, 4,5% (IC95% 2,8;6,9) das crianças tiveram oportunidades não recuperadas, recebendo de uma a três doses. Dessas, 70% (IC95% 45,7;88,1) receberam três doses; 25% (IC95% 8,6;49,1) receberam somente duas doses; e 5% (IC95% 0,1;24,9), uma só vacina. A vacina VRH foi a de menor cobertura entre as crianças com esquema incompleto de vacinação, ausente em 60% (IC95% 36,0;80,8) desses casos; 3,7% (IC95% 2,1;5,9) das crianças não receberam nenhuma vacina.

Tabela 3
Proporções (%) e intervalos de confiança de 95% (IC95) das carteiras de vacinação com oportunidades recuperadas, datas das doses coincidentes ou doses ausentes referentes às vacinas aplicadas aos 2 meses, por estrato socioeconômico, em Londrina, de nascidos em 2017 e 2018 (n = 456)

Para as doses aplicadas aos 2 meses, a proporção de crianças com doses coincidentes foi maior entre as do estrato socioeconômico D (91,0%, IC95%79,3;96.4), e as de oportunidades recuperadas, entre as do estrato B (18,4%, IC95% 3,9;55,3). O estrato A apresentou a maior proporção de ausência de vacinas (10,7%, IC95% 4,6;22,7). Não houve diferença estatística (p=0,083). (Tabela 3)

Em relação às doses previstas para serem aplicadas aos 4 meses, 82,0% (IC95% 72,3;88,9) receberam todas as vacinas na mesma sessão e 4,6% (IC95% 2,4;8,7) tiveram oportunidades recuperadas (Tabela 4). A VRH foi a vacina de maior oportunidade recuperada, atrasada em 48,6% (IC95% 31,92;65,6). Ainda, 7,2% (IC95% 5,0;10,2) das crianças tiveram oportunidades não recuperadas, e receberam entre uma e três doses. Dessas, 68,7% (IC95% 50,0;83,9) receberam três doses; 22,0% (IC95% 9,3;40,0) receberam somente duas; e 9,3% (IC95% 2,0;25,0), uma só vacina. A vacina VRH foi a de menor cobertura entre as crianças com esquema incompleto de vacinação, ausente em 72,0% (IC95% 53,2;86,2) das carteiras; 4,2% (IC95% 2,5;6,4) das crianças não receberam nenhuma vacina.

Tabela 4
Proporções (%) e intervalos de confiança de 95% (IC95) das carteiras de vacinação com oportunidades recuperadas, datas das doses coincidentes ou doses ausentes referentes às vacinas aplicadas aos 4 meses, por estrato socioeconômico, em Londrina, de nascidos em 2017 e 2018 (n = 456)

A proporção de crianças com doses coincidentes aos 4 meses foi maior entre as do estrato socioeconômico D (90,2%, IC95% 80,0;95,5), e as de oportunidades recuperadas, entre as do estrato A (9,9%, IC95% 4,2;21,7). O estrato B apresentou a maior proporção de ausência de vacinas (16,0%, IC95% 5,3;39,3), porém, não houve diferença estatística (p=0,178) (Tabela 4).

Por fim, com relação às vacinas previstas aos 6 meses de idade, 83,0% (IC95% 73,6;89,6) receberam todas as doses na mesma data, e 4,8% (IC95% 2,0;10,7) tiveram oportunidades recuperadas (Tabela 5). No caso destas, a vacina penta foi aplicada antes da vacina VIP em 50,0% (IC95% 28,2;72,0) dos casos; 2,1% (IC95% 1,0;4,0) das crianças apresentaram oportunidades não recuperadas, sendo a vacina VIP a de menor cobertura, ausente em 66,7% (IC95% 30,0;92,5) dessas. E 7,4% (IC95% 5,2;10,2) das crianças não receberam nenhuma das duas doses.

Tabela 5
Proporções (%) e intervalos de confiança de 95% (IC95) das carteiras de vacinação com oportunidades recuperadas, datas coincidentes ou doses ausentes referentes às vacinas aplicadas aos 6 meses, por estrato socioeconômico, em Londrina, de nascidos em 2017 e 2018 (n = 456)

Diante das doses aplicadas aos 6 meses, o estrato socioeconômico D apresentou maior coincidência entre as datas das doses das vacinas aplicadas (93,3%, IC95% 82,8;97,6), e o estrato C expressou maior oportunidade recuperada (8,1%, IC95% 3,3;18,9), O estrato B apresentou a maior ausência de vacinas (15,5%, IC95% 5,0;39,2). Não houve significância estatística (p=0,499) (Tabela 5).

DISCUSSÃO

Em relação às oportunidades perdidas não recuperadas de vacinação, as proporções variaram de acordo com a faixa etária observada. Os maiores valores foram encontrados nas vacinas aplicadas aos 4 meses e ao nascer, enquanto as oportunidades recuperadas, nas doses ao nascer e aos 2 meses. Não houve diferença estatística na relação entre os estratos e a regularidade vacinal.

Para as vacinas aplicadas ao nascer, a BCG apresentou maior proporção de oportunidade recuperada de vacinação. O atraso na BCG demonstra que a aplicação não está ocorrendo na maternidade, como recomendado pelo Ministério da Saúde. Como a vacina possui técnica específica e complexa para ser aplicada,33 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014. a falta de capacitação técnica é uma das principais causas da não aplicação da vacina em recém-nascidos, como já apontado por um estudo realizado em Porto Alegre.1212 Capponi RL, Cunha CB, Bronca LP, Silva LB. Implantação da vacina Bacilo Calmette-Guérin (BCG) nas maternidades do município de Porto Alegre – RS, 2019-2020. Rev Eletronica Acervo Saude [Internet]. 2022 Jan 18 [cited 2024 Mar 7];15(1). doi: 10.25248/reas.e9611.2022.
https://doi.org/10.25248/reas.e9611.2022...
Apesar disso, a maior taxa de oportunidade não recuperada é a da vacina da HepB, o que também foi encontrado em estudo com metodologia ativa em menores de 1 ano em São Paulo.1313 Paulo EF. Oportunidades perdidas de vacinação em crianças menores de dois anos de idade, ocorridas nas salas de vacinação, das unidades de saúde da região norte do município de São Paulo [dissertation]. São Paulo (SP): Centro de Controle de Doenças da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo; 2010. A não aplicação da HepB nas primeiras 12 horas de vida é extremamente grave, pois essa janela de tempo é crucial para prevenir a transmissão vertical do vírus da mãe para o bebê, especialmente se a mãe for portadora. Quando a vacina é administrada dentro desse período crítico, ela atua como uma medida de profilaxia imediata, prevenindo a infecção antes que o vírus tenha a oportunidade de se estabelecer no organismo da criança.33 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014.

No que concerne às vacinas aplicadas aos 2 e 4 meses, a VRH foi a de maior proporção não recuperada. Um estudo de metodologia retrospectiva utilizando uma base de dados nacional realizado no Peru também aponta esse resultado e alerta para a tendência do crescimento desse resultado na América do Sul.1414 Matta-Chuquisapon J, Gianella C, Carrasco-Escobar G. Oportunidades perdidas para vacinação no Peru 2010-2020: um estudo sobre desigualdades socioeconômicas. Lancet Reg Health Am. 2022;14:100321. doi: 10.1016/j.lana.2022.100321.
https://doi.org/10.1016/j.lana.2022.1003...
A VRH é de grande importância para a saúde pública, diminuindo drasticamente as taxas de hospitalizações, complicações e mortes pela doença.1515 Masukawa MD, Moriwaki AM, Santana RG, Uchimura NS, Uchimura TT. Impacto da vacina oral de rotavírus humano nas taxas de hospitalizações em crianças. Acta Paul Enferm. 2015;28(3):243-9. doi: 10.1590/1982-0194201500041.
https://doi.org/10.1590/1982-01942015000...
A primeira dose da VRH deve ser dada até aos 3 meses e meio de idade, enquanto a segunda dose, aos 7 meses e meio, e esse limite rígido na idade de aplicação da vacina pode ser uma justificativa para o número expressivo de oportunidades perdidas não recuperadas de vacinação.1616 Vacina contra rotavírus. Rev Saude Publica. 2006;40(2):355-8. doi: 10.1590/s0034-89102006000200026.
https://doi.org/10.1590/s0034-8910200600...
,1717 Camilo R, Paixão JG, Miranda FC, Donza FC, Silva AM, Caçador DF et al. Cumprimento do calendário de vacinação de crianças em uma unidade de saúde da família. Rev Pan-Amaz Saude. 2010;1(2):55-60. Um estudo americano também aponta como principais causas que contribuem para a queda na cobertura da VRH a preocupação dos pais acerca da segurança geral da vacina e falhas nos locais de aplicação da vacina, além de evidenciar que a maioria das crianças não vacinadas tiveram pelo menos uma oportunidade perdida de receber a vacinação, apontando crescimento de 10% no esquema completo de vacinação contra a doença se todas essas oportunidades perdidas tivessem sido aproveitadas. 1818 Kempe A, O’Leary ST, Cortese MM, Crane LA, Cataldi JR, Brtnikova M et al. Por que não estamos atingindo altas taxas de vacinação para a vacina contra rotavírus nos Estados Unidos? Acad Pediatr. 2022 May-Jun;22(4):542-50. doi: 10.1016/j.acap.2021.07.003.
https://doi.org/10.1016/j.acap.2021.07.0...
,1919 Sederdahl BK, Orenstein WA, Yi J, Anderson EJ, Bednarczyk RA. Oportunidades perdidas para a vacinação contra o rotavírus. Pediatrics. 2019 May;143(5). doi: 10.1542/peds.2018-2498.
https://doi.org/10.1542/peds.2018-2498...

Em relação às vacinas aplicadas aos 6 meses, as terceiras doses da penta e da VIP não apresentaram perdas tão expressivas quando comparadas às doses anteriores. A VIP apresentou a maior proporção recuperada e não recuperada, diferentemente do encontrado em um estudo realizado em São Luis.2020 Yokokura AVCP, Silva AAM, Bernardes ACF, Lamy Filho F, Alves MTSSB, Cabra NAL, et al. Cobertura vacinal e fatores associados ao esquema vacinal básico incompleto aos 12 meses de idade, São Luís, Maranhão, Brasil, 2006. Cad Saude Publica. 2013 Mar;29(3):522–34. doi: 10.1590/S0102-311X2013000300010.
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201300...
Por outro lado, a ausência de vacinação condiz com uma tendência mundial de queda de cobertura de ambas as vacinas, e é similar ao encontrado em artigos que analisaram as taxas de vacinação nos âmbitos nacional e regional nos últimos anos.55 Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS – Ministério da Saúde [cited 2022 Apr 7]. Available from: https://datasus.saude.gov.br/.
https://datasus.saude.gov.br/...
,2121 Carvalho CC, Miranda Filho FD, Neves RA. Causas da queda progressiva das taxas de vacinação para poliomielite no Brasil, no ano de 2018. Rev Bras Mil Cienc. 2021;7(18). doi: 10.36414/rbmc.v7i18.98.
https://doi.org/10.36414/rbmc.v7i18.98...

As oportunidades recuperadas de vacinação, apesar de permitirem que a criança receba as vacinas que perdeu, indicam que ela não recebeu as vacinas na data determinada, necessitando de mais visitas ao sistema de saúde para completar o esquema vacinal. Como podem detectar irregularidades na aplicação de determinada vacina, identificá-las é de suma importância para prevenir o surgimento de falhas na imunização da população infantil. No estudo, com exceção das doses aplicadas ao nascer, todas as idades tiveram a vacina de maior oportunidade recuperada como também a de maior oportunidade perdida. Ainda, elas não implicam necessariamente doses válidas de vacinação, já que cada vacina apresenta um período mínimo no qual deve ser aplicada para melhor resposta imunológica.33 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014.

As causas relatadas de oportunidades perdidas de vacinação atualmente são variadas e comuns em vários artigos publicados. Em estudos realizados na Cidade do Cabo (Nigéria), Malawi e Chade, utilizando questionários aos cuidadores e verificação de carteira vacinal nas saídas das unidades de saúde, os números de oportunidades perdidas de vacinação encontram-se muito superiores aos encontrados em Londrina, chegando a taxas de quase 40%.2222 Nnaji CA, Wiysonge CS, Adamu AA, Lesosky M, Mahomed H, Ndwandwe D. Oportunidades perdidas para vacinação e fatores associados entre crianças atendidas em unidades de atenção primária na Cidade do Cabo, África do Sul: uma análise multinível pré-intervenção. Vaccines. 2022;10(5):785. doi: 10.3390/vaccines10050785.
https://doi.org/10.3390/vaccines10050785...

23 Fatiregun AA, Lochlainn LN, Kaboré L, Dosumu M, Isere E, Olaoye I et al. Oportunidades perdidas para vacinação entre crianças de 0 a 23 meses que visitam unidades de saúde em um estado do sudoeste da Nigéria, dezembro de 2019. PLoS One. 2021;16(8). doi: 10.1371/journal.pone.0252798.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.025...
-2424 Ogbuanu IU, Li AJ, Anya BP, Tamadji M, Chirwa G, Chiwaya KW et al. A cobertura vacinal pode ser melhorada reduzindo as oportunidades perdidas para vacinação? Resultados de avaliações no Chade e Malawi usando a nova metodologia da OMS. PLoS One. 2019;14(1). doi: 10.1371/journal.pone.0210648.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.021...
Utilizando como população crianças de 0 a 23 meses, reforçam a grande proporção de incompletude vacinal em menores de 1 ano, apontando como principais causas a ausência de checagem das carteiras de vacinação, a falta de conhecimento e capacitação dos trabalhadores da área da saúde acerca do assunto, desconhecimento dos pais sobre a importância das vacinas e das oportunidades perdidas de vacinação, e problemas nas campanhas vacinais e na distribuição e oferta de vacinas. Tais causas coincidem com aquelas apontadas pelo estudo realizado no Peru,1414 Matta-Chuquisapon J, Gianella C, Carrasco-Escobar G. Oportunidades perdidas para vacinação no Peru 2010-2020: um estudo sobre desigualdades socioeconômicas. Lancet Reg Health Am. 2022;14:100321. doi: 10.1016/j.lana.2022.100321.
https://doi.org/10.1016/j.lana.2022.1003...
que acrescenta o medo de efeitos adversos e a recusa de grande quantidade de vacinas aplicadas simultaneamente. Esta última, inclusive, pode estar associada às oportunidades recuperadas. Segundo um trabalho argentino,2525 Dayan GH, Shaw KM, Baughman AL, Orellana LC, Forlenza R, Ellis A et al. Avaliação do atraso na vacinação em idade apropriada usando análise de sobrevivência. Am J Epidemiol. 2006;163(6):561-70. doi: 10.1093/aje/kwj074.
https://doi.org/10.1093/aje/kwj074...
a utilização plena de todas as oportunidades para a administração simultânea de todas as doses de vacinas elegíveis para a idade, durante a mesma visita de vacinação, é uma estratégia crucial para alcançar a meta de cobertura vacinal. Assim, é essencial capacitar os trabalhadores da área da saúde tanto para a aplicação de vacinas, como para verificar as carteiras de vacinação das crianças, em qualquer contato destas com os serviços de saúde, abordando também as vacinas faltantes.

A literatura evidencia que a classe socioeconômica, o nível de alfabetização dos cuidadores e fatores culturais influenciam diretamente a adesão ao calendário vacinal infantil.44 Fernandes AS, Moreira EB, Muniz JR, Dutra LD. Oportunidades perdidas para vacinação de crianças: uma revisão integrativa da literatura. Braz J Health Rev. 2021;4(6):29207-24. doi: 10.34119/bjhrv4n6-451.
https://doi.org/10.34119/bjhrv4n6-451...
,1010 Moraes JC, et al. Inquérito de cobertura e hesitação vacinal nas capitais brasileiras, Distrito Federal e em 12 municípios do interior, em crianças nascidas em 2017-2018 e residentes nas áreas urbanas. Relatório final, processo CNPQ 404131/2019-0. São Paulo: 2023. Available from: https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv2023/.
https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv...
,2525 Dayan GH, Shaw KM, Baughman AL, Orellana LC, Forlenza R, Ellis A et al. Avaliação do atraso na vacinação em idade apropriada usando análise de sobrevivência. Am J Epidemiol. 2006;163(6):561-70. doi: 10.1093/aje/kwj074.
https://doi.org/10.1093/aje/kwj074...
,2626 Barata RB, Sampaio de Almeida Ribeiro MC, de Moraes JC, Flannery B. Desigualdades socioeconômicas e cobertura vacinal: resultados de uma pesquisa de cobertura vacinal em 27 capitais brasileiras, 2007-2008. J Epidemiol Community Health. 2012;66(10):934-41. doi: 10.1136/jech-2011-200341.
https://doi.org/10.1136/jech-2011-200341...
A estratificação socioeconômica foi vantajosa para representar adequadamente os diferentes setores censitários de Londrina, oferecendo uma visão clara das desigualdades vacinais.

O estrato socioeconômico D – ou seja, crianças que vivem nos setores censitários mais desfavorecidos – apresentou as maiores proporções de datas coincidentes entre as doses recebidas nas respectivas idades quando comparado aos outros estratos, enquanto os estratos A e C, as menores ausências de vacinas. Entretanto, não houve diferença estatística entre os estratos.

Em pesquisas em capitais brasileiras, crianças de estratos socioeconômicos mais elevados registraram a menor taxa de vacinação completa e menor cobertura para várias vacinas individuais,2626 Barata RB, Sampaio de Almeida Ribeiro MC, de Moraes JC, Flannery B. Desigualdades socioeconômicas e cobertura vacinal: resultados de uma pesquisa de cobertura vacinal em 27 capitais brasileiras, 2007-2008. J Epidemiol Community Health. 2012;66(10):934-41. doi: 10.1136/jech-2011-200341.
https://doi.org/10.1136/jech-2011-200341...
demonstrando uma tendência contemporânea da queda de cobertura que se relaciona com os estratos mais ricos. Assim, sugere-se que os programas de imunização do serviço público, que é o mais utilizado pela população mais desfavorecida, estão cumprindo com as recomendações do PNI, e que provavelmente as perdas vacinais não estejam relacionadas com a estrutura desses locais de aplicação.

A diminuição, ao longo dos últimos 40 anos, da ocorrência de doenças imunopreveníveis atrelada a ondas crescentes de informações falsas sobre os efeitos adversos da vacina pode gerar uma atitude de desinteresse e hesitação entre os segmentos mais privilegiados da população londrinense, como já apontado em países desenvolvidos e no Brasil.2727 Hill HA, Yankey D, Elam-Evans LD, Singleton JA, Sterrett N. Cobertura vacinal até os 24 meses entre crianças nascidas em 2017 e 2018 – National Immunization Survey-Child, Estados Unidos, 2018-2020. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2021;70(41):1435-40. doi: 10.15585/mmwr.mm7041a1.
https://doi.org/10.15585/mmwr.mm7041a1...

28 Dubé E, Gagnon D, Ouakki M, Bettinger JA, Guay M, Halperin S et al. Entendendo a hesitação vacinal no Canadá: Resultados de um estudo de consulta pela Canadian Immunization Research Network. PLoS One. 2016;11(6). doi: 10.1371/journal.pone.0156118.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.015...
-2929 Singh AM. Infecções respiratórias precoces, asma e alergia: acompanhamento de 10 anos da coorte de nascimento de Oslo. Pediatrics. 2006;118(Suppl 1). doi: 10.1542/peds.2006-0900k. Esse cenário propicia o descumprimento do calendário vacinal infantil entre os estratos socioeconômicos altos, causando taxas de perdas vacinais. Como boa parte dessas crianças tendem a utilizar serviços privados de vacinação, é importante entender a dinâmica adotada pelos profissionais de saúde, a fim de minimizarem a hesitação dos cuidadores que impedem que as crianças recebam todas as vacinas necessárias em dada sessão. Dessa forma, é imprescindível que haja, por parte do poder público, a identificação das principais barreiras que dificultam, para a população dos estratos altos, a regularização do esquema vacinal de suas crianças, e o direcionamento de campanhas educativas que desmistifiquem os medos desse segmento da população. Ademais, é necessário envolver o sistema privado de saúde no combate às oportunidades perdidas de vacinação.

O estudo engloba uma distribuição significativa das crianças da área urbana de Londrina, possuindo uma amostra representativa do local, além de não ter apresentado perda amostral. Apesar disso, como limitação, não abarcou a área rural, que possui população de 13.181 crianças.3030 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Cidades e estados: Londrina [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2023 [cited 2024 Sep 22]. Available from: https://www.ibge.gov.br.
https://www.ibge.gov.br...
Ainda, a leitura da caderneta de vacinação também pode conter erros, dada a falta de padronização de anotações e datas ilegíveis, dificultando a transcrição de dados.

O estudo revela perdas vacinais para vacinas que deveriam ser aplicadas na mesma sessão. Recomendam-se, portanto, campanhas educativas focadas na desinformação e medo dos efeitos adversos, capacitação dos profissionais da sessão de vacinação e melhor integração entre os sistemas público e privado de saúde, a fim de se garantir o monitoramento contínuo do estado vacinal. Estudos futuros devem explorar as causas da hesitação vacinal e estratégias para reduzir essas oportunidades perdidas, visando maior adesão ao calendário vacinal.

  • FINANCIAMENTO

    Departamento de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, processo no 404131.

Referências bibliográficas

  • 1
    Sato AP. Qual é a importância da hesitação vacinal na queda da cobertura vacinal no Brasil? Rev Saude Publica. 2018;52:96. doi: 10.11606/s1518-8787.2018052001199.
    » https://doi.org/10.11606/s1518-8787.2018052001199
  • 2
    Domingues CMAS, Teixeira MAS. Coberturas vacinais e doenças imunopreveníveis no Brasil no período 1982-2012: avanços e desafios do Programa Nacional de Imunizações. Epidemiol Serv Saude. 2013;22:9-27.
  • 3
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014.
  • 4
    Fernandes AS, Moreira EB, Muniz JR, Dutra LD. Oportunidades perdidas para vacinação de crianças: uma revisão integrativa da literatura. Braz J Health Rev. 2021;4(6):29207-24. doi: 10.34119/bjhrv4n6-451.
    » https://doi.org/10.34119/bjhrv4n6-451
  • 5
    Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS – Ministério da Saúde [cited 2022 Apr 7]. Available from: https://datasus.saude.gov.br/
    » https://datasus.saude.gov.br/
  • 6
    Tampi M, Silva W, Pereira B. Revisão sistemática sobre a redução das oportunidades perdidas para vacinação na América Latina. Rev Panam Salud Publica [Internet]. 2022;46. doi: 10.26633/RPSP.2022.65.
  • 7
    Barros MGM, Santos MC da S, Bertolini RPT, Netto VBP, Andrade MS. Perda de oportunidade de vacinação: aspectos relacionados à atuação da atenção primária em Recife, Pernambuco, 2012. Epidemiol Serv Saúde. 2015;24(4):701-10. doi: 10.5123/S1679-49742015000400012.
    » https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000400012
  • 8
    Barata RB, França AP, Guibu IA, Vasconcellos MT, Moraes JC. Inquérito Nacional de Cobertura Vacinal 2020: métodos e aspectos operacionais. Rev Bras Epidemiol. 2023;26. doi: 10.1590/1980-549720230031.2.
    » https://doi.org/10.1590/1980-549720230031.2
  • 9
    Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. Critério de classificação econômica Brasil [Internet]. 2019 [cited 2023 May 17]. Available from: https://www.abep.org/criterio-brasil
    » https://www.abep.org/criterio-brasil
  • 10
    Moraes JC, et al. Inquérito de cobertura e hesitação vacinal nas capitais brasileiras, Distrito Federal e em 12 municípios do interior, em crianças nascidas em 2017-2018 e residentes nas áreas urbanas. Relatório final, processo CNPQ 404131/2019-0. São Paulo: 2023. Available from: https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv2023/
    » https://www.cealag.com.br/pubdigital/icv2023/
  • 11
    Dean AG, Sullivan KM, Soe MM. OpenEpi: Open Source Epidemiologic Statistics for Public Health, Version 3.01 [Internet] 2013/04/06. Available from: https://www.openepi.com/Menu/OE_Menu.htm
    » https://www.openepi.com/Menu/OE_Menu.htm
  • 12
    Capponi RL, Cunha CB, Bronca LP, Silva LB. Implantação da vacina Bacilo Calmette-Guérin (BCG) nas maternidades do município de Porto Alegre – RS, 2019-2020. Rev Eletronica Acervo Saude [Internet]. 2022 Jan 18 [cited 2024 Mar 7];15(1). doi: 10.25248/reas.e9611.2022.
    » https://doi.org/10.25248/reas.e9611.2022
  • 13
    Paulo EF. Oportunidades perdidas de vacinação em crianças menores de dois anos de idade, ocorridas nas salas de vacinação, das unidades de saúde da região norte do município de São Paulo [dissertation]. São Paulo (SP): Centro de Controle de Doenças da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo; 2010.
  • 14
    Matta-Chuquisapon J, Gianella C, Carrasco-Escobar G. Oportunidades perdidas para vacinação no Peru 2010-2020: um estudo sobre desigualdades socioeconômicas. Lancet Reg Health Am. 2022;14:100321. doi: 10.1016/j.lana.2022.100321.
    » https://doi.org/10.1016/j.lana.2022.100321
  • 15
    Masukawa MD, Moriwaki AM, Santana RG, Uchimura NS, Uchimura TT. Impacto da vacina oral de rotavírus humano nas taxas de hospitalizações em crianças. Acta Paul Enferm. 2015;28(3):243-9. doi: 10.1590/1982-0194201500041.
    » https://doi.org/10.1590/1982-0194201500041
  • 16
    Vacina contra rotavírus. Rev Saude Publica. 2006;40(2):355-8. doi: 10.1590/s0034-89102006000200026.
    » https://doi.org/10.1590/s0034-89102006000200026
  • 17
    Camilo R, Paixão JG, Miranda FC, Donza FC, Silva AM, Caçador DF et al. Cumprimento do calendário de vacinação de crianças em uma unidade de saúde da família. Rev Pan-Amaz Saude. 2010;1(2):55-60.
  • 18
    Kempe A, O’Leary ST, Cortese MM, Crane LA, Cataldi JR, Brtnikova M et al. Por que não estamos atingindo altas taxas de vacinação para a vacina contra rotavírus nos Estados Unidos? Acad Pediatr. 2022 May-Jun;22(4):542-50. doi: 10.1016/j.acap.2021.07.003.
    » https://doi.org/10.1016/j.acap.2021.07.003
  • 19
    Sederdahl BK, Orenstein WA, Yi J, Anderson EJ, Bednarczyk RA. Oportunidades perdidas para a vacinação contra o rotavírus. Pediatrics. 2019 May;143(5). doi: 10.1542/peds.2018-2498.
    » https://doi.org/10.1542/peds.2018-2498
  • 20
    Yokokura AVCP, Silva AAM, Bernardes ACF, Lamy Filho F, Alves MTSSB, Cabra NAL, et al. Cobertura vacinal e fatores associados ao esquema vacinal básico incompleto aos 12 meses de idade, São Luís, Maranhão, Brasil, 2006. Cad Saude Publica. 2013 Mar;29(3):522–34. doi: 10.1590/S0102-311X2013000300010.
    » https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000300010
  • 21
    Carvalho CC, Miranda Filho FD, Neves RA. Causas da queda progressiva das taxas de vacinação para poliomielite no Brasil, no ano de 2018. Rev Bras Mil Cienc. 2021;7(18). doi: 10.36414/rbmc.v7i18.98.
    » https://doi.org/10.36414/rbmc.v7i18.98
  • 22
    Nnaji CA, Wiysonge CS, Adamu AA, Lesosky M, Mahomed H, Ndwandwe D. Oportunidades perdidas para vacinação e fatores associados entre crianças atendidas em unidades de atenção primária na Cidade do Cabo, África do Sul: uma análise multinível pré-intervenção. Vaccines. 2022;10(5):785. doi: 10.3390/vaccines10050785.
    » https://doi.org/10.3390/vaccines10050785
  • 23
    Fatiregun AA, Lochlainn LN, Kaboré L, Dosumu M, Isere E, Olaoye I et al. Oportunidades perdidas para vacinação entre crianças de 0 a 23 meses que visitam unidades de saúde em um estado do sudoeste da Nigéria, dezembro de 2019. PLoS One. 2021;16(8). doi: 10.1371/journal.pone.0252798.
    » https://doi.org/10.1371/journal.pone.0252798
  • 24
    Ogbuanu IU, Li AJ, Anya BP, Tamadji M, Chirwa G, Chiwaya KW et al. A cobertura vacinal pode ser melhorada reduzindo as oportunidades perdidas para vacinação? Resultados de avaliações no Chade e Malawi usando a nova metodologia da OMS. PLoS One. 2019;14(1). doi: 10.1371/journal.pone.0210648.
    » https://doi.org/10.1371/journal.pone.0210648
  • 25
    Dayan GH, Shaw KM, Baughman AL, Orellana LC, Forlenza R, Ellis A et al. Avaliação do atraso na vacinação em idade apropriada usando análise de sobrevivência. Am J Epidemiol. 2006;163(6):561-70. doi: 10.1093/aje/kwj074.
    » https://doi.org/10.1093/aje/kwj074
  • 26
    Barata RB, Sampaio de Almeida Ribeiro MC, de Moraes JC, Flannery B. Desigualdades socioeconômicas e cobertura vacinal: resultados de uma pesquisa de cobertura vacinal em 27 capitais brasileiras, 2007-2008. J Epidemiol Community Health. 2012;66(10):934-41. doi: 10.1136/jech-2011-200341.
    » https://doi.org/10.1136/jech-2011-200341
  • 27
    Hill HA, Yankey D, Elam-Evans LD, Singleton JA, Sterrett N. Cobertura vacinal até os 24 meses entre crianças nascidas em 2017 e 2018 – National Immunization Survey-Child, Estados Unidos, 2018-2020. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2021;70(41):1435-40. doi: 10.15585/mmwr.mm7041a1.
    » https://doi.org/10.15585/mmwr.mm7041a1
  • 28
    Dubé E, Gagnon D, Ouakki M, Bettinger JA, Guay M, Halperin S et al. Entendendo a hesitação vacinal no Canadá: Resultados de um estudo de consulta pela Canadian Immunization Research Network. PLoS One. 2016;11(6). doi: 10.1371/journal.pone.0156118.
    » https://doi.org/10.1371/journal.pone.0156118
  • 29
    Singh AM. Infecções respiratórias precoces, asma e alergia: acompanhamento de 10 anos da coorte de nascimento de Oslo. Pediatrics. 2006;118(Suppl 1). doi: 10.1542/peds.2006-0900k.
  • 30
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Cidades e estados: Londrina [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2023 [cited 2024 Sep 22]. Available from: https://www.ibge.gov.br
    » https://www.ibge.gov.br

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jan 2025
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    14 Mar 2023
  • Aceito
    14 Out 2024
Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente - Ministério da Saúde do Brasil Brasília - Distrito Federal - Brazil
E-mail: ress.svs@gmail.com