Diabetes nos partos hospitalares em sistemas de saúde público e privado

Partos gestantes con diabetes en hospitales de los sistemas de salud público y privado

Carla Regina de Souza Teixeira Laércio Joel Franco Rosane Aparecida Monteiro Felipe Granado Sobre os autores

Resumos

OBJETIVO:

Analisar tendências da presença do diagnóstico de diabetes mellitus em partos hospitalares.

MÉTODOS:

Estudo transversal com dados analisados de partos hospitalares de gestantes residentes em Ribeirão Preto, SP, no período de 1998 a 2007. Os dados foram obtidos no Centro de Processamento de Dados Hospitalares da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, referentes à categoria diabetes mellitus na gravidez. Os dados analisados foram: faixa etária, tipo de parto (vaginal ou cirúrgico), duração da internação e tipo de assistência pública (SUS) ou privada (saúde suplementar e particular).

RESULTADOS:

Houve aumento de 3,9 vezes na proporção de partos com menção de diabetes em relação ao total de partos (p = 0,01). Esse aumento foi de 4,5 vezes nos partos pela assistência pública (p = 0,01) e de 3 vezes na assistência privada (p = 0,01). Observou-se aumento da presença de diabetes em todas as faixas etárias, proporcionalmente mais acentuado nas mais baixas. A frequência de parto cirúrgico nas gestações com menção de diabetes diminuiu de 64,5% em 1998/1999 para 39,8% em 2006/2007 na assistência pública; e na privada a frequência se manteve sempre acima de 90%.

CONCLUSÕES:

Houve tendência crescente da presença de diabetes mellitus nos partos hospitalares ao longo dos biênios, apesar da tendência de diminuição do número de partos e aumento da população feminina em idade reprodutiva residente em Ribeirão Preto. Essa tendência necessita não só de sua identificação e tratamento, mas também de intervenções pré-gestacionais que possam revertê-la.

Diabetes Gestacional; Parto Obstétrico; Cesárea; Hospitais Privados; Hospitais Públicos


OBJETIVO:

Analizar tendencias de la presencia de diagnóstico de diabetes mellitus en partos hospitalarios

MÉTODOS:

Estudio transversal con datos analizados de partos hospitalarios de gestantes residentes en Ribeirao Preto, SP, Brasil, en el período de 1998 a 2007. Los datos fueron obtenidos en el Centro de Procesamiento de Datos Hospitalarios de la Facultad de Medicina de Ribeirao Preto de la Universidad de Sao Paulo, referentes e la categoría diabetes mellitus en el embarazo. Los datos analizados fueron: grupo etario, tipo de parto (vaginal o quirúrgico), duración de la internación y tipo de asistencia pública (SUS) o privada (salud suplementaria y particular).

RESULTADOS:

Hubo aumento de 3,9 en la propo rción de partos con mención de diabetes con relación al total de partos (p= 0,01). Este aumento fue de 4,5 en los partos con asistencia pública (p=0,01) y de e, en la asistencia privada (p=0,01). Se observó aumento de la presencia de diabetes en todos los grupos etarios, proporcionalmente más acentuado en las más bajas. En los partos con mención de diabetes, la frecuencia del parto quirúrgico fue de 30% en la asistencia pública y de 90% en la asistencia privada. La frecuencia de parto quirúrgico en las gestaciones con mención de diabetes disminuyó de 64,5% en 1988/1999 para 39,8% en 2006/2007 en la asistencia pública; y en la privada se mantuvo siempre por encima de 90%.

CONCLUSIONES:

Hubo tendencia creciente de la presencia de diabetes mellitus en los partos hospitalarios a lo largo de los bienios, a pesar de la tendencia de disminución del número de partos y aumento de la población femenina en edad reproductiva residente en Ribeirao Preto. Esta tendencia necesita no solo de identificación y tratamiento, sino también de intervenciones pre-gestacionales que puedan revertirla.

Diabetes Gestacional; Parto Obstétrico; Cesárea; Hospitales Privados; Hospitales Públicos


INTRODUÇÃO

Atualmente, tem-se observado aumento na prevalência do diabetes em quase todos os países. No Brasil, estudo de base populacional realizado em capitais brasileiras, em 1986-1988, com população de 30 a 69 anos de idade mostrou uma prevalência de diabetes de 7,6% e, no município de São Paulo, de 9,7%.1212. Malerbi DA, Franco LJ; The Brazilian Cooperative Group on the Study of Diabetes Prevalence. Multicenter study of the prevalence of the diabetes mellitus and impaired glucose tolerance in the urban Brazilian population aged 30-69 yr. Diabetes Care. 1992;15(11):1509-16. DOI:10.2337/diacare.15.11.1509
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Estudos regionais mais recentes mostram taxas mais elevadas, de 15,0% na cidade de Ribeirão Preto, SP, em 2005-2007,1414. Moraes SA, Freitas ICM, Gimeno SGA, Mondini L. Prevalência de diabetes mellitus e identificação de fatores associados em adultos residentes em área urbana de Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, 2006: Projeto OBEDIARP. Cad Saude Publica. 2010;26(5):929-41. DOI:10.1590/S0102-311X2010000500015
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e de 13,5%, na cidade de São Carlos, SP, em 2008.44. Bosi PL, Carvalho AM, Contrera D, Casale G, Pereira MA, Gronner MF, et al. Prevalência de diabetes melito e tolerância à glicose diminuída na população urbana de 30 a 79 anos da cidade de São Carlos, São Paulo. Arq Bras Endocrinol Metab. 2009;53(6):726-32. DOI:10.1590/S0004-27302009000600006
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Com o aumento da prevalência do diabetes na população em geral, possivelmente esse aumento também deve estar ocorrendo entre gestantes.

Vários estudos relatam tendência crescente para o diabetes mellitus gestacional e pré-gestacional (DMG),77. Dabelea D, Snell-Bergeon JK, Hartsfield CL, Bischoff KJ, Hamman RF, McDuffie RS. Increasing prevalence of gestational diabetes mellitus (GDM) over time and by birth cohort: Kaiser Permanente of Colorado GDM Screening Program. Diabetes Care. 2005;28(3):579-84. DOI:10.2337/diacare.28.3.579
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, 88. Ferrara A, Kahn HS, Quesenberry CP, Riley C, Hedderson MM. An increase in the incidence of gestational diabetes mellitus: Northern California, 1991 - 2000. Obstet Gynecol. 2004;103(3):526-33. DOI:10.1097/01.AOG.0000113623.18286.20
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, 1111. Lawrence JM, Contreras R, Chen W, Sacks DA. Trends in the prevalence of preexisting diabetes and gestational diabetes mellitus among a racially/ethnically diverse population of pregnant women, 1999-2005. Diabetes Care. 2008;31(5):899-904. DOI:10.2337/dc07-2345
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que está associado com maior risco de morbidade e mortalidade materna e perinatal.22. American College of Obstetricians and Gynecologists. ACOG Practice Bulletin. Clinical management guidelines for obstetrician-gynecologists. Number 60, March 2005. Pregestational diabetes mellitus. Obstet Gynecol. 2005;105(3):675-85. , 66. Coustan DR. Gestational diabetes. In: National Diabetes Data Group. Diabetes in America. 2.ed. Bethesda (MD): National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases; 1995. p.703-17. (NIH Publication, Nº 95-1468). , 1818. Schaefer-Graf UM, Buchanan TA, Xiang A, Songster G, Montoro M, Kjos SL. Patterns of congenital anomalies and relationship to initial maternal fasting glucose levels in pregnancies complicated by type 2 and gestational diabetes. Am J Obstet Gynecol. 2000;182(2):313-20. , 2121. Schramm JMA, Szwarcwald CL, Esteves MAP. Assistência obstétrica e risco de internação na rede de hospitais do Estado do Rio de Janeiro. Rev Saude Publica. 2002;36(5):590-7. DOI:10.1590/S0034-89102002000600008
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Nos EUA, foi descrita tendência crescente da presença de DMG nos partos hospitalares, em todos os grupos etários, no período de 1994 a 2004, com aumento mais acentuado do diabetes tipo 2.1111. Lawrence JM, Contreras R, Chen W, Sacks DA. Trends in the prevalence of preexisting diabetes and gestational diabetes mellitus among a racially/ethnically diverse population of pregnant women, 1999-2005. Diabetes Care. 2008;31(5):899-904. DOI:10.2337/dc07-2345
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Estudo que avaliou as frequências de diabetes tipo 1 (DM1), tipo 2 (DM2) e DMG em 261 gestantes diabéticas em Ribeirão Preto, SP, entre 1992 e 1999, encontrou o DMG como condição predominante em 53,2% das gestantes.1313. Montenegro Jr RM, Paccola GMFG, Faria CM, Sales APM, Montenegro APDR, Jorge SM, et al. Evolução materno-fetal de gestantes diabéticas seguidas no HC-FMRP-USP no período de 1992-1999. Arq Bras Endocrinol Metab. 2001;45(5):467-74. DOI:10.1590/S0004-27302001000500010
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O objetivo do presente estudo foi analisar as tendências do diagnóstico de diabetes mellitus em partos hospitalares.

MÉTODOS

Estudo transversal que analisou dados sobre partos hospitalares em Ribeirão Preto, SP, entre 1998 e 2007, disponíveis no Centro de Processamento de Dados Hospitalares (CPDH) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, tanto do sistema público (Sistema Único de Saúde - SUS) como do privado, do município de Ribeirão Preto e dos municípios do XIII Departamento Regional de Saúde (DRS XIII). A partir do registro contínuo de informações referentes à utilização de leitos hospitalares e à caracterização da assistência prestada (utilizando a Folha de Alta Hospitalar, que é o instrumento informativo de dados coletados diretamente dos hospitais), os dados são encaminhados para o CPDH para serem codificados por especialistas em codificação de doenças e procedimentos, seguidos da consolidação nos bancos de dados, elaboração de relatórios estatísticos e processamento para pesquisa.

Os diagnósticos de alta hospitalar por parto foram identificados pelo diagnóstico principal (motivo da hospitalização) pelos códigos O80-O84, e a presença de diabetes na gravidez foi identificada pelo código O24, da 10ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10).aa Organização Mundial da Saúde. Classificação Estatística Internacional de doenças e problemas relacionados a saúde- CID-10. São Paulo: Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde para Classificação de Doenças em Português/ EDUSP;1997. Não foram analisados os tipos de diabetes, pois essa informação na Folha de Alta Hospitalar tem limitações quanto à sua confiabilidade ou é inexistente.

Foram consideradas como variáveis independentes: faixa etária, tipo de financiamento da internação (SUS e outros hospitais), tipo de parto e média de permanência das internações em dias.

As internações classificadas em não atendidas pelo SUS incluem as particulares, com pagamento direto ao médico e ao estabelecimento hospitalar, e as de pré-pagamento, tais como os planos de saúde, medicina de grupo, cooperativas, convênios ou de autogestão. Quanto ao tipo, os partos foram classificados de acordo com a resolução, a saber: vaginal (normal ou fórceps) ou cirúrgico (cesárea).

Para o estudo descritivo das variáveis, utilizou-se o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 17.0. Na apresentação dos resultados, os dados foram agrupados em biênios para menor variabilidade e melhor visualização dos resultados.

Para testar a hipótese de variação das taxas de DM ao longo do período estudado, foi utilizado um modelo de regressão no qual se considerou que o número de mulheres com DM mencionado no parto em cada biênio segue uma distribuição de Poisson, sendo a média o produto entre o total de gestações no biênio e a respectiva taxa de DM nos partos hospitalares. Para controlar efeitos de superdispersão dos dados, foi incluído no modelo um efeito aleatório com distribuição normal.11. Achcar JA, Coelho-Barros EA, Martinez EZ. Statistical analysis for longitudinal counting data in the presence of a covariate considering different frailty models. Braz J Probab Stat. 2008;22(2):183-205. Considerou-se que a taxa de DM mencionada no parto é relacionada ao tempo por uma função de ligação logarítmica, de forma que, ao se testar a significância do coeficiente associado ao tempo, é testada a hipótese nula de homogeneidade dessas taxas ao longo do período. Foram incluídos nessa função coeficientes que permitiram a estratificação das taxas por faixas etárias. Adotou-se, nos testes de hipóteses, nível de significância de 0,05. Utilizou-se para essa análise o SAS/STAT, versão 9.2.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética do Centro de Saúde Escola da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (Protocolo nº 51/2011).

RESULTADOS

No período de 1998 a 2007, por faixa etária, tipo de assistência, média de permanência e tipo de parto, observa-se tendência de diminuição no número total de partos ao longo dos biênios, proporcionalmente mais acentuada nas faixas etárias mais baixas. Em contrapartida, a frequência dos partos na faixa etária acima de 35 anos aumentou de 9,5% no biênio 1998-1999 para 12,7% no biênio 2006-2007. Houve predomínio de financiamento dos partos pelo SUS (60% do total). No período, a frequência de partos cirúrgicos foi de 30,2% na assistência pelo SUS e de 86,9% pelos demais hospitais. A média de permanência das internações por parto cirúrgico foi de 2,8 dias na assistência pelo SUS e de 1,6 dia nos demais hospitais; para partos vaginais, as médias de permanência foram de 1,9 a 1,2 dia, respectivamente (Tabela 1).

Tabela 1
Número de partos segundo faixa etária, assistência, tipo de parto e tempo médio de permanência hospitalar. Ribeirão Preto, SP, 1998-2007.

Em relação à presença do diagnóstico de DM nos partos hospitalares (Tabela 2), observou-se um aumento de 3,4 vezes no número de partos ao longo do período. Esse aumento ocorre em todas as faixas etárias, sendo mais acentuado naquelas mais baixas. Houve predomínio da assistência pública (SUS) nos partos de mulheres com DM em todos os biênios. No período de 1998 a 2007, nas gestantes com DM, a frequência de parto cirúrgico foi de 49,7% nas assistidas pelo SUS e de 93,2% nos demais hospitais; observou-se diminuição na proporção de partos cirúrgicos nas gestantes com diabetes atendidas pelo SUS (64,5% em 1998/1999 para 39,8% em 2006/2007), tendo sido a proporção de partos cirúrgicos em outros hospitais sempre acima de 90%. A duração média das internações por parto das gestantes com diabetes foi de 3,0 dias nos partos vaginais e de 3,8 dias nos partos cirúrgicos na assistência pelo SUS e respectivamente de 1,7 e 2,0 dias na assistência nos demais hospitais.

Tabela 2
Número de partos decorrentes de gestações com diabetes mellitus segundo a faixa etária, assistência, tipo de parto e tempo médio de permanência. Ribeirão Preto, SP, 1998-2007.

A Tabela 3 apresenta as porcentagens de partos com menção de diabetes, segundo a faixa etária e tipo de financiamento. A proporção de diabetes foi mais frequente e crescente na faixa etária de 35 anos ou mais (p = 0,01). Entretanto, mesmo na faixa etária de 15 a 24 anos, a presença do diabetes foi expressiva, com frequência crescente (p < 0,01) em proporção maior do que nas outras faixas etárias. Nos dois tipos de assistência ao parto, o aumento da frequência de diabetes foi estatisticamente significante, em todas as faixas etárias (SUS: 15-24 e 24-35, p < 0,01 e 35 ou mais, p = 0,01; nos demais hospitais: p = 0,01 em todas as faixas etárias; 15-24 e 25-34, p < 0,01 e 35 ou mais, p = 0,01). Tanto a proporção de diabetes quanto sua tendência de aumento foram mais acentuadas nos partos assistidos pelo SUS dos que nos demais hospitais, conforme pode ser observado nas Figuras 1 e 2.

Tabela 3
Porcentagem de partos decorrentes de gestações com diabetes mellitus segundo a faixa etária e tipo de assistência. Ribeirão Preto, SP, 1998-2007.

Figura 1
Proporção de partos hospitalares com menção de diabetes segundo faixa etária e tipo de assistência entre os biênios. Ribeirão Preto, SP, 1998-2007.

Figura 2
Proporção (%) do total de partos hospitalares com menção de diabetes por faixa etária entre os biênios. Ribeirão Preto, SP, 1998-2007.

DISCUSSÃO

Em relação à presença do diagnóstico de diabetes nos partos de residentes em Ribeirão Preto, observa-se acentuado aumento de 3,9 vezes no período de 1998 a 2007. Estudos internacionais de base populacional também mostram tendências de aumento da presença de diabetes na gravidez.22. American College of Obstetricians and Gynecologists. ACOG Practice Bulletin. Clinical management guidelines for obstetrician-gynecologists. Number 60, March 2005. Pregestational diabetes mellitus. Obstet Gynecol. 2005;105(3):675-85. , 77. Dabelea D, Snell-Bergeon JK, Hartsfield CL, Bischoff KJ, Hamman RF, McDuffie RS. Increasing prevalence of gestational diabetes mellitus (GDM) over time and by birth cohort: Kaiser Permanente of Colorado GDM Screening Program. Diabetes Care. 2005;28(3):579-84. DOI:10.2337/diacare.28.3.579
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, 88. Ferrara A, Kahn HS, Quesenberry CP, Riley C, Hedderson MM. An increase in the incidence of gestational diabetes mellitus: Northern California, 1991 - 2000. Obstet Gynecol. 2004;103(3):526-33. DOI:10.1097/01.AOG.0000113623.18286.20
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, 1111. Lawrence JM, Contreras R, Chen W, Sacks DA. Trends in the prevalence of preexisting diabetes and gestational diabetes mellitus among a racially/ethnically diverse population of pregnant women, 1999-2005. Diabetes Care. 2008;31(5):899-904. DOI:10.2337/dc07-2345
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Esses achados reforçam a hipótese de que o aumento da prevalência de diabetes descrita para a população de Ribeirão Preto1414. Moraes SA, Freitas ICM, Gimeno SGA, Mondini L. Prevalência de diabetes mellitus e identificação de fatores associados em adultos residentes em área urbana de Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, 2006: Projeto OBEDIARP. Cad Saude Publica. 2010;26(5):929-41. DOI:10.1590/S0102-311X2010000500015
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também pode ser observado no aumento da presença do DM nos partos de mulheres residentes na cidade.

Dessa forma, os dados mostram a tendência crescente da presença de DM nos partos ao longo dos biênios, apesar da tendência de diminuição do número total de partos e aumento da população feminina em idade reprodutiva residente em Ribeirão Preto.

Como a prevalência do DM aumenta com o progredir da idade,1111. Lawrence JM, Contreras R, Chen W, Sacks DA. Trends in the prevalence of preexisting diabetes and gestational diabetes mellitus among a racially/ethnically diverse population of pregnant women, 1999-2005. Diabetes Care. 2008;31(5):899-904. DOI:10.2337/dc07-2345
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, 1414. Moraes SA, Freitas ICM, Gimeno SGA, Mondini L. Prevalência de diabetes mellitus e identificação de fatores associados em adultos residentes em área urbana de Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil, 2006: Projeto OBEDIARP. Cad Saude Publica. 2010;26(5):929-41. DOI:10.1590/S0102-311X2010000500015
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o fato de se observar aumento na proporção de partos de mulheres em faixa etária mais alta pode estar colaborando para o aumento da presença de DM nas gestantes.

A idade materna mais avançada, definida como a idade de 35 anos ou mais na data prevista para o parto, tem se tornado mais frequente.55. Cleary-Goldman J, Malone FD, Vidaver J, Ball RH, Nyberg DA, Comstock CH, et al. Impact of maternal age on obstetric outcome. Obstet Gynecol. 2005;105(5 Pt 1):983-90. DOI:10.1097/01.AOG.0000158118.75532.51
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Conforme resultados obtidos em Ribeirão Preto, a proporção de partos nessa faixa etária aumentou de 9,5% no biênio 1998-1999 para 12,7% no biênio 2006-2007.

Neste estudo, a frequência do diagnóstico de DM nas altas hospitalares por partos em Ribeirão Preto foi de 2,1% no período, sendo de 0,8% no biênio 1998-1999 e de 3,2% no biênio 2006-2007. Nos partos assistidos pelo SUS, a frequência de diabetes foi maior do que naquele em outros hospitais, diferença que vem se acentuando nos últimos biênios e que chega a ser duas vezes maior no biênio 2006/2007 (4,0% versus 2,0%). Tal achado pode ser decorrente do fato de que a maioria dos serviços de referência para gravidez de alto risco pertence ao SUS.1313. Montenegro Jr RM, Paccola GMFG, Faria CM, Sales APM, Montenegro APDR, Jorge SM, et al. Evolução materno-fetal de gestantes diabéticas seguidas no HC-FMRP-USP no período de 1992-1999. Arq Bras Endocrinol Metab. 2001;45(5):467-74. DOI:10.1590/S0004-27302001000500010
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Dados internacionais apontam que em aproximadamente 7% das gestações é feito o diagnóstico de DM, com variação de 1% a 14%, dependendo da população estudada e dos testes de diagnóstico empregados.1010. International Association of Diabetes and Pregnancy Study Groups Consensus Panel. International Association of Diabetes and Pregnancy Study Groups recommendations on the diagnosis and classification of hyperglycemia in pregnancy. Diabetes Care. 2010;33(3):676-82 DOI:10.2337/dc09-1848
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, 1111. Lawrence JM, Contreras R, Chen W, Sacks DA. Trends in the prevalence of preexisting diabetes and gestational diabetes mellitus among a racially/ethnically diverse population of pregnant women, 1999-2005. Diabetes Care. 2008;31(5):899-904. DOI:10.2337/dc07-2345
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Não é possível detalhar os critérios utilizados para o diagnóstico de diabetes no presente estudo, pois os dados foram obtidos das Folhas de Alta Hospitalar de diversos hospitais, com os códigos de parto e das morbidades associadas. É provável que alguns casos de pré-diabetes, que atualmente seriam classificados como DMG pelos critérios atualmente propostos,1717. Reichelt AJ, Oppermann MLR, Schmidt MI. Recomendações da 2ª Reunião do Grupo de Trabalho em Diabetes e Gravidez. Arq Bras Endocrinol Metab. 2002;46(5):574-81. DOI:10.1590/S0004-27302002000500012
https://doi.org/10.1590/S0004-2730200200...
, 1919. Schmidt MI, Matos MC, Reichelt AJ, Forti AC, Lima L, Duncan BB. Prevalence of gestational diabetes mellitus: do the new WHO criteria make a difference? Diabet Med. 2000:17(5):376-80. DOI:10.1046/j.1464-5491.2000.00257
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não tenham sido categorizados como tal. Assim, a frequência da presença de DM nos partos hospitalares de Ribeirão Preto poderia estar subestimada.

Em relação à faixa etária de mulheres com presença de DM nos partos, observa-se que houve aumento em todas as idades, mais acentuadamente entre as mais jovens. Diversos estudos têm apresentado resultados semelhantes, apontando as preocupações sobre o aumento do diabetes entre mulheres mais jovens, grupo que se pensava ser de menor risco.99. Getahun D, Nath C, Ananth CV, Chavez MR, Smulian JC. Gestational diabetes in the United States: temporal trends 1989 through 2004. Am J Obstet Gynecol. 2008;198(5):525.e1 - 5. DOI:10.1016/j.ajog.2007.11.017
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, 1111. Lawrence JM, Contreras R, Chen W, Sacks DA. Trends in the prevalence of preexisting diabetes and gestational diabetes mellitus among a racially/ethnically diverse population of pregnant women, 1999-2005. Diabetes Care. 2008;31(5):899-904. DOI:10.2337/dc07-2345
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Na faixa etária de 15-24 anos, no período houve aumento de 6,4 vezes na proporção da menção do diabetes nos partos hospitalares.

Chama a atenção a queda observada na proporção de cesáreas nos partos com DM atendidos pelo SUS, que variou de 64,5% em 1998/1999 para 49,7% em 2006/2007, em contraste com os demais hospitais, que ficaram estáveis e acima de 90%. Portaria do Ministério da Saúde, de 1998,bb Ministério da Saúde. Portaria GM 2.816, de 29 e maio de 1998. Dispõe sobre aumento da remuneração do parto normal e limite máximo para pagamento de cesáreas por hospital. Diario Oficial 29/05/98 Seção I Pág. 9 que aumentou a remuneração ao parto normal e instituiu limite máximo para pagamento de cesáreas por hospital, pode ter contribuído para a queda da taxa de cesáreas no SUS.

Em relação ao tempo médio das internações, a média de permanência no período variou de 2,9 a 3,5 dias para os partos com DM, maior do que os que não tinham a presença do DM, que variou de 1,7 dia a 2,1 dias, independentemente do tipo de parto. A média de permanência nos partos assistidos pelo SUS é maior, seja se cirúrgico, seja vaginal, com ou sem DM. A maior média de permanência nas internações atendidas pelo SUS pode estar refletindo diversas situações, como: receber maior número de gestantes com complicações, o profissional que faz o parto não ser geralmente quem fez o pré-natal, e mesmo questões de gerenciamento. Tais aspectos merecem estudos específicos e não fizeram parte do escopo do presente estudo.

Outro aspecto a ser considerado é relativo à melhora da qualidade nos registros hospitalares ao longo do período estudado. No Brasil, nas últimas duas décadas, vem se ampliando o interesse em utilizar sistematicamente bancos de dados originados dos serviços de saúde como ferramenta na elaboração de políticas de saúde e no planejamento e gestão de serviços de saúde.33. Bittencourt SA, Camacho LAB, Leal MC. O Sistema de Informação Hospitalar e sua aplicação na saúde coletiva. Cad. Saude Publica. 2006;22(1):19-30. DOI:10.1590/S0102-311X2006000100003
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Os dados do presente estudo apontam tendência de crescimento no número de partos com a presença de DM, principalmente nas faixas etárias mais jovens, e nos partos assistidos tanto pelo serviço público como pelo privado. Diante desse panorama, ressalta-se a importância de se considerar a prevenção do diabetes mellitus antes do evento gestação, nas diversas faixas etárias.

Considerando-se os riscos de morbidade perinatal e materna associados ao diabetes, sua crescente importância na gravidez necessita não só de sua identificação e tratamento, mas também de intervenções pré-gestacionais, para que se possa reverter essa tendência de aumento de DM nas gestações.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2013

Histórico

  • Recebido
    27 Ago 2011
  • Aceito
    12 Nov 2012
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
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