Gravidade da maloclusão em adolescentes: estudo de base populacional no norte de Minas Gerais, Brasil

Marise Fagundes Silveira Rafael Silveira Freire Marcela Oliveira Nepomuceno Andrea Maria Eleutério de Barros Lima Martins Luiz Francisco Marcopito Sobre os autores

RESUMO

OBJETIVO

Identificar os fatores associados à gravidade da maloclusão em uma população de adolescentes.

MÉTODOS

Neste estudo transversal de base populacional, o tamanho da amostra (n = 761) foi calculado considerando prevalência de maloclusão de 50,0%, com nível de 95% de confiança e precisão de 5,0%. Foi adotada correção para o efeito de delineamento (deff = 2), e acréscimo de 20,0% para compensar perdas e recusas. Adotou-se amostragem probabilística por conglomerado em múltiplos estágios. Profissionais treinados e calibrados realizaram os exames intrabucais e entrevistas nos domicílios. A variável dependente, gravidade da maloclusão, foi avaliada pelo Índice de Estética Dental. As variáveis independentes foram agrupadas em cinco blocos: características demográficas, condição socioeconômica, uso de serviços odontológicos, comportamento relacionado à saúde e condições subjetivas de saúde bucal. Foi utilizado modelo de regressão logística ordinal para identificar os fatores associados à gravidade da maloclusão.

RESULTADOS

Foram entrevistados e examinados 763 adolescentes (taxa de resposta de 91,5%), dos quais 69,6% não apresentou anormalidades ou apresentou maloclusão leve. Maloclusão definida foi observada em 17,8% dos adolescentes, sendo grave ou muito grave em 12,6% dos adolescentes, com tratamento ortodôntico altamente necessário ou fundamental. As chances de maior gravidade de maloclusão foram maiores entre adolescentes que relataram ser negro, índio, pardo ou amarelo, ter menor renda per capita, ter hábitos bucais deletérios, ter percepção negativa de sua aparência e percepção do seu relacionamento social afetado pela condição bucal.

CONCLUSÕES

As maloclusões graves ou muito grave foram mais prevalentes entre adolescentes com desvantagem social, que relataram hábitos deletérios, que perceberam comprometimento estético e nas relações sociais. Visto que as oclusopatias podem interferir na autoimagem dos adolescentes, torna-se fundamental o aprimoramento de políticas públicas voltadas para a inclusão do tratamento ortodôntico entre os procedimentos de saúde acessíveis a essa população, sobretudo aos menos favorecidos socioeconomicamente.

Adolescente; Má Oclusão, epidemiologia; Fatores de Risco; Fatores Socioeconômicos; Autoimagem; Estudos Transversais

INTRODUÇÃO

Embora a cárie dentária tenha diminuído em diversos países, inclusive no Brasil, continua sendo o problema de saúde bucal mais prevalente entre crianças e adolescentes continua99. Frias AC, Antunes JLF, Junqueira SR, Narvai PC. Determinantes individuais e contextuais da prevalência de cárie dentária não tratada no Brasil. Rev Panam Salud Publica. 2007;22(4):279-85. DOI:10.1590/S1020-49892007000900008,1919. Peres SHCS, Carvalho FS, Carvalho CP, Bastos JRM, Lauris JRP. Polarização da cárie dentária em adolescentes, na região sudoeste do estado de São Paulo, Brasil. Cien Saude Coletiva. 2008;13(Supl 2):2155-62. DOI:10.1590/S1413-81232008000900020. À medida que as pessoas permanecem com seus dentes hígidos na boca, outros problemas de saúde bucal podem demandar atenção, como as maloclusões22. Alves JAO, Forte FDS, Sampaio FC. Condição socioeconômica e prevalência de más oclusões em crianças de 5 e 12 anos na USF Castelo Branco III- João Pessoa/Paraíba. Rev Dental Press Ortodon Ortop Facial. 2009;14(3):52-9. DOI:10.1590/S1415-54192009000300008. Maloclusões ou oclusopatias são consideradas problemas de crescimento e desenvolvimento dos ossos maxilares e mandibulares no período da infância e adolescência1111. Luiz RR, Costa AJL, Nadanovsky P. Epidemiologia e bioestatística na pesquisa odontológica. São Paulo: Atheneu; 2005.. Essas anomalias podem provocar alterações funcionais, estéticas ou psicossociais com impacto negativo nas atividades diárias dos indivíduos acometidos1616. Michel-Crosato E, Biazevic MGH; Crosato E. Relação entre maloclusão e impactos nas atividades diárias: um estudo de base populacional. Rev Odontol. 2005;34(1):3-42.. Apresentam etiologia multifatorial, sendo uma interação de fatores ambientais, congênitos, morfológicos e biomecânicos88. Emerich A, Fonseca L, Elias AM, Medeiros UV. Relação entre hábitos bucais, alterações oronasofaringianas e mal-oclusões em pré-escolares de Vitória, Espírito Santo, Brasil. Cad Saude Publica. 2004;20(3):689-97. DOI:10.1590/S0102-311X2004000300005.

As oclusopatias podem ser consideradas um problema de saúde pública, visto que apresentam alta prevalência e possibilidade de prevenção e tratamento2020. Peres KG, Traebert ESA, Marcenes W. Diferenças entre autopercepção e critérios normativos na identificação das oclusopatias. Rev Saude Publica. 2002;36(2):230-6. DOI:10.1590/S0034-89102002000200016. A demanda por tratamento ortodôntico na sociedade contemporânea tem crescido, no entanto, ainda são relativamente escassos estudos abrangentes, de base populacional, que investigaram a prevalência das maloclusões e sua associação com fatores sociodemográficos, uso de serviços odontológicos e autopercepção da saúde bucal entre adolescentes brasileiros. Neste contexto, o presente estudo objetivou identificar os fatores associados à maloclusão em uma população de adolescentes brasileiros.

MÉTODOS

Este estudo transversal de base populacional utilizou dados coletados no levantamento epidemiológico das condições de saúde bucal da população de Montes Claros, MG (Projeto SB-MOC)1414. Martins AMEBL, Guimarães ALS, Paula AMB, Pires CPAB, Haikal DS, Silva JM et al. Levantamento epidemiológico das condições de saúde bucal da população de Montes Claros – MG - Projeto SBMOC. Rev Unimontes Cient. 2012;14(1):3-14.. Montes Claros é uma cidade de porte médio, localizada no norte de Minas Gerais, na bacia do rio São Francisco, a 422 km da capital mineira. Apresenta índice de desenvolvimento humano (IDH) de 0,770 e renda per capita de R$650,62. É considerado o principal polo econômico e universitário da região, com economia baseada na indústria, serviços, comércio e agropecuária. De acordo com o censo demográfico de 2010aa Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, Cidades@. Minas Gerais: Montes Claros. Rio de Janeiro (RJ): Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2010 [citado 2011 ago 26]. Disponível em: http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=314330, o município possui população residente de 361.971 habitantes, dos quais 34.143 (9,4%) pertencem à faixa etária de 15 a 19 anos.

Trata-se de um levantamento epidemiológico de saúde bucal, que buscou estimar prevalências de diversos agravos à saúde bucal, como cárie dentária, doença periodontal, maloclusão, fluorose, entre outros, em adolescentes de 15 a 19 anos. O tamanho da amostra foi calculado visando a estimar parâmetros populacionais com prevalência de 50,0%, com nível de 95% de confiança e precisão de 5,0%. Foi adotada correção para o efeito de delineamento (deff = 2) decorrente da amostragem por conglomerado, e acréscimo de 20,0% para compensar perdas e recusas. Estimou-se uma amostra de, no mínimo, 761 pessoas.

O processo de amostragem foi por conglomerado em dois estágios. No primeiro, foram sorteados 52 dos 276 setores censitários urbanos existentes no município (fração amostral [f1] = 0,19) por amostragem aleatória simples (AAS). Para definição do número de setores foi considerada a média de domicílio por setor e a média de indivíduos por domicílio no município (dados baseados no senso de 2003 e estimados para 2008). No segundo estágio, por AAS, foi selecionada uma fração amostral (f2) das quadras em cada um dos 52 setores sorteados (f2 variou de 0,06 a 0,16), obtendo-se em média sete quadras por setor. Todos os domicílios das quadras selecionadas foram sequencialmente visitados e seus residentes pertencentes à faixa etária estudada foram convidados a participar da pesquisa. Na área rural, o processo de amostragem foi por conglomerado em um único estágio. Foram sorteadas duas das onze áreas rurais identificadas (f1 = 0,18) por AAS. Para definição do número de áreas foram considerados o número médio de domicílios nas áreas rurais, a média de indivíduos por domicílio e a proporção da população rural no município (dados fornecidos pela vigilância epidemiológica do município). Todos os domicílios situados a uma distância de até 500 m de uma instituição de referência (escola) foram selecionados e os seus moradores com idade entre 15 e 19 anos foram convidados a participar do inquérito. Detalhes sobre o procedimento amostral podem ser obtidos em outra publicação1515. Martins AMEBL, Santos-Neto PE, Batista, LHS, Nascimento JE, Gusmão AT, Eleutério NB et al. Plano amostral e ponderação pelo efeito de desenho de um levantamento epidemiológico de saúde bucal. Rev Unimontes Cient. 2012;14(1):15-29..

Para incorporar a estrutura do plano amostral complexo na análise estatística dos dados, cada entrevistado foi associado a um peso p, que correspondeu ao inverso de sua probabilidade de inclusão na amostra (f). Na área urbana, a seleção dos indivíduos foi constituída por dois estágios. Com isso, a probabilidade de inclusão dos mesmos foi obtida pelo produto da probabilidade de inclusão em cada um dos dois estágios (f = f1 x f2). Sendo f1 = probabilidade de inclusão no primeiro estágio e f2 = probabilidade de inclusão no segundo estágio. Considerou-se também a possibilidade de recusa na participação, o que acarretaria em diferentes possibilidades de inclusão. Assim, a taxa de resposta (tresposta) em cada setor foi incorporada e a probabilidade final de inclusão de cada indivíduo foi obtida pela expressão f = f1 x f2 x tresposta. Na área rural, a seleção dos indivíduos foi constituída por apenas um estágio, com isso a probabilidade de inclusão foi calculada pela expressão f = f1 x tresposta, considerando f1 = probabilidade de inclusão no primeiro estágio. Por fim, o peso de cada entrevistado foi obtido pelo inverso da probabilidade de inclusão (p = 1/f)1515. Martins AMEBL, Santos-Neto PE, Batista, LHS, Nascimento JE, Gusmão AT, Eleutério NB et al. Plano amostral e ponderação pelo efeito de desenho de um levantamento epidemiológico de saúde bucal. Rev Unimontes Cient. 2012;14(1):15-29..

O trabalho de campo foi executado por 24 equipes compostas por um anotador e um examinador previamente treinados e calibrados. No treinamento e calibração, as concordâncias inter e intraexaminadores foram estimadas pelo coeficiente de correlação intraclasse (CCI) para o índice de estética dental (DAI) e o kappa ponderado para os seus componentes, tendo como limite aceitável o valor de 0,60. Os examinadores com concordância superior a esse limite foram considerados aptos; os demais foram submetidos a mais um exercício de calibração, até atingir limite aceitável. Detalhes do processo de treinamento e calibração podem ser obtidos em outra publicação1313. Martins AMEBL, Silveira MF, Freitas CV, Eleutério, NB, Oliveira PHA, Ferreira RC. Desafios de um exercício de calibração para estudo epidemiológico envolvendo variáveis quantitativas e categóricas ordinais: um exemplo. Arq Odontol. 2011;47(4):196-207..

Os dados foram coletados empregando um computador de mão com um programa criado especificamente para esse fim, que permitiu a construção simultânea e automática do banco de dados. Foram realizados entrevistas e exames intrabucais em ambiente amplo sob iluminação natural com espelho e sonda Índice Periodontal Comunitário (CPI) da Organização Mundial de Saúde (OMS) previamente esterilizados. Os dados armazenados no computador de mão foram transferidos para um computador central e, em seguida, exportados para o programa PASW 17.0, para conferência, revisão e correção dos mesmos.

A variável dependente gravidade da maloclusão foi avaliada pelo DAI, que possibilitou a classificação dos indivíduos em: ausência de anormalidade ou maloclusão leve (DAI ≤ 25); maloclusão definida (DAI = 26 a 30); maloclusão grave (DAI = 31 a 35) e maloclusão muito grave (DAI ≥ 36)1313. Martins AMEBL, Silveira MF, Freitas CV, Eleutério, NB, Oliveira PHA, Ferreira RC. Desafios de um exercício de calibração para estudo epidemiológico envolvendo variáveis quantitativas e categóricas ordinais: um exemplo. Arq Odontol. 2011;47(4):196-207.. As variáveis independentes foram: (a) características demográficas: sexo (masculino; feminino), cor de pele autodeclarada (não branca; branca), estado conjugal (solteiro; casado ou união estável) e idade (em anos); (b) condição socioeconômica: escolaridade (≤ 8 anos de estudo; > 8 anos de estudo), renda per capita mensal (≤ R$200,00; > R$200,00), aglomeração do domicílio (mais de uma pessoa por cômodo; até uma pessoa por cômodo); (c) uso de serviços odontológicos: uso de serviço alguma vez na vida (nunca usou; usou), tipo de serviço odontológico utilizado (público ou filantrópico; privado, plano de saúde ou convênio), tempo desde a última consulta ao dentista (< 1 ano; ≥ 1 ano), realiza visitas periódicas ao dentista (não; sim); (d) comportamento relacionado à saúde: frequência de escovação dos dentes (< 3 vezes/dia; ≥ 3 vezes/dia), uso de fio dental (não usa; usa), uso de flúor tópico (não; sim), hábitos bucais deletérios (sim; não), hábitos tabagistas (sim; não), consumo de bebida alcoólica (sim; não), prática de atividade física (nunca ou raramente; ocasionalmente; frequentemente ou sempre); e (e) condições subjetivas de saúde bucal: autopercepção da saúde bucal (negativa; positiva), autopercepção da mastigação (negativa; positiva), autopercepção da aparência de dentes ou gengivas (negativa; positiva), da fala devido aos dentes ou gengivas (negativa; positiva), do relacionamento social afetado pela saúde bucal (afeta; não afeta).

A variável cor de pele foi categorizada em não branca (aqueles que declararam ser negro, pardo, amarelo ou indígena) e branca (aqueles que declararam ser branco). Quanto à renda per capita, a mediana da distribuição foi R$200,00, valor adotado como ponto de corte. A autopercepção da saúde bucal, da mastigação, da aparência e da fala foi considerada negativa quando o indivíduo avaliou como péssima, ruim ou regular; e positiva quando autopercebeu como ótima ou boa.

As variáveis foram descritas por meio de suas distribuições de frequências absolutas e relativas. Foi também estimado intervalo de 95% de confiança para a prevalência da maloclusão. Na análise dos fatores associados ao desfecho foi utilizado modelo de regressão logística ordinal (modelo de odds proporcionais)11. Abreu MNS, Siqueira AL, Caiaffa WT. Regressão logística ordinal em estudos epidemiológicos. Rev Saude Publica. 2009;43(1):183-94. DOI:10.1590/S0034-8910200900010025. Foram realizadas análises bivariadas e as variáveis que apresentaram nível descritivo inferior a 0,20 (p < 0,20) foram selecionadas para o modelo múltiplo77. Costa JFR, Chagas LD, Silvestre RM, organizadores. A política nacional de saúde bucal do Brasil: registro de uma conquista histórica. Brasília (DF): Organização Pan-Americana da Saúde; 2006. (Série técnica Desenvolvimento de sistemas e services de saúde. vol. 11).. Para construção do modelo de regressão múltipla, adotou-se o procedimento passo à frente (stepwise forward procedure), ou seja, iniciou-se o modelo com a variável com maior significância estatística, selecionada na análise bivariada e, em seguida, foram acrescentadas as demais variáveis, uma a uma, por ordem decrescente do nível descritivo. Variáveis que apresentaram associação significativa com o desfecho (p < 0,05) permaneceram no modelo final. Foram estimadas razões de chances (odds ratio) brutas e ajustadas, com seus respectivos intervalos de 95% de confiança.

A qualidade de ajuste do modelo final foi avaliada pelo teste de deviance e o pressuposto de odds proporcional, pelos testes de linhas paralelas11. Abreu MNS, Siqueira AL, Caiaffa WT. Regressão logística ordinal em estudos epidemiológicos. Rev Saude Publica. 2009;43(1):183-94. DOI:10.1590/S0034-8910200900010025. Todas as análises foram realizadas no programa estatístico PASW17.0, utilizando o módulo complex sample para análise de dados provenientes de amostras complexas, objetivando ajustar as estimativas de variabilidade na amostragem por conglomerados.

Este estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da Universidade Estadual de Montes Claros (Parecer 318/08). Todos os indivíduos que participaram da pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

Participaram do estudo 763 adolescentes, dos quais 99,6% residiam na área urbana. A taxa de resposta foi de 91,5% e o principal motivo das perdas foi a não localização dos adolescentes, após três visitas aos domicílios.

A média de idade dos adolescentes foi de 17,1 anos, sendo que a maior parte era do sexo feminino (52,7%), solteira (94,7%), autodeclarou ser de cor não branca (73,1%), estava frequentando instituições de ensino (73,9%), já haviam cursado mais de oito anos de estudo (77,2%) e possuía renda per capita mensal igual ou inferior a R$200,00 (58,7%). As demais características dos adolescentes estão descritas na Tabela 1.

Tabela 1
Distribuição dos adolescentes de 15 a 19 anos segundo características demográficas e socioeconômica, uso de serviços odontológicos, comportamento relacionado à saúde e condições subjetivas de saúde bucal. Montes Claros, MG, 2009.

Quanto à gravidade da maloclusão, constatou-se expressiva proporção (69,6%) de adolescentes sem anormalidades ou com maloclusão leve, enquanto a maloclusão definida foi observada em 17,8%. Cinquenta e seis (6,2%) e 49 (6,4%) adolescentes apresentavam oclusão grave e muito grave, respectivamente. As prevalências das condições oclusais avaliadas estão apresentadas na Tabela 2.

Tabela 2
Distribuição dos adolescentes de 15 a 19 anos segundo gravidade da maloclusão e condições oclusais avaliadas pelo índice de estética dental (DAI). Montes Claros, MG, 2009.

Os resultados da análise bivariada estão apresentados na Tabela 3. Nela, estão somente as variáveis que apresentaram p < 0,20 e foram selecionadas para a análise múltipla: cor de pele, escolaridade, renda per capita, aglomeração do domicílio, tempo desde a última consulta ao dentista, hábitos bucais deletérios, autopercepção da saúde bucal, da aparência e do relacionamento afetado pela saúde bucal.

Tabela 3
Distribuição da gravidade da maloclusão entre adolescentes de 15 a 19 anos segundo características demográficas e socioeconômicas, uso de serviços odontológicos, comportamento relacionada à saúde e condições subjetivas de saúde bucal. Montes Claros, MG, 2009.

Na Tabela 4 estão apresentados os resultados da análise múltipla. Dentre as características demográficas e socioeconômicas foram fatores associados à maior gravidade da maloclusão: adolescentes não brancos (OR = 1,5; IC95% 1,1–2,2) e que possuíam renda per capita mensal inferior a R$200,00 (OR = 1,5; IC95% 1,1–2,4). Os indivíduos que relataram prática de hábitos deletérios no presente ou no passado apresentaram maiores chances (OR = 17; IC95% 1,1–2,9) de estarem em uma categoria de maior gravidade da maloclusão. Dentre as condições subjetivas de saúde bucal, constituíram-se fatores associados à maior gravidade da maloclusão: adolescentes que autoperceberam a aparência como negativa (OR = 1,8; IC95% 1,1–3,1) e que autoperceberam o relacionamento social afetado pelas condições de saúde bucal (OR = 1,4; IC95% 1,1–2,1).

Tabela 4
Resultados da análise ajustada para gravidade da maloclusão entre adolescentes de 15 a 19 anos*. Montes Claros, MG, 2008-2009.

DISCUSSÃO

A prevalência de maloclusão na população investigada foi de 30,4%, e as chances de maior gravidade da maloclusão foram maiores entre os adolescentes com desvantagem social, que relataram hábitos deletérios e que perceberam comprometimento estético e nas relações sociais. Do ponto de vista da implantação de políticas públicas de saúde, as informações epidemiológicas apresentadas neste estudo são úteis para priorizar e alocar adequadamente os recursos necessários para o fornecimento de tratamento ortodôntico a adolescentes.

Apesar do rigor metodológico do projeto SB-MOC1414. Martins AMEBL, Guimarães ALS, Paula AMB, Pires CPAB, Haikal DS, Silva JM et al. Levantamento epidemiológico das condições de saúde bucal da população de Montes Claros – MG - Projeto SBMOC. Rev Unimontes Cient. 2012;14(1):3-14., o delineamento transversal deste estudo não possibilitou avaliar relações de causalidade entre a gravidade da maloclusão e os fatores investigados. Outra limitação refere-se ao processo amostral na zona rural, nos quais foram excluídos domicílios com distância superior a 500 m de uma instituição de referência, o que pode ter gerado um viés de seleção, visto que, em zonas rurais, 500 m não representam uma grande distância. Isso pode ter levado ao baixo percentual (0,4%) de adolescentes da zona rural na amostra. Sendo assim, é cauteloso assumir que essa amostra seja representativa apenas da população de adolescentes da zona urbana do Município de Montes Claros.

Foi observada predominância de adolescentes sem anormalidade ou com maloclusão leve, seguidos daqueles com maloclusão definida, muito grave e grave, que requerem tratamento ortodôntico eletivo, fundamental e altamente necessário, respectivamente. Esses resultados são semelhantes aos encontrados na Índia1616. Michel-Crosato E, Biazevic MGH; Crosato E. Relação entre maloclusão e impactos nas atividades diárias: um estudo de base populacional. Rev Odontol. 2005;34(1):3-42. e no levantamento epidemiológico nacional conduzido em 2010bb Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: pesquisa nacional de saúde bucal: resultados principais. Brasília (DF); 2011..

O apinhamento dentário (41,8%) e a relação molar (43,7%) foram os componentes do DAI mais prevalentes. Diferentes resultados foram encontrados na Hungria1010. Gábris K, Márlon S, Madléna M. Prevalence of malocclusions in Hungarian adolescents. Eur J Orthod. 2006;28(5):467-70. DOI:10.1093/ejo/cjl027, cujas alterações mais prevalentes foram desalinhamento maxilar (56,7%), desalinhamento mandibular (41,8%) e overjet maxilar (60,8%). Cerca de 20,0% dos adolescentes apresentaram overjet maxilar, similar ao observado em Lima, no Peru44. Bernabé E, Flores-Mir C. Orthodontic treatment need in Peruvian young adults evaluated though Dental Aesthetic Index. Angle Orthod. 2006;76(3):417-21. e em Recife, PE1212. Marques CR, Couto GB, Orestes CS. Assessment of orthodontic treatment needs in Brazilian schoolchildren according to the Dental Aesthetic Index (DAI). Community Dental Health. 2007;24(3):145-8.. A maioria (99,6%) dos adolescentes examinados não apresentou overjet mandibular, resultado semelhante ao encontrado na Hungria1010. Gábris K, Márlon S, Madléna M. Prevalence of malocclusions in Hungarian adolescents. Eur J Orthod. 2006;28(5):467-70. DOI:10.1093/ejo/cjl027. Também foram observadas prevalências expressivas de espaçamento no segmento anterior (19,2%) e diastema mediano (19,5%), corroborando com estudo prévio44. Bernabé E, Flores-Mir C. Orthodontic treatment need in Peruvian young adults evaluated though Dental Aesthetic Index. Angle Orthod. 2006;76(3):417-21.. Os desalinhamentos maxilar e mandibular acometeram, respectivamente, 22,6% e 24,8% dos adolescentes, percentuais inferiores aos relatados em estudos entre adolescentes de Lima, Peru44. Bernabé E, Flores-Mir C. Orthodontic treatment need in Peruvian young adults evaluated though Dental Aesthetic Index. Angle Orthod. 2006;76(3):417-21. e Hungria1010. Gábris K, Márlon S, Madléna M. Prevalence of malocclusions in Hungarian adolescents. Eur J Orthod. 2006;28(5):467-70. DOI:10.1093/ejo/cjl027.

As prevalências dos diferentes tipos de maloclusão observadas no presente estudo e na literatura mostram grande variabilidade nos achados, indicando a necessidade de se analisar em âmbito local as diferentes necessidades de tratamento entre populações. Possivelmente, essa variabilidade está relacionada à etiologia multifatorial das maloclusões88. Emerich A, Fonseca L, Elias AM, Medeiros UV. Relação entre hábitos bucais, alterações oronasofaringianas e mal-oclusões em pré-escolares de Vitória, Espírito Santo, Brasil. Cad Saude Publica. 2004;20(3):689-97. DOI:10.1590/S0102-311X2004000300005 ou decorrentes dos diferentes instrumentos de medidas adotadas para caracterizar os oclusopatias1818. Peres KG, Frazão P, Roncalli AG. Padrão epidemiológico das oclusopatias muito graves em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica. 2013;47(supl 3):109-17. DOI:10.1590/S0034-8910.2013047004366.

As chances mais elevadas de gravidade da maloclusão em adolescentes de cor de pele autodeclarada não branca já havia sido relatada no Brasil1818. Peres KG, Frazão P, Roncalli AG. Padrão epidemiológico das oclusopatias muito graves em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica. 2013;47(supl 3):109-17. DOI:10.1590/S0034-8910.2013047004366. Essa associação pode ser atribuída à pior condição socioeconômica desses grupos étnicos em relação aos brancos na sociedade brasileira33. Bastos JL, Peres MA, Peres KG, Dumith SC, Gigante DP. Diferenças socioeconômicas entre autoclassificação e heteroclassificação de cor/raça. Rev Saude Publica. 2008;42(2):324-34. DOI:10.1590/S0034-89102008005000005. Os jovens com renda per capita mais baixa também apresentaram maiores chances de maior gravidade de maloclusão quando comparados com àqueles com maior renda per capita, associação já observada em outro estudo brasileiro1818. Peres KG, Frazão P, Roncalli AG. Padrão epidemiológico das oclusopatias muito graves em adolescentes brasileiros. Rev Saude Publica. 2013;47(supl 3):109-17. DOI:10.1590/S0034-8910.2013047004366. No entanto, ainda são escassos estudos brasileiros que avaliaram a influência de fatores socioeconômicos sobre as maloclusões.

Parece existir uma complexa inter-relação entre os determinantes sociais da saúde bucal. As condições socioeconômicas influenciam indiretamente a gravidade da maloclusão, por influenciarem outros determinantes, como nível de escolaridade, padrões de comportamento e acesso a alimentos, produtos de higiene bucal e a serviços de saúde, especialmente o tratamento ortodôntico.

Os indivíduos que relataram prática de hábitos bucais deletérios apresentaram maiores chances de estarem em uma categoria de maior gravidade da maloclusão, independentemente das características demográficas e condição socioeconômica. Dentre os hábitos bucais deletérios, a sucção de chupeta e a de dedos podem causar maloclusões, uma vez que estes podem alterar o desenvolvimento normal do sistema estomatognático, devido a um desequilíbrio entre as forças musculares externas e internas66. Cavalcanti AL, Bezerra PKM, Moura C. Aleitamento natural, aleitamento artificial, hábitos de sucção e maloclusões em pré-escolares brasileiros. Rev Saude Publica. 2007;9(2):194-204.. Neste estudo, 41,2% dos adolescentes declararam que possuíam um ou mais tipos de hábitos bucais deletérios em algum momento de suas vidas, sendo que o hábito de roer unha e sucção de chupeta ou dedo foram os mais relatados (23,8% e 14,8%, respectivamente).

Em consonância com os achados de estudo anterior55. Borges CM, Peres MA, Peres KG. Associação entre presença de oclusopatias e insatisfação com a aparência dos dentes e gengivas: estudo com adolescentes brasileiros. Rev Bras Epidemiol. 2010;13(4):713-23. DOI:10.1590/S1415-790X2010000400015, os adolescentes que perceberam sua aparência como péssima/ruim e regular apresentaram maiores chances de maior gravidade da maloclusão, bem como aqueles que perceberam seus relacionamentos afetados pelas condições de saúde bucal. Não foi observada associação entre gravidade da maloclusão e autopercepção da mastigação ou da fala, sugerindo que as maloclusões não apresentaram impacto funcional perceptível pelos adolescentes. Esses achados sugerem uma tendência dos indivíduos de relacionar a maloclusão mais à estética do que a problemas funcionais1717. Peres KG, Barros AJD, Anselmi L, Peres MA, Barros FC. Does malocclusion influence the adolescent’s satisfaction with appearance? A cross-sectional study nested in a Brazilian birth cohort. Community Dent Oral Epidemiol. 2008;36(2):137-43. DOI:10.1111/j.1600-0528.2007.00382.x,2020. Peres KG, Traebert ESA, Marcenes W. Diferenças entre autopercepção e critérios normativos na identificação das oclusopatias. Rev Saude Publica. 2002;36(2):230-6. DOI:10.1590/S0034-89102002000200016. É provável que os indivíduos com problemas oclusais tenham percebido seus relacionamentos afetados pelas condições de saúde bucal por serem considerados menos atrativos socialmente, visto que, para o adolescente, a estética bucal desempenha importante papel na autoimagem e nas relações sociais.

Foi expressiva a prevalência de maloclusão na população investigada e cerca de um terço dos adolescentes apresentaram necessidade de tratamento ortodôntico. As oclusopatias mostraram-se associadas com variáveis que caracterizam desvantagem social, com hábitos deletérios, com a autopercepção negativa da aparência e autopercepção do comprometimento nas relações sociais. No norte de Minas Gerais, os serviços públicos prestados à população não oferecem tratamento ortodôntico, evidenciando problemas de acesso ao tratamento da maloclusão entre os adolescentes cujos pais não têm renda familiar suficiente para arcar com os elevados custos desse tratamento em consultórios particulares. Em consequência, esses jovens poderão enfrentar dificuldades de inserção social, já que as maloclusões podem representar uma desvantagem social para aqueles que não têm acesso ao tratamento. Torna-se fundamental o aprimoramento de políticas públicas voltadas para a inclusão do tratamento ortodôntico nos procedimentos de saúde acessíveis a essa população, sobretudo aos menos favorecidos socioeconomicamente.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Maio 2016

Histórico

  • Recebido
    16 Set 2014
  • Aceito
    31 Maio 2015
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
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