ATUALIDADES/ACTUALITIES
Planejamento de banco de leite humano e central de informações sobre aleitamento materno
Planning of the human milk bank and the information center on breast feeding
Maria Alice Altenburg de AssisI; Evanguelia Kotzias Atherino dos SantosII; Denise Maria Guerreiro Vieira da SilvaIII
IDa Fundação Hospitalar de Santa Catarina. Rua Irmã Benwarda, No 41 88000 Florianópolis, SC Brasil
IIDa Maternidade Carmela Dutra. Rua Irmã Benwarda, S/No 88000 Florianópolis, SC Brasil
IIIDo Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina, Cidade Universitária 88000 Florianópolis, SC Brasil
RESUMO
Apresenta-se o planejamento das atividades e da área física do Banco de Leite Humano e Central de Informações sobre Aleitamento Materno da Maternidade Carmela Dutra, da Fundação Hospitalar de Santa Catarina. Com a implantação deste serviço, procura-se atender as necessidades dos bebês internados em Unidades de Tratamento Intensivo das Maternidades e Hospitais Infantis desta Fundação. Além de coletar, analisar, armazenar e processar adequadamente o leite doado por nutrizes voluntárias, são realizadas atividades educativas e de incentivo ao aleitamento materno junto a comunidade e aos profissionais de saúde.
Unitermos: Banco de leite humano. Aleitamento. Educação em saúde pública.
ABSTRACT
The planning of the activities and the layout of the Human Milk Bank and Information Center on Breast Feeding of the Carmela Dutra Maternity Hospital of the Santa Catarina Hospital Foundation (Brazil) are presented. The implantation of this service seeks to attend to the necessities of babies under treatment in Intensive Care Units of the Maternity and other children's hospitals of this Foundation. Besides collecting analising, storing and processing, adequately, the milk donated by volunteer wet-nurses, educational and promotional activities related to breast feeding are carried out in the community and among health profissionais.
Uniterms: Human milk banks. Breast feeding. Health education.
1. INTRODUÇÃO
A utilização ao leite e colostro humano revelou-se em vários estudos relatados como um método eficaz de dominar as epidemias de diarréia aguda produzida por E. coli enteropatogênica, observadas com freqüência nas Unidades de Internação dos recém--nascidos de alto risco 3,7,8.
Crianças prematuras ou de baixo peso ao nascer possuem maiores exigências de proteínas e de cálcio, em relação ao bebê a termo, devido a maior aceleração do crescimento 6. O mesmo não ocorre quando o pré-termo recebe o colostro humano que apresenta elevado teor de proteínas e cálcio 6.
Muitos problemas impossibilitam o uso do leite humano para essas crianças. Além da dificuldade encontrada pelos recém-nascidos de alto risco de sugar o seio materno, observa-se em alguns casos a falta de interesse da equipe de saúde para orientar a mãe sobre a retirada manual do leite.
Ocorrem também outros problemas de ordem prática, tais como a dificuldade de obter-se leite, em quantidade suficiente, de mães que, por alguma razão, estão impossibilitadas de amamentar ou, em alguns casos, a falta de interesse da equipe de saúde para facilitar o acesso da mãe às Unidades de Tratamento Intensivo, onde permanececm seus bebês2.
Encontrar um suprimento de leite suficiente para tais bebês é um problema que não se resolve somente com doações de outras mães internadas nas Unidades de Puerpério. As doações são irregulares e o volume que se obtem, muitas vezes, não corresponde às necessidades, em geral, dos prematuros 2.
Em hospitais infantis, onde estão internados os bebês seriamente doentes, com intolerância gastrintestinal ou submetidos a cirurgias, a dificuldade é considerável devido a ausência constante das doadoras, como sucede nas Maternidades 2.
A implantação de um Banco de Leite Humano pode constituir um valioso recurso para a recuperação dessas crianças, pois se define como uma área física capacitada a coletar, armazenar e distribuir adequadamente o leite humano.
Bancos de leite humano foram implantados na Inglaterra e nos Estados Unidos, antes da II Guerra Mundial, sucedendo-se um período de desinteresse pelo uso de leite humano na alimentação dos recém-nascidos de alto risco, devido ao abandono da prática do aleitamento materno 4.
Bancos de leite mais sofisticados foram implantados na Inglaterra, na década de 1970, e entre seus serviços incluiam-se análises nutricionais e bacteriológicas das amostras 10.
O Brasil já possui bancos de leite humano na maioria de seus Estados, porém há necessidade de divulgar suas atividades e características da área física2.
No decorrer da Campanha Nacional de Incentivo ao Aleitamento Materno, houve recomendações no sentido de que os bancos de leite também desenvolvessem atividades que estimulassem o aleitamento natural.
Acatando a recomendação, a Fundação Hospitalar de Santa Catarina implantou, na Maternidade Carmela Dutra, o Banco de Leite Humano e Central de Informações sobre Aleitamento Materno, que vem funcionando satisfatoriamente há cerca de um ano.
O presente trabalho apresenta o planejamento efetuado para o referido setor, oferecendo subsídios às entidades que desejarem implementar projeto dessa natureza.
2. BANCO DE LEITE HUMANO E CENTRAL DE INFORMAÇÕES SOBRE ALEITAMENTO MATERNO
2.1. OBJETIVOS
2.1.1. Objetivo geral
Desenvolver atividades que atendam à filosofia do projeto e garantam o acesso da população alvo ao Banco de Leite.
2.1.2. Objetivos específicos
Coletar leite humano possibilitando estoque regular para suprir a demanda.
Organizar cadastro das doadoras para possibilitar a coleta domiciliar.
Distribuir o leite às maternidades e hospitais infantis, respeitando os critérios de prioridade estabelecidos.
Propiciar às doadoras e seus dependentes menores, condições favoráveis de atendimento médico, nutricional e social.
Prestar informações de natureza técnico-científica à comunidade, visando contribuir para o estímulo ao aleitamento natural.
2.2. GRUPO ALVO
Recém-nascidos prematuros.
Recém-nascidos de baixo peso para a idade gestacional.
Crianças imunologicamente deficientes.
Recém-nascidos com enterocolite necrotizante.
Crianças alérgicas a outros leites.
Doadoras de leite
Gestantes, puérperas e nutrizes.
2.3. ATIVIDADES
O leite humano é coletado de acordo com as técnicas assépticas estabelecidas, no setor e a domicílio.
Um estoque satisfatório é obtido sempre que se realiza campanhas de divulgação nos meios de comunicação, para a população em geral, sensibilizando-se o profissional de saúde da área materno-infantil das clínicas particulares e da universidade.
Diariamente, a equipe previamente treinada, orienta e encaminha as puérperas da maternidade para comparecerem ao Banco de Leite.
Realiza-se um trabalho paralelo junto às mães de recém-nascidos de alto risco, que já receberam alta, a fim de continuarem a retirar leite no Banco, com o intuito de manter o aleitamento e prover o filho com o aleitamento natural.
Além da coleta do leite, as doadoras são orientadas quanto às vantagens e técnicas do aleitamento materno, sendo enfatizada a importância das doações.
As doadoras voluntárias, no período pós-hospitalar, são orientadas sobre a coleta domiciliar, caso não possam comparecer ao Banco. Seu endereço é anotado para que diariamente um profissional da equipe efetue, em sua casa, a retirada do leite e lhe dê maiores orientações. Bem orientada, a mãe que reside distante do Banco de Leite, retira ela própria o leite e estoca no congelador para que uma vez por semana seja recolhido pelo carro do Banco.
As mães carentes de recursos recebem passes de ônibus, doados pela Fundação Legião Brasileira de Assistência, para comparecerem ao Banco e amamentarem seus filhos internados nas Unidades de Tratamento Intentivo; são também cadastradas no Programa de Nutrição em Saúde, com direito a receber alimentos do Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (INAN).
No Banco de Leite, a estocagem é realizada na geladeira se a utilização for feita dentro de 24 horas, caso contrário, processa-se o congelamento em congeladores comerciais, até um período de seis meses.
Para controle da qualidade microbiológica do leite, analisa-se três amostras por semana, pesquisando-se os microorganismos mais comumente encontrados no leite humano, segundo a bibliografia consultada 5,9. A qualidade é avaliada seguindo-se os padrões de referência citados na literatura 2, 10.
A requisição do leite é feita através de formulário próprio, contendo dados sobre o volume solicitado, nome, intercorrência clínica da criança e volume cedido.
Atividades educativas visam divulgar a importância do aleitamento materno à comunidade, orientar as instituições sobre montagem e operacionalização de Bancos de Leite e incentivar a criação da Liga do Leite Materno em Santa Catarina.
Através de estágios são treinados pessoal de nível superior, médio e operacional da área materno-infantil, para que de alguma forma contribuam no desenvolvimento dos trabalhos do Banco de Leite.
2.4. LOCALIZAÇÃO E ÁREA FÍSICA
O Banco de Leite Humano e Central de Informações sobre Aleitamento Materno localiza-se na Maternidade Carmela Dutra, em local de fácil acesso ao público.
A área física é composta de cinco salas por se constituir no Banco de Leite Central. Postos de Coleta, subordinados tecnicamente ao Banco de Leite Central e com estrutura física composta de apenas duas salas (recepção e coleta), foram montados em outras maternidades e hospitais infantis da Fundação Hospitalar de Santa Catarina.
O Banco de Leite Central esta constituído das seguinte salas, dispostas conforme planta em anexo.
2.4.1. Sala de Recepção e Triagem das Doadoras
Área: 6,26 m2
Piso: lajota
Revestimento: tinta plástica
Finalidade: destina-se ao atendimento de gestantes, puérperas e nutrizes no que diz respeito as orientações sobre aleitamento materno, encaminhamento para coleta e registro dos dados médico-sociais.
Material permanente:
Telefone
Mesa com gavetas laterais
Cadeira de madeira
Banco, sofá ou poltrona para quatro pessoas.
Armário
Arquivo para fichas
Material de consumo
Fichas para o registro de dados médico-sociais
Manuais e folhetos sobre aleitamento materno
Bandeja para lanches
Passes de ônibus
2.4.2. Sala de Coleta do Leite
Área: 11,80 m2
Piso: lajota
Revestimento: azulejo
Finalidade: coletar leite humano de acordo com as técnicas assépticas estabelecidas, fazer aplicação de calor, massagem nas mamas, usar oxitocina sintética nas clientes que apresentarem ingurgitamento mamário; guardar o leite coletado na geladeira por um período máximo de 24 h.
Material permanente:
Três bombas elétricas extratoras de leite
Vinte bombas manuais
Uma geladeira
Um ar condicionado
Duas banquetas giratórias
Dois carrinhos com rodízio para as bombas elétricas
Duas divisórias de material divelux com vidro, a fim de separar a área de coleta das pias
Um armário para guardar aventais, gorros, máscaras, propés, camisolas com aberturas nos seios.
Um armário para guardar mamadeiras e bombas manuais
Material de consumo
Bombas manuais
Toalheiro de papel
Adaptadores de sucção para seio
Borracha intermediária para bombas elétricas
Mamadeiras de plástico
Mamadeiras de vidro
Escova para lavar mamadeira
Bolsa de água quente
Sabão
Sabonete
Álcool
Camisolas com abertura nos seios
Hamper para roupas usadas
Sacos de hamper
Propés
Máscaras
Gorros
Balde plástico para lixo
2.4.3. Sala de Esterilização do Material
Área: 5,39 m 2
Piso: lajota
Revestimento: azulejo
Finalidade: esterilizar e desinfetar o material utilizado na sala de coleta, armazenamento e laboratório
Material permanente:
Uma estufa
Uma autoclave
Um armário
Material de consumo
Cubas para desinfetante
Desinfetantes e desincrostantes
2.4.4. Sala de Estocagem
Área: 6,52 m 2
Piso: cerâmica
Revestimento: azulejo
Finalidade: estocar leite humano disponível "in natura" ou liofilizado em freezer, após análise de sua qualidade microbiológica
Material permanente:
Um "freezer"
Um liofilizador
Material de consumo
Gelo seco
2.4.5. Sala de Laboratório
Área: 5,70m 2
Piso: cerâmica
Revestitmento: azulejo
Finalidade: analisar o leite humano quanto a qualidade microbiológica, nutricional e imunológica
Material permanente:
Uma balança com capacidade para uma grama
Uma estufa
Um microscópio
Um bico de bünsen
Um contador de colônias microbiológicas
Um armário
Material de consumo
Meios de cultura
Placas de imunodifusão radial
Reagentes diversos
2.5. RECURSOS HUMANOS
Poderá ser utilizada a equipe técnica multiprofissional da própria instituição, composta por enfermeiros, nutricionistas, tecnólogo de alimentos, médicos pediatras, obstetras e assistentes sociais.
Além da equipe técnica pode-se contar com o trabalho de uma atendente de enfermagem e de estagiários de cursos universitários da área de saúde.
2.6. INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES
Fundação Hospitalar de Santa Catarina
Maternidade Carmela Dutra
Hospital Infantil Joana de Gusmão
Maternidade Dr. Carlos Corrêa
Secretaria da Saúde de Santa Catarina
Departamento Autônomo de Saúde Pública
Fundação Legião Brasileira de Assistência
Prefeitura Municipal de Florianópolis
Clubes de Serviço (Rotary, Lions, Casa da Amizade)
Hospital Florianópolis
Hospital Universitário
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. APPLEBAUM, R.M. Técnicas modernas para o êxito da amamentação. Maceió, La Leche League de Maceió, 1970.
2. ASSIS, M.A.A. Estudos sobre a preservação do colostro humano para bancos de leite. Campinas, 1981, [Dissertação de Mestrado Faculdade de Engenharia de Alimentos e Agrícola da UNICAM].
3. BULLEN, J.J. & ROGERS, H.J. Iron binding proteins in milk and resistance to Escherichia coli infections in infants. Brit. med. J., 1:69-75, 1972.
4. DAVY, S.T. Human milk banks. Nurs. Times, 15:758-61, 1975.
5. LUCAS, A. & ROBERTS, C.D. Bacteriological quality control in human milk-banking. Brit. med. J., 1:80-2, 1979.
6. NORDIO, S.; LEVI, U. & ANTENER, I. Aspectos nutricionais e metabólicos do aleitamento ao seio. An. Nestlé, S. Paulo, (103): 80-9, 1979.
7. ROSS, C.A.C. & DAWES, E.A. Resistance of the breast-fed infant to gastro-enterites. Lancet, 15:994-8, 1954.
8. SVISKY-GROSS, S. Pathogenic strains of coli (0.111) among prematures and the use of human milk in controlling the outbreak of diarrhea. Ann. Paediat., 190:109-15, 1958.
9. TORRES-GOITIA, J.; FERNANDEZ, F.R.; FERNANDEZ, P.R.; FERREIRA, S.M. & RIZZADINI, P.M. Estudos en lactancia materna. I. Resistencia de la leche materna a la contaminación bacteriana. Bol. med. Hosp. inf., 36:599-604, 1979.
10. WILLIAMSON, S.; HEWITT, J.H.; FINUCANE, E. & GAMSU, H.R. Organization of bank of raw and pasteurized human milk for neonatal intensive care. Brit. med. J., 1:393-6, 1970.
Recebido para publicação em 02/05/1983
Aprovado para publicação em 08/08/1983