A vigilância genômica do SARS-CoV-2 no Brasil na resposta à pandemia da COVID-19

Janaína Sallas Guilherme Almeida Elidio Daniela Buosi Rohlfs Arnaldo Correia de Medeiros Dirce Bellezi Guilhem Sobre os autores

Ao Editor,

Diariamente, milhares de variantes do SARS-CoV-2 surgem no mundo (11. Burki T. Understanding variants of SARS-CoV-2. Lancet (London, England). 2021;397(10273):462. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(21)00298-1
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), evidenciando o desafio de reforçar a capacidade de detecção oportuna com ampliação e fortalecimento da vigilância epidemiológica, vigilância laboratorial e comunicação rápida, com desenvolvimento de pesquisas em saúde que possam apoiar as medidas de prevenção e controle da pandemia da COVID-19. Ainda que não se conheçam todas as implicações das novas variantes da COVID-19 para o controle da doença, algumas mutações ou combinações podem fornecer ao vírus uma vantagem seletiva, que contribui para aumentar a transmissibilidade ou a capacidade de evadir a resposta imune do hospedeiro.

No Brasil, até 10 de abril de 2021, foram registrados e confirmados 13 445 006 casos e 361 334 óbitos por COVID-19, com incidência acumulada de 6 397,9 por 100 mil habitantes e mortalidade de 157,2 por 100 mil habitantes. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o segundo país com maior número de casos e óbitos por COVID-19 no mundo (22. World Health Organization (WHO). COVID-19 weekly epidemiological update 22. Disponível em: https://www.who.int/docs/default-source/coronaviruse/situation-reports/weekly_epidemiological_update_22.pdf Acessado em abril de 2021.
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). Entretanto, além da alta incidência e mortalidade pela doença encontradas no Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) está sendo desafiado pela circulação de variantes de atenção do SARS-CoV-2 nos estados.

No cenário mundial, existem três variantes de atenção para SARS-CoV-2 (33. World Health Organization (WHO). Weekly epidemiological update on COVID-19 - 30 March. Disponível em:: https://www.who.int/docs/default-source/coronaviruse/situation-reports/weekly_epidemiological_update_22.pdf Acessado em abril de 2021.
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): do Reino Unido (B.1.1.7), com circulação em 111 países; da África do Sul (B.1.351), com circulação em 70 países; e do Brasil (P.1.), com circulação em 36 países. No Brasil, no período compreendido pelas semanas epidemiológicas 1 até 14 de 2021 (ou seja, de 3 de janeiro de 2021 até 10 de abril de 2021), a vigilância genômica identificou essas três variantes de atenção. Quanto à P.1, variante de maior circulação no Brasil, detectada pelas autoridades em 9 de janeiro de 2021, 1 690 amostras foram registradas em 24 unidades federadas nas cinco regiões do país, sendo 44,6% originárias da região Norte. Com relação à B.1.1.7, foi detectada pelas autoridades brasileiras em 2 de janeiro de 2021 e, até o momento, foram identificadas 63 amostras distribuídas em 10 unidades federadas e quatro regiões (Nordeste, Sudeste, Sul e Centro Oeste), porém com concentração no Sudeste (63,5%). Quanto à B.1.351, apenas um caso foi detectado no país, em 7 de abril de 2021, em São Paulo, região Sudeste.

Os estudos sobre a variante de atenção P.1. ainda são muito limitados, havendo poucas evidências disponíveis para determinar uma mudança na transmissibilidade ou gravidade da doença (44. Martins AF, Zavascki AP, Wink PL, Volpato FCZ, Monteiro FL, Rosset C, et al. Detection of SARS-CoV-2 lineage P.1 in patients from a region with exponentially increasing hospitalization rates in February 2021, Rio Grande do Sul, Southern Brazil. medRxiv. 2021;26(12):2021.03.09.21253204. https://doi.org/10.1101/2021.03.09.21253204
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). No entanto, é plausível o aumento da transmissibilidade, tendo em vista a presença de alteração de aminoácidos N501Y nas três variantes de atenção (55. Le Page M. Threats from new variants. New Sci. 2021;249(3316):8–9. http://dx.doi.org/10.1016/S0262-4079(21)00003-8
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, 66. Ministry of Health (New South Wales). Critical Intelligence Unit. SARS-CoV-2 Variants. 2021;(February):1–30. https://aci.health.nsw.gov.au/__data/assets/pdf_file/0010/627409/20210125-Evidence-Check-SARS-CoV-2-Variants.pdf Acessado em abril de 2021.
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). Com relação à B.1.1.7, pesquisas do Reino Unido estimam ser até 71% mais transmissível do que a forma anteriormente circulante do vírus, com possibilidade de carga viral mais alta (66. Ministry of Health (New South Wales). Critical Intelligence Unit. SARS-CoV-2 Variants. 2021;(February):1–30. https://aci.health.nsw.gov.au/__data/assets/pdf_file/0010/627409/20210125-Evidence-Check-SARS-CoV-2-Variants.pdf Acessado em abril de 2021.
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). No rastreamento de contatos, a taxa de ataque secundário pode ser maior, de 15,1% versus 9,8% em outras variantes (66. Ministry of Health (New South Wales). Critical Intelligence Unit. SARS-CoV-2 Variants. 2021;(February):1–30. https://aci.health.nsw.gov.au/__data/assets/pdf_file/0010/627409/20210125-Evidence-Check-SARS-CoV-2-Variants.pdf Acessado em abril de 2021.
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). Estudos afirmam que a variante de atenção B.1.351 pode apresentar maior potencial de transmissibilidade, cerca de 50%, em comparação com as variantes pré-existentes, além de ser amplamente resistente a anticorpos neutralizantes, podendo gerar risco significativo de reinfecção (66. Ministry of Health (New South Wales). Critical Intelligence Unit. SARS-CoV-2 Variants. 2021;(February):1–30. https://aci.health.nsw.gov.au/__data/assets/pdf_file/0010/627409/20210125-Evidence-Check-SARS-CoV-2-Variants.pdf Acessado em abril de 2021.
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).

Nesse cenário, muitas perguntas precisam ser respondidas de forma oportuna, como: existem diferenças na doença provocada pelas variantes de atenção? Como as variantes podem afetar a assistência, as práticas terapêuticas, a resposta às vacinas e os testes disponíveis? Em busca de respostas, desde 8 de fevereiro de 2021 o Ministério da Saúde do Brasil está implementando um plano nacional de fortalecimento e ampliação da vigilância genômica para SARS-CoV-2. Entre os objetivos propostos estão: identificar estratégias de vigilância genômica; orientar quanto aos critérios para sequenciamento de amostras; padronizar o envio dos resultados das pesquisas genômicas; reforçar a comunicação imediata e oportuna; e analisar os resultados das pesquisas genômicas em parceria com a vigilância epidemiológica. Em um prazo de 14 dias, a rede de vigilância genômica passou de 10 amostras mensais por estado para três mil amostras a cada 4 semanas epidemiológicas. Acreditamos que o fortalecimento da rede mundial de vigilância genômica seja um dos caminhos para subsidiar as medidas de controle da pandemia da COVID-19 em todo o mundo, tornando possível o enfrentamento do desafio das variações do SARS-CoV-2 no SUS e no Brasil.!

Declaração.

As opiniões expressas no manuscrito são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem necessariamente a opinião ou política da RPSP/PAJPH ou da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

  • Conflitos de interesse.
    Nada declarado pelos autores.

REFERÊNCIAS

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Jun 2021
  • Data do Fascículo
    2021
Organización Panamericana de la Salud Washington - Washington - United States
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