Análise de possíveis fatores de interferência no uso da voz durante atividade docente

Bárbara Gabriela Silva Tiago Visacre Chammas Marcia Simões Zenari Renata Rodrigues Moreira Alessandra Giannella Samelli Kátia Nemr Sobre os autores

RESUMO

OBJETIVO

Mensurar o risco de disfonia em professores, bem como investigar se os aspectos vocais perceptivo-auditivos e acústicos em situação de ruído, a relação sinal-ruído e os níveis de ruído em sala de aula estão associados à presença de disfonia.

MÉTODOS

Pesquisa transversal observacional com 23 professores da educação infantil e ensino fundamental de uma escola particular do município de São Paulo divididos nos grupos sem disfonia e com disfonia. Foram realizados os seguintes procedimentos: protocolo de rastreio de risco de disfonia geral (PRRD-Geral) e complementar para voz falada - professor (PRRD-Específico), gravação da voz durante aula e em situação individual em sala silenciosa, medição da relação sinal-ruído e dos níveis de ruído das salas de aula.

RESULTADOS

Foram encontradas diferenças entre os grupos quanto à atividade física (PRRD-Geral) e particularidades da profissão (PRRD-Específico), bem como em todos os aspectos da análise vocal perceptivo-auditiva. No grupo sem disfonia, foram encontrados sinais de desgaste da voz. Quanto aos recursos vocais nas situações de ruído e silêncio, identificamos diferença para produção de ataque vocal brusco e tendência de uma fala mais precisa na situação-ruído. Tanto a relação sinal-ruído quanto os níveis de ruído das salas durante a aula foram elevados nos dois grupos.

CONCLUSÕES

Os professores dos dois grupos estão expostos a riscos elevados para o desenvolvimento de disfonias e apresentam sinais vocais negativos em maior ou menor grau. A relação sinal-ruído apresentou-se inadequada em grande parte das salas de aula, considerando-se as normas tanto para crianças com audição normal quanto para aquelas com perda auditiva, assim como os níveis de ruído equivalentes.

DESCRITORES
Professores Escolares; Distúrbios da Voz; epidemiología; Ruído; efeitos adversos; Perda Auditiva; Fatores de Risco; Condições de Trabalho

INTRODUÇÃO

Estudos sobre a voz dos professores demonstram elevado índice de disfonia nessa classe profissional33. Behlau M, Zambon F, Guerrieri AC, Roy N. Epidemiology of voice disorders in teachers and nonteachers in Brazil: prevalence and adverse effects. J Voice. 2012;26(5):665.e9-18. https://doi.org/10.1016/j.jvoice.2011.09.010
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,1010. Houtte V, Claeys S, Wuyts F, Van Lierde KV. The impact of voice disorders among teachers: vocal complaints, treatment-seeking behavior, knowledge of vocal care, and voice-related absenteeism. J Voice. 2011;25(5):571-5. https://doi.org/10.1016/j.jvoice.2010.04.008
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,2424. Simões-Zenari M, Bitar ML, Nemr NK. Efeito do ruído na voz de educadoras de instituições de educação infantil. Rev Saude Publica. 2012;46(4):657-64. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000038
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. A gravidade da disfonia pode interferir negativamente na viabilização do trabalho docente, com consequente prejuízo para a compreensão dos alunos2222. Servilha EAM, Correia JM. Correlações entre condições do ambiente, organização do trabalho, sintomas vocais autorreferidos por professores universitários e avaliação fonoaudiológica. Disturb Comun. 2014 [cited 2017 Sep 30];26(3):452-62. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/16222
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e, em casos mais graves, afastamento desses profissionais de suas funções1919. Provenzano LCFA, Sampaio TMM. Prevalência de disfonia em professores do ensino púbico estadual afastados de sala de aula. Rev CEFAC. 2010;12(1):97-108.https://doi.org/10.1590/S1516-18462010000100013
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.

Dentre as condições de trabalho que permeiam o processo saúde-doença dos docentes, destacam-se as longas jornadas de trabalho, a utilização vocal prolongada e excessiva55. Biserra MP, Giannini SPP, Paparelli R, Ferreira LP. Voz e trabalho: estudo dos condicionantes das mudanças a partir do discurso de docentes. Saude Soc. 2014;23(3):966-78. https://doi.org/10.1590/S0104-12902014000300019
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, bem como os níveis elevados e constantes de ruído nas salas de aula1111. Libardi A, Gonçalves CGO, Vieira TPG, Silverio KCA, Rossi D, Penteado RZ. O ruído em sala de aula e a percepção dos professores de uma escola de ensino fundamental de Piracicaba. Disturb Comun. 2006 [cited 2017 Sep 30];18(2):167-78. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/11782
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, acima do recomendado pela NBR 10152, entre 40 dB e 50 dB(A)aaAssociação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10152: níveis de ruído para conforto acústico. Rio de Janeiro: ABNT; 2000.

Durante as aulas, o ruído excessivo, além de interferir na atenção e concentração dos docentes1111. Libardi A, Gonçalves CGO, Vieira TPG, Silverio KCA, Rossi D, Penteado RZ. O ruído em sala de aula e a percepção dos professores de uma escola de ensino fundamental de Piracicaba. Disturb Comun. 2006 [cited 2017 Sep 30];18(2):167-78. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/11782
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e dificultar o processamento auditivo das informações essenciais para o desenvolvimento das atividades, transfigura-se em um estímulo sonoro competitivo à produção vocal, podendo gerar ajustes inadequados da voz, elevando o risco de disfonia2020. Rantala LM, Hakala S, Holmqvist S, Sala E. Classroom noise and teacher's voice production. J Speech Lang Hear Res. 2015;58(5):1397-406. https://doi.org/10.1044/2015_ISLHR-S-14-0248
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,2424. Simões-Zenari M, Bitar ML, Nemr NK. Efeito do ruído na voz de educadoras de instituições de educação infantil. Rev Saude Publica. 2012;46(4):657-64. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000038
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.

Um fator acústico de interferência em sala de aula, e importante ferramenta para monitorar tanto o ruído quanto as vozes dos professores, consiste na relação sinal-ruído (RSR)44. Bentler RA. List equivalency and test-retest reliability of the speech in noise test. Am J Audiol. 2000;9(2):84-100. https://doi.org/10.1044/1059-0889(2000/010)
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, calculada a partir da diferença, em decibels (dB), entre o nível do sinal de interesse (no caso, a voz do professor) e a intensidade do ruído de fundo do ambiente; pode variar de acordo com a distância e intensidade do sinal de interesse, a reverberação do ambiente e o ruído de fundo88. Dreossi RCF, Momensohn-Santos T. Noise and its interference over students in a classroom environment: literature review. Pro-Fono Rev Atual Cient. 2005;17(2):251-8. https://doi.org/10.1590/S0104-56872005000200014
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.

A investigação, tanto do risco de disfonia quanto do ruído durante a atividade docente, tem o propósito de auxiliar no direcionamento de programas e atividades de promoção e prevenção de distúrbios vocais, bem como nas modificações necessárias na organização e condições de trabalho para, não só diminuir o número de afastamentos dos professores do trabalho, mas melhorar o ensino e a qualidade de vida dos envolvidos.

O objetivo deste estudo foi mensurar o risco de disfonia em professores, bem como investigar se os aspectos vocais perceptivo-auditivos e acústicos em situação de ruído, a relação sinal-ruído e os níveis de ruído em sala de aula estão associados à presença de disfonia.

MÉTODOS

Pesquisa transversal observacional aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Parecer 169/15), realizada em uma escola de ensino infantil e fundamental particular do município de São Paulo.

Vinte e três professoras, com média de idade de 37,26 anos (DP = 7,0), assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Na própria escola, foram realizados os seguintes procedimentos:

  • Aplicação do Protocolo de Rastreio de Risco de Disfonia Geral (PRRD-Geral)1515. Nemr K, Simões-Zenari M, Duarte JMT, Lobrigate KE, Bagatini FA. Dysphonia risk screening protocol. Clinics. 2016;71(3):114-27. https://doi.org/10.6061/clinics/2016(03)01
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    e Protocolo de Rastreio de Risco de Disfonia Complementar para Profissional da Voz Falada, Professor (PRRD-Específico)bbSampaio AP, Simões-Zenari M, Nemr NK. Aplicabilidade de protocolo de rastreio de risco de disfonia em professores. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2015. Trabalho de Conclusão de Curso de Fonoaudiologia., para identificação de queixas vocais, hábitos de vida geral e ocupacionais, entre outros. Os protocolos foram explicados pelos pesquisadores e preenchidos pelos professores na presença dos mesmos.

  • Gravação da voz em ambiente silencioso (situação-silêncio) para posterior análise vocal perceptivo-auditiva e acústica: vogais sustentadas, frases e fala espontânea de acordo com o protocolo CAPE-VccAmerican Speech-Language Hearing Association, ASHA Division 3 - Voice and Voice Disorders; University of Pittisburg, Department of Communication Science and Disorders. A Consensus Auditory - Perceptual Evaluation of Voice (CAPE -V). Pittisburgh: ASHA; 2002 [citado 23 out 2017]. Disponível em: https://csd.wisc.edu/slpgames/capev_activities/capev_Instructions.pdf . Foi utilizado o equipamento ZOOM H4 posicionado perpendicularmente a 30 cm da boca do professor.

  • Gravação da voz com o gravador ZOOM H4 posicionado no meio da sala de aula (situação-ruído) durante 15 minutos de fala efetiva (situação de aula expositiva).

  • Simultaneamente à gravação dos professores nas salas de aula, utilizou-se um dosímetro, SVANTEK (modelo SV102, Polônia), posicionado no centro da sala, para medição dos níveis de pressão sonora (níveis máximo, mínimo e ruído equivalente [Leq]), durante 15 minutos.

Análise dos Dados

Foi obtido escore final dos protocolos de rastreio, que consiste na soma dos valores dos escores parciais de cada subitem; no PRRD-Geral, varia de zero a 131 e no PRRD-Específico, de zero a 56 para homens e de zero a 60 para mulheres1515. Nemr K, Simões-Zenari M, Duarte JMT, Lobrigate KE, Bagatini FA. Dysphonia risk screening protocol. Clinics. 2016;71(3):114-27. https://doi.org/10.6061/clinics/2016(03)01
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. Quanto maior o valor obtido, maior o risco de disfonia1515. Nemr K, Simões-Zenari M, Duarte JMT, Lobrigate KE, Bagatini FA. Dysphonia risk screening protocol. Clinics. 2016;71(3):114-27. https://doi.org/10.6061/clinics/2016(03)01
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,bbSampaio AP, Simões-Zenari M, Nemr NK. Aplicabilidade de protocolo de rastreio de risco de disfonia em professores. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2015. Trabalho de Conclusão de Curso de Fonoaudiologia..

A análise perceptivo-auditiva das gravações de voz obtidas no silêncio foi realizada por um juiz fonoaudiólogo especialista em voz com ampla experiência em avaliação com CAPE-V e elevada confiabilidade interna de julgamento, aferida em estudo anterior1515. Nemr K, Simões-Zenari M, Duarte JMT, Lobrigate KE, Bagatini FA. Dysphonia risk screening protocol. Clinics. 2016;71(3):114-27. https://doi.org/10.6061/clinics/2016(03)01
https://doi.org/10.6061/clinics/2016(03)...
. A partir do valor do grau geral de alteração vocal, os professores foram divididos em dois grupos: sem disfonia (GSD), para valores entre zero e 34; ou com disfonia (GCD), para valores superiores a 341212. Martins PC, Couto TE, Gama ACC. Avaliação perceptivo-auditiva do grau de desvio vocal: correlação entre escala visual analógica e escala numérica. CoDAS. 2015;27(3):279-84. https://doi.org/10.1590/2317-1782/20152014167
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. Procedeu-se a avaliação acústica da mesma amostra por meio do programa de uso livre Praat, considerando-se as medidas automáticas: frequência fundamental (normalidade: 150 Hz a 250 Hz); jitter, (0,30% a 0,50%); shimmer (3% e 5%); e proporção harmônico-ruído (22 dB)22. Behlau M, Madazio G, Feijó D, Pontes P. Avaliação da voz. In: Behlau M, organizadora. Voz: o livro do especialista. Rio de Janeiro: Revinter; 2001. v. 1, p.91-113.,1717. Pinho SMR, Tsuji DH. Fundamentos em laringología e voz. Rio de Janeiro: Revinter; 2006.,ddLeão SHS. Análise espectrográfica acústica de vozes rugosas, soprosas e tensas [dissertação]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP; 2008..

As vozes captadas em situação-silêncio e situação-ruído foram analisadas por dois dos pesquisadores por consenso, sendo classificadas quanto aos recursos vocais99. Feijó D. Avaliando a comunicação oral. In: Kyrillos LR, organizadora. Fonoaudiologia e telejornalismo. São Paulo: Revinter; 2003. p.75-88.: tipo de voz (neutro, alterado); ataque vocal (isocrônico, brusco, aspirado); loudness (forte, médio, fraco); pitch (grave, médio, agudo); ressonância (equilibrada, oral, laringofaríngica, nasal, hiponasal); articulação (precisa, reduzida); velocidade de fala (lenta, média, acelerada); e coordenação pneumofonoarticulatória (presente, ausente).

Com o registro vocal captado em aula, mensurou-se a RSR de cada sala por meio do programa Audacity 2.0.6, protocolo Canadian E-Ramp-Inc. Para classificação da RSR em adequada ou inadequada, foram considerados os valores de corte de +15 dB para salas de aula de crianças com audição normal (ASHA, 2000)eeCrandell CC, Smaldino JJ. Classroom acoustics for children with normal hearing and with hearing impairment. Lang Speech Hear Serv Sch. 2000;31(4):362-70. https://doi.org/10.1044/0161-1461.3104.362 e de +20 dB para crianças com perda auditiva (British Association of Teachers of the Deaf, 2009)ffGlasgow M. Classroom acoustics: recommended standards: classroom acoustic standards for children with sensori-neural hearing loss. Cheshire (UK): The British Association of Teachers of the Deaf; 2009..

Em relação à medição dos níveis de pressão sonora em sala de aula, para classificação em adequados ou elevados, utilizou-se a NBR 10152 (ABNT, 2000)aaAssociação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10152: níveis de ruído para conforto acústico. Rio de Janeiro: ABNT; 2000, que considera aceitável para salas de aula ruído ambiente de 40 dB a 50 dB(A).

Análise Estatística

Foram utilizadas medidas descritivas e aplicados os testes ANOVA não pareado e qui-quadrado (teste Exato MID-P) com nível de significância de 0,05.

RESULTADOS

Quanto à divisão dos grupos a partir dos valores do Grau Geral do CAPE-V, obteve-se: GSD composto por 11 participantes (média do escore de 20,81, DP = 10,1) e GCD composto por 12 indivíduos (média do escore de 52,91, DP = 12,43).

No que se refere ao PRRD-Geral, encontrou-se diferença apenas para o escore parcial do subitem prática regular de atividade física (Tabela 1), com menor ocorrência no GCD. Para o PPRD-Específico, encontrou-se diferença no subitem especificidades da profissão (Tabela 1), em que o GSD apresentou pontuação mais elevada. Em relação ao escore final do PRRD-Geral e do PRRD-Específico, não houve diferença entre os grupos.

Tabela 1
Média, desvio padrão, mínimo e máximo referentes aos escores do PRRD-Geral e PRRD-Complementar para os grupos com e sem disfonia.

Não foram encontradas diferenças entre os grupos em nenhum dos aspectos vocais acústicos avaliados. Em relação ao CAPE-V, observou-se diferença entre os grupos em todos os aspectos, com maior alteração para o GCD (Tabela 2).

Tabela 2
Média, desvio padrão, mínimo e máximo referentes à análise acústica e perceptivo-auditiva para os grupos com e sem disfonia.

Quanto às médias das RSR obtidas durante as aulas, verificou-se tendência à diferença entre os grupos (p = 0,096), com média maior para o GCD (Tabela 3). Quando avaliada cada sala de aula separadamente, verificou-se que a RSR estava alterada em nove delas (39%), considerando a norma para audição normal, e em 23 salas (95%), considerando a norma para perda auditiva.

Tabela 3
Média, desvio padrão, mínimo e máximo referentes à relação sinal-ruído para os grupos com e sem disfonia.

Quando avaliados os recursos vocais nas duas diferentes situações (ruído e silêncio), observou-se que, na situação-ruído, um maior número de professores realizou ataque vocal brusco comparativamente à situação-silêncio. Além disso, as professoras mostraram tendência a tornar a articulação dos sons da fala mais precisa na situação-ruído (p = 0,052) (Tabela 4).

Tabela 4
Número de professores (n) em cada situação (silêncio e ruído) e em cada classificação dos recursos vocais.

A partir da relação encontrada entre exposição ao ruído e ataque vocal brusco, realizou-se análise de risco para esse fator. Com isso, identificamos que o risco de realizar ataque vocal brusco na situação-ruído corresponde a 21,7% (IC95% 9,2-42,3). No ambiente silencioso, o risco foi inexistente (IC95% 0-16,9).

Quanto às médias dos níveis de ruído medidos nas salas de aula, não foi identificada diferença entre os grupos para nenhuma medida, ainda que os valores das salas do grupo GCD tenham sido mais elevados. As médias de Leq para ambos os grupos demonstram que o ruído nas salas de aula não está adequado para a maioria delas. Apenas duas salas de aula (8,7%) no GSD apresentaram-se com ruído abaixo de 50 dB(A) durante as aulas.

Tabela 5
Média, desvio padrão referentes aos níveis de ruído (Leq, mínimo e máximo em dBA) para os gruposcom e sem disfonia.

DISCUSSÃO

A voz do professor é um tema muito investigado, mas poucos estudos relacionam as questões ambientais ao risco de disfonia77. Cutiva LC, Vogel I, Burdorf A. Voice disorders in teachers and their associations with work-related factors: a systematic review. J Commun Disord. 2013;46(2):143-55. https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.01.001
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,1313. Medeiros AM, Barreto SM, Assunção AA. Voice disorders (dysphonia) in public school female teachers working in Belo Horizonte: prevalence and associated factors. J Voice. 2008;22(6):676-87. https://doi.org/10.1016/j.jvoice.2007.03.008
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. Avaliar esse risco constitui ferramenta importante para ações de promoção da saúde no ambiente escolar, que podem nortear um processo de conscientização dos envolvidos, bem como mudanças de hábitos, além de adequações ambientais que favoreçam a melhora da qualidade de vida. Além disso, ações de promoção da saúde nesse ambiente favorecem o diagnóstico mais precoce das disfonias11. Bassi IB, Assunção AA, Gama ACC, Gonçalves LG. Características clínicas, sócio demográficas e ocupacional de professoras com disfonia. Disturb Comun. 2011 [cited 2017 Sep 30];23(2):173-80. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/8273
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.

O grupo de participantes desta pesquisa foi composto por professoras com média de idade de 37,26 anos. Sabe-se que há maior frequência de mulheres nessa profissão; porém, a faixa etária é bastante variada33. Behlau M, Zambon F, Guerrieri AC, Roy N. Epidemiology of voice disorders in teachers and nonteachers in Brazil: prevalence and adverse effects. J Voice. 2012;26(5):665.e9-18. https://doi.org/10.1016/j.jvoice.2011.09.010
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,55. Biserra MP, Giannini SPP, Paparelli R, Ferreira LP. Voz e trabalho: estudo dos condicionantes das mudanças a partir do discurso de docentes. Saude Soc. 2014;23(3):966-78. https://doi.org/10.1590/S0104-12902014000300019
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,77. Cutiva LC, Vogel I, Burdorf A. Voice disorders in teachers and their associations with work-related factors: a systematic review. J Commun Disord. 2013;46(2):143-55. https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.01.001
https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.0...
,1010. Houtte V, Claeys S, Wuyts F, Van Lierde KV. The impact of voice disorders among teachers: vocal complaints, treatment-seeking behavior, knowledge of vocal care, and voice-related absenteeism. J Voice. 2011;25(5):571-5. https://doi.org/10.1016/j.jvoice.2010.04.008
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,1919. Provenzano LCFA, Sampaio TMM. Prevalência de disfonia em professores do ensino púbico estadual afastados de sala de aula. Rev CEFAC. 2010;12(1):97-108.https://doi.org/10.1590/S1516-18462010000100013
https://doi.org/10.1590/S1516-1846201000...
,2222. Servilha EAM, Correia JM. Correlações entre condições do ambiente, organização do trabalho, sintomas vocais autorreferidos por professores universitários e avaliação fonoaudiológica. Disturb Comun. 2014 [cited 2017 Sep 30];26(3):452-62. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/16222
https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/...
,2424. Simões-Zenari M, Bitar ML, Nemr NK. Efeito do ruído na voz de educadoras de instituições de educação infantil. Rev Saude Publica. 2012;46(4):657-64. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000038
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,bbSampaio AP, Simões-Zenari M, Nemr NK. Aplicabilidade de protocolo de rastreio de risco de disfonia em professores. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2015. Trabalho de Conclusão de Curso de Fonoaudiologia.. Quando comparadas aos homens, as mulheres se mostram mais propensas a alterações vocais pela própria configuração laríngea1313. Medeiros AM, Barreto SM, Assunção AA. Voice disorders (dysphonia) in public school female teachers working in Belo Horizonte: prevalence and associated factors. J Voice. 2008;22(6):676-87. https://doi.org/10.1016/j.jvoice.2007.03.008
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,1818. Pontes P, Kyrillos L, Behlau M, De Biase N, Pontes A. Vocal nodules and laryngeal morphology. J Voice. 2002;16(3):408-14. https://doi.org/10.1016/S0892-1997(02)00112-1
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.

Por meio do PRRD-Geral e do PRRD-Específico, observamos neste estudo que, independentemente de apresentar disfonia, os professores estão expostos a riscos semelhantes para disfonia, como encontrado em estudo anteriorbbSampaio AP, Simões-Zenari M, Nemr NK. Aplicabilidade de protocolo de rastreio de risco de disfonia em professores. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2015. Trabalho de Conclusão de Curso de Fonoaudiologia..

Quanto ao PRRD-Geral, houve diferença entre os grupos apenas quanto à prática regular de atividade física, maior no grupo sem disfonia. No grupo sem disfonia, também foi menor a ocorrência de tensão vocal. Praticantes de atividade física podem ter menores níveis de estresse e tensão corporal1414. Mello MT, Lemos VA, Antunes HKM, Bittencourt L, Santos-Silva R, Tufik S. Relationship between physical activity and depression and anxiety symptoms: a population study. J Affect Disord. 2013;149(1-3):241-6.https://doi.org/10.1016/j.jad.2013.01.035
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e, consequentemente, vocal, o que sugere uma relação entre sedentarismo e disfonia11. Bassi IB, Assunção AA, Gama ACC, Gonçalves LG. Características clínicas, sócio demográficas e ocupacional de professoras com disfonia. Disturb Comun. 2011 [cited 2017 Sep 30];23(2):173-80. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/8273
https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/...
. Além disso, a prática de exercícios físicos diminui os sintomas de depressão e ansiedade1414. Mello MT, Lemos VA, Antunes HKM, Bittencourt L, Santos-Silva R, Tufik S. Relationship between physical activity and depression and anxiety symptoms: a population study. J Affect Disord. 2013;149(1-3):241-6.https://doi.org/10.1016/j.jad.2013.01.035
https://doi.org/10.1016/j.jad.2013.01.03...
, o que impactaria positivamente para a produção vocal sem tensão e na qualidade de vida dos professores. Ressalta-se que a prática de atividade física depende de rotina e hábitos de vida estabelecidos pelo indivíduo e pode ser reforçada em ações de promoção de saúde.

Em relação ao PRRD-Específico, os grupos diferenciaram-se quanto às particularidades da profissão atual, com o GSD com maior escore. Ao observar mais detalhadamente esses dados, observou-se que, no GSD, havia somente professores considerados regentes e apenas no GCD havia professores especialistas (artes, música e informática). No cálculo do escore, o professor regente recebe um ponto a mais do que o especialista por se considerar que, com muita frequência, o especialista destina parte da carga horária das aulas à prática dos alunos e, por isso, poderia se supor que dá menos tempo de aula expositiva do que o regente, o que seria positivo para o bem-estar vocal. Mas, se todos os professores especialistas estavam no GCD, esse fator pode estar sendo minimizado por outros de maior risco para disfonia. Deve-se considerar ainda que as crianças podem ficar mais agitadas nessas aulas, o que poderia levar o professor especialista a retomar os limites fazendo uso da voz. Estudos com outras escolas irão possibilitar análises mais amplas e que poderão indicar, inclusive, a necessidade de revisão do cálculo do escore do PRRD-Específico.

Outro aspecto desse subitem que pontuou mais no GSD foi o número de anos de atuação das professoras junto ao nível de ensino atual. Contrariamente ao encontrado na literatura1515. Nemr K, Simões-Zenari M, Duarte JMT, Lobrigate KE, Bagatini FA. Dysphonia risk screening protocol. Clinics. 2016;71(3):114-27. https://doi.org/10.6061/clinics/2016(03)01
https://doi.org/10.6061/clinics/2016(03)...
,2525. Souza CL, Carvalho FM, Araújo TM, Reis EJFB, Lima VMC, Porto LA. Fatores associados a patologias de pregas vocais em professores. Rev Saude Publica. 2011;45(5):914-21. https://doi.org/10.1590/S0034-89102011005000055
https://doi.org/10.1590/S0034-8910201100...
, as professoras sem alteração vocal indicaram mais anos lecionando em sala de aula em comparação às professoras do GCD. Esse dado também foi observado em outro estudo77. Cutiva LC, Vogel I, Burdorf A. Voice disorders in teachers and their associations with work-related factors: a systematic review. J Commun Disord. 2013;46(2):143-55. https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.01.001
https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.0...
, na caracterização da amostra, em que apenas 33% dos professores com distúrbio vocal apresentavam mais de dez anos de atuação. Esse achado pode indicar uma adaptação positiva dessas profissionais ao longo do tempo ou mesmo algum treinamento recebido, fatores que também podem ser melhor explorados em estudos futuros. Em relação ao nível de ensino, a maior parte das professoras do GSD lecionam para o ensino fundamental e metade das professoras do GCD atuam junto à educação infantil. Estudo realizado com professoras da educação infantil2323. Simões M, Latorre MRDO. Prevalência de alteração vocal em educadoras e sua relação com a auto-percepção. Rev Saude Publica. 2006;40(6):1013-8. https://doi.org/10.1590/S0034-89102006000700008
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200600...
encontrou prevalência de disfonia mais elevada em comparação a outras pesquisas com professores do ensino fundamental, médio e superior, o que pode indicar que as particularidades do trabalho junto a essa faixa etária se configuram como mais um fator a ser considerado.

Desse modo, levando-se em conta as particularidades do trabalho, devem ser consideradas as modificações que podem ocorrer a cada semestre na grade dos docentes quanto às horas/aula e que justificariam um monitoramento periódico para avaliação de possíveis tendências de aumento ou diminuição de riscos; além disso, esse controle poderia contribuir com análises acerca de possível fadiga vocal ao final de cada semestre.

Embora não tenham sido observadas diferenças entre os grupos no que se refere ao escore final do PRRD-Geral e do PRRD-Específico, observou-se maior média no escore do GCD, o que poderia ser melhor evidenciado em estudos com amostras maiores.

As médias obtidas no escore do PRRD-Geral para ambos os grupos se encontraram acima da nota de corte para mulheres, que é de 29,251515. Nemr K, Simões-Zenari M, Duarte JMT, Lobrigate KE, Bagatini FA. Dysphonia risk screening protocol. Clinics. 2016;71(3):114-27. https://doi.org/10.6061/clinics/2016(03)01
https://doi.org/10.6061/clinics/2016(03)...
. Isso representa elevado risco para disfonia para as professoras com e sem alteração vocal, corroborando outros estudos11. Bassi IB, Assunção AA, Gama ACC, Gonçalves LG. Características clínicas, sócio demográficas e ocupacional de professoras com disfonia. Disturb Comun. 2011 [cited 2017 Sep 30];23(2):173-80. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/8273
https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/...
,bbSampaio AP, Simões-Zenari M, Nemr NK. Aplicabilidade de protocolo de rastreio de risco de disfonia em professores. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2015. Trabalho de Conclusão de Curso de Fonoaudiologia..

A diminuição de riscos requer mudanças nas condições e organização do trabalho e depende de mobilizações de instâncias maiores55. Biserra MP, Giannini SPP, Paparelli R, Ferreira LP. Voz e trabalho: estudo dos condicionantes das mudanças a partir do discurso de docentes. Saude Soc. 2014;23(3):966-78. https://doi.org/10.1590/S0104-12902014000300019
https://doi.org/10.1590/S0104-1290201400...
. A partir deste estudo, observou-se que, independentemente da presença e do grau de alteração vocal, os riscos ocupacionais para disfonia aos quais os professores se expõem diariamente são elevados11. Bassi IB, Assunção AA, Gama ACC, Gonçalves LG. Características clínicas, sócio demográficas e ocupacional de professoras com disfonia. Disturb Comun. 2011 [cited 2017 Sep 30];23(2):173-80. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/8273
https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/...
,77. Cutiva LC, Vogel I, Burdorf A. Voice disorders in teachers and their associations with work-related factors: a systematic review. J Commun Disord. 2013;46(2):143-55. https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.01.001
https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.0...
,bbSampaio AP, Simões-Zenari M, Nemr NK. Aplicabilidade de protocolo de rastreio de risco de disfonia em professores. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2015. Trabalho de Conclusão de Curso de Fonoaudiologia..

No que diz respeito à análise acústica das vozes gravadas em ambiente silencioso, de acordo com os parâmetros avaliados, não foram encontradas diferenças entre os grupos. Em estudo pregresso com 28 educadoras, com análise vocal acústica realizada por meio do mesmo software, foram comparados grupos de professores com vozes adequadas, vozes alteradas em grau leve e alteradas em grau moderado2424. Simões-Zenari M, Bitar ML, Nemr NK. Efeito do ruído na voz de educadoras de instituições de educação infantil. Rev Saude Publica. 2012;46(4):657-64. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000038
https://doi.org/10.1590/S0034-8910201200...
. Assim como nesta pesquisa, os autores2424. Simões-Zenari M, Bitar ML, Nemr NK. Efeito do ruído na voz de educadoras de instituições de educação infantil. Rev Saude Publica. 2012;46(4):657-64. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000038
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não observaram diferenças para os parâmetros acústicos frequência fundamental, shimmer e proporção harmônico-ruído. No entanto, encontraram diferenças quanto ao jitter. No presente estudo, apesar de não haver diferença entre os grupos em relação aos parâmetros vocais na análise acústica, a média encontrada no GCD está abaixo dos valores de referência. Pesquisa com 99 professoras, com análise acústica das vozes feita por meio de outro software (Multi-Dimensional Voice Program Advanced), encontrou medidas de jitter, shimmer e frequência fundamental acima da normalidade2121. Ribeiro VV, Cielo CA. Medidas vocais perceptivo-auditivas e acústicas, queixas vocais e características profissionais de professoras de Santa Maria (RS). Audiol Commun Res. 2014;19(4):387-98. https://doi.org/10.1590/S2317-64312014000400001395
https://doi.org/10.1590/S2317-6431201400...
. Os valores da proporção harmônico-ruído foram abaixo do esperado nos dois grupos, indicando que, no GSD, as vozes consideradas sem alteração estão apresentando mais ruído do que seria esperado, o que pode ser sinal de fadiga vocal2424. Simões-Zenari M, Bitar ML, Nemr NK. Efeito do ruído na voz de educadoras de instituições de educação infantil. Rev Saude Publica. 2012;46(4):657-64. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000038
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. Esse dado mostra a importância de se combinar a análise perceptivo-auditiva e a acústica para maior detalhamento.

Na análise vocal perceptivo-auditiva pelo CAPE-V, foram encontradas diferenças em todos os aspectos avaliados quando comparados os dois grupos, com desvios no GCD. Ainda assim, o GSD apresentou soprosidade e rugosidade, ainda que reduzida e não configurando disfonia, mas que pode estar associada às alterações observadas em medidas acústicas como jitter e proporção harmônico-ruído discutidas anteriormente.

A presença maior de rugosidade nas professoras com disfonia pode estar relacionada a alterações de massa nas pregas vocais, como nódulos vocais que são comumente encontrados nessa categoria profissional2222. Servilha EAM, Correia JM. Correlações entre condições do ambiente, organização do trabalho, sintomas vocais autorreferidos por professores universitários e avaliação fonoaudiológica. Disturb Comun. 2014 [cited 2017 Sep 30];26(3):452-62. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/16222
https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/...
e mais frequentemente em mulheres, assim como a soprosidade, por causa da própria configuração laríngea, propensa à existência de fenda glótica1818. Pontes P, Kyrillos L, Behlau M, De Biase N, Pontes A. Vocal nodules and laryngeal morphology. J Voice. 2002;16(3):408-14. https://doi.org/10.1016/S0892-1997(02)00112-1
https://doi.org/10.1016/S0892-1997(02)00...
. Estes dados enfatizam a importância de avaliação das condições laríngeas das professoras com disfonia.

As alterações vocais encontradas reforçam os achados de outros estudos2121. Ribeiro VV, Cielo CA. Medidas vocais perceptivo-auditivas e acústicas, queixas vocais e características profissionais de professoras de Santa Maria (RS). Audiol Commun Res. 2014;19(4):387-98. https://doi.org/10.1590/S2317-64312014000400001395
https://doi.org/10.1590/S2317-6431201400...
,2222. Servilha EAM, Correia JM. Correlações entre condições do ambiente, organização do trabalho, sintomas vocais autorreferidos por professores universitários e avaliação fonoaudiológica. Disturb Comun. 2014 [cited 2017 Sep 30];26(3):452-62. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/16222
https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/...
e justificam a realização de ações de promoção de saúde e bem-estar vocal que melhorem a qualidade de voz desses profissionais. Intervenções simples, como prática de aquecimento vocal e treino respiratório, apresentam resultados positivos1616. Pereira LPP, Masson MLV, Carvalho FM. Aquecimento vocal e treino respiratório em professores: ensaio clínico randomizado. Rev Saude Publica. 2015;49:67. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2015049005716
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20150...
.

No que concerne à RSR, houve tendência de média mais elevada no GCD, sugerindo que, nas salas dos professores com disfonia, a voz seja mais intensa do que nas demais. Esse dado concorda com outros estudos2020. Rantala LM, Hakala S, Holmqvist S, Sala E. Classroom noise and teacher's voice production. J Speech Lang Hear Res. 2015;58(5):1397-406. https://doi.org/10.1044/2015_ISLHR-S-14-0248
https://doi.org/10.1044/2015_ISLHR-S-14-...
,2424. Simões-Zenari M, Bitar ML, Nemr NK. Efeito do ruído na voz de educadoras de instituições de educação infantil. Rev Saude Publica. 2012;46(4):657-64. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000038
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e representa fator de risco ocupacional importante para esses profissionais.

Na situação-ruído, observou-se a utilização de ataque vocal brusco, com risco de 21,7% de sua realização durante as aulas. O ataque vocal brusco consiste em um padrão vocal inadequado, relacionado ao fonotrauma, em que ocorre rápida e completa adução das pregas vocais ao início da fonação. Esse estado pode ser acompanhado de tensão muscular e, quando frequente, sinaliza esforço aumentado22. Behlau M, Madazio G, Feijó D, Pontes P. Avaliação da voz. In: Behlau M, organizadora. Voz: o livro do especialista. Rio de Janeiro: Revinter; 2001. v. 1, p.91-113.. Para se fazer entender nas salas de aula, o professor pode alterar seu padrão vocal habitual, nem sempre com ajuste adequado para suas condições laríngeas, como é o caso do ataque vocal brusco2020. Rantala LM, Hakala S, Holmqvist S, Sala E. Classroom noise and teacher's voice production. J Speech Lang Hear Res. 2015;58(5):1397-406. https://doi.org/10.1044/2015_ISLHR-S-14-0248
https://doi.org/10.1044/2015_ISLHR-S-14-...
,2424. Simões-Zenari M, Bitar ML, Nemr NK. Efeito do ruído na voz de educadoras de instituições de educação infantil. Rev Saude Publica. 2012;46(4):657-64. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000038
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.

Um fator de proteção observado nos dois grupos foi a tendência a articular os sons da fala de maneira mais precisa na situação de ruído. Além disso, os dois grupos mantiveram adequados pitch, velocidade de fala e coordenação respiração-fala quando expostos à situação de ruído. Ambos resultados sugerem um ajuste positivo natural ou resultado de treinamento prévio.

Dentre os riscos ocupacionais possíveis, o presente estudo enfatizou a investigação dos níveis de ruído presentes em sala de aula, bem como a análise da relação sinal-ruído. O monitoramento dessas duas medidas no contexto escolar é fundamental para guiar ações que minimizem prejuízos para a voz do professor. Além disso, esses níveis, quando acima do recomendado, podem interferir não só no desempenho dos professores, mas também no aprendizado dos alunos1111. Libardi A, Gonçalves CGO, Vieira TPG, Silverio KCA, Rossi D, Penteado RZ. O ruído em sala de aula e a percepção dos professores de uma escola de ensino fundamental de Piracicaba. Disturb Comun. 2006 [cited 2017 Sep 30];18(2):167-78. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/11782
https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/...
.

Com relação ao ruído presente em sala de aula, não houve diferença entre os grupos para as médias de ruído equivalente, ainda que os valores das salas do GCD tenham sido maiores. Além disso, apenas duas salas de aula (8,7%) no GSD apresentaram ruído abaixo do proposto durante as aulas77. Cutiva LC, Vogel I, Burdorf A. Voice disorders in teachers and their associations with work-related factors: a systematic review. J Commun Disord. 2013;46(2):143-55. https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.01.001
https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.0...
,aaAssociação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10152: níveis de ruído para conforto acústico. Rio de Janeiro: ABNT; 2000. A relação sinal-ruído foi inferior ao recomendado para crianças com audição normaleeCrandell CC, Smaldino JJ. Classroom acoustics for children with normal hearing and with hearing impairment. Lang Speech Hear Serv Sch. 2000;31(4):362-70. https://doi.org/10.1044/0161-1461.3104.362 em aproximadamente 39% das salas, e para crianças com perda auditivaffGlasgow M. Classroom acoustics: recommended standards: classroom acoustic standards for children with sensori-neural hearing loss. Cheshire (UK): The British Association of Teachers of the Deaf; 2009., em aproximadamente 95%. Os níveis elevados de ruído encontrados reforçam a atual situação das escolas no Brasil77. Cutiva LC, Vogel I, Burdorf A. Voice disorders in teachers and their associations with work-related factors: a systematic review. J Commun Disord. 2013;46(2):143-55. https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.01.001
https://doi.org/10.1016/j.jcomdis.2013.0...
,1111. Libardi A, Gonçalves CGO, Vieira TPG, Silverio KCA, Rossi D, Penteado RZ. O ruído em sala de aula e a percepção dos professores de uma escola de ensino fundamental de Piracicaba. Disturb Comun. 2006 [cited 2017 Sep 30];18(2):167-78. Available from: https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/11782
https://revistas.pucsp.br/index.php/dic/...
,1313. Medeiros AM, Barreto SM, Assunção AA. Voice disorders (dysphonia) in public school female teachers working in Belo Horizonte: prevalence and associated factors. J Voice. 2008;22(6):676-87. https://doi.org/10.1016/j.jvoice.2007.03.008
https://doi.org/10.1016/j.jvoice.2007.03...
.

Com a redução dos níveis de ruído nas salas de aula, a relação sinal-ruído aumenta sem que o professor precise realizar ajustes no padrão vocal, o que facilita a compreensão dos alunos e diminui o risco de disfonia.

Ressalta-se a necessidade de novas pesquisas que investiguem e enfatizem a importância da relação sinal-ruído também no monitoramento dos problemas vocais, visto que a relação sinal-ruído pode ser importante aliada para controle da intensidade do ruído e situação de escuta oferecidas nas salas de aula.

Programas direcionados nesse sentido poderiam viabilizar medidas preventivas, bem como o desenvolvimento de estratégias que capacitariam os professores e funcionários da escola como agentes promotores de saúde.

  • a
    Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10152: níveis de ruído para conforto acústico. Rio de Janeiro: ABNT; 2000
  • b
    Sampaio AP, Simões-Zenari M, Nemr NK. Aplicabilidade de protocolo de rastreio de risco de disfonia em professores. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2015. Trabalho de Conclusão de Curso de Fonoaudiologia.
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  • d
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  • e
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Dez 2017

Histórico

  • Recebido
    22 Jun 2016
  • Aceito
    24 Jan 2017
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
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