Fatores socioeconômicos, higiênicos e de saneamento na redução de diarreia na Amazônia

Katiuscia Shirota Imada Thiago Santos de Araújo Pascoal Torres Muniz Valter Lúcio de Pádua Sobre os autores

RESUMO

OBJETIVO

Analisar as contribuições das melhorias socioeconômicas, higiênicas e de saneamento na redução da prevalência de diarreia em uma cidade na Amazônia.

MÉTODOS

Neste estudo transversal de base populacional, foram analisados dados dos inquéritos realizados no município de Jordão, Acre. Em 2005 e 2012, foram avaliadas, respectivamente, 466 e 826 crianças menores de cinco anos. Foram aplicados questionários sobre as condições socioeconômicas, construção dos domicílios, hábitos higiênicos e alimentares e saneamento ambiental. Foi aplicado o teste Qui-quadrado de Pearson e a Regressão de Poisson para verificar a relação existente entre procedência da água, tipo de construção do domicílio, idade de introdução de leite de vaca na dieta e local de nascimento e a prevalência de diarreia.

RESULTADOS

A prevalência de diarreia foi reduzida de 45,1% para 35,4%. Foi identificada maior probabilidade de desenvolvimento de diarreia em crianças que não utilizaram água da rede pública, as que receberam leite de vaca no primeiro mês após o nascimento e as residentes em domicílios de paxiúba. As crianças que nasceram no domicílio apresentaram menor risco de diarreia quando comparadas às que nasceram em hospital, com essa diferença se invertendo para o inquérito de 2012.

CONCLUSÕES

Ocorreu melhora nas condições de saneamento com aumento no número de banheiro com vasos sanitários, implantação do Programa de Saúde da Família e tratamento de água na sede do município. O modelo de regressão multivariada identificou associação estatisticamente significativa entre utilização de água da rede pública, construção da moradia, introdução tardia de leite de vaca e acesso a serviço de saúde com ocorrência de diarreia.

Pré-Escolar; Diarreia, epidemiologia; Saneamento Básico; Abastecimento de água; Esgotos Domésticos; Desenvolvimento da Comunidade; Fatores Socioeconômicos

INTRODUÇÃO

O saneamento, reconhecido como importante estratégia de promoção à saúde, figura na agenda internacional entre os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, cuja meta de reduzir à metade a população sem acesso à água potável foi atingida antecipadamente. Contudo, 11,0% da população mundial ainda permanece sem acesso à água potável. A superação desse desafio requer o enfretamento de barreiras tecnológicas, políticas e gerenciais, que são ainda mais complexos na região Amazônica em virtude dos obstáculos naturais.

No Brasil, o saneamento básico é um direito assegurado pela Constituição e definido pela Lei 11.445/2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico, definido como o conjunto dos serviços, infraestrutura e instalações de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana, drenagem urbana, manejos de resíduos sólidos e de águas pluviaisa. Esses serviços promovem a melhoria da qualidade de vida da população, refletindo diretamente na saúde infantil, com redução da mortalidade infantil e de doenças diarreicas, parasitárias e de pele. Adicionalmente, são protegem a saúde da população, minimizando as consequências da pobreza, além de proteger o meio ambientebbTeixeira JC. Associação entre cenários de saneamento e indicadores de saúde em crianças. Estudo de áreas de assentamento subnormal em Juiz de Fora, MG [tese]. Belo Horizonte (MG): Escola de Engenharia da UFMG; 2003..

A diarreia é um grave problema de saúde pública relacionado às condições de higiene e à qualidade da água utilizada99. Özkan S, Tüzün H, Görer N, Ceyhan M, Aycan S, Albayrakv S et al. Water usage habits and the incidence of diarrhea in rural Ankara, Turkey. Trans Soc Trop Med Hyg. 2007;101(11):1131-5. DOI:10.1016/j.trstmh.2007.05.011
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. É a segunda causa de óbitos na infância, representando em torno de 1,5 milhões de mortes/ano em menores de cinco anosccWorld Health Organization (WHO). Diarrhea: why children are still dying and what can be done. Geneva: World Health Organization; 2009 [citado 2014 out 31]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/44174/1/9789241598415_eng.pdf . Existem muitos fatores determinantes1313. Tumwine JK, Thompson J, Katui-Katua M, Mujwahuzi M, Johnstone N, Porras I. Sanitation and hygiene in urban and rural households in East Africa. Int J Environ Health Res. 2003;13(2):107-15. DOI:10.1080/0960312031000098035
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; cerca de 88% das mortes por diarreia são atribuídas à água não potável, esgotamento sanitário inadequado e higiene precáriaccWorld Health Organization (WHO). Diarrhea: why children are still dying and what can be done. Geneva: World Health Organization; 2009 [citado 2014 out 31]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/44174/1/9789241598415_eng.pdf . Assim, medidas de prevenção da diarreia infantil devem ser priorizadas como estratégia fundamental para melhoria da saúde infantil. Entre as medidas, estão as seguintes: provimento de água, tanto em quantidade quanto qualidade; afastamento e tratamento de esgotos domésticos; e promoção das ações de saneamento em toda comunidadeccWorld Health Organization (WHO). Diarrhea: why children are still dying and what can be done. Geneva: World Health Organization; 2009 [citado 2014 out 31]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/44174/1/9789241598415_eng.pdf . Esses serviços são de responsabilidade do setor de infraestrutura para fornecimento de água tratada, esgotamento sanitário, limpeza e coleta de resíduos sólidos e drenagem e manejo de água de água pluviais, com participação do setor de saúde pública e da comunidade, como previsto na Constituição Federal de 1988ddBrasil. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Brasília (DF): Senado; 1988..

Em algumas localidades isoladas e mais pobres do Estado do Acre, como é o caso do Jordão, a expansão da rede de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário e também do atendimento médico se deu de modo lento em virtude de dificuldades logísticas, especialmente para a população rural. Este estudo teve por objetivo analisar a contribuição das ações de saneamento como abastecimento de água potável, construção dos domicílios, introdução de leite de vaca e local de nascimento na redução da prevalência de diarreia em crianças menores de cinco anos na zona urbana e rural do município.

MÉTODOS

Este estudo transversal de base populacional utilizou dados de dois inquéritos realizados no município de Jordão, Acre, nos anos de 2005 e 2012 que avaliaram, respectivamente, 466 e 826 crianças menores de cinco anos em sua área urbana e rural88. Oliveira CSM, Cardoso MA, Araújo TS, Muniz PT. Anemia em crianças de 6 a 59 meses e fatores associados no Município de Jordão, Estado do Acre, Brasil. Cad Saude Publica. 2011;27(5):1008-20. DOI:10.1590/S0102-311X2011000500018
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Jordão está situado a 700 km de Rio Branco, no Estado do Acre, foi criado em 1992 após separação do município de Tarauacá, situado no Vale do Juruá. Possui área de 5.429 km2, banhado pelos rios Jordão e Tarauacá e faz fronteira com os municípios de Marechal Thaumaturgo, Feijó e Tarauacá e com o Peru. A população do município no Censo 2010 contava com 6.577 habitantes, sendo 2.272 residentes na área urbana e 4.305 na área ruraleeInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico 2010 [citado 2013 ago 14]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010 . É um dos municípios mais isolados do estado por possuir acesso apenas pela via fluvial e aérea, contribuindo para manutenção de preços elevados de mercadorias e alimentos. Até 2005, não contava com tratamento de água e nem esgotamento sanitário.

No contexto da realidade amazônica e do estado do Acre, Jordão é considerado um dos municípios mais pobres do País. Em 2000, seu Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) era de 0,222 e, em 2010, passou para 0,469ffAtlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. Índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM). Brasília (DF): PNUD; 2013.. Porém, ainda é considerado um IDH muito baixo, figurando entre os 10 de menor valor do País.

Nos dois inquéritos, as informações das características dos domicílios, do saneamento ambiental e de saúde foram obtidas por aplicação de questionários, realizada por pesquisadores devidamente treinados. O respondente foi algum adulto responsável pelo domicílio, ao qual foi perguntado, para caracterizar a ocorrência de diarreia, se a(s) criança(s) da casa apresentou(aram) nos últimos 15 dias mais de quatro evacuações/dia de consistência líquida ou com aumento de volume de evacuação. Para avaliação socioeconômica, foram avaliadas presença de energia elétrica; benefício do Programa Bolsa Família; escolaridade materna e renda familiar. Quanto aos domicílios, foram considerados o tipo de material da construção da residência, da cobertura e do piso e o total de cômodos. Com relação à alimentação infantil, foi considerado o período de introdução de leite de vaca. Quanto ao local de nascimento, foi considerado se ocorreu em casa ou em hospital. Para avaliação do saneamento ambiental, foram considerados o tipo de vaso sanitário no domicílio e o destino do lixo, bem como a procedência, a frequência de falta e o tipo de tratamento realizado na água de beber.

Para as variáveis categóricas foi aplicado o teste Qui-quadrado de Pearson e teste de tendência linear, que considera o feito do nível de exposição no momento de identificar diferenças entre os dois inquéritos. Para a obtenção das medidas de associação brutas e ajustadas e avaliação da força da associação entre as variáveis independentes e o desfecho, foi utilizada a regressão de Poisson com estimativa de erro robusta (Stata 9.0).

Os projetos foram aprovados pelos Comitês de Ética em Pesquisa da Fundação Hospitalar Estadual do Acre e da Universidade Federal do Acre (UFAC) (Pareceres 042/2005 e 23107.017408/2010-16). Os responsáveis pelas crianças assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

Comparando o inquérito de 2005 e o de 2012, a prevalência de diarreia de 45,1% (IC95% 40,5–49,7) para 35,4% (IC95% 32,1–38,7), respectivamente (Figura). Essa redução foi expressiva na zona urbana. Quanto às internações por diarreia, houve um aumento de 4,5% para 10,7% entre os anos de 2005 e 2012. Paralelamente, a proporção de internação por diarreia aumentou na zona urbana do município (p < 0,001).

Figura
Prevalência de diarreia nos últimos 15 dias e internação por esse agravo em crianças da zona urbana e rural do município de Jordão, Acre, 2005 e 2012.

A Tabela 1 apresenta dados sobre as condições sociodemográficas e ambientais para os anos de 2005 e 2012. Não houve mudança na proporção de famílias com crianças menores de cinco anos com acesso à rede de energia elétrica e na proporção de salários mínimos recebidos pelas famílias. Contudo, a proporção de famílias beneficiadas pelo Programa Bolsa Família aumentou, passando de 23,9% em 2005 para 53,9% em 2012. A escolaridade materna aumentou, reduzindo o analfabetismo em 5,4 pontos percentuais. Observou-se redução expressiva, especialmente na zona urbana, de domicílios construídos com paxiúbaggNome popular de uma palmeira da família das Arecáceas; ocorre na América Central e do Sul e no Brasil, utilizada para construir casas e na confecção de assoalhos., bem como aumento do uso de madeira na construção dos domicílios e no piso das residências. Considerando o tipo de cobertura dos domicílios, o material mais empregado foi a palha. Houve aumento significativo no número de cômodos dos domicílios. Quanto ao local de nascimento das crianças, houve redução de partos no hospital e aumento nos partos domiciliares. A introdução de leite de vaca na alimentação infantil no primeiro mês de vida aumentou, representando valores de 43,0% e 24,8%, nos anos de 2005 e 2012, respectivamente.

Tabela 1
Características socioambientais dos domicílios, local de nascimento e introdução de leite de vaca na alimentação de crianças menores de cinco anos residentes na zona urbana e rural do município de Jordão, Acre, 2005 e 2012.

A Tabela 2 descreve as transformações nas condições sanitárias ocorridas em Jordão entre os inquéritos analisados. Parcela significativa das famílias com crianças menores de cinco anos não possuía vaso sanitário no domicílio, 36,5% e 34,8% nos anos de 2005 e 2012. Contudo, houve melhora estaticamente significativa na substituição de privadas por vaso sanitário de cerâmica nos domicílios entre os anos de 2005 e 2012. Em 65,6% dos domicílios dotados de banheiro, este foi construído fora da casa. Essa variável só foi possível avaliar no inquérito de 2012, pois em 2005 não fazia parte do questionário aplicado. Das famílias que não possuíam banheiro, 94,4% relataram fazer suas necessidades no quintal, mato ou área aberta e 5,6% utilizar sanitário dos vizinhos.

Tabela 2
Condições de saneamento dos domicílios com crianças menores de cinco anos residentes na zona urbana e rural do município de Jordão, Acre, 2005 e 2012.

Quanto à procedência da água (Tabela 2) utilizada nos domicílios nos anos de 2005 e 2012, predominou o uso de água do rio, representando 48,2% e 56,8%, respectivamente. Mais de um terço dos domicílios não apresentavam ligações domiciliares da rede pública de abastecimento de água em 2012. Nos anos de 2005 e 2012, respectivamente, 72,5% e 62,1% dos participantes relataram que a água nunca falta e 15,8% e 20,4%, que raramente falta. A cloração da água no domicílio foi a técnica de tratamento mais relatada pelas famílias com crianças menores de cinco anos nos dois inquéritos. Uma parcela da população utiliza água sem nenhum tratamento antes do consumo, representando 31,1% das crianças menores de cinco anos. Referente ao destino do lixo, não houve mudança significativa, com predomínio de coleta pública em 36,8% e 38,8% nos anos de 2005 e 2012, respectivamente. Quanto ao destino do esgoto, em 2005, 46,0% dos domicílios o realizava por meio de vala a céu aberto, 28,4% por fossa negra e 14,2% por fossa séptica. Em 2012, fossa negra e vala a céu aberto eram usadas por, respectivamente, 39,8% e 34,7% dos domicílios.

A Tabela 3 apresenta informações referentes à presença de insetos e roedores nos domicílios, bem como os cuidados das famílias com a manipulação de alimentos. Em relação às moscas, 28,0% das famílias classificaram como alta a presença desse inseto no domicílio. A presença de baratas ocorreu em 89,7% dos domicílios, com 42,8% das famílias classificando como alta a infestação por esse inseto. Em relação aos roedores, 78,8% relataram presença, com 27,5% dos domicílios apresentando alta infestação. Quanto aos cuidados higiênicos durante a manipulação de alimentos, 88,7% relataram lavar as mãos antes de manipular alimentos que serão consumidos pelas crianças. Quanto aos cuidados de higiene de frutas e verduras consumidos crus, somente 23,8% das famílias lavavam com água tratada, 43,4% lavavam com água não tratada e 25,3% não lavavam as frutas e verduras consumidas pelas crianças menores de cinco anos.

Tabela 3
Infestação animal e cuidado de higiene nos domicílios com crianças menores de cinco anos residentes na zona urbana e rural do município de Jordão, Acre, 2012.

A Tabela 4 descreve a associação entre diarreia e os quatro fatores determinantes selecionados: procedência da água, tipo de domicílio, idade de introdução de leite de vaca e local de nascimento para os anos de 2005 e 2012. Quanto à procedência da água utilizada, nos dois inquéritos foi identificada maior probabilidade de desenvolvimento de diarreia entre as crianças que não utilizavam água da rede pública de abastecimento. Em 2005, esse risco foi de 1,38 vezes e em 2012, 1,60 vezes, quando comparados às crianças que utilizavam água de poço.

Tabela 4
Prevalência (%) e risco relativo de diarreia em crianças menores de cinco anos segundo variáveis de procedência da água, tipo de domicílio, idade de introdução de leite de vaca e local de nascimento. Jordão, Acre, 2005 e 2012.

Em relação ao tipo de domicílio, mesmo não atingindo a significância estatística, essa variável foi mantida no modelo em virtude das mudanças expressivas observadas na construção das casas na comparação entre anos de 2005 e 2012. Essa variável sugere probabilidade maior de desenvolvimento de diarreia em crianças residentes em domicílios de paxiúba, que chegou a 1,21 vezes em relação ao valor observado entre as crianças de casa de alvenaria ou madeira beneficiada, em 2012.

Em 2005, as crianças que receberam leite de vaca no primeiro mês após o nascimento apresentaram probabilidade de desenvolvimento de diarreia 1,3 vezes à apresentada pelas crianças que nunca tinham consumido leite de vaca e probabilidade 17,0% maior que a verificada entre as que receberam leite de vaca após os 30 dias. Essa mesma tendência foi observada em 2012, chegando ao dobro da probabilidade de ocorrência de episódio de diarreia do primeiro grupo e de 1,76 vezes em relação ao segundo. Em relação ao local de nascimento, em 2005, as crianças que nasceram no domicílio apresentaram menor risco de diarreia quando comparadas às que nasceram em hospital, com essa diferença se invertendo em 2012.

DISCUSSÃO

Nos sete anos entre os dois inquéritos, foi identificada elevada prevalência de diarreia entre as crianças residentes no município, mas com redução de 9,7% na ocorrência desse agravo. Cesário et al.33. Cesario RR, Tavares-Neto J. Prevalência de diarréia na população do Distrito Docente-Assistencial do Tucumã, Rio Branco, Estado do Acre, Brasil, em 2003. Epidemiol Serv Saude. 2006;15(3):19-28. DOI:10.5123/S1679-49742006000300003
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, em estudo de prevalência de diarreia em um distrito docente-assistencial de Rio Branco, AC, em 2003, encontraram prevalência de diarreia de 33,3% em menores de cinco anos de idade. Benício et al.22. Benicio MHD’A, Monteiro CA. Tendência secular da doença diarréica na infância na cidade de São Paulo (1984-1996). Rev Saude Publica. 2000;34(6 Suppl):83-90. DOI:10.1590/S0034-89102000000700011
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estimaram a prevalência de diarreia em menores de cinco anos no Brasil de 10,5%, de 12,5% na região Norte e, em São Paulo, prevalência de 4,7% considerando os diversos estrados socioeconômicos e de 9,3% em crianças de famílias mais carentes. Vásquez et al.1414. Vázquez ML, Mosquera M, Cuevas LE, González ES, Veras ICL, Luz EO et al. Incidência e fatores de risco de diarreia e infecções respiratórias agudas em comunidades urbanas de Pernambuco, Brasil. Cad Saude Publica. 1999;15(1):163-72. DOI:10.1590/S0102-11X1999000100016
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encontraram 10,2% de prevalência de diarreia na população infantil de Pernambuco e 16,9% na região metropolitana de Recife. Kariuki et al.66. Kariuki JC, Macambo KJ, Njeruh MF, Muchiri EM, Nzioka SM, Kariuki S. Effects of hygiene and sanitation interventions on reducing diarrhoea prevalence among children in resource constained communities: case study of Turkana Dsitrict, Kenya. J Community Health. 2012;37(6):1178-84. DOI:10.1007/s10900-012-9560-1.
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(2012) relataram que no Distrito de Turkana, Quênia, a prevalência de diarreia em 2007 foi de 43,7% e em 2008, de 30,7%. Observa-se que a prevalência de diarreia em crianças de Jordão foi superior a todas as pesquisas citadas.

Apesar dessa elevada prevalência, observou-se redução desse agravo, ao mesmo tempo em que se verificou aumento no número de internações por diarreia, entre os anos de 2005 e 2012. Ambas as situações podem ser consequência da implantação do Programa de Saúde da Família (PSF), em 2007, e da inauguração de um hospital da Família no município, em 2008, o que facilitou o acesso da população ao atendimento de média complexidade.

O município de Jordão ainda apresenta população rural superior à urbana, o que justifica muitos domicílios não contar com energia elétrica e, consequentemente, com as facilidades trazidas por esse recurso. Essa realidade do interior da Amazônia difere acentuadamente da vivenciada no centro-sul do País, que, mesmo nos municípios pequenos e distantes dos centros urbanos, apresentam população urbana maior que a rural e maior cobertura de serviços de energia elétrica11. Azeredo CM, Cotta RMM, Schott M, Maia TM, Marques ES. Avaliação das condições de habitação e saneamento: a importância da visita domiciliar no contexto do Programa de Saúde da Família. Cienc Saude Colet. 2007;12(3):743-53. DOI:10.1590/S1413-1232007000300025
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Quanto ao auxílio social, foi expressivo o aumento de famílias beneficiadas pelo Programa Bolsa Família, sobretudo na zona rural do município, fator de incremento para aquisição de bens de consumo ou melhoria da qualidade da alimentação.

Verificou-se modificação na estrutura dos domicílios, com aumento do uso de madeira beneficiada para construção e do piso, assim como no número de cômodos das residências. Esse cenário mostra melhoria do poder aquisitivo da população neste município e pode indicar melhores condições de infraestrutura das famílias com crianças menores de cinco anos, que certamente contribuem para diminuição de exposições às doenças, entre elas a diarreia.

Como forma de avaliar o acesso aos serviços de saúde, foi escolhida a variável de local de nascimento. O aumento de partos domiciliares pode ser atribuído à população do município ser predominantemente da zona rural e, após a implantação do PSF, ao aumento à atenção ao pré-natal, treinamento de parteiras e estímulo ao parto natural.

A introdução de leite de vaca na alimentação infantil é uma importante variável para avaliar o cuidado e o conhecimento da mãe sobre a importância do aleitamento materno. Foi observada introdução mais tardia de leite de vaca na alimentação infantil, diminuindo o risco de diarreia. Esses dados sinalizam para a importância das práticas de alimentação completar e de aleitamento materno para prevenção de problemas de saúde nos primeiros anos de vida. O leite de vaca é responsável por 20,0% das alergias alimentares77. Monte CMG, Giugliani ERJ. Recomendações para alimentação complementar da criança em aleitamento materno. J Pediatr (Rio J). 2004;80(5 Suppl):s131-41. DOI:10.1590/S0021-75572004000700004
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; além disso, a digestão da proteína do leite de vaca é difícil em crianças, aumentando o risco de diarreia. O aumento da escolaridade da mãe e ações do PSF podem ter contribuído para introdução mais tardia do leite de vaca na alimentação infantil.

Parcela significativa das crianças ainda não possuía vaso sanitário no seu domicílio, mesmo com a construção de unidades sanitárias domiciliares em convênio com a Fundação Nacional de Saúde, que promoveu a substituição de privadas por vaso sanitário de cerâmica nos domicílios entre os anos de 2005 e 2012. Há predomínio de banheiro fora da casa, característico da zona rural. Essa variável só foi possível avaliar no inquérito de 2012, visto que em 2005 não fazia parte do questionário aplicado no inquérito. Em países da África, o uso de latrina ou privada é universalizado1313. Tumwine JK, Thompson J, Katui-Katua M, Mujwahuzi M, Johnstone N, Porras I. Sanitation and hygiene in urban and rural households in East Africa. Int J Environ Health Res. 2003;13(2):107-15. DOI:10.1080/0960312031000098035
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: cerca de 92,4% em Uganda, 95,0% no Quênia e 99,5% na Tanzânia. As latrinas na área urbana são construídas de materiais permanentes e, na área rural, de lama e galhos, para evitar que o material fecal chegue ao ambiente doméstico1313. Tumwine JK, Thompson J, Katui-Katua M, Mujwahuzi M, Johnstone N, Porras I. Sanitation and hygiene in urban and rural households in East Africa. Int J Environ Health Res. 2003;13(2):107-15. DOI:10.1080/0960312031000098035
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Observa-se a importância do programa de distribuição de hipoclorito de sódio no município, já que mais de 50,0% dos entrevistados contam com esse recurso para o tratamento da água de beber. O Ministério da Saúde e as secretarias estaduais e municipais recomendam a utilização de soluções de hipoclorito de sódio para a desinfecção de água em regiões onde não existe saneamento básico, pois trata-se de medida preventiva simples, de baixo custo e eficaz no combate a doenças de veiculação hídricahhMinistério da Saúde (BR). Indicadores de morbidade e fatores de risco. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2006.. O tipo de tratamento de água utilizado em Jordão difere de outras localidades, como no município de Iporanga, SP, onde 69% dos domicílios avaliados possuem água encanada e, destes domicílios, 22,0% filtram a água de beber, 15,0% fervem e 62,0% não realizam nenhum tratamento55. Giatti LL, Rocha AA, Santos FA, Bitencourt SC, Pieroni SRM. Condições de saneamento básico em Iporanga, Estado de São Paulo. Rev Saude Publica. 2004;38(4). DOI:10.1590/S0034-89102004000400014
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Quanto ao destino do lixo, não houve melhoria na coleta e destinação adequada em aterro sanitário entre os anos de 2005 e 2012, condição que contribui para a presença e proliferação de insetos e roedores, fato sustentado pela elevada presença de insetos nos domicílios. De fato, a presença de moscas está associada à diarreia infantil1111. Teixeira JC, Heller L. Fatores ambientais associados à diarreia infantil em áreas de assentamento subnormal em Juiz de Fora, Minas Gerais. Rev Bras Saude Mater Infant. 2005;5(4):449-55. DOI:10.1590/S1519-38292005000400008
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Quanto ao destino do esgoto, em 2005, predominavam vala a céu aberto e fossa negra, situações que favorecem a contaminação do ambiente próximo aos domicílios e que interferem nas condições de saúde das crianças1010. Paz MGA, Almeida MF, Günther WMR. Prevalência de diarréia em crianças e condições de saneamento e moradia em áreas periurbanas de Guarulhos, SP. Rev Bras Epidemiol. 2012;15(1):188-97. DOI:10.1590/S1415-790X2012000100017
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. A inexistência de rede coletora de esgotos interfere diretamente na saúde das crianças por poluir o ambiente e possibilitar a veiculação de doenças relacionadas a excretas, principalmente as parasitoses. A disposição de excreta a céu aberto em terrenos ou rua constitui um risco para helmintoses e, consequentemente, para outras doenças de vinculação hídrica, como a diarreiaiiTeixeira JC; Heller L. Fatores ambientais associados às helmintoses intestinais em áreas de assentamento subnormal, Juiz de Fora, MG. Eng. Sanit.Ambient. 2004;9(4),301-5. DOI:10.1590/S1413-41522004000400006.

Verificou-se o cuidado com a higiene das mãos antes do preparo dos alimentos, mas uma pequena parcela não realizava esses cuidados, contribuindo para o risco de contaminação durante o preparo dos alimentos. Quanto às frutas e verduras consumidas cruas, parcela expressiva as lavava, mas com água não tratada. Como a procedência da água era predominantemente de rio, essa prática pode oferecer risco de transmissão de doenças, em especial as diarreias. A água utilizada para consumo nas zonas rural e urbana, no presente estudo, era proveniente de poço ou rio, representando risco de 38,0 e 60,0% maior (para os anos de 2005 e 2012) para diarreia que o consumo de água da rede pública. Entretanto, os riscos encontrados para diarreia foram inferiores ao encontrado por Teixeira e Heller1111. Teixeira JC, Heller L. Fatores ambientais associados à diarreia infantil em áreas de assentamento subnormal em Juiz de Fora, Minas Gerais. Rev Bras Saude Mater Infant. 2005;5(4):449-55. DOI:10.1590/S1519-38292005000400008
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, em áreas de assentamento subnormal na cidade de Juiz de Fora. A lavagem de mãos com água e sabão é capaz de reduzir 48,0% do risco de diarreia; a melhoria da qualidade da água, 17,0% do risco; e a coleta adequada de esgoto, 36,0% do risco de diarreia44. Cairncross S, Hunt C, Boisson S, Bostoen K, Curtis V, Fung ICH, Schmidt WP. Water, sanitation and hygiene for the prevention of diarrhoea. Int J Epidemiol. 2010;39(suppl 1):i193-205. DOI:10.1093/ije/dyq035
https://doi.org/10.1093/ije/dyq035...
.

As condições de saneamento no município apresentaram melhora expressiva, com aumento no número de banheiros com vasos sanitários, implantação do tratamento de água na zona urbana do município, aumento da escolaridade materna e acesso ao serviço de saúde. O modelo de regressão multivariada identificou associação estatisticamente significava entre utilização de água da rede pública, tipo de domicílio, introdução tardia de leite de vaca e acesso a serviço de saúde com ocorrência de diarreia. Embora as transformações sanitárias ocorridas em Jordão fossem importantes sobre a ocorrência de diarreia, o abastecimento de água e os esgotamentos sanitários permanecem não universalizados. A expansão deve ser priorizada, já que esse serviço ainda não alcançou grande parcela da população residente no meio rural.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Dez 2016

Histórico

  • Recebido
    25 Jun 2015
  • Aceito
    10 Jul 2016
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
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