RESUMO
O artigo apresenta o processo de construção da Pesquisa Nacional sobre Acesso, Utilização e Promoção do Uso Racional de Medicamento a partir de uma concepção integradora da Assistência Farmacêutica, Ciência, Tecnologia e Inovação. Inicia-se contextualizando a saúde e o desenvolvimento no País e apresenta elementos da Política Nacional de Ciência Tecnologia e Inovação em Saúde no Brasil e da Política Nacional de Assistência Farmacêutica. Ao apresentar as diretrizes das Políticas Farmacêuticas, destaca-se a carência de dados de abrangência nacional. A presente pesquisa, encomendada pelo Ministério da Saúde, foi estruturada em dois componentes: inquérito domiciliar e avaliação dos serviços de assistência farmacêutica na atenção básica. As perspectivas dos resultados representam, além do incremento das políticas públicas farmacêuticas e de saúde pública, resultados de ações governamentais voltadas ao desenvolvimento do complexo econômico-industrial da saúde, visando a melhoria das condições de saúde da população brasileira.
Política Nacional de Assistência Farmacêutica; Política de Inovação e Desenvolvimento; Políticas Públicas de Saúde; Sistema Único de Saúde
INTRODUÇÃO
Este suplemento da Revista de Saúde Pública representa um marco no campo das Políticas Públicas Farmacêuticas no Brasil, ao apresentar os resultados da primeira pesquisa de abrangência nacional sobre o tema, como também ao abordar a interface das Políticas Farmacêuticas com as Políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde no País. A Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde encomendou, a instituições de pesquisa de diferentes universidades públicas brasileiras estaduais e federais, a Pesquisa Nacional sobre Acesso, Utilização e Promoção do Uso Racional de Medicamentos (PNAUM).
Neste artigo de abertura desta coletânea inédita e rica, busca-se apresentar o processo de construção da PNAUM a partir de uma concepção integradora da Assistência Farmacêutica, Ciência, Tecnologia e Inovação. Para isso, inicia-se a temática com uma argumentação relativa ao contexto do desenvolvimento nacional sobre a saúde e à Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde no Brasil; apresenta-se um panorama sucinto sobre a Pesquisa, Ciência e Inovação em Saúde e o papel dos Departamentos de Ciência e Tecnologia e Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos, assim como o processo de construção desta pesquisa e as perspectivas de elaboração de estratégias para as políticas farmacêuticas pelo Ministério da Saúde.
SAÚDE E DESENVOLVIMENTO
A temática da saúde tem sido incorporada e institucionalizada na agenda de desenvolvimento nacional, no campo da Ciência, Tecnologia e Inovação, em função do seu caráter estratégico. A saúde constitui um componente inerente à dimensão social do desenvolvimento, por razões diversas: possibilita o atendimento de necessidades humanas; exerce papel significativo no desenvolvimento econômico do País, com a geração de emprego e renda, por meio de 14 milhões de empregos diretos e cinco milhões indiretos – quadro que representou, em 2009, aproximadamente 9,0% do produto interno bruto do País; e ocupa posição de liderança em termos de investimentos em pesquisa e desenvolvimento22. Gadelha CAG. O Complexo Industrial da Saúde: desafios para uma política de inovação e desenvolvimento. In: Ministério da Saúde (BR). Saúde no Brasil: contribuições para a Agenda de Prioridades de Pesquisa. 2.ed. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2006. p.275-301. (Série B. Textos Básicos de Saúde).. Dessa forma, a saúde se institui não apenas como integrante do estado de bem-estar social e da condição básica de cidadania para a população brasileira, mas também se qualifica como fator indutor da geração de emprego, renda e riqueza no País33. Gadelha CAG, Costa LS. Saúde e desenvolvimento no Brasil: avanços e desafios. Rev Saude Publica. 2012;46 Supl 1:13-20. DOI:10.1590/S0034-89102012005000062
https://doi.org/10.1590/S0034-8910201200... .
No tocante à pesquisa e desenvolvimento, parcela expressiva do esforço vem se processando no campo da saúde, imbricada, em escala mundial, em um conjunto de tecnologias relacionadas a um padrão internacional e competitivo de conhecimento: nanotecnologia, biotecnologia, tecnologia de informação e comunicação, dentre outras33. Gadelha CAG, Costa LS. Saúde e desenvolvimento no Brasil: avanços e desafios. Rev Saude Publica. 2012;46 Supl 1:13-20. DOI:10.1590/S0034-89102012005000062
https://doi.org/10.1590/S0034-8910201200... . Os investimentos públicos em pesquisa e desenvolvimento no Brasil vêm expressando, na saúde, índices bastante elevados, desde a organização da 2ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde, em 2004. O setor saúde representa o maior componente do conjunto da produção científica e tecnológica, no Brasil e em diversos países44. Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Ciência e Tecnologia. Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde. 2.ed. Brasília (DF); 2008. (Série B. Textos Básicos em Saúde)..
Na vida social e econômica das nações, a incorporação dos avanços da Ciência, Tecnologia e Inovação no setor saúde contribui de forma decisiva para a melhoria das condições de vida da população22. Gadelha CAG. O Complexo Industrial da Saúde: desafios para uma política de inovação e desenvolvimento. In: Ministério da Saúde (BR). Saúde no Brasil: contribuições para a Agenda de Prioridades de Pesquisa. 2.ed. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2006. p.275-301. (Série B. Textos Básicos de Saúde)..
MARCO LEGAL E NORMATIVO DA POLÍTICA NACIONAL DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO EM SAÚDE NO BRASIL
No artigo 200, inciso V, da Constituição Federal de 1988, haviam sido estabelecidas as competências do sistema de saúde do País, dentre as quais se inclui o incremento do desenvolvimento científico e tecnológico em sua área de atuação. A Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde foi formulada em 2004, como parte integrante da Política Nacional de Saúde, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)44. Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Ciência e Tecnologia. Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde. 2.ed. Brasília (DF); 2008. (Série B. Textos Básicos em Saúde)., e componente da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, estando subordinada aos mesmos princípios que regem esta última: o mérito técnico-científico e a relevância social66. Novaes HMD, Elias FTS. Uso da avaliação de tecnologias em saúde em processos de análise para incorporação de tecnologias no Sistema Único de Saúde no Ministério da Saúde. Cad Saude Publica. 2013;29 Supl 1:s7-16. DOI:10.1590/0102-311X00008413
https://doi.org/10.1590/0102-311X0000841... ,aaBrasil. Decreto nº 8.065, de 7 de agosto de 2013. Aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções Gratificadas do Ministério da Saúde e remaneja cargos em comissão. Brasília (DF): 2013 [citado 2015 jan 29]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Decreto/D8065.htm .
A aprovação da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde em 2004 havia resultado de um consenso coletivo a respeito da pertinência em realizar ações indutoras do fomento à ciência, tecnologia e inovação, vinculadas às necessidades do SUS, a fim de reverter a frágil articulação entre as ações de fomento em Ciência, Tecnologia e Inovação e a política de saúde. Esse esforço coletivo teve o envolvimento, em todas as suas etapas, de quinze mil integrantes dos setores da saúde, ciência e tecnologia e educação44. Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Ciência e Tecnologia. Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde. 2.ed. Brasília (DF); 2008. (Série B. Textos Básicos em Saúde)..
O objetivo da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde, como também da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, consiste em contribuir para que o desenvolvimento nacional ocorra em bases sustentáveis, por meio da produção de conhecimentos tecnológicos e científicos vinculados às necessidades econômicas, sociais, culturais e políticas do País44. Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Ciência e Tecnologia. Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde. 2.ed. Brasília (DF); 2008. (Série B. Textos Básicos em Saúde)..
A criação da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE), em 2003, propiciou a incorporação gradual e progressiva, nas políticas públicas de saúde, de temáticas e demandas até então debatidos nas áreas de Ciência, Tecnologia e Inovação; por outro lado, foram estabelecidas interações mais ativas com o campo da saúde. Dessa forma, a criação de uma Secretaria com esse perfil representou um fator decisivo para a efetivação da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde44. Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Ciência e Tecnologia. Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde. 2.ed. Brasília (DF); 2008. (Série B. Textos Básicos em Saúde)..
A SCTIE está estruturada em quatro departamentos: Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos, Ciência e Tecnologia, Complexo Industrial e Inovação em Saúde e, mais recentemente, Departamento de Gestão e Incorporação de TecnologiasaaBrasil. Decreto nº 8.065, de 7 de agosto de 2013. Aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções Gratificadas do Ministério da Saúde e remaneja cargos em comissão. Brasília (DF): 2013 [citado 2015 jan 29]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Decreto/D8065.htm . Os departamentos conjuntamente buscam o desenvolvimento de programas e ações por meio da abordagem de Ciência, Tecnologia e Inovação no campo da saúde, a qual compreende uma relação intrínseca entre pesquisa e desenvolvimento; produção e inovação; incorporação de tecnologias; atenção, vigilância e promoção da saúde, conforme representado na Figura 1.
EVOLUÇÃO DA PRODUTIVIDADE CIENTÍFICA E DO FOMENTO À CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO EM SAÚDE NO BRASIL
De acordo com a SCImago Journal & Country Rank, o Brasil ocupou no ano de 2014 a 14ª posição mundial no número absoluto de artigos científicos em saúde publicados em periódicos indexados na base de dados Scopus®. Quanto à evolução da produtividade científica em saúde entre os anos de 1996 e 2014 no âmbito dos países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), o Brasil ocupa a 3ª posição, ficando atrás da China e da ÍndiabbCountry Ranks of SCImago Journal & Country Rank. [citado 2015 nov 24]. Disponível em: http://www.scimagojr.com/countryrank.php?area=2700&category=0®ion=all&year=2014&order=it&min=0&min_type=it . Adicionalmente, a produtividade científica em saúde no Brasil cresceu expressivamente nas últimas duas décadas. Em 1996, o Brasil era responsável por aproximadamente 40,2% e 0,7% da produtividade científica em saúde na América Latina e mundialmente, respectivamente. Entretanto, em 2014, esses percentuais passaram para 55,2% e 2,2%, respectivamenteccSJR SCImago Journal & Country Rank. Country search: Brazil. [citado 2015 nov 24]. Disponível em: http://www.scimagojr.com/countrysearch.php?country=BR .
No tocante ao fomento à pesquisa em saúde no Brasil, observa-se um aumento significativo dos dispêndios à Ciência, Tecnologia e Inovação na última década, totalizando aproximadamente R$4,5 bilhões de reais (Figura 2).
Evolução dos dispêndios* do CNPq/MCTI no fomento à pesquisa (bolsas no país + bolsas no exterior + auxílio à pesquisa) nas áreas de Ciências da Saúde e Biológicas em milhões de reais.
PAPEL DO DECIT NO FOMENTO À PESQUISA EM SAÚDE NO BRASIL
Desde a criação do Departamento de Ciência e Tecnologia (Decit) – oficializado pelo Decreto 3.496, de 1º de junho de 2000 – o Ministério da Saúde vem realizando avanços significativos no fomento à pesquisa em saúde no Brasil, bem como na formulação, implementação e avaliação de Políticas Nacionais de Ciência, Tecnologia e Inovação em saúde, visando à utilização do conhecimento científico e tecnológico em todos os níveis de gestão do SUS. Dentre as modalidades de fomento à pesquisa praticadas pelo Decit, destacam-se o fomento nacional, o fomento descentralizado (Programa Pesquisa para o SUS: Gestão Compartilhada em Saúde) e as contratações diretas. Somente de 2011 a 2015 foram financiados 1.514 projetos, totalizando aproximadamente R$292 milhões investidos por esse departamento e seus parceirosddMinistério da Saúde. Pesquisa Saúde: Base de Dados Gerenciais do Decit/SCTIE/MS. Brasília (DF); 2015 [citado 2015 nov 24]. Disponível em: http://200.214.130.94/bdgdecit/index.php .
A atuação do Decit por meio das parcerias nacionais e internacionais – como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, a Financiadora de Estudos e Projetos, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, as Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa, as Secretarias de Estado da Saúde, a Bill & Melinda Gates Foundation, o National Institute of Health, a Agencia Argentina de Promoción Científica y Tecnológica, dentre outras – tem possibilitado o incremento do aporte de recursos de outras instituições e a formação de redes de colaboração científica a nível nacional e internacional em pesquisas estratégicas e prioritárias para o Ministério da Saúde visando o fortalecimento do SUS.
FOMENTO DO DECIT NA ÁREA DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA
Todas as ações de fomento do Decit têm como objetivo comum financiar pesquisas que fortaleçam os princípios doutrinários do SUS – a promoção da universalidade, da equidade, da integralidade e da resolutividade. Quanto à assistência farmacêutica, o Decit, por meio de seus editais nacionais, estaduais (Programa Pesquisa para o SUS: Gestão Compartilhada em Saúde) e contratações diretas, financiou no período de 2011 a 2014 cerca de 228 pesquisas, com investimentos na ordem de R$33,5 milhões.
Reconhecendo que o País carecia de estudo nacional de base populacional especifico para identificar aspectos referentes à Política Nacional de Assistência Farmacêutica (PNAF)eeMinistério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 338, de 6 de maio de 2004. Aprova a Política Nacional de Assistência Farmacêutica e estabelece seus princípios gerais e eixos estratégicos. Diario Oficial Uniao. 20 maio 2004; Seção I., a SCTIE investiu mais de R$9,4 milhões na PNAUM.
O PAPEL DO DEPARTAMENTO DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA E INSUMOS ESTRATÉGICOS NAS POLÍTICAS FARMACÊUTICAS NACIONAIS
Nos últimos anos, a assistência terapêutica integral, assegurada pela Lei Orgânica da SaúdeffBrasil. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diario Oficial Uniao. 20 set 1990; Seção I:18055., tem sido foco de reflexões e debates entre gestores, profissionais, acadêmicos do campo da saúde, Poder Judiciário e outros atores da sociedade, no que se refere ao princípio da integralidade, aos critérios de incorporação de tecnologias em saúde e à disponibilidade dos medicamentos para a população55. Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos. Serviços farmacêuticos na atenção básica à saúde. Brasília (DF); 2014. (Cuidado Farmacêutico na Atenção Básica; caderno 1)..
Para cumprir com esse requisito, foi iniciada em escala nacional a efetivação da Assistência Farmacêutica como política pública, por meio da promulgação da Política Nacional de MedicamentosggMinistério da Saúde. Portaria nº 3.916, de 30 de outubro de 1998. Aprova a Política Nacional de Medicamentos, cuja íntegra consta no anexo desta portaria. Diario Oficial Uniao. 10 nov 1998; Seção 1:18-22.. Esta política tem as seguintes finalidades principais: garantia da segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos; promoção do uso racional dos medicamentos; e acesso da população aos medicamentos considerados essenciais55. Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos. Serviços farmacêuticos na atenção básica à saúde. Brasília (DF); 2014. (Cuidado Farmacêutico na Atenção Básica; caderno 1)..
O aprimoramento da Política Nacional de Medicamentos visou à complementação e ao aprofundamento das propostas da Assistência Farmacêutica no País, de modo a incorporar, de forma mais explícita, os princípios doutrinários da universalidade, integralidade e equidade e as ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, estabelecidos no SUS.
A partir de uma abordagem integradora, a PNAF foi formulada em 2004 e é compreendida como política pública e parte integrante da Política Nacional de Saúde77. Novaes HMD, Carvalheiro JR. Ciência, tecnologia e inovação em saúde e desenvolvimento social e qualidade de vida: teses para debate. Cienc Saude Coletiva. 2007;12 Supl:1841-9. DOI:10.1590/S1413-81232007000700007
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A Resolução que promulgou a PNAFeeMinistério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 338, de 6 de maio de 2004. Aprova a Política Nacional de Assistência Farmacêutica e estabelece seus princípios gerais e eixos estratégicos. Diario Oficial Uniao. 20 maio 2004; Seção I. define a Assistência Farmacêutica como conjunto de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, individual e coletivamente, utilizando o medicamento como insumo essencial, visando ao seu acesso e uso racional. Esse conjunto de ações envolve “a pesquisa, o desenvolvimento e a produção de medicamentos e insumos, bem como sua seleção, programação, aquisição, distribuição, dispensação, garantia da qualidade dos produtos e serviços, acompanhamento e avaliação de sua utilização, na perspectiva da obtenção de resultados concretos e da melhoria da qualidade de vida da população” (p.52)eeMinistério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 338, de 6 de maio de 2004. Aprova a Política Nacional de Assistência Farmacêutica e estabelece seus princípios gerais e eixos estratégicos. Diario Oficial Uniao. 20 maio 2004; Seção I..
Desde 2013, com a criação do Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos, institucionalizou-se um setor nacional responsável pela formulação e coordenação das políticas nacionais farmacêuticas no Brasil. Entre outras competências, o Departamento é responsável por cooperar tecnicamente no aperfeiçoamento da capacidade gerencial e operacional de estados e municípios; promover, normatizar e coordenar a aquisição e distribuição de insumos estratégicos, nos diferentes níveis de atenção; fomentar, monitorar e avaliar a implantação de serviços de Assistência Farmacêutica e promover a qualificação dos serviços farmacêuticos no SUS.
O Estado brasileiro vem desenvolvendo diferentes iniciativas para implementação dessas políticas e garantia do acesso da população à Assistência Farmacêutica e aos medicamentos. Entre as iniciativas, constam o Programa Farmácia Popular do Brasil, em 2004; a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, em 2006; a conformação do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica, em 2009; o Programa Nacional de Qualificação da Assistência Farmacêutica no âmbito do SUS (QUALIFAR-SUS), em 2012hhMinistério da Saúde. Portaria nº 1.214, de 13 de junho de 2012. Institui o Programa Nacional de Qualificação da Assistência Farmacêutica no âmbito do Sistema Único de Saúde (QUALIFAR-SUS). Diario Oficial Uniao. 14 jun 2012; Seção I:29-30., dentre outras. Tais políticas são indutoras de desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação no País.
Além do advento de políticas públicas, programas e iniciativas, o Ministério da Saúde vem garantindo e ampliando o investimento destinado à Assistência Farmacêutica no País, o qual passou de um recurso de cerca de R$2 bilhões, em 2003, para aproximadamente R$15 bilhões em 2015 (Figura 3).Os crescentes investimentos nas políticas farmacêuticas no Brasil demandam, dos gestores públicos, informações e racionalidade no planejamento voltadas à implementação dessas políticas. Portanto, tornou-se imperativo obter dados mais precisos e representativos do acesso ao medicamento e de seu uso racional por parte da população. Nesse contexto, a Pesquisa Nacional sobre Acesso, Utilização e Promoção do Uso Racional de Medicamento torna-se uma estratégia institucional para avaliar o impacto da implementação das políticas farmacêuticas no País.
Evolução dos dispêndios (em bilhões de reais) do Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde. Brasil, 2003-2015.
É necessário aferir se os esforços governamentais investidos para ampliar o acesso e a garantia dos benefícios da Assistência Farmacêutica à população estão repercutindo na redução dos gastos do orçamento familiar para a aquisição de medicamentos no País, e se os recursos aplicados estão se transformando em impactos efetivos na saúde da população brasileira, como a utilização adequada dos medicamentos, nos diferentes estratos populacionais e nas grandes regiões brasileirasiiCosta KS. Acesso e uso de medicamentos: inquéritos de saúde como estratégia de avaliação [tese]. Campinas: Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas; 2014 [citado 2015 out 30]. Disponível em: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000928053 .
A PESQUISA NACIONAL SOBRE ACESSO, UTILIZAÇÃO E PROMOÇÃO DO USO RACIONAL DE MEDICAMENTO – PNAUM
O Ministério da Saúde instituiu, por meio da Portaria 2.077, de 17 de setembro de 2012jjMinistério da Saúde. Portaria nº 2.077, de 17 de setembro de 2012. Institui a Pesquisa Nacional sobre Acesso, Utilização e Promoção do Uso Racional de Medicamentos no Brasil (PNAUM). Diario Oficial Uniao. 19 set 2012; Seção I:36., a PNAUM, operacionalizada por duas estratégias articuladas (componentes): o Componente Populacional (inquérito) e o Componente Serviços (Avaliação dos Serviços de Assistência Farmacêutica na Atenção Básica). O objetivo geral da pesquisa é avaliar o acesso, a utilização e o uso racional de medicamentos por parte da população brasileira e sua efetivação na atenção básica do SUS.
O Componente Inquérito da PNAUM, coordenado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, compreendeu uma pesquisa domiciliar, de delineamento transversal e abrangência nacional; os primeiros resultados desse componente estão apresentados neste suplemento. O Componente Avaliação dos Serviços de Assistência Farmacêutica na Atenção Básica, coordenado pela Universidade Federal de Minas Gerais, consistiu em uma pesquisa de natureza quali-quantitativa, com o propósito de avaliar as políticas públicas farmacêuticas na Atenção Básica do País (resultados a serem apresentados em um segundo suplemento temático).
O processo de formulação e pactuação da PNAUM, envolvendo 11 universidades públicas estaduais e federais de diferentes regiões do País, iniciou-se com a formação da equipe de pesquisadores, em 2009, e materializou-se em setembro de 2013, com início dos trabalhos nas grandes regiões e municípios brasileiros. Houve supervisão executiva dos representantes nomeados pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, integrantes do comitê gestor da PNAUM, durante todo o período do estudo, por meio de acompanhamento presencial, participação em reuniões técnicas e relatórios de progresso.
PERSPECTIVAS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE COM RELAÇÃO AOS RESULTADOS DA PNAUM
A partir da consolidação e análise dos dados da PNAUM, o Ministério da Saúde tenciona avançar e aprimorar a implementação, o monitoramento e a avaliação contínua das políticas farmacêuticas (Política Nacional de Medicamentos e PNAF) no País. Os resultados permitirão ampliar o conhecimento na área, estabelecer indicadores nacionais sobre acesso e uso racional de medicamentos no Brasil, priorizar rumos estratégicos das políticas e dos programas, aferir os esforços governamentais investidos no acesso e na garantia dos benefícios da Assistência Farmacêutica e disseminar nacional e internacionalmente os resultados obtidos com diferentes atores da sociedade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo de incorporação das tecnologias de saúde demanda a implantação de registros estruturados, os quais propiciem a análise dos impactos gerados por tais tecnologias, em consonância com as demandas crescentes dos diferentes setores econômicos e sociais do País66. Novaes HMD, Elias FTS. Uso da avaliação de tecnologias em saúde em processos de análise para incorporação de tecnologias no Sistema Único de Saúde no Ministério da Saúde. Cad Saude Publica. 2013;29 Supl 1:s7-16. DOI:10.1590/0102-311X00008413
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Conforme exposto, a fragilidade das informações e dos indicadores consistentes e padronizados sobre a evolução do Complexo Econômico-Industrial da Saúde, a Assistência Farmacêutica e o campo da Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde apresenta-se como limite não somente em termos da produção e avaliação, mas no tocante à assimilação e consolidação de padrões de indicadores preconizados ou pactuados, para subsidiar a implementação de políticas88. Rede Interagencial de Informação para a Saúde. Indicadores básicos para a saúde no Brasil: conceitos e aplicações. 2.ed. Brasília (DF): Organização Pan-Americana da Saúde; 2008.. Dentre os efeitos negativos inserem-se as limitações que impedem a incorporação dos impactos do desenvolvimento científico e tecnológico sobre a saúde das populações, em maior escala77. Novaes HMD, Carvalheiro JR. Ciência, tecnologia e inovação em saúde e desenvolvimento social e qualidade de vida: teses para debate. Cienc Saude Coletiva. 2007;12 Supl:1841-9. DOI:10.1590/S1413-81232007000700007
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No contexto do presente artigo, o Brasil não dispunha, até então, de dados produzidos por investigação científica de âmbito nacional, compartilhada por instituições acadêmicas e órgãos gestores de saúde, realizada com a temática exclusiva da Assistência Farmacêutica. Esse tipo de avaliação possibilita obter subsídios com potencial de nortear iniciativas governamentais e políticas públicas de farmacêuticas, de modo a favorecer a consolidação de ações de saúde mais equânimes no País e a melhoria das condições de saúde e qualidade de vida da população brasileira.
No presente suplemento serão apresentados os primeiros resultados da PNAUM em relação ao componente populacional. A equipe de pesquisadores buscou desenhar os artigos a partir do conjunto dos objetivos específicos da Pesquisa, de modo a respondê-los. Para isso, além do aspecto metodológico da PNAUM, serão abordados temas relacionados ao acesso global e gratuito aos medicamentos; ao uso de medicamentos em idosos, crianças e portadores de hipertensão; à utilização de medicamentos genéricos; aos gastos catastróficos; à automedicação; dentre outros temas relevantes para a área.
O panorama delineado neste artigo também buscou refletir a respeito da medida presumivelmente mais estruturante, introduzida no período recente na Política de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde, no âmbito do Ministério da Saúde: uma ação integradora das várias dimensões do desenvolvimento em saúde, ao contemplar o fomento à pesquisa, a incorporação do incremento tecnológico com base em fundamentos científicos e o patamar do desenvolvimento produtivo, no âmbito do Complexo Econômico-Industrial da Saúde, com a finalidade de favorecer o acesso à saúde em bases universais, integrais e equânimes.
Buscou-se também enfatizar uma abordagem de desenvolvimento na qual, além da demanda de natureza técnica, o conceito de inovação se reportasse ao processo político e social, de forma a refletir a dimensão ética e social inerente à inovação, uma vez que esta se vincula ao atendimento das necessidades humanas, como lembra Celso Furtado:
O desenvolvimento (...) pode ser definido como processo de mudança social pelo qual o crescente número de necessidades humanas, pré-existentes ou criadas pela própria mudança, são satisfeitas através de uma diferenciação no sistema produtivo, gerado pela introdução de inovações tecnológicas (p. 39-40)88. Rede Interagencial de Informação para a Saúde. Indicadores básicos para a saúde no Brasil: conceitos e aplicações. 2.ed. Brasília (DF): Organização Pan-Americana da Saúde; 2008..
Apresentamos a todos o convite à leitura deste suplemento, integrado por um conjunto de artigos considerados de elevada relevância para a Saúde Coletiva no Brasil, na expectativa de que o conteúdo da leitura possa contribuir para maior eficácia na efetivação das políticas públicas farmacêuticas, resultando em benefícios à saúde da população brasileira.
Referências bibliográficas
- 1Furtado C. Dialética do desenvolvimento. Rio de Janeiro (RJ): Fundo de Cultura; 1964. p. 39-40.
- 2Gadelha CAG. O Complexo Industrial da Saúde: desafios para uma política de inovação e desenvolvimento. In: Ministério da Saúde (BR). Saúde no Brasil: contribuições para a Agenda de Prioridades de Pesquisa. 2.ed. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2006. p.275-301. (Série B. Textos Básicos de Saúde).
- 3Gadelha CAG, Costa LS. Saúde e desenvolvimento no Brasil: avanços e desafios. Rev Saude Publica 2012;46 Supl 1:13-20. DOI:10.1590/S0034-89102012005000062
» https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000062 - 4Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Ciência e Tecnologia. Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde. 2.ed. Brasília (DF); 2008. (Série B. Textos Básicos em Saúde).
- 5Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos, Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos. Serviços farmacêuticos na atenção básica à saúde. Brasília (DF); 2014. (Cuidado Farmacêutico na Atenção Básica; caderno 1).
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» https://doi.org/10.1590/0102-311X00008413 - 7Novaes HMD, Carvalheiro JR. Ciência, tecnologia e inovação em saúde e desenvolvimento social e qualidade de vida: teses para debate. Cienc Saude Coletiva 2007;12 Supl:1841-9. DOI:10.1590/S1413-81232007000700007
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Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
12 Dez 2016
Histórico
- Recebido
29 Jan 2015 - Aceito
25 Fev 2016