Utilização do Programa Farmácia Popular do Brasil por idosos

Vanessa Iribarrem Avena Miranda Anaclaudia Gastal Fassa Rodrigo Dalke Meucci Bárbara Heather Lutz Sobre os autores

RESUMO

OBJETIVO

Avaliar a prevalência e os fatores associados à utilização do Programa Farmácia Popular do Brasil – modelo expansão entre idosos e os motivos de não utilização.

MÉTODOS

Neste estudo transversal de base populacional, realizado na zona urbana de Pelotas, RS, foram avaliados 1.305 idosos (60 anos ou mais) que utilizaram medicamentos nos últimos 15 dias. Como variáveis independentes foram caracterizados fatores socioeconômicos, nível econômico, renda familiar em salários mínimos, escolaridade em anos de estudo e status ocupacional. As variáveis demográficas foram sexo, idade, situação conjugal e cor da pele autorreferida. Para análise dos fatores associados à utilização do PFPB-E, utilizou-se regressão de Poisson.

RESULTADOS

A prevalência de utilização do programa foi de 57,0% e a de conhecimento foi de 87,0%. Nos indivíduos com 80 anos ou mais, a utilização do programa foi de 41,0%. Quanto à origem das prescrições utilizadas pelos idosos, 46,0% eram oriundas do SUS. Os principais motivos para não utilização foram: dificuldade em conseguir receita, falta do medicamento, desconhecimento sobre os medicamentos ofertados e sobre o programa. Maior idade, menor renda, ter doença crônica e usar quatro ou mais medicamentos estiveram associados à utilização.

CONCLUSÕES

É preciso ampliar o conhecimento e a utilização do Programa Farmácia Popular do Brasil, especialmente entre os mais idosos, e melhorar a divulgação da lista de medicamentos do programa aos usuários e aos médicos. Dessa forma, será possível reduzir gastos com medicamentos de uso contínuo, que são especialmente importantes para essa população.

Idoso; Serviços Comunitários de Farmácia; Equidade no Acesso; Uso de Medicamentos; Farmacoepidemiologia; Estudos Transversais

INTRODUÇÃO

Garantir o acesso a medicamentos básicos e essenciais a todos os indivíduos é prioridade nas políticas de saúde atuais1313. Machado CV, Baptista TWF, Nogueira CO. Políticas de saúde no Brasil nos anos 2000: a agenda federal de prioridades. Cad Saude Publica. 2011;27(3):521-32. DOI:10.1590/S0102-311X2011000300012,aaMinistério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde. Política Nacional de Medicamentos: informe técnico institucional. Brasília (DF); 2000.. O Governo Federal lançou em 2004 o Programa Farmácia Popular do Brasil (PFPB), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)bbMinistério da Saúde. Programa Farmácia Popular do Brasil: manual básico. Brasília (DF); 2005.,ccMinistério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos. Programa Farmácia Popular do Brasil: manual de informações às unidades credenciadas: sistema de co-pagamento. 2.ed. Brasília (DF); 2008.,ddBrasil. Decreto nº 5.090, de 20 de maio de 2004. Regulamenta a Lei nº 10.858, de 13 de abril de 2004, e institui o programa “Farmácia Popular do Brasil” e dá outras providências. Brasília (DF); 2004 [citado 2015 set 16]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5090.htm . Essa estratégia visa promover a ampliação do acesso a medicamentos e se destina ao atendimento igualitáriobbMinistério da Saúde. Programa Farmácia Popular do Brasil: manual básico. Brasília (DF); 2005. de toda a população. Com isso, o PFPB visa evitar o abandono do tratamento, principalmente por parte dos indivíduos de baixa renda que utilizam serviços privados de saúde, mas que têm dificuldades em adquirir os medicamentos necessários em farmácias comerciais2020. Trevisan L, Junqueira LAP. Gestão em rede do SUS e a nova política de produção de medicamentos. Saude Soc. 2010;19(3):638-52. DOI:10.1590/S0104-12902010000300015,eeMinistério da Saúde. Portaria nº 749, de 15 de abril de 2009. Dispõe sobre a expansão do Programa Farmácia Popular do Brasil – Aqui Tem Farmácia Popular. Brasília (DF); 2009 [citado 2015 set 16]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2009/prt0749_15_04_2009.html .

O PFPB desenvolve dois eixos de ação: a rede própria de Farmácias Populares e o Aqui tem Farmácia Popular (PFPB-E). As Farmácias Populares, em funcionamento desde 2004, contam com um elenco de 112 medicamentos, dispensados pelo seu valor de custo, representando uma redução de até 90,0% do valor de mercado. O PFPB-E, considerado uma expansão do PFPB em parceria com farmácias e drogarias da rede privada, foi criado com o objetivo de ampliar a cobertura da assistência farmacêutica, promovendo a integralidade do atendimento à saúde55. Coelho Filho JM, Marcopito LF, Castelo A. Perfil de utilização de medicamentos por idosos em área urbana do Nordeste do Brasil. Rev Saude Publica. 2004;38(4):557-64. DOI:10.1590/S0034-89102004000400012. Nessa modalidade, o Ministério da Saúde (MS) subsidia 90,0% do valor de referência para doenças, como dislipidemia, Parkinson, glaucoma, osteoporose e rinite, além de anticoncepcionais e fraldas geriátricasffPortal Brasil. Gratuidade de medicamentos beneficia 14 milhões de pessoas. Brasília (DF); 2013 [citado 2013 mar]. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/governo/2013/02/gratuidade-de-medicamentos-beneficia-14-milhoes-de-pessoas.. A partir de 2011, com a criação do Saúde Não Tem Preço, os dois eixos de ação passaram a contar com medicamentos gratuitos para asma, diabetes e hipertensãoggMinistério da Saúde. Portaria nº 1.146, de 1º de junho de 2012. Altera e acresce dispositivos à Portaria nº. 971/GM/MS, de 17 de maio de 2012, para ampliar a cobertura da gratuidade no âmbito do Programa Farmácia Popular do Brasil. Brasília (DF); 2012 [citado 2015 set 16]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2012/prt1146_01_06_2012.html .

Embora o programa seja direcionado para todas as faixas etárias, é especialmente importante para idosos, os quais tendem a apresentar maiores necessidades de saúde, resultando em maior utilização dos serviços de saúde e de medicamentos55. Coelho Filho JM, Marcopito LF, Castelo A. Perfil de utilização de medicamentos por idosos em área urbana do Nordeste do Brasil. Rev Saude Publica. 2004;38(4):557-64. DOI:10.1590/S0034-89102004000400012,1919. Travassos C, Viacava F, Pinheiro R, Brito A. Utilização dos serviços de saúde no Brasil: gênero, características familiares e condição social. Rev Panam Salud Publica. 2002;11(5-6):365-73. DOI:10.1590/S1020-49892002000500011,hhWorld Health Organization. Envelhecimento ativo: uma política de saúde. Brasília (DF): Organização Pan-Americana da Saúde; 2005 [citado 2015 set 16]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/envelhecimento_ativo.pdf . Nesse sentido, o PFPB-E contribui no controle e prevenção de doenças crônicas, aumentando o acesso da população à terapia medicamentosa e reduzindo o impacto do custo dos medicamentos no orçamento familiar33. Bertoldi AD, Barros AJ, Camargo AL, Hallal PC, Vandoros S, Wagner A et al. Household expenditures for medicines and the role of free medicines in the Brazilian public health system. Am J Public Health. 2011;101(5):916-21. DOI:10.2105/AJPH.2009.175844.

Como o PFPB é relativamente novo, os estudos sobre ele são escassos e dão maior ênfase à rede própria, consolidada primeiramente, se detendo na descrição do programa, em termos de disponibilidade de medicamentos comparados ao setor público e privado e o perfil da população que acessa o programa88. Costa KS, Francisco PMSB, Barros MBA. Conhecimento e utilização do Programa Farmácia Popular do Brasil: estudo de base populacional no município de Campinas, SP. Epidemiol Serv Saude. 2014;23(3):397-408. DOI:10.5123/S1679-49742014000300003,1414. Pinto CB, Miranda ES, Emmerick IC, Costa Ndo R, Osório-de-Castro CGS. Preços e disponibilidade de medicamentos no Programa Farmácia Popular do Brasil. Rev Saude Publica. 2010;44(4):611-9. DOI:10.1590/S0034-89102010005000021,1515. Pinto CB, Costa NR, Osório-de-Castro CG. Quem acessa o Programa Farmácia Popular do Brasil? Aspectos do fornecimento público de medicamentos. Cienc Saude Coletiva. 2011;16(6):2963-73. DOI:10.1590/S1413-81232011000600034. Embora este estudo aborde o PFPB apenas na rede privada, visto que não há unidades próprias do programa na cidade de Pelotas, este é o primeiro estudo de base populacional que obteve informações sobre a utilização do PFPB-E para cada medicamento referidoiiFerreira RL. Análise de implantação do Programa Farmácia Popular do Brasil no Rio de Janeiro e no Distrito Federal: um estudo de casos [dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz; 2006.,jjJunges F. Avaliação do Programa Farmácia Popular do Brasil: aspectos referentes a estrutura e a processos [dissertação]. Porto Alegre (RS): Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2009..

Diante da importância da universalização do acesso a medicamentos para a saúde da população e do papel do PFPB para a ampliação desse acesso, objetivou-se avaliar a prevalência e os fatores associados à utilização do PFPB-E entre idosos e os motivos de não utilização.

MÉTODOS

Realizou-se estudo transversal de base populacional com idosos (60 anos ou mais) na zona urbana de Pelotas, RS. O município possui aproximadamente 46.099 idosos em área urbana (Censo demográfico de 2010, IBGE)kkInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico 2010: Cidades: Rio Grande do Sul: Pelotas. Rio de Janeiro; s.d.[citado 2014 dez 5]. Disponível em: http://cidades.ibge.gov.br/painel/painel.php?lang=&codmun=431440&search=|pelotas . Segundo dados da Vigilância Sanitária local, ele possui cerca de 165 farmácias e drogarias, das quais 62,0% estão vinculadas ao PFPB-E. Este estudo é parte da pesquisa “Avaliação da saúde de idosos da cidade de Pelotas”, realizada no primeiro semestre de 2014.

O cálculo do tamanho amostral para o estudo da prevalência da utilização do PFPB-E considerou os seguintes parâmetros: nível de confiança de 95%, prevalência estimada de 60,0%, erro aceitável de 4 pontos percentuais e acréscimo de 10,0% para perdas e recusas. Para avaliar os fatores associados ao desfecho, os parâmetros utilizados foram nível de confiança de 95%, poder estatístico mínimo de 80,0%, relação de 1:5 entre não expostos e expostos, prevalência estimada nos não expostos de 48,0%, razão de prevalência de 1,3 e acréscimo de 15,0% para fatores de confusão e efeito de delineamento de 1,5, totalizando um tamanho amostral estimado de 1.246 idosos.

A seleção da amostra foi realizada em dois estágios. No primeiro, os 488 setores censitários de Pelotas foram listados e ordenados de acordo com a renda média, realizando o sorteio sistemático de 133 setores. Essa estratégia garantiu a inclusão de diversos bairros da cidade e com situações econômicas distintas. No segundo estágio, realizou-se contagem dos domicílios ocupados nos setores selecionados, estimando-se aproximadamente um idoso para cada três domicílios, foram sorteados 31 domicílios por setor, com o intuito de reduzir os efeitos de delineamento e foram amostrados cerca de 10 domicílios em cada um dos setores selecionados, totalizando 4.123 domicílios. Todas as pessoas com 60 anos ou mais de cada domicílio foram convidadas a participar do estudo. Foram excluídos aqueles institucionalizados e impossibilitados de responder ao questionário devido a problemas mentais ou físicos e que não possuíssem acompanhante ou cuidador.

O desfecho utilização do PFPB foi definido como a obtenção de pelo menos um medicamento pelo PFPB-E entre idosos que utilizaram algum medicamento nos últimos 15 dias. O conhecimento sobre o PFPB foi verificado pela resposta afirmativa à pergunta “O(a) sr.(a) conhece o Programa Farmácia Popular?”.

Quando o entrevistado referia não ter adquirido o medicamento no PFPB-E ou em farmácias do SUS (municipal ou de unidades básicas de saúde), era questionado se havia tentado conseguir esse medicamento pelo PFPB-E. Em caso de resposta afirmativa, eram questionados os motivos pelos quais não conseguiu obter o medicamento e, em caso de resposta negativa, os motivos pelos quais não procurou o PFPB-E. Para todos os medicamentos utilizados pelos idosos, foram solicitadas as embalagens ou receitas para verificação do nome correto e posterior classificação por grupos farmacológicos. Para mapear a origem das prescrições, foi feita a pergunta: “Quem indicou esse remédio para o sr.(a)?” (médico ou dentista pelo SUS; médico ou dentista particular ou por convênio).

As variáveis independentes foram: fatores socioeconômicos; nível econômico, classificado de acordo com a Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP)llAssociação Brasileira de Empresas de Pesquisa – ABEP. Critério de Classificação Econômica Brasil – CCEB 2012: Base LSE 2010. Disponível em: http://www.abep.org/criterio-brasil (Classes A ou B; C; D ou E), renda familiar em salários mínimos categorizada (≤ 1; 2-3; 4-5; 6-9; ≥ 10), escolaridade em anos de estudo (nenhuma; até três anos; quatro a sete anos; oito a 10 anos; 11 ou mais) e status ocupacional (trabalhando; aposentado ou encostado; aposentado e trabalhando; do lar ou desempregado). As variáveis demográficas foram sexo (masculino; feminino), idade em anos, segundo quatro categorias (60-64; 65-69; 70-79; ≥ 80), situação conjugal (com companheiro; sem companheiro) e cor da pele autorreferida (branca; não branca).

Para descrição da amostra segundo morbidades, caracterizou-se o diagnóstico médico referido pelo entrevistado em: diabetes, hipertensão, doenças respiratórias (asma; bronquite; enfisema), rinite, glaucoma, doença de Parkinson, dislipidemia e osteoporose. Também investigou-se a necessidade de utilizar remédio de uso contínuo, por meio da pergunta “O(a) sr.(a) precisa tomar algum remédio de uso contínuo? Considere remédio de uso contínuo aquele que o(a) sr.(a) usa regularmente sem data para parar”, e examinou-se o número de medicamentos utilizados pelo idoso nos últimos 15 dias (1, 2, 3 e ≥ 4). O suporte social foi considerado presente se o idoso contasse com a ajuda de alguém para atender suas necessidades.

Treze entrevistadores treinados visitaram os domicílios selecionados para entregar uma carta de apresentação do estudo, a qual dava esclarecimentos e convidava os idosos a participar do estudo. A partir do aceite dos indivíduos elegíveis, as entrevistas eram agendadas de acordo com a disponibilidade dos idosos. Os questionários eletrônicos com questões pré-codificadas foram aplicados com netbooks.

Consideraram-se perdas e recusas as entrevistas não realizadas após três tentativas, sendo uma destas realizada por um supervisor do estudo. O controle de qualidade foi realizado pelo supervisor de campo a 10,0% dos entrevistados selecionados de forma aleatória. Utilizou-se versão reduzida do questionário, composta por 19 questões. A análise de concordância foi obtida pelo índice kappa.

As análises foram realizadas no software Stata 12.1. Realizou-se a descrição da amostra em relação às variáveis independentes e calculou-se a prevalência do desfecho utilização do PFPB-E com os respectivos intervalos de confiança para os indivíduos que utilizaram algum medicamento nos últimos 15 dias. Para o cálculo das prevalências dos motivos da não utilização do programa, utilizou-se uma análise estratificada por idade.

Os fatores associados à utilização do PFBB-E foram analisados por regressão de Poisson, utilizando o comando svy para considerar o efeito de delineamento do estudo. Variáveis com p > 0,2 não foram levadas para análise ajustada. A regressão seguiu um modelo hierárquico de seleção para trás, o qual compreende três níveis. O nível distal incluiu as variáveis demográficas e socioeconômicas; o segundo nível, a presença de morbidades; e o nível proximal, o conhecimento sobre o PFPB e o número de medicamentos utilizados. Foram utilizados os testes de Wald, para heterogeneidade e tendência linear paras as variáveis categóricas. Variáveis com p < 0,2 foram mantidas no modelo para controle de fatores de confusão. Considerou-se o nível de significância de 0,05.

Para a análise das prevalências de utilização do PFPB-E e fatores associados, utilizou-se como denominador o número total de idosos que utilizaram medicamentos nos últimos 15 dias. Para caracterizar os medicamentos (presença no PFPB-E, classificação por grupos farmacológicos, gratuidade dos medicamentos), utilizou-se como denominador o total de medicamentos utilizados.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pelotas (Parecer 472.357). Todos os participantes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido e receberam garantia da confidencialidade das informações prestadas.

RESULTADOS

Foram entrevistados 1.451 idosos. As perdas e recusas totalizaram 21,3% (n = 393), sendo a maioria mulheres e da faixa etária entre 60-69 anos. Das entrevistas, 4,0% foram respondidas por cuidador ou acompanhante. A maioria (90,5%) dos idosos utilizou pelo menos um medicamento nos últimos 15 dias. Entre esses, a média de idade foi de 70,9 anos (DP = 8,2), 64,8% eram mulheres, 84,2% tinham cor da pele branca, 52,4% tinham companheiro e 30,2% tinham quatro a sete anos de estudo. O status ocupacional predominante foi aposentado ou encostado (72,0%) e 42,7% apresentava renda familiar de dois a três salários mínimos e 51,8% estava no estrato econômico C (Tabela 1).

Tabela 1
Descrição da amostra de idosos que utilizaram medicamentos nos últimos 15 dias segundo variáveis demográficas e socioeconômicas e estratificadas por idade. Pelotas, RS, Brasil, 2014. (N = 1.305)

Cerca de 93,0% dos idosos relataram poder contar com a ajuda de alguém para atender às suas necessidades. Quanto às condições de saúde autorreferidas, 25,4% eram diabéticos, 71,5% hipertensos e 17,3% possuíam alguma doença respiratória (Tabela 1).

A prevalência de utilização do PFPB-E foi de 56,8% e a de conhecimento do programa foi de 87,4%. Cerca de 95,0% dos idosos precisavam tomar medicamento de uso contínuo, e 54,0% utilizavam quatro ou mais medicamentos (Tabela 1). Dos indivíduos que faziam uso contínuo de medicação e que tomaram algum medicamento nos últimos 15 dias, 53,9% utilizaram o PFPB-E para obtenção de pelo menos um medicamento (dados não apresentados em tabela). Considerando a estratificação etária, 71,3% dos idosos com 80 anos ou mais conheciam o PFPB, 41,2% utilizaram o programa e 64,1% utilizavam quatro ou mais medicamentos (Tabela 1).

Entre os 1.014 idosos que não adquiriram todos os seus medicamentos pelo PFPB-E ou diretamente em unidades do SUS, 54,0% haviam tentado adquirir pelo programa. Os principais motivos relatados pelos idosos para não terem conseguido algum medicamento pelo programa foram o medicamento não fazer parte da lista do PFPB-E (74,0%), dificuldade em conseguir a receita médica (17,0%) e falta do medicamento (13,0%). Entre aqueles que não tentaram conseguir o medicamento pelo PFPB-E, os principais motivos foram o medicamento não fazer parte da lista do PFPB-E (46,0%), desconhecimento sobre quais medicamentos estavam disponíveis (39,0%) e o não conhecimento sobre o PFPB (29,0%) (Tabela 2).

Tabela 2
Motivos da não utilização do Programa Farmácia Popular entre os idosos que não adquiriram todos os seus medicamentos pelo PFPB-E ou pelo SUS, nos últimos 15 dias de acordo com a idade. Pelotas, RS, Brasil, 2014. (N = 1.014)

Dos idosos com 80 anos ou mais que não adquiriram todos os seus medicamentos pelo PFPB-E ou pelo SUS, 42,0% tentaram conseguir os medicamentos pelo programa. Este grupo etário teve mais dificuldade de conseguir a receita médica (21,0%) e de ir até a farmácia (12,0%) do que os de 60 a 79 anos (16,0% e 4,0%, respectivamente). Aproximadamente 45,0% deles relataram a falta de conhecimento sobre o programa e sobre os medicamentos disponíveis como motivo para não tentarem conseguir o medicamento pelo PFPB-E. Entre os idosos com 80 anos ou mais, 16,0% apresentaram a dificuldade de deslocamento até a farmácia como motivo (Tabela 2).

A Tabela 3 descreve os fatores associados à utilização do PFPB-E. A análise bruta não mostrou associação com sexo, cor da pele, ocupação e suporte social. Idosos com 80 anos ou mais apresentaram utilização do PFPB-E 28,0% menor quando comparados àqueles de 60 a 64 anos, enquanto aqueles com companheiro utilizaram 13,0% mais em relação àqueles sem companheiro. A utilização do programa diminuiu linearmente com o aumento da renda e indivíduos com renda familiar igual ou maior que 10 salários mínimos utilizavam 34,0% menos o programa quando comparados com aqueles de menor renda.

Tabela 3
Fatores associados à utilização do programa farmácia popular nos últimos 15 dias. Pelotas, RS, Brasil, 2014.

Indivíduos com doenças crônicas como diabetes, hipertensão e dislipidemia utilizaram 19,0%, 52,0% e 31,0% mais o programa, respectivamente, do que os que não tinham essas morbidades. Idosos que conhecem o PFPB o utilizavam três vezes mais do que os que não o conhecem, e indivíduos que fazem uso de quatro ou mais medicamentos utilizam 40,0% mais o PFPB-E que aqueles que tomam apenas um medicamento (Tabela 3).

Dos 5.700 medicamentos utilizados pelos idosos, 32,9% (n = 1.873) faziam parte do PFPB-E e, desses, 67,6% (n = 1.249) foram adquiridos pelo programa, dos quais 79,3% (n = 991) foram obtidos gratuitamente. Quanto à origem da prescrição utilizada para obtenção dos medicamentos da farmácia popular, 54,4% foi por convênio ou particular. Os medicamentos mais utilizados pelo PFPB-E, conforme classificação farmacológica, foram os anti-hipertensivos (58,3%), antidiabéticos (18,7%) e os agentes modificadores de lipídios (17,5%) (Tabela 4).

Tabela 4
Descrição dos medicamentos presentes na lista do PFPB-E conforme utilização do programa. Pelotas, RS, Brasil, 2014. (N = 1.873)

Entre os medicamentos utilizados para condições crônicas como doenças respiratórias, diabetes e hipertensão, 41,9%, 85,2% e 58,9%, respectivamente, estavam presentes na lista do PFPB-E (dados não apresentados em tabela).

O efeito de delineamento do presente estudo foi de 1,14, coeficiente de correlação intraclasse de 0,0099 e o índice kappa da variável conhecimento do PFPB apresentou boa reprodutibilidade (kappa ≥ 0,7).

DISCUSSÃO

Dos idosos que utilizaram medicamentos, mais de 80,0% conheciam o PFPB e mais da metade o utilizaram. Entretanto, aqueles com 80 anos ou mais utilizaram menos o programa. Isso mostra que o programa está bem difundido, exceto entre os mais idosos. Além disso, parcela expressiva de idosos oriundos do SUS obtiveram medicamentos pelo PFPB-E, embora não sejam o grupo prioritário.

Em estudo de base populacional com adultos de 20 anos ou mais, realizado em 2008, o conhecimento sobre o PFPB foi de 32,8%88. Costa KS, Francisco PMSB, Barros MBA. Conhecimento e utilização do Programa Farmácia Popular do Brasil: estudo de base populacional no município de Campinas, SP. Epidemiol Serv Saude. 2014;23(3):397-408. DOI:10.5123/S1679-49742014000300003. O maior conhecimento sobre PFPB no presente estudo pode ser consequência do maior tempo decorrido entre a coleta de dados e o início do programa ou do fato de avaliar apenas idosos, que utilizam mais serviços de saúde e mais medicamentos, aumentando as oportunidades de receber orientações sobre o programa88. Costa KS, Francisco PMSB, Barros MBA. Conhecimento e utilização do Programa Farmácia Popular do Brasil: estudo de base populacional no município de Campinas, SP. Epidemiol Serv Saude. 2014;23(3):397-408. DOI:10.5123/S1679-49742014000300003,1010. Flores VB, Benvegnú LA. Perfil de utilização de medicamentos em idosos da zona urbana de Santa Rosa, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saude Publica. 2008;24(6):1439-46. DOI:10.1590/S0102-311X2012000100006.

As principais barreiras para utilização do programa são a falta da receita médica, falta do medicamento e o medicamento não fazer parte do programa, o que sugere dificuldade de acesso à consulta e programação insuficiente da oferta e distribuição dos medicamentos. Embora o número de medicamentos ofertados pelo programa seja amplo (incluindo a grande maioria dos tratamentos para condições crônicas) e a lista seja revisada periodicamente, é preciso avaliar se os medicamentos incluídos no programa contemplam adequadamente as necessidades terapêuticas da população99. Dal Pizzol TS, Trevisol DJ, Heineck I, Flores LM, Camargo AL, Köenig A et al. Adesão a listas de medicamentos essenciais em municípios de três estados brasileiros. Cad Saude Publica. 2010;26(4):827-36. DO:10.1590/S0102-311X2010000400024. Por outro lado, para os medicamentos que não fazem parte do programa, existem similares que estão incluídos, indicando que os médicos eventualmente não priorizam ou não conhecem os medicamentos do programa11. Aziz MM, Calvo MCM, d’Orsi E. Medicamentos prescritos aos idosos em uma capital do Sul do Brasil e a Relação Municipal de Medicamentos. Cad Saude Publica. 2012;28(1):52-64. DOI:10.1590/S0102-311X2012000100006,1616. Portela AS, Leal AAF, Werner RPB, Simões MOS, Medeiros ACD. Políticas públicas de medicamentos: trajetória e desafios. Rev Cienc Farm Basica Apl. 2010;31(1):9-14..

Percebe-se, também, que nos idosos com 80 anos ou mais a dificuldade de ir até a farmácia destaca-se como problema importante, visto que, na ausência do idoso, é necessário um representante legal para retirada de medicamento. Embora exista amplo conhecimento sobre a existência do programa, ainda há falta de informação, especialmente entre os idosos de 80 anos ou mais. A lista de medicamentos ofertados pelo programa é o aspecto sobre o qual a população provavelmente tem menos conhecimento.

A utilização do PFPB-E foi maior nos idosos com menos de 80 anos. A redução da utilização do programa nos idosos com 80 anos ou mais pode refletir iniquidade no acesso a medicamentos, visto que, a medida que a idade aumenta, o idoso tende a ser mais medicalizado. Essa iniquidade pode estar relacionada à incapacidade ou dificuldade de locomoção, que dificulta o acesso à consulta para renovação da receita e o deslocamento até o cartório para obtenção da procuração exigida nos casos de retirada de medicamento por representante legal.

O estudo foi consistente com os achados de Costa et al.88. Costa KS, Francisco PMSB, Barros MBA. Conhecimento e utilização do Programa Farmácia Popular do Brasil: estudo de base populacional no município de Campinas, SP. Epidemiol Serv Saude. 2014;23(3):397-408. DOI:10.5123/S1679-49742014000300003, que não encontraram associação entre sexo dos entrevistados e utilização do programa. As mulheres vivem mais, procuram mais os serviços de saúde22. Bertoldi AD, Barros AJD, Hallal PC, Lima RC. Utilização de medicamentos em adultos: prevalência e determinantes individuais. Rev Saude Publica. 2004;38(2):228-38. DOI:10.1590/S0034-89102004000200012 e utilizam mais medicamentos22. Bertoldi AD, Barros AJD, Hallal PC, Lima RC. Utilização de medicamentos em adultos: prevalência e determinantes individuais. Rev Saude Publica. 2004;38(2):228-38. DOI:10.1590/S0034-89102004000200012,1010. Flores VB, Benvegnú LA. Perfil de utilização de medicamentos em idosos da zona urbana de Santa Rosa, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saude Publica. 2008;24(6):1439-46. DOI:10.1590/S0102-311X2012000100006,1818. Silva GOB, Gondim APS, Monteiro MP, Frota MA, Meneses ALL. Uso de medicamentos contínuos e fatores associados em idosos de Quixadá, Ceará. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(2):386-95. DOI:10.1590/S1415-790X2012000200016. Assim, a falta de associação observada ocorre pela concentração de mulheres no grupo de 80 anos ou mais, que enfrenta barreiras para acessar o programa.

Indivíduos com companheiro utilizaram mais o PFPB-E, coerente com o fato de que indivíduos com companheiro utilizam mais os serviços de saúde77. Costa JSD, Reis MC, Silveira Filho CV, Linhares RS, Piccinini F. Prevalência de consultas médicas e fatores associados, Pelotas (RS), 1999-2000. Rev Saude Publica. 2008;42(6):1074-84. DOI:10.1590/S0034-89102008005000060,88. Costa KS, Francisco PMSB, Barros MBA. Conhecimento e utilização do Programa Farmácia Popular do Brasil: estudo de base populacional no município de Campinas, SP. Epidemiol Serv Saude. 2014;23(3):397-408. DOI:10.5123/S1679-49742014000300003. Com isso, esses indivíduos têm maior probabilidade de diagnosticar doenças, ter acesso à receita médica e receber informações a respeito do PFPB.

Este estudo mostra, de forma consistente com a literatura, que o programa atende todos os estratos socioeconômicos da população88. Costa KS, Francisco PMSB, Barros MBA. Conhecimento e utilização do Programa Farmácia Popular do Brasil: estudo de base populacional no município de Campinas, SP. Epidemiol Serv Saude. 2014;23(3):397-408. DOI:10.5123/S1679-49742014000300003,1515. Pinto CB, Costa NR, Osório-de-Castro CG. Quem acessa o Programa Farmácia Popular do Brasil? Aspectos do fornecimento público de medicamentos. Cienc Saude Coletiva. 2011;16(6):2963-73. DOI:10.1590/S1413-81232011000600034. Além disso, embora a maioria das prescrições utilizadas pelos idosos para obtenção dos medicamentos sejam provenientes do setor privado, o número de usuários da rede pública é alto, representando 46,0%, assim como Pinto et al.1414. Pinto CB, Miranda ES, Emmerick IC, Costa Ndo R, Osório-de-Castro CGS. Preços e disponibilidade de medicamentos no Programa Farmácia Popular do Brasil. Rev Saude Publica. 2010;44(4):611-9. DOI:10.1590/S0034-89102010005000021,1515. Pinto CB, Costa NR, Osório-de-Castro CG. Quem acessa o Programa Farmácia Popular do Brasil? Aspectos do fornecimento público de medicamentos. Cienc Saude Coletiva. 2011;16(6):2963-73. DOI:10.1590/S1413-81232011000600034 encontraram em sua pesquisa.

Um estudo de caso, realizado em 2007 e que inclui municípios das cinco regiões do Brasil, sugere que os usuários podem ter procurado o programa devido à pronta disponibilidade dos medicamentos e ao menor tempo de espera do atendimento1515. Pinto CB, Costa NR, Osório-de-Castro CG. Quem acessa o Programa Farmácia Popular do Brasil? Aspectos do fornecimento público de medicamentos. Cienc Saude Coletiva. 2011;16(6):2963-73. DOI:10.1590/S1413-81232011000600034. A centralização da compra de medicamentos pode reduzir custos da assistência farmacêutica, mas o fato de os medicamentos para asma, diabetes e hipertensão estarem disponíveis gratuitamente no PFPB não isenta a responsabilidade dos gestores estaduais e municipais de continuarem fornecendo esses medicamentos. Eles devem estar disponíveis nas farmácias da atenção primária à saúde, facilitando o acesso para os usuários do SUSmmMinistério da Saúde. Crescimento do Programa Farmácia Popular. Brasília (DF); 2013 [citado 2014 mar]. Disponível em: http://www.cosemsms.org.br/ultimas-noticias/farmacia-popular-nota-de-esclarecimento . Assim, falhas na provisão gratuita de medicamentos da rede pública municipal sobrecarregará a demanda do PFPB-E, gerando custos ao usuário, tanto com medicamentos não cobertos pelo programa como com deslocamento para acessar a farmácia.

A falta de medicamento nos setores público e privado (PFPB-E) implica maior comprometimento de renda nos gastos em saúde, que já são extremamente elevados. A situação torna-se ainda mais complicada para aqueles que não conseguem seguir o tratamento por falta de dinheiro para realizar a compra, o que muitas vezes gera o agravamento de seu estado de saúde44. Boing AC, Bertoldi AD, Peres KG. Desigualdades socioeconômicas nos gastos e comprometimento da renda com medicamentos no Sul do Brasil. Rev Saude Publica. 2011;45(5):897-905. DOI:10.1590/S0034-89102011005000054.

Concordando com estudos anteriores66. Costa HS, Borba ERC, Vilanova CM, Costa DM, Coutinho DF. Programa Farmácia Popular do Brasil: evolução do programa na cidade de São Luís - MA. Rev Pesq Saude. 2010;11(3):16-9.,1111. Inocencio M, De Vivo B. Acesso a medicamentos: análise das estratégias do estado para o desenvolvimento do Programa Farmácia Popular. Cad Gestao Publica Cidadania. 2011;16(59):201-21. DOI:10.12660/cgpc.v16n59.3700,1515. Pinto CB, Costa NR, Osório-de-Castro CG. Quem acessa o Programa Farmácia Popular do Brasil? Aspectos do fornecimento público de medicamentos. Cienc Saude Coletiva. 2011;16(6):2963-73. DOI:10.1590/S1413-81232011000600034,1717. Ruppenthal LR, Petrovick PR. Comparação do perfil dos usuários e dos medicamentos dispensados na Farmácia Popular do Brasil e em drogaria privada em Porto Alegre, Brasil. Latin Am J Pharm. 2010;29(1):22-9., os medicamentos do PFPB-E mais utilizados foram aqueles para condições cardiovasculares e os relacionados ao metabolismo. O que pode ser explicado, em parte, pelo fato de estes medicamentos estarem disponíveis de forma gratuita e pelo padrão de consumo desses medicamentos, que reflete o perfil das doenças crônicas mais prevalentes entre idosos55. Coelho Filho JM, Marcopito LF, Castelo A. Perfil de utilização de medicamentos por idosos em área urbana do Nordeste do Brasil. Rev Saude Publica. 2004;38(4):557-64. DOI:10.1590/S0034-89102004000400012,1212. Loyola Filho AI, Uchoa E, Firmo JOA, Lima-Costa MF. Estudo de base populacional sobre o consumo de medicamentos entre idosos: Projeto Bambuí. Cad Saude Publica. 2005;21(2):545-53. DOI:10.1590/S0102-311X2005000200021.

A amostra estudada é representativa da população idosa residente em áreas urbanas. As perdas não foram substancialmente diferentes da população estudada, o que reforça a validade interna. Como este estudo abordou somente as redes privadas do PFPB, os resultados são extrapoláveis para municípios com essas características. Para melhor qualificação da caracterização do desfecho, foram solicitadas as embalagens ou receitas de todos medicamentos referidos pelos entrevistados. A falta de outros inquéritos domiciliares relativos ao PFPB-E limitou a análise de consistência deste estudo.

Os resultados obtidos por este inquérito populacional ampliam o conhecimento a respeito da utilização do PFPB-E pela população idosa e dos motivos para a não utilização. Desta maneira, contribuem para a definição de políticas para qualificar o programa. Os idosos de 80 anos ou mais apresentam grande necessidade de acesso a medicamentos e, segundo dados do IBGE, o número de pessoas nessa faixa etária cresceu 70,0% entre 2000 e 2010nnInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico e contagem da população. Rio de Janeiro; 2014. Disponível em: http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/tabela . Esse cenário demanda medidas que diminuam a iniquidade na assistência farmacêutica deste grupo etário, bem como a ampliação da utilização do programa. Para isso, pode-se ampliar a atenção domiciliar de forma a facilitar a obtenção da receita médica. Entretanto, considerando as dificuldades de deslocamento característica deste grupo populacional, é crítico estudar alternativas para a exigência de procuração para a retirada do medicamento na farmácia por meio de representante legal.

É preciso divulgar, tanto para a população quanto para os médicos, a lista de medicamentos ofertados pelo programa. Esse conhecimento pode contribuir para ampliar a utilização do programa pelos idosos e para que os médicos, sempre que possível, direcionem a prescrição para medicamentos da lista, reduzindo os gastos com medicamentos de uso contínuo, que são especialmente importantes nessa população11. Aziz MM, Calvo MCM, d’Orsi E. Medicamentos prescritos aos idosos em uma capital do Sul do Brasil e a Relação Municipal de Medicamentos. Cad Saude Publica. 2012;28(1):52-64. DOI:10.1590/S0102-311X2012000100006,99. Dal Pizzol TS, Trevisol DJ, Heineck I, Flores LM, Camargo AL, Köenig A et al. Adesão a listas de medicamentos essenciais em municípios de três estados brasileiros. Cad Saude Publica. 2010;26(4):827-36. DO:10.1590/S0102-311X2010000400024.

O PFPB agregou enorme custo na assistência farmacêutica com o elenco atualmente disponível e a gratuidade dos medicamentos mais utilizados para asma, diabetes e hipertensão. Um medicamento do PFPB chega a custar até 290,0% a mais para o MS do que para a Farmácia Básica quando dispensa o mesmo medicamentoooCarraro WBWH. Desenvolvimento econômico do Brasil e o Programa Aqui Tem Farmácia Popular: limitantes e potencialidades [tese]. Porto Alegre (RS): Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS; 2014..

É fundamental que os municípios se responsabilizem pela assistência farmacêutica dos usuários do SUS, promovendo o acesso ao medicamento e a inserção efetiva da assistência farmacêutica como uma ação de saúde, especialmente para aqueles em áreas remotas, com oferta de medicamentos mais próximo do usuário. Esta estratégia é crucial para evitar gastos com medicamentos, deslocamento e até mesmo baixa aderência ao tratamento na população de baixa renda.

Agradecimentos

À Marília Guttier pelo apoio na construção do banco de medicamentos.

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DESTAQUES

Esse estudo objetivou gerar evidências a respeito da utilização do programa Farmácia Popular do Brasil (PFPB) e dos motivos da não utilização entre idosos que fazem uso de medicamentos. Entre os idosos, a prevalência de utilização do PFPB foi de 56,8% e a de conhecimento do programa foi de 87,4%.

As principais barreiras para utilização do programa para aqueles que não conseguiram algum medicamento foram: o medicamento não fazer parte da lista do PFPB (74,0%), dificuldade em conseguir a receita médica (17,0%) e falta do medicamento (13,0%). Esses motivos foram mais acentuados para os idosos acima de 80 anos de idade.

Aproximadamente 45,0% deles relataram a falta de conhecimento sobre o programa e sobre os medicamentos disponíveis como motivo para não tentarem conseguir o medicamento pelo PFPB. Os idosos com 80 anos ou mais apresentaram também como motivo a dificuldade de deslocamento até a farmácia.

A ampliação da utilização do programa pode ser feita, em parte, pela ampliação da atenção domiciliar de forma a facilitar a obtenção da receita médica. Também é preciso divulgar, tanto para a população quanto para os médicos, a lista de medicamentos ofertados pelo programa. Formas de facilitar a compra por parentes ou cuidadores evitando a necessidade de deslocamento dos idosos também podem aumentar a sua utilização.

Rita de Cássia Barradas Barata

Editora Científica

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Maio 2016

Histórico

  • Recebido
    10 Fev 2015
  • Aceito
    31 Maio 2015
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@org.usp.br