Necessidade de aprimoramento do atendimento à saúde no sistema carcerário

Luiz Henrique Fernandes Carlos Willie Alvarenga Luciane Loures dos Santos Antonio Pazin FilhoSobre os autores

Resumos

OBJETIVO

Analisar a estrutura física, as condições de trabalho dos profissionais da saúde e o delineamento de processos estabelecidos em unidades prisionais.

MÉTODOS

Foram analisados 34 centros de detenção provisória e 69 unidades prisionais masculinas e seis femininas do Estado de São Paulo, Brasil, em 2009. Foi desenvolvido instrumento autoaplicativo para coleta de dados quantitativos sobre as características de estrutura, equipamento e pessoal para atendimento à saúde nas unidades prisionais. A análise de variância (ANOVA) ou equivalente não paramétrico e os testes de Qui-quadrado ou Fisher foram utilizados para comparação de variáveis contínuas ou categóricas, respectivamente, entre os grupos estudados.

RESULTADOS

Os principais problemas foram o retardo nos resultados de exames laboratoriais e de imagem. Quanto às equipes, grande maioria apresentou condições próximas da proposta pela Comissão InterGestores Bipartite 2013, mas sem que isso se refletisse em melhoria dos indicadores. Com relação ao processo, observou-se que mais de 60,0% das unidades prisionais estão localizadas em cidades pequenas, sem condições estruturais de saúde para garantir o atendimento secundário ou terciário para continuidade do processo de tratamento.

CONCLUSÕES

O perfil apresentado das unidades prisionais do País poderá ser utilizado para planejamento e acompanhamento de ações futuras para melhoria contínua das condições estruturais de saúde.

Prisões, organização & administração; Planos e Programas de Saúde; Equipe de Assistência ao Paciente; Riscos Ocupacionais


INTRODUÇÃO

O planejamento e execução de programas de saúde para a população carcerária é preocupação mundial.9. Sparrow N. Health care in secure environments. Br J Gen Pract. 2006;56(530):724-5. Essa população apresenta elevados níveis de distúrbios mentais, de doenças crônicas e de uso de drogas, superiores aos das populações das quais os indivíduos tiveram origem.9. Sparrow N. Health care in secure environments. Br J Gen Pract. 2006;56(530):724-5. Adicionalmente, qualquer ambiente de concentração populacional é propício ao agravo de condições de saúde prévias, bem como ao desenvolvimento de novos agravos, como doenças sexualmente transmissíveis ou de transmissão aérea. O crescimento da população carcerária aumenta essa problemática observada em diversos países. No Brasil, essa preocupação dura mais de uma década.aa Ferreira MCF, coordenador. Plano nacional de saúde no sistema penitenciário. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2004.

Muito embora diagnosticado, o problema é de difícil abordagem, pois a implantação de um programa de assistência ao detento defronta-se com inúmeros entraves: a variabilidade de agravos à saúde de acordo com as características da população carcerária; a capacidade instalada prevista e real para o atendimento; as características das equipes de saúde no que se refere à disponibilidade e capacitação; e a relação da unidade prisional com a hierarquia do Sistema Único de Saúde (SUS).

A população confinada no sistema penitenciário da região de Ribeirão Preto, SP, foi estimada em 4.698 indivíduos distribuídos em seis unidades prisionais (UP), sendo três no município de Ribeirão Preto (uma feminina, uma masculina e um centro de detenção provisória masculino) e três no município de Serra Azul (duas masculinas e um centro de detenção provisória masculino), em 2009. Essas unidades apresentaram taxa de ocupação entre 120,0% e 225,0% e número insuficiente de profissionais para a assistência da população encarcerada, produzindo intervenções pontuais de baixa resolubilidade, ações de pronto atendimento e necessidade elevada de deslocamento para serviços de saúde oferecidos fora das UP.

A sobrecarga de encaminhamentos para atendimento fora das UP gerou mais solicitações de escolta sem conseguir atender a todas as demandas. Tal dificuldade propiciou o início do diálogo entre os representantes das UP, mediados pela Coordenadoria da Saúde da Secretaria de Administração Presidiária e o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. O intuito inicial foi o de facilitar o atendimento dos presidiários referendados para essa instituição de modo a reduzir o risco que a duração prolongada da escolta significa quanto a deixar a população em geral desguarnecida. Dessa iniciativa, identificou-se a necessidade de mapear a estrutura física, o processo de trabalho dos profissionais de saúde, as condições gerais de atendimento, bem como o perfil dos encarcerados das UP da região de Ribeirão Preto, posteriormente ampliado para todo o Estado de São Paulo.

Este trabalho teve como objetivo analisar a estrutura física, as condições de trabalho dos profissionais da saúde e o delineamento de processos estabelecidos em UP do Estado de São Paulo.

MÉTODOS

O instrumento desenvolvido para coleta de dados das características estruturais e profissionais foi embasado no trabalho de Marshall et al6. Marshall T, Simpson S, Stevens A. Health care needs assessment in prisons: a toolkit. J Public Health Med. 2001;23(3):198-204. DOI:10.1093/pubmed/23.3.198
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e da Organização Mundial de Saúde,1. Adolfi Jr MS, Pallini FM, Pessotti H, Wolf CM, Patelli HT, Capeli RD, et al. Emergency medical coordination using a web platform: a pilot study. Rev Saude Publica. 2010;44(6):1063-71. DOI:10.1590/S0034-89102010000600011
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para favorecer comparação com outros estudos. Trata-se de questionário autoaplicativo, com dados quantitativos, a ser preenchido pelos gestores das UP, visando à generalização externa e possibilidade de reaplicação periódica para acompanhamento de processos futuros.

Esse questionário foi aplicado pelos pesquisadores em visitas in locu às seis UP do complexo Ribeirão Preto/Serra Azul em um projeto piloto e o instrumento foi aprimorado para ser aplicado junto aos gestores responsáveis pelo setor da saúde das UP do Estado de São Paulo.

O estudo envolveu 139 UP do Estado de São Paulo, mas a análise foi restrita a 34 centros de detenção provisória (CDP) e a 69 UP masculinas (UP-MASC) e seis femininas (UP-FEM), pois as demais instituições apresentam características diferentes de população carcerária. Para apresentação dos dados, a análise foi realizada utilizando-se esses grupos, apesar do número reduzido de UP-FEM para comparação absoluta. Foi realizada análise de sensibilidade com exclusão das UP-FEM quando os valores foram muito discrepantes sem alteração dos achados. A divisão nesses grupos procurou capturar a diferença esperada de comportamento entre o tipo de unidade prisional e o gênero.

A análise dos dados foi realizada utilizando o programa Stata versão 10 e o programa ArcGIS versão 9 para análise de geodistribuição. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HC-FMRP-USP (CAAE 2731.0.000.004-09), sendo respeitadas as necessidades de segurança recomendadas pela Secretaria da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo. Por se tratar de dados administrativos, foi obtida a dispensa do termo de consentimento.

RESULTADOS

Com relação às condições estruturais de atendimento, todas as unidades referiram dispor de local próprio, com prontuário médico e capacidade para solicitação de exames laboratoriais e de imagem. Quanto aos prontuários, todos os detentos possuíam prontuário clínico não informatizado, transferido com o presidiário no caso de mudança de unidade prisional. Observaram-se iniciativas variando entre 21,0% e 35,0% das unidades de informatização dos dados do prontuário, com o objetivo de facilitar o acompanhamento do processo de tratamento. No entanto, esses sistemas são variáveis e, por serem iniciativas locais não interconectam as diversas UP dispersas no Estado de São Paulo.

Quanto aos exames complementares, todos os entrevistados informaram que os exames laboratoriais eram colhidos na própria unidade e que havia demora da entrega desses resultados. Em relação aos exames de imagem, quanto maior a complexidade do exame, maior a dificuldade de ser realizado (9,0% em relação à radiografia e 71,0% nos casos de tomografia), e também havia demora para obtenção dos resultados. Os medicamentos disponíveis são previstos no programa Dose Certa,bb O Dose Certa é o Programa de Assistência Farmacêutica Básica da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo que fornece, gratuitamente, medicamentos para os municípios do Estado. Disponível em: http://www.saopaulo.sp.gov.br/acoesdegoverno/saude/#dose-certa mas cerca de 60,0% das unidades refere falta de medicamentos, principalmente anti-inflamatórios e benzodiazepínicos.

A Tabela 1 descreve as características dos profissionais de saúde envolvidos no atendimento. A Tabela 2 mostra a prevalência das necessidades de saúde dos detentos e a eventual capacidade de resolução. Na Tabela 3 encontra-se a interconexão das condições internas de atendimento com a hierarquia do SUS. A Figura ilustra a concentração da população carcerária no Estado de São Paulo de acordo com o município, tanto em valores absolutos como relativos à população do município sede.

Tabela 1
Distribuição dos profissionais de acordo com o tipo de unidade prisional. São Paulo, 2009.
Tabela 2
Distribuição das categorias de atenção à saúde de acordo com o tipo de unidade prisional. São Paulo, 2009.
Tabela 3
Parâmetros de fluxo de internos ao longo do Sistema Único de Saúde. São Paulo, 2009.

Figura.
(A) Mapa de distribuição da população de detentos nas unidades prisionais do Estado de São Paulo. (B) Mapa da área coberta pelo Departamento de Saúde XIII do Estado de São Paulo, municípios de Ribeirão Preto e Serra Azul (Microrregião administrativa de Ribeirão Preto) (B). Em I está destacado o número absoluto de detentos; em II a distribuição proporcional em relação à população do município.

DISCUSSÃO

O levantamento realizado permitiu observar que todas as UP tinham condições estruturais relativamente adequadas para atendimento clínico do detento, com condições de realização de exames laboratoriais e solicitação de exames de imagem, embora com demora no retorno dos resultados.

Quanto aos recursos humanos, os entrevistados informaram que existem equipes de profissionais disponíveis, mas o processo de atendimento é falho pela falta de equipes completas para o atendimento, sobretudo pela dificuldade na inclusão da população carcerária nas redes de atenção hierarquizadas do SUS. Essa realidade contradiz o modelo preconizado pela Portaria Interministerial nº 1777/03 que instituiu o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário, destinado a prover a atenção integral à saúde da população prisional.cc Ministério da Saúde. Plano nacional de saúde no sistema penitenciário. Brasília (DF); 2005. Recente portaria aprovada pela Comissão Intergestores Bipartite definiu que cada UP deveria conter uma equipe mínima composta por um médico (20h), um odontologista (20h), um enfermeiro (30h) e dois auxiliares de enfermagem (30h) para ser responsável por 500 a 1.200 detentos.dd São Paulo. Deliberação CIB – 62 de 6 de setembro de 2012. Diario Oficial Estado Sao Paulo. 07 set 2012; Seção 1:34. Essa mencionada Portaria está de acordo com o Plano Nacional de Saúde no sistema penitenciário, que prevê a instalação de equipes de saúde que tenha a mesma formação de uma equipe da Estratégia Saúde da Família (ESF) e que possa atender e resolver os problemas de saúde de nível primário, com resolutividade alta, diminuindo sobremaneira os encaminhamentos para outros níveis do sistema. Entretanto, quando necessário, a referência para os serviços de média e alta complexidade, inclusive as urgências, deve ser garantida.

Na Tabela 1 as recomendações da Comissão Intergestores Bipartite já seriam atingidas numa proporção razoável de profissionais por UP. Contudo, o que se observou na avaliação in locu é que, apesar de muitas vezes existir um profissional de referência, esse não cumpria toda a jornada e exercia função mais de pronto atendimento do que de estruturação de serviço de saúde, baseado em ações de promoção, prevenção, cura e tratamento dos agravos mais comuns.bb O Dose Certa é o Programa de Assistência Farmacêutica Básica da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo que fornece, gratuitamente, medicamentos para os municípios do Estado. Disponível em: http://www.saopaulo.sp.gov.br/acoesdegoverno/saude/#dose-certa

Essa proposta defende que a equipe atenda seguindo a mesma lógica da ESF, tendo como atribuições fundamentais o planejamento das ações, o trabalho interdisciplinar em equipe e a priorização das ações de vigilância e promoção da saúde, como a vacinação, que são as ações da atenção básica, de fácil realização e baixo custo, mas que não atingem 100% das UP, conforme visto na Tabela 2.

Unidades prisionais são evitadas por profissionais de saúde, que as consideram de alta periculosidade. Isso faz com que, embora exista um contingente de profissionais previstos, este frequentemente não esteja completo e a reposição seja morosa e difícil. As condições de trabalho oferecidas aos profissionais de saúde nas UP também devem ser avaliadas. As necessidades de documentação médico legal, acesso informatizado à rede de prestadores, segurança, contrarreferência e incentivos financeiros são condições de trabalho que podem motivar o profissional.

Uma das possibilidades para essa questão talvez seja o incentivo e a formação de profissionais com perfil mais adequado a essa realidade. Em outros países, médicos de família têm atuado em UP e têm se especializado em medicina em prisões, com carga horária diferenciada e formação específica nas afecções mais prevalentes nas UP.5. Ginsburg P, Koretz D. Bed availability and hospital utilization: estimates of the “Roemer effect.”Heal. Health Care Financ Rev. 1983;5(1):87-92.

Quanto à abordagem das condições nosológicas nas UP, observamos que a alta rotatividade dos detentos nos CDP dificulta ações de prevenção, promoção e de tratamento das condições mais prevalentes. Em 2009, a rotatividade foi de 120,0%, de acordo com os gerentes das UP, sendo impossível manter qualquer informação atualizada sobre a saúde se não houver um sistema de informatização que comunique as UP, além da aplicação de protocolos já estabelecidos. Outra questão que possibilitaria aumentar a resolutividade dos problemas de saúde da população encarcerada seria a implantação de protocolos clínicos e de regulação já disponíveis nos serviços públicos de saúde, que aumenta a resolutividade a um preço acessível e com medicações disponíveis na própria UP.

Algumas condições consideradas de suma importância em todos os complexos prisionais no mundo, como distúrbios mentais e uso de álcool e drogas, são reconhecidamente não identificadas ou abordadas apenas em situações complexas. Provavelmente, esse dado pode estar subestimado por receio dos gestores em informar uma situação sobre a qual não estejam tendo controle, levando à suspeita de que o problema seja ainda maior. O cuidado requerido para tratamento e prevenção desses problemas requer uma equipe multiprofissional, que tenha psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais e o médico de família. Os psicólogos e assistentes sociais são a maioria e, pelas visitas in locu, os verdadeiros responsáveis pelo funcionamento mínimo que se observa. Esses profissionais, se não ocupados por diferenciadas tarefas, poderiam ter mais tempo para auxiliar na identificação de problemas dessa natureza.

Outro indicador importante e de grande impacto para o bom funcionamento dos serviços de atenção à saúde refere-se à distribuição das UP do Estado de São Paulo e a representação proporcional em relação ao município em que estão alocadas. Como exemplo, observou-se que a população carcerária representa 40,0% ou mais da população total do município de Serra Azul. Considerando-se que o município é responsável pela atenção básica e que a instalação de recursos secundários e terciários de saúde é diretamente proporcional à população residente, não é de se estranhar que o maior problema relatado seja a continuidade do processo de atendimento para instâncias secundárias, terciárias ou em situação de emergência, pois em muitos desses municípios elas não estão disponíveis. Nesse sentido, seria importante que a política de implantação das UP levasse em conta a capacidade da rede de atenção à saúde do Sistema Único de Saúde (SUS), instalada no município, e que essa fosse integrada ao sistema referencial do SUS. No exemplo citado, todas as vezes que a população prisional de Serra Azul requer cuidado secundário ou terciário deve ser transferida para o município de Ribeirão Preto. Além de exigir a demanda de escolta, deve-se considerar que a população prisional também implica num aumento da “população flutuante” de familiares que acompanham o detento em suas transferências e que também poderá necessitar do sistema de saúde.

Em relação à prevalência de doenças crônicas, são escassos os estudos sobre tais doenças no âmbito das UP, dificultando comparações com outros serviços. Por ser tratar de estudo ecológico, onde o objeto do estudo foram UP e não os indivíduos, fica difícil estudar a efetividade das ações. Contudo, considerando-se a aparente desorganização do processo de trabalho e da integração com outros níveis do sistema de atenção à saúde, é esperado encontrar baixa resolutividade, além de certamente haver grande demanda reprimida.4. Condon L, Hek G, Harris F, Powell J, Kemple T, Price S. Users’ views of prison health services: a qualitative study. J Adv Nurs. 2007;58(3):216-26.

Pode-se observar que a tuberculose é ainda um problema nas UP, apesar de as taxas de tratamento alcançarem quase 100% com a instituição do tratamento supervisionado implantado. No entanto, enfrentam-se continuamente novas doenças de transmissão respiratória, como a H1N1, para as quais a taxa de contaminação é muito maior. Adicionalmente, a sobrelotação das UP pode implicar em situações de alto risco epidêmico. A medida de prevenção recomendada é a implantação de protocolos de triagem admissional mais estruturados que não estão disponíveis de forma adequada. Além de aprimorar o serviço de saúde prestado pela unidade prisional, ressalta-se a importância de garantir a referência com outros níveis da rede de atenção à saúde para que a ocorrência de surtos, como o observado em 2010 em cerca de 1.500 dos 3.000 detentosee Informações prestadas pela Vigilância Sanitária do Departamento Regional de Saúde XIII do Estado de São Paulo. de uma unidade prisional num município como Serra Azul, possa ser prevenida e combatida. As UP devem ser levadas em consideração na elaboração de planos de catástrofe em situações epidêmicas.

Para tanto, é necessário que outras medidas sejam tomadas em conjunto, como a capacitação de profissionais de saúde, principalmente os médicos, para atuar nas condições específicas do sistema penitenciário. Apesar de já ser demonstrado que esse ambiente pode ser cenário importante para a formação do médico, ainda são poucas as escolas médicas que incluem essa temática no currículo.2. Alemagno SA, Wilkinson M, Levy L. Medical education goes to prison: why? Acad Med. 2004;79(2):123-7. DOI:10.1097/00001888-200402000-00005
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A Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP é pioneira ao incluir a RCG0480 – Medicina de Confinamento – Estrutura de Atendimento à Saúde, Risco Ocupacional e Nosocomial, onde os alunos estudam a epidemiologia do ambiente prisional e são levados ao presídio.ff Pazin-Filho A, Macedo CSV, Barbosa HF. RCG0480 - Medicina de Confinamento - estrutura de atendimento à saúde, risco ocupacional e nosocomial. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2013. Disponível em: https://titanita.cirp.usp.br/moodle/course/info.php?id=426 Também no curso de Ginecologia e Obstetrícia da mesma instituição está incluído o atendimento em UPC-FEM. Esse trabalho pode vir a despertar o profissional para esse campo de trabalho e desfazer mitos sobre as condições de atendimento no sistema penitenciário.

A iniciativa da Comissão Intergestores Bipartite do Estado de São Paulo visa novas formas de enfrentar o problema de implantação das equipes mínimas, a partir do estabelecimento de parcerias Estado/Municípios, voltadas à atenção à saúde da população privada de liberdade, previstas pela Deliberação CIB-62, de 6/9/2012. Mesmo com essa iniciativa, ainda não é esperado que todas as metas propostas sejam alcançadas, sobretudo no que concerne às atividades preventivas,4. Condon L, Hek G, Harris F, Powell J, Kemple T, Price S. Users’ views of prison health services: a qualitative study. J Adv Nurs. 2007;58(3):216-26. , 1010 . Viggiani N. Unhealthy prisons: exploring structural determinants of prison health. Sociol Health Illn. 2007;29(1):115-35. tendo em vista a complexidade do contexto prisional. Nesse sentido, iniciativas realizadas na penitenciária masculina “Mário de Moura e Albuquerque”, localizada no município de Franco da Rocha, com a formação de presos para atuarem como agentes promotores de saúde, coordenada por essa equipe instalada, e a intervenção das universidades de saúde podem ser estratégias muito importantes para melhoria da assistência à saúde no sistema prisional.

Outro ponto importante é o auxílio da informática. Observou-se no trabalho a iniciativa de diversas unidades em estabelecer um sistema de controle dos processos de saúde e tratamento. Entretanto, essas iniciativas dependem de pessoas isoladas e não intercomunicam as UP. A informatização em saúde é um avanço importante para melhoria dos processos internos e para os registros epidemiológicos. O estabelecimento de prontuário eletrônico, como a inclusão da população prisional nos sistemas de dados nacionais (Datasus), deve ser priorizado.9. Sparrow N. Health care in secure environments. Br J Gen Pract. 2006;56(530):724-5. Além do prontuário eletrônico, o sistema carcerário deve ser integrado ao sistema de regulação médica de emergências, para que as solicitações de vagas sejam facilitadas e documentadas.1010 . Viggiani N. Unhealthy prisons: exploring structural determinants of prison health. Sociol Health Illn. 2007;29(1):115-35.

Uma das dificuldades encontradas para análise dos questionários foram questões não respondidas. É possível que algumas perguntas não tenham sido claras para os gestores e eles optaram por não responder. Apesar do cuidado na elaboração de um instrumento que fosse autoaplicativo, com linguagem clara e acessível, algumas questões poderiam ser mais bem interpretadas e, consequentemente, as informações seriam mais fidedignas se a entrevista fosse feita in locu, o que não foi viável pelo número de unidades que teriam que ser visitadas e às limitações orçamentárias do projeto. Outros estudos são necessários para caracterizar a população prisional e delimitar políticas de saúde. Entretanto, diante desse panorama documentado, a aplicação regular do instrumento utilizado neste estudo pode servir como indicador do comportamento da saúde, importante tanto para as novas recomendações da Comissão Intergestores Bipartite como para avaliação e acompanhamento dos indicadores de saúde.

Este trabalho apresentou um perfil das unidades prisionais do País, que poderá ser utilizado para planejamento e acompanhamento de ações futuras para melhoria contínua do processo de saúde.

AGRADECIMENTOS

À Secretaria da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo, pelo apoio e aplicação dos questionários às UP do Estado de São Paulo.

Aos responsáveis pelo setor da saúde das unidades prisionais do Estado de São Paulo, em especial aos profissionais dos municípios de Ribeirão Preto e Serra Azul.

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  • Estudo financiado pela Fundação de Apoio, Pesquisa e Assistência (FAEPA) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FAEPA/HC-98/2009) e pelo Programa Ensinar com Pesquisa da Universidade de São Paulo (PROEP/2009) (bolsa para os alunos da Faculdade de Medicina).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr 2014

Histórico

  • Recebido
    11 Maio 2013
  • Aceito
    16 Dez 2013
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@org.usp.br