Custos do Programa de Tratamento do Tabagismo no Brasil

Andréa Cristina Rosa Mendes Cristiana Maria Toscano Rosilene Marques de Souza Barcellos Alvaro Luis Pereira Ribeiro Jonas Bohn Ritzel Valéria de Souza Cunha Bruce Bartholow Duncan Sobre os autores

RESUMO

OBJETIVO

Analisar os custos do Programa de Tratamento do Tabagismo no Sistema Único de Saúde e estimar o custo de sua implementação plena em um município brasileiro.

MÉTODOS

A abordagem intensiva e tratamento do tabagismo engloba consultas, sessões de terapia cognitivo-comportamental em grupo e uso de medicamentos. Os custos do atendimento e gerenciamento do programa foram estimados utilizando a metodologia do microcusteio. A implementação plena do programa no município de Goiânia, Goiás, foi definida como sua expansão para suprir a demanda de todos os fumantes motivados a parar de fumar no município que seriam atendidos pelo Sistema Único de Saúde. Foram considerados custos médicos e não médicos diretos: recursos humanos, medicamentos, material de consumo, despesas gerais, transporte, viagens, eventos e custos de capital. Foram incluídos custos dos níveis federal, estadual e municipal de gestão. A perspectiva da análise foi a do Sistema Único de Saúde. Análise de sensibilidade foi realizada variando parâmetros referentes à quantidade de atividades e aos recursos utilizados. As fontes de dados incluíram uma amostra de unidades de saúde da Atenção Primária, secretarias de saúde municipal e estadual e Ministério da Saúde. Os custos foram estimados em reais (R$) para o ano de 2010.

RESULTADOS

O custo do programa em Goiânia foi de R$429.079, sendo 78,0% referentes à abordagem e tratamento do tabagismo. O custo por paciente foi de R$534 e, por paciente que deixou de fumar, de R$1.435. A implementação plena do programa no município de Goiânia geraria custo de R$20,28 milhões, para atender 35.323 fumantes.

CONCLUSÕES

O Programa de Tratamento do Tabagismo tem bom desempenho em termos de custo por paciente que deixa de fumar. Tendo em vista a carga do tabagismo no Brasil, o tratamento para cessação de fumar deve ser considerado prioritário ao se programar a alocação de recursos de saúde.

Abandono do Hábito de Fumar, economia; Custos e Análise de Custo; Custos de Cuidados de Saúde; Sistema Único de Saúde; Tabagismo

INTRODUÇÃO

O tabagismo é doença epidêmica decorrente da dependência de nicotina e principal causa de mortes evitáveis no mundo, estimadas em 6 milhões, anualmenteaaWorld Health Organization. WHO report on the global tobacco epidemic 2013: enforcing bans on tobacco advertising, promotion and sponsorship. Geneva; 2013 [citado 2014 jun 25]. Disponível em: http://www.who.int/tobacco/global_report/2013/en/ . Estima-se que será responsável por mais de 175 milhões de mortes entre 2005-2030bbWorld Health Organization. WHO report on the global tobbaco epidemic, 2008: the MPOWER package. Geneva; 2008 [citado 2012 nov 12]. Disponível em: http://www.who.int/tobacco/mpower/2008/en/ .

A carga econômica do tabagismo para a sociedade também é expressiva. Os gastos anuais com tratamento de doenças tabaco-relacionadas e a perda de produtividade resultante da morbimortalidade do tabagismo geraram uma carga econômica de U$193 bilhões nos Estados Unidos entre 2000-200411. Adhikari B, Kahende J, Malarcher A, Pechacek T, Tong V. Smoking-attributable mortality, years of potential life lost, and productivity losses - United States, 2000-2004. MMWR Morb Mort Wkly Rep. 2008;57(45):1226-8. e €21 bilhões na Alemanha, em 20031313. Neubauer S, Welte R, Beiche A, Koenig HH, Buesch K, Leidl R. Mortality, morbidity and costs attributable to smoking in Germany: update and a 10-year comparison. Tob Control. 2006;15(6):464-71. DOI:10.1136/tc.2006.016030.

No Brasil, o tabagismo resultou em 130 mil mortes em 2008, 13,0% do total de óbitos, já superando estimativas internacionais de 10,0% de mortes atribuíveis ao tabaco em 2015. Os custos do tratamento das doenças tabaco-relacionadas foram de R$21 bilhões em 2011, considerando os sistemas de saúde público e suplementar1111. Mathers CD, Loncar D. Projections of global mortality and burden of disease from 2002 to 2030. PLoS Med. 2006;3(11):e442. DOI:10.1371/journal.pmed.0030442,ccPinto MT, Pichon-Riviere A, Biz A, Schluckbier L, Araújo A. Carga das doenças tabaco-relacionadas para o Brasil: relatório final. 2012 [citado 2012 nov 13]. Disponível em: http://actbr.org.br/uploads/conteudo/721_Relatorio_Carga_do_tabagismo_Brasil.pdf .

Desde a década de 1980, o Ministério da Saúde vem adotando várias ações para controle do tabagismo, que culminaram na criação do Programa Nacional de Controle do Tabagismo, coordenado pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA), a partir do início da década de 1990ddCarvalho CRS. O Instituto Nacional do Câncer e o controle do tabagismo: uma análise da gestão federal do tratamento do tabagismo no SUS [dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Fiocruz, Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca; 2009., e hoje parte integrante da Política Nacional de Controle do Tabaco, de caráter intersetorial. O programa engloba desde ações abrangentes, como promoção de ambientes livres de fumo, às mais focalizadas, como promoção e apoio à cessação de fumar. Com enfoque nesta última, o Programa de Tratamento do Tabagismo foi implementado no Sistema Único de Saúde (SUS), a partir de 2002, visando a aumentar o acesso do fumante aos métodos eficazes para cessação de fumar e adotando os métodos reconhecidos como primeira linha de tratamentoeeMinistério da Saúde, Instituto Nacional de Câncer. Programa Nacional de Controle de Tabagismo e Outros Fatores de Risco de Câncer. 2 ed. Rio de Janeiro; 2003. Disponível em: http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/3cd1b40047ea8d588830cd9ba9e4feaf/programa-nacional-de-controle-do-tabagismo-e-outros-fatores-de-risco-de-cancer.pdf?MOD=AJPERES&CACHEID=3cd1b40047ea8d588830cd9ba9e4feaf , conforme recomendações do Consenso para Abordagem e Tratamento do Fumante1010. Marques ACPR, Campana A, Gigliotti AP, Lourenço MTC, Ferreira MP, Laranjeira R. Consenso sobre o tratamento da dependência de nicotina. Rev Bras Psiquiatr. 2001;23(4):200-14. DOI:10.1590/S1516-44462001000400007. Em Goiás, o município de Goiânia foi o primeiro a implantar o programa, figurando entre os 88 municípios com tratamento do tabagismo no Brasil em 2005ddCarvalho CRS. O Instituto Nacional do Câncer e o controle do tabagismo: uma análise da gestão federal do tratamento do tabagismo no SUS [dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Fiocruz, Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca; 2009..

No modelo de tratamento adotado pelo Brasil, após consulta de avaliação inicial, os fumantes recebem a abordagem cognitivo-comportamental intensiva, terapia que combina intervenções cognitivas com treinamento de habilidades comportamentais1010. Marques ACPR, Campana A, Gigliotti AP, Lourenço MTC, Ferreira MP, Laranjeira R. Consenso sobre o tratamento da dependência de nicotina. Rev Bras Psiquiatr. 2001;23(4):200-14. DOI:10.1590/S1516-44462001000400007. A abordagem é realizada em grupo de 10 a 15 fumantes ou individualmente, sendo composta de quatro sessões iniciais estruturadas, de 90 minutos, preferencialmente semanais, seguidas de 12 sessões, até completar um ano de tratamento. O tratamento medicamentoso, quando indicado, é feito por meio da terapia de reposição de nicotina (TRN), com a utilização de adesivos transdérmicos de nicotina (21, 14 e 7 mg), goma de mascar ou pastilha de nicotina (2 e 4 mg) e do antidepressivo cloridrato de bupropiona (150 mg), utilizados individualmente ou em combinação. O programa também prevê a abordagem breve, realizada nas consultas de rotina, com duração de três a cinco minutosffMinistério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. Portaria nº 442, de 13 de agosto de 2004. Aprova o Plano de Implantação da Abordagem e Tratamento do Tabagismo na Rede SUS, na forma do Anexo I, e o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas – Dependência à Nicotina, na forma do Anexo II desta Portaria. Diario Oficial Uniao. 17 ago 2004; Seção1:62. Disponível em: ftp://ftp.cve.saude.sp.gov.br/doc_tec/cronicas/PortSAS442_ago04.pdf .

O gerenciamento do programa é feito de forma articulada pelos níveis federal, estadual e municipal de gestão do SUS. Os treinamentos, apoio técnico às atividades e distribuição dos insumos utilizados são feitos “em cascata”, desde o nível federal até o municipal. Material educativo e medicamentos são fornecidos pelo Ministério da Saúde, podendo haver complementação pelos estados e municípios. A coleta e consolidação das informações são feitas do nível local para o central.

A efetividade do aconselhamento breve, da terapia intensiva em grupo, da TRN, e da bupropiona foi evidenciada por diversas metanálises33. Cahill K, Stevens S, Perera R, Lancaster T. Pharmacological interventions for smoking cessation: an overview and network meta-analysis. Cochrane Database Syst Rev. 2013;5:CD009329. DOI:10.1002/14651858.CD009329.pub2,2323. Stead LF, Lancaster T. Group behaviour therapy programmes for smoking cessation. Cochrane Database of Syst Rev. 2005;(2):CD001007. DOI:10.1002/14651858.CD001007.pub2,2626. Stead LF, Buitrago D, Preciado N, Sanchez G, Hartmann-Boyce J, Lancaster T. Physician advice for smoking cessation. Cochrane Database Syst Rev. 2013;(5):CD000165. DOI:10.1002/14651858.CD000165.pub4. A combinação da terapia comportamental ao uso de medicamentos é recomendada, apresentando resultados ligeiramente melhores quando a abordagem comportamental é mais intensiva2424. Stead LF, Lancaster T. Combined pharmacotherapy and behavioural interventions for smoking cessation. Cochrane Database Syst Rev. 2012;(10):CD008286. DOI:10.1002/14651858.CD008286.pub2,2525. Stead LF, Lancaster T. Behavioural interventions as adjuncts to pharmacotherapy for smoking cessation. Cochrane Database Syst Rev. 2012;(12):CD009670. DOI:10.1002/14651858.CD009670.pub2. No Brasil, foram relatadas taxas de cessação entre 23,5% e 50,8%, após pelo menos seis meses do início do tratamento1414. Otero UB, Perez CA, Szklo M, Esteves GA, Pinho MM, Szklo AS, et al. Ensaio clínico randomizado: efetividade da abordagem cognitivo-comportamental e uso de adesivos transdérmicos de reposição de nicotina, na cessação de fumar, em adultos residentes no Município do Rio de Janeiro, Brasil. Cad Saude Publica. 2006;22(2):439-49. DOI:10.1590/S0102-311X2006000200021,2020. Sales MPU, Figueiredo MRF, Oliveira MI, Castro HN. Ambulatório de apoio ao tabagista no Ceará: perfil dos pacientes e fatores associados ao sucesso terapêutico. J Bras Pneumol. 2006;32(5):410-7. DOI:10.1590/S1806-37132006000500007,2121. Santos JDP, Duncan BB, Sirena SA, Vigo A, Abreu MNS. Indicadores de efetividade do Programa de Tratamento do Tabagismo no Sistema Único de Saúde em Minas Gerais, Brasil, 2008. Epidemiol Serv Saude. 2012;21(4):579-88. DOI:10.5123/S1679-49742012000400007.

Tendo em vista a escassez de recursos para a saúde, além da efetividade, é preciso considerar também os custos dos programas de saúde. Esses são ainda parte essencial das avaliações econômicas em saúde, que comparam alternativas de tratamento, produzindo informação sobre os custos e benefícios das mesmas, orientando assim a tomada de decisão77. Drummond MF, Sculpher MJ, Torrance GW, O’Brien BJ, Stoddart GL. Methods for the economic evaluation of health care programs. 3.ed. Oxford: Oxford University Press; 2005..

Estudos realizados nos Estados Unidos indicaram custos de programas de tratamento do tabagismo por participante de U$67 (aconselhamento telefônico breve sem TRN), U$268 (aconselhamento intensivo associado a TRN)88. Hollis JF, McAfee TA, Fellows JL, Zbikowski SM, Stark M, Riedlinger K. The effectiveness and cost effectiveness of telephone counselling and the nicotine patch in a state tobacco quitline. Tob Control. 2007;16 Suppl 1:i53-9. DOI:10.1136/tc.2006.019794 e U$183 (aconselhamento telefônico, farmacoterapia e promoção e propaganda)1818. Richard P, West K, Ku L. The return on investment of a Medicaid tobacco cessation program in Massachusetts. PLoS ONE. 2012;7(1):e29665. DOI:10.1371/journal.pone.0029665. No Brasil, não há, até o momento, estudos que avaliem o custo do programa implementado no SUS.

A estimativa de custos do Programa de Tratamento do Tabagismo no Brasil constitui, portanto, subsídio relevante para apoiar os gestores do SUS no planejamento das ações e maximização do uso dos recursos, bem como na tomada de decisão quanto à sua priorização, orientando a alocação eficiente de recursos.

O objetivo deste estudo foi estimar custos do programa em um município brasileiro, incluindo o tratamento do fumante e o gerenciamento do programa, considerando os diversos níveis de gestão envolvidos. Realizou-se também a estimativa dos custos caso o atendimento fosse ampliado para suprir plenamente a demanda dos fumantes do município motivados a parar de fumar.

MÉTODOS

Estudo de custos do Programa de Tratamento do Tabagismo, implementado na Atenção Primária. A unidade de análise foi o município de Goiânia, adotando-se como horizonte temporal o ano de 2010, tanto para mensuração dos dados quanto valoração dos insumos. Foi considerada a perspectiva do SUS, financiador do programa no setor público de saúde no Brasil, incluindo custos médicos e não médicos diretos e custos de gerenciamento. Custos indiretos não foram considerados.

As atividades realizadas foram identificadas e agrupadas em componentes dos dois eixos do programa: abordagem e tratamento do tabagismo e gerenciamento. O eixo abordagem e tratamento compreende os seguintes componentes: (i) consultas (médicas e de enfermagem), incluindo avaliação clínica inicial e consultas de retorno; (ii) sessões de abordagem cognitivo-comportamental intensiva, incluindo sua preparação e execução; e (iii) tratamento medicamentoso. Em Goiânia, as sessões em grupo são conduzidas ao longo de seis meses. A abordagem breve não foi considerada. O eixo gerenciamento inclui dois componentes: (i) apoio técnico e (ii) capacitação.

Os custos da abordagem e tratamento do tabagismo foram estimados considerando uma amostra de conveniência de unidades de saúde e extrapolados para o município como um todo, utilizando também dados disponíveis para todos os grupos realizados e pacientes atendidos. A amostra foi selecionada considerando os seguintes critérios: (i) sistematização e disponibilidade de informações; (ii) tempo de implantação do programa; (iii) quantidade de grupos; (iv) tipo de unidade; e (v) localização das unidades. Seis unidades de saúde foram selecionadas, considerando unidades de diferentes tipos e localização, com o maior número de grupos, tempo de implantação e melhor qualidade de informações. O gerenciamento do programa foi custeado considerando as atividades executadas pelas coordenações municipal, estadual e federal do programa.

As atividades dos dois eixos do programa foram custeadas por microcusteio, mensurando-se a quantidade utilizada de cada recurso e atribuindo-lhe o valor unitário correspondente. Os recursos utilizados foram identificados como itens de custo e categorizados como custos-médicos e não médicos, considerando custos recorrentes e de capital. A estrutura de custos, conforme os componentes e eixos do programa, é apresentada na Tabela 1. Foram incluídos os custos incorridos pelas três esferas de gestão do SUS.

Tabela 1
Estrutura de custos considerada para a estimativa de custos, conforme os eixos do Programa de Tratamento do Tabagismo. Goiânia, GO, Brasil, 2010.

Os custos compartilhados com outros programas e ações de saúde foram atribuídos ao Programa de Tratamento do Tabagismo utilizando-se como indicador da fração atribuível a proporção do tempo dos profissionais dedicada ao programa em relação ao tempo total das atividades-fim da unidade de saúde ou, no caso do gerenciamento, do setor administrativo onde se encontra a coordenação do programa.

Nas unidades amostradas, o custeio da abordagem e tratamento foi feito por grupo terapêutico, conforme a configuração de atendimento específica adotada na unidade quanto à frequência e duração das atividades, e profissionais envolvidos. Os dados foram obtidos em entrevistas com os coordenadores dos grupos. O tempo dos profissionais dedicado às sessões de abordagem cognitivo-comportamental foi obtido em entrevista individualizada, considerando a média de tempo para a estimativa de custo. O tempo das consultas e da dispensação de medicamentos foi arbitrado considerando a literatura2222. Santos V, Nitrini SMOO. Indicadores do uso de medicamentos prescritos e de assistência ao paciente de serviços de saúde. Rev Saude Publica. 2004;38(6):819-26. DOI:10.1590/S0034-89102004000600010,ggMinistério da Saúde. Portaria nº 1.101/GM, de 12 de junho de 2002. Estabelece os parâmetros assistenciais no âmbito do Sistema Único de Saúde. Diario Oficial Uniao. 13 jun 2002; Seção 1:36. Disponível em: http://www1.saude.ba.gov.br/regulasaude/2009/PN%20PORTARIAS%202009/nvos%20pdfs%202009/PT%20GM%201101%2012.06.2002.pdf . Remuneração de profissionais de saúde foi obtida nos sistemas de informação sobre recursos humanos da Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia (SMS) e da Secretaria Estadual de Saúde de Goiás (SES). A fonte de informação para preços dos medicamentos foi o Banco de Preços em Saúde (BPS)hhMinistério da Saúde. Secretaria Executiva. Departamento de Economia da Saúde, Investimentos e Desenvolvimento. Banco de preços em saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012 [citado 2012 fev 25]. Disponível em: http://aplicacao.saude.gov.br/bps/login.jsf , do Ministério da Saúde. Os demais dados foram obtidos de sistemas de informação gerenciais e registros administrativos da SMS, SES e Ministério da Saúde.

Para estimar o custo da abordagem e tratamento no município como um todo, considerou-se que todos os fumantes atendidos em 2010 (n = 803) foram submetidos a uma configuração comum de atendimento. Os parâmetros utilizados no cenário-base de estimativa de custos de cada componente da abordagem e tratamento e a respectiva fonte de dados são apresentados na Tabela 2.

Tabela 2
Parâmetros utilizados na estimativa de custos, conforme componente da abordagem e tratamento do tabagismo e tipo de custo. Goiânia, GO, Brasil, 2010.

O custo com recursos humanos foi obtido multiplicando-se a frequência da atividade pelo número de profissionais envolvidos, pelo tempo de duração e pela remuneração média dos profissionais, acrescida de encargos patronais. Ao valor obtido, foram somados os demais custos médicos (custo com equipamento de consultório para consultas e custo com TRN e antidepressivos para tratamento medicamentoso). Os custos não médicos foram estimados em função do percentual que representaram em relação aos custos médicos nas unidades amostradas. A soma de custos médicos e não médicos foi multiplicada pelo número de pacientes atendidos, para consultas e tratamento medicamentoso, e pelo número de grupos (n = 44), para sessões. Nas consultas, foram estratificados pacientes que receberam ou não medicamentos, considerando que pacientes presentes na quarta sessão de abordagem cognitivo-comportamental fizeram consultas de retorno. A soma do custo total com consultas, sessões de abordagem e tratamento medicamentoso resultou no custo total da abordagem e tratamento do tabagismo.

O custeio do gerenciamento foi feito por esfera de gestão. Os dados foram obtidos junto aos coordenadores do programa, em registros administrativos e sistemas de informação gerenciais das três esferas. A fração do custo federal e estadual atribuível ao município de Goiânia foi obtida com base no número de municípios gerenciados por estas coordenações. O total do gerenciamento atribuído ao município foi divido entre os grupos realizados.

A Figura apresenta a análise da estimativa de custo realizada, considerando a distribuição de todos os pacientes atendidos pelos componentes da abordagem intensiva e tratamento do tabagismo (A) e a estimativa final de custos do Programa de Tratamento do Tabagismo, incluindo o gerenciamento (B).

Figura
Representação esquemática da análise de estimativa de custos do Programa de Tratamento do Tabagismo. Goiânia, GO, Brasil, 2010.

Os resultados são apresentados como custo total do programa, por grupo, estratificados por item de custo, componente e fonte de financiamento. Custo por paciente foi estimado dividindo-se o custo do programa entre todos os pacientes atendidos na primeira sessão de abordagem cognitivo-comportamental. O custo por paciente que deixou de fumar corresponde ao custo total dividido pelos pacientes que estavam sem fumar ao final do tratamento.

A expansão do programa para suprir a demanda de todos os fumantes motivados a parar de fumar no município foi definida como implementação plena. Para a estimativa do número de fumantes a serem atendidos foi considerada a prevalência de fumantes na população com 15 anos ou mais de idade (17,0%)iiMinistério da Saúde, Instituto Nacional de Câncer; Organização Pan-Americana da Saúde. Pesquisa Especial de Tabagismo – PETab: relatório Brasil. Rio de Janeiro (RJ): INCA; 2011. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pesquisa_especial_tabagismo_petab.pdf ,jjOs parâmetros obtidos desta pesquisa referem-se ao estado de Goiás e foram utilizados como uma proxy para o município de Goiânia., o percentual destes que tenta parar de fumar (41,8%)iiMinistério da Saúde, Instituto Nacional de Câncer; Organização Pan-Americana da Saúde. Pesquisa Especial de Tabagismo – PETab: relatório Brasil. Rio de Janeiro (RJ): INCA; 2011. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pesquisa_especial_tabagismo_petab.pdf ,jjOs parâmetros obtidos desta pesquisa referem-se ao estado de Goiás e foram utilizados como uma proxy para o município de Goiânia., descontando a taxa de cessação natural, ou seja, os que deixariam de fumar sem tratamento (2,5%)55. Cinciripini PM, Hecht SS, Henningfield JE, Manley MW, Kramer BS. Tobacco addiction: implications for treatment and cancer prevention. J Natl Cancer Inst. 1997;89(24):1852-67. DOI:10.1093/jnci/89.24.1852, e indivíduos previamente atendidos em 2010 (803). Foram considerados os fumantes potenciais usuários do SUS para o tratamento (50,0%)iiMinistério da Saúde, Instituto Nacional de Câncer; Organização Pan-Americana da Saúde. Pesquisa Especial de Tabagismo – PETab: relatório Brasil. Rio de Janeiro (RJ): INCA; 2011. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pesquisa_especial_tabagismo_petab.pdf .

Os fumantes foram distribuídos pelos três componentes da abordagem e tratamento, conforme configuração de atendimento comum do município, considerando eficiência máxima: todas as unidades da Atenção Primária realizando dois grupos de 15 fumantes ao ano, com provisão de medicamentos para 84,0% deles, conforme grau de dependência à nicotina dos pacientes de 2010, medido pelo Teste de Fagerström. O custo do gerenciamento foi estimado multiplicando-se o custo anual de 2010 pela quantidade de anos necessários para acesso de todos os fumantes ao tratamento.

Análise de sensibilidade foi realizada para avaliar o impacto da variação de parâmetros nos resultados de custos da abordagem e tratamento. Foram variados parâmetros não conhecidos ou com valores diversos em fontes de informação distintas. Além do cenário-base, três novos cenários foram criados: (i) Orientações SMS-Goiânia – considerando recomendações ou registros administrativos da coordenação municipal do programa; (ii-iii) Mínimo e Máximo, considerando respectivamente valores mínimos e máximos encontrados nas unidades amostradas e fontes de dados (Tabela 3).

Tabela 3
Parâmetros variados na análise de sensibilidade, para estimativa de custos do Programa de Tratamento do Tabagismo nos diferentes cenários considerados. Goiânia, GO, Brasil, 2010.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (Protocolo 155/2011).

RESULTADOS

Nas unidades amostradas, o custo da abordagem e tratamento por grupo terapêutico, composto de oito a 36 fumantes, variou de R$2.937 a R$9.864. Deste total, custos médicos representaram, em média, 85,8% e custos com recursos humanos, 73,1% (variando de 62,3% a 90,2%). Incluindo os custos de gerenciamento, o custo total do Programa de Tratamento do Tabagismo por grupo variou entre R$5.130 e R$12.057. A maior participação no financiamento do programa foi do município, responsável por 78,2% do custo total, seguido do nível federal (13,6%) e estadual (8,4%). A maior participação federal foi relacionada a medicamentos, sendo o Ministério da Saúde responsável por 67,7% do custo total com TRN e bupropiona.

No município como um todo foram realizados 44 grupos, de seis a 55 fumantes, gerando um custo total do programa de R$429.079 no cenário-base, sendo 78,0% referente a abordagem e tratamento do tabagismo. O componente de maior participação nos custos da abordagem e tratamento foram sessões de abordagem cognitivo-comportamental (54,0%), seguidas de tratamento medicamentoso (24,3%) e consultas (21,7%). O custo médio por paciente foi de R$534 e por paciente que deixou de fumar, de R$1.435. O custo médio do tratamento medicamentoso por paciente que fez uso de TRN ou bupropiona foi de R$174. Na análise de sensibilidade, os resultados variaram nos cenários mínimo e máximo, mas não no cenário Orientações SMS-Goiânia (Tabela 4).

Tabela 4
Custo total do Programa de Tratamento do Tabagismo no município, conforme os cenários adotados. Goiânia, GO, Brasil, 2010.

Para a implementação plena do programa seriam necessários R$20,28 milhões, beneficiando 35.323 fumantes motivados a parar de fumar, de um total de 175.331 fumantes, representando R$574 por paciente. Desse total, o custo da abordagem e tratamento seria R$19,05 milhões e de gerenciamento, R$1,24 milhão. Na análise de sensibilidade, o custo total variou entre R$13,61 e R$34,35 milhões.

DISCUSSÃO

O presente estudo contribui para o conhecimento dos custos do Programa de Tratamento do Tabagismo no Brasil, estimando os custos não somente do tratamento, mas também do gerenciamento do programa nos três níveis de gestão, com custo por paciente que deixou de fumar próximo aos menores referidos na literatura internacional.

A comparação dos resultados com a literatura é difícil, dadas as variações metodológicas referentes à perspectiva da análise, pressupostos, método de custeio e itens de custo considerados1919. Ruger JP, Lazar CM. Economic evaluation of pharmaco- and behavioral therapies for smoking cessation: a critical and systematic review of empirical research. Annu Rev Public Health. 2012;33:279-305. DOI:10.1146/annurev-publhealth-031811-124553. Há ainda diversidade no formato dos programas avaliados em diferentes países, dificultando a validade externa dos resultados de diferentes estudos. Estimativas de custo por paciente que deixou de fumar, em programas com aconselhamento geralmente menos intensivo que no caso brasileiro, não incluindo gerenciamento, variaram entre U$1,353 e U$3,59622. An LC, Schillo BA, Kavanaugh AM, Lachter RB, Luxenberg MG, Wendling AH, et al. Increased reach and effectiveness of a statewide tobacco quitline after the addition of access to free nicotine replacement therapy. Tob Control. 2006;15(4):286-93. DOI:10.1136/tc.2005.014555,66. Cromwell J, Bartosch WJ, Fiore MC, Hasselblad V, Baker T. Cost-effectiveness of the clinical practice recommendations in the AHCPR guideline for smoking cessation. JAMA. 1997;278(21):1759-66. DOI:10.1001/jama.1997.03550210057039,2727. Wasserfallen JB, Digon P, Cornuz J. Medical and pharmacological direct costs of a 9-week smoking cessation programme. Eur J Prev Cardiol. 2012;19(3):565-70. DOI:10.1177/1741826711406059. Em Minnesota, EUA, o custo por participante e por paciente que deixou de fumar foi de U$352 e U$1,934, respectivamente, incluindo TRN, bupropiona, abordagem mínima e sessões de aconselhamento telefônico22. An LC, Schillo BA, Kavanaugh AM, Lachter RB, Luxenberg MG, Wendling AH, et al. Increased reach and effectiveness of a statewide tobacco quitline after the addition of access to free nicotine replacement therapy. Tob Control. 2006;15(4):286-93. DOI:10.1136/tc.2005.014555. Na Suíça, esses custos foram de U$1,182 e U$1,353, respectivamente, incluindo TRN e nove sessões de aconselhamento2727. Wasserfallen JB, Digon P, Cornuz J. Medical and pharmacological direct costs of a 9-week smoking cessation programme. Eur J Prev Cardiol. 2012;19(3):565-70. DOI:10.1177/1741826711406059. Estimativa de custo de implementação das recomendações propostas em guideline dos EUAkkFiore MC, Bailey WC, Cohen SJ, Dorfman SF, Goldstein MG, Gritzer, et al. Smoking cessation: clinical practice guideline n 18. Rockville, MD: US Department of Health and Human Services; Agency for Health Care Policy and Research; 1996 (AHCPR Publication n 96-0692)., no formato que mais se aproxima do programa brasileiro (aconselhamento intensivo com sete sessões em grupo e TRN), foi de U$2,310 e U$3,596 por paciente que deixou de fumar, considerando adesivo e goma de nicotina, respectivamente66. Cromwell J, Bartosch WJ, Fiore MC, Hasselblad V, Baker T. Cost-effectiveness of the clinical practice recommendations in the AHCPR guideline for smoking cessation. JAMA. 1997;278(21):1759-66. DOI:10.1001/jama.1997.03550210057039.

A proporção de custos com tratamento medicamentoso em Goiânia (24,3%) não foi elevada, assemelhando-se ao observado no programa avaliado na Suíça (22,8%)2727. Wasserfallen JB, Digon P, Cornuz J. Medical and pharmacological direct costs of a 9-week smoking cessation programme. Eur J Prev Cardiol. 2012;19(3):565-70. DOI:10.1177/1741826711406059. A maior participação das sessões em grupo, responsáveis por 54,0% do custo da intervenção, associada à proporção de custos com recursos humanos (73,1%), observada entre as unidades amostradas neste estudo e semelhante à encontrada no Programa da Saúde da Família de Porto Alegre em 2002 (65,5%)44. Castro JD, Marinho ME. Os custos do Programa de Saúde da Família de Porto Alegre - 1998 e 2002. Rev Bras Med Fam Com. 2007;2(8):298-306. DOI:10.5712/rbmfc2(8)69, indica a importância de se maximizar o uso do tempo dos profissionais. Tais evidências reforçam a relevância do adequado planejamento das ações realizadas no município, responsável por 78,0% do custo total do programa.

O custo com medicamentos por paciente, incluindo TRN e bupropiona, que variou de R$174 a R$194 nos diferentes cenários, difere dos achados de outro estudo nacionalllAraújo AJ. Custo-efetividade de intervenções de controle de tabaco no Brasil [tese]. Rio de Janeiro (RJ): Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2008., R$329 e R$501 por paciente para bupropiona e adesivos de nicotina, respectivamente. AraújollAraújo AJ. Custo-efetividade de intervenções de controle de tabaco no Brasil [tese]. Rio de Janeiro (RJ): Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2008. considerou a posologia completa do tratamento, baseada em diretrizes (e não o consumo real dos pacientes), e preços praticados no mercado no Rio de Janeiro, até três vezes maiores que os preços pagos pelo Ministério da Saúde. Isso explica a diferença observada nos resultados. A estratégia de compra centralizada do medicamento pelo Ministério da Saúde resulta em preços mais baixos dos medicamentos, contribuindo para custos menores do programa.

Este estudo tem pontos fortes e limitações. A metodologia de custeio utilizada permitiu identificação dos recursos com alto grau de detalhamento, conferindo precisão aos resultados, em uma abordagem ampla, que considerou também o gerenciamento do programa. Algumas limitações decorrem da dificuldade de estimar o custo e a parcela atribuível ao programa de atividades como a divulgação e o processo de compra de medicamentos. Em nível federal, não foram incluídos custos com transporte, despesas gerais e custos de capital. No entanto, como estes custos não tiveram grande influência no custo do gerenciamento municipal e estadual, acreditamos que não aumentariam de maneira significativa os custos no nível federal. Outra limitação refere-se à informação sobre a cessação do tabagismo, obtida com base no autorrelato dos pacientes, sem confirmação bioquímica da abstinência.

Ao estimar os custos da implementação plena, incorremos em incertezas em vários parâmetros. O número de fumantes a ser tratado pode estar subestimado, pois foi considerado apenas o estágio mais avançado de motivação para o tratamento, enquanto o estágio anterior tem sido mencionado como preditor de sucessommSantos JDP. Avaliação da efetividade do programa de tratamento do tabagismo no Sistema Único de Saúde [dissertação]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Medicina; 2011.. Pode também ter sido superestimado, pois o número de fumantes que não necessitariam de tratamento para deixar de fumar foi obtido pela taxa de cessação natural da literatura internacional, que pode ser mais alta entre os fumantes brasileiros, dada a significativa queda na prevalência do tabagismo vivenciada pelo País nos últimos anos (35,0% entre 1989 e 2003)1212. Monteiro CA, Cavalcante TM, Moura EC, Claro RM, Szwarcwald CL. Population-based evidence of a strong decline in the prevalence of smokers in Brazil (1989-2003). Bull World Health Organ. 2007;85(7):527-34. Considerou-se que a estrutura para gerenciamento municipal disponível em 2010, maior que em anos anteriores de implantação do programa, seria capaz de absorver o aumento da demanda pelo tratamento.

Apesar da variação de custos descrita, as intervenções para cessação do tabagismo têm sido consideradas altamente custo-efetivas99. Kahende JW, Loomis BR, Adhikari B, Marshall L. A review of economic evaluations of tobacco control programs. Int J Environ Res Public Health. 2009;6(1):51-68. DOI:10.3390/ijerph6010051,1919. Ruger JP, Lazar CM. Economic evaluation of pharmaco- and behavioral therapies for smoking cessation: a critical and systematic review of empirical research. Annu Rev Public Health. 2012;33:279-305. DOI:10.1146/annurev-publhealth-031811-124553. Essas análises de custo-efetividade não são transponíveis para o Brasil. Porém, tendo em vista que, em geral, consideram taxas de cessação do tabagismo menores que as sugeridas nos estudos nacionais, é possível que o custo-efetividade do tratamento do tabagismo no País seja ainda mais favorável.

No Brasil, 82,0% dos casos de câncer de pulmão, uma das principais doenças tabaco-relacionadas, são atribuíveis ao tabagismo. Seu tratamento em hospital público especializado foi estimado em R$28.901 em 2006 para pacientes com histórico de tabagismo, custo significativamente mais alto do que o custo por paciente que deixa de fumar do Programa de Tratamento do Tabagismo1515. Pinto M, Ugá MAD. Custo do tratamento de pacientes com histórico de tabagismo em hospital especializado em câncer. Rev Saude Publica. 2011;45(3):575-82. DOI:10.1590/S0034-89102011005000026,ccPinto MT, Pichon-Riviere A, Biz A, Schluckbier L, Araújo A. Carga das doenças tabaco-relacionadas para o Brasil: relatório final. 2012 [citado 2012 nov 13]. Disponível em: http://actbr.org.br/uploads/conteudo/721_Relatorio_Carga_do_tabagismo_Brasil.pdf . Outra estratégia de prevenção de câncer, o rastreamento do câncer de mama em mulheres, considerada prioritária nos últimos anos, teve custo cumulativo estimado em R$1.008 para o cuidado usual no SUS, próximo do custo por paciente que deixa de fumar1717. Ribeiro RA, Caleffi M, Polanczyk CA. Custo-efetividade de um programa de rastreamento organizado de câncer de mama no Sul do Brasil. Cad Saude Publica. 2013;29 Supl 1:s131-45. DOI:10.1590/0102-311X00005213. O valor transferido pelo Ministério da Saúde ao município de Goiânia em 2010 para realização das mamografias para rastreamento, R$1,34 milhãonnMinistério da Saúde, Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde - DATASUS. Informações de Saúde (TABNET): assistência à saúde [citado 2014 out 25]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=0202 , supera em três vezes o custo total do Programa de Tratamento do Tabagismo. Ainda que o valor das transferências não represente o custo da intervenção, mas o aporte federal de recursos para sua realização (conforme valor unitário fixado pelo próprio ministério para ressarcimento do procedimento), a sua magnitude evidencia o esforço feito para prevenção do câncer de mama. Considerando que o câncer de mama resultou em 12.705 óbitos em mulheres em 2010ooMinistério da Saúde, Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde - DATASUS. Informações de Saúde (TABNET): estatísticas vitais [citado 2014 out 25]. Disponível em: www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=0205, é importante ressaltar o potencial benefício do tratamento do tabagismo, fator de risco para doenças crônicas de grande impacto mundial e responsável por 130 mil óbitos anuais no PaísccPinto MT, Pichon-Riviere A, Biz A, Schluckbier L, Araújo A. Carga das doenças tabaco-relacionadas para o Brasil: relatório final. 2012 [citado 2012 nov 13]. Disponível em: http://actbr.org.br/uploads/conteudo/721_Relatorio_Carga_do_tabagismo_Brasil.pdf ,ppWorld Health Organization. Global health risks: mortality and burden of disease attributable to selected major risks. Geneva; 2009 [citado 2014 out 7]. Disponível em: http://www.who.int/healthinfo/global_burden_disease/GlobalHealthRisks_report_full.pdf .

Corroborando as evidências disponíveis na literatura internacional, este estudo sugere que o Programa de Tratamento do Tabagismo, implantado no SUS há cerca de uma década, tem bom desempenho quanto ao custo por paciente que deixa de fumar em Goiânia, município que segue o modelo de tratamento preconizado nacionalmente. Este custo pode ser ainda menor com aumento do acesso e gerenciamento da demanda, diluindo-se os custos de gerenciamento do programa e promovendo maior aproveitamento das sessões de abordagem cognitivo-comportamental.

Tendo em vista o grande impacto do tabagismo na morbimortalidade da população brasileira, o alto custo de tratamento das doenças tabaco-relacionadas e o custo-efetividade favorável das intervenções para tratamento do tabagismo, o programa para cessação de fumar deve ser considerado prioritário ao se planejar a alocação de recursos de saúde. Reforça tal recomendação a evidência de que o financiamento total do tratamento, ou seja, sem custo adicional para o paciente, resulta em maiores taxas de abstinência1616. Reda AA, Kaper J, Fikrelter H, Severens JL, Schayck CP. Healthcare financing systems for increasing the use of tobacco dependence treatment. Cochrane Database Syst Rev. 2009;(2):CD004305. DOI:10.1002/14651858.CD004305.pub3.

Sugerimos a realização de estudo para avaliar a indicação de tratamento do tabagismo para os usuários do SUS na prática clínica, auxiliando na definição de estratégias para referenciamento de pacientes e aumento da abrangência do programa. Também, estudo de custo-efetividade do programa é necessário para fornecer mais subsídios para a tomada de decisão dos gestores quanto à sua priorização e incentivo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Nov 2016

Histórico

  • Recebido
    3 Abr 2015
  • Aceito
    11 Out 2015
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revsp@org.usp.br