Violência por parceiro íntimo e prática educativa materna

Josianne Maria Mattos da Silva Marília de Carvalho Lima Ana Bernarda Ludermir Sobre os autores

RESUMO

OBJETIVO

Analisar a associação entre a violência pelo parceiro íntimo contra a mulher e a prática educativa materna direcionada às crianças no início da escolaridade formal.

MÉTODOS

Estudo transversal, realizado entre 2013 e 2014, com 631 pares mãe/criança, cadastradas na Estratégia de Saúde da Família do Distrito Sanitário II da cidade do Recife, Pernambuco. Integra o estudo de coorte prospectivo delineado para investigar as consequências da exposição à violência pelo parceiro íntimo para a criança que nasceu da gestação que ocorreu entre 2005 e 2006. A prática educativa materna foi avaliada pela escala de conflitos Parent-Child Conflict Tactics Scale e a violência pelo parceiro íntimo por um questionário adaptado do Estudo Multipaíses sobre a Saúde da Mulher e Violência Doméstica da Organização Mundial da Saúde. A violência pelo parceiro íntimo referiu-se aos últimos 12 meses e foi definida por atos concretos de violência psicológica, física e sexual infligidos à mulher pelo parceiro. Foram estimadas as razões de prevalência brutas e ajustadas para a associação estudada, utilizando-se a regressão log-binominal.

RESULTADOS

A prevalência da violência pelo parceiro íntimo foi de 24,4%, e da prática educativa materna violenta de 93,8%. O uso de disciplina não violenta foi referido por 97,6% das mulheres, coexistindo com estratégias violentas de disciplinamento. As crianças cujas mães relataram violência pelo parceiro íntimo apresentaram maior chance de sofrer agressão psicológica (RP = 2,2; IC95% 1,0–4,7).

CONCLUSÕES

A violência sofrida pela mãe interfere na educação parental. Os achados demonstram alta prevalência de prática educativa materna que perpassa pela violência, o que aponta para a necessidade de intervenções que minimizem os prejuízos da violência na mulher e na criança.

Violência contra a Mulher; Maus-Tratos Conjugais; Violência Doméstica; Maus-Tratos Infantis; Educação Infantil; Relações Familiares; Estudos Transversais

INTRODUÇÃO

A violência por parceiro íntimo (VPI) é um fenômeno de alta frequência constatado no Estudo Multipaíses sobre a Saúde da Mulher e Violência Doméstica, realizado pela Organização Mundial de Saúde com 24.097 mulheres entre 15 e 49 anos, das quais 15% a 71% relataram violência física ou sexual por parceiro íntimo em algum momento de suas vidas1010. Garcia-Moreno C, Jansen HA, Ellsberg M, Heise L, Watts CH. Prevalence of intimate partner violence: findings from the WHO multi-country study on women’s health and domestic violence. Lancet. 2006;368(9543):1260-9. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(06)69523-8
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. A amostra brasileira foi composta por 940 mulheres da cidade de São Paulo e 1.188 mulheres da Zona da Mata Pernambucana, apresentando prevalências de 9,3% e 14,8%, respectivamente, para a ocorrência de violência física ou sexual por parceiro íntimo nos últimos 12 meses2525. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL, França-Junior I, Diniz S, Portella AP, Ludermir AB, et al. Prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo em regiões do Brasil. Rev Saude Publica. 2007;41(5):797-807. https://doi.org/10.1590/S0034-89102007000500014
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.

Estudo anterior2727. Taylor CA, Guterman NB, Lee SJ, Rathouz PJ. Intimate partner violence, maternal stress, nativity, and risk for maternal maltreatment of young children. Am J Public Health. 2009;99(1):175-83. https://doi.org/10.2105/AJPH.2007.126722
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analisou a associação entre VPI com o risco de maus-tratos à criança. Dentre os resultados, 40% das mulheres tinham sofrido violência pelo parceiro atual e apresentavam duas vezes mais risco de perpetrar maus-tratos contra seus filhos comparadas às mulheres sem histórico de VPI. Elevados níveis de estresse materno mostraram-se associados à perpetração dos quatro tipos de violência analisados (agressão física, palmadas, agressão psicológica e negligência).

Pesquisas indicam que a presença de VPI aumenta os riscos de punição física11. Casanueva C, Martin SL, Runyan DK. Repeated reports for child maltreatment among intimate partner violence victims: findings from the National Survey of Child and Adolescent Well-Being. Child Abuse Negl. 2009;33(2):84-93. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2007.04.017
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e maus-tratos infantis pela genitora (punição física, negligência, agressão psicológica e violência sexual)22. Chang JJ, Theodore AD, Martin SL, Runyan DK. Psychological abuse between parents: associations with child maltreatment from a population-based sample. Child Abuse Negl. 2008;32(8):819-29. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2007.11.003
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,99. Gage AJ, Silvestre EA. Maternal violence, victimization, and child physical punishment in Peru. Child Abuse Negl. 2010;34(7):523-33. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2009.12.004
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,1212. Kelleher KJ, Hazen AL, Coben JH, Wang Y, McGeehan J, Kohl PL, et al. Self-reported disciplinary practices among women in the child welfare system: association with domestic violence victimization. Child Abuse Negl. 2008;32(8):811-8. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2007.12.004
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,3030. Zolotor AJ, Theodore AD, Coyne-Beasley T, Runyan DK. Intimate partner violence and child maltreatment: overlapping risk. Brief Treat Crisis Interv. 2007;7(4):305-21. https://doi.org/10.1093/brief-treatment/mhm021
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.

Ao analisar a associação entre a experiência da violência sofrida pela mãe e o uso de punição física como prática educativa, estudo realizado no Peru99. Gage AJ, Silvestre EA. Maternal violence, victimization, and child physical punishment in Peru. Child Abuse Negl. 2010;34(7):523-33. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2009.12.004
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concluiu que ter sido vítima de VPI aumenta o risco de a mãe punir fisicamente seus filhos. A pesquisa de Chang et al.22. Chang JJ, Theodore AD, Martin SL, Runyan DK. Psychological abuse between parents: associations with child maltreatment from a population-based sample. Child Abuse Negl. 2008;32(8):819-29. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2007.11.003
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indicou associação entre violência psicológica pelo parceiro e maus tratos contra a criança. Na investigação das práticas disciplinares utilizadas por mães vítimas de violência, Kelleher et al.1212. Kelleher KJ, Hazen AL, Coben JH, Wang Y, McGeehan J, Kohl PL, et al. Self-reported disciplinary practices among women in the child welfare system: association with domestic violence victimization. Child Abuse Negl. 2008;32(8):811-8. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2007.12.004
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observaram que qualquer forma de violência praticada pelo parceiro estava associada a frequências mais elevadas de agressão física, psicológica e negligência dirigidas à criança pela mãe, concluindo que a violência sofrida pela mulher associa-se a uma maternagem mais agressiva.

A VPI coloca a mulher em um ambiente hostil, estressante e debilitante, afetando sua relação com os filhos2323. Sani AI. Mulher e mãe no contexto de violência doméstica. Ex aequo. 2008;(18):123-33.,2424. Sani AI. Práticas educativas parentais em mulheres vítimas e não vítimas de violência conjugal. Psic Teor Pesq. 2011;27(4):429-37. https://doi.org/10.1590/S0102-37722011000400006
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. O desenvolvimento de sintomas pós-traumáticos pode gerar sentimento de insegurança nesse vínculo1616. Levendosky AA, Leahy KL, Bogat GA, Davidson WS, Von Eye A. Domestic violence, maternal parenting, maternal mental health, and infant externalizing behavior. J Fam Psychol. 2006;20(4):544-52. https://doi.org/10.1037/0893-3200.20.4.544
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, influenciando no comportamento parental da mulher1414. Levendosky AA, Graham-Bermann SA. Parenting in battered women: the effects of domestic violence on women and their children. J Fam Violence. 2001;16(2):171-92. https://doi.org/10.1023/A:1011111003373
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,2323. Sani AI. Mulher e mãe no contexto de violência doméstica. Ex aequo. 2008;(18):123-33.. Ela pode desenvolver comportamentos compensatórios, oferecendo aos filhos uma maternagem adequada e resguardando-os da realidade da violência, ou, em contrapartida, comportamentos agressivos, refletindo a experiência de violência na vida dos filhos2020. Peled E, Gil IB. The mothering perceptions of women abused by their partner. Violence Against Women. 2011;17(4):457-79. https://doi.org/10.1177/1077801211404676
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. Como consequência, a VPI pode elevar os riscos da utilização de métodos disciplinares inadequados como a punição corporal pela mãe2020. Peled E, Gil IB. The mothering perceptions of women abused by their partner. Violence Against Women. 2011;17(4):457-79. https://doi.org/10.1177/1077801211404676
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Entretanto, há poucos estudos sobre a associação da VPI sofrida pela mulher com a violência praticada pela mãe contra a criança, principalmente na realidade brasileira. Assim, o objetivo deste artigo foi investigar a associação entre violência cometida pelo parceiro íntimo (VPI) contra a mulher, nos últimos 12 meses, e prática educativa materna (PEM) direcionada aos seus filhos no início da escolaridade formal.

MÉTODOS

Este é um estudo transversal realizado no Distrito Sanitário II do Recife, PE, entre julho de 2013 e dezembro 2014, com mulheres e crianças participantes da terceira fase de um estudo de coorte prospectivo delineado para investigar as consequências da violência cometida pelo parceiro íntimo contra a mulher durante a gravidez, no pós-parto e nos últimos sete anos para a saúde mental da mulher e para o desenvolvimento psicossocial de crianças nascidas entre julho de 2005 e outubro de 2006. A ocupação do Distrito Sanitário II é predominantemente residencial, voltada para o seguimento de média e baixa renda. Apresenta cinco zonas especiais de interesse social (ZEIS), nas quais residem em média 60% de toda sua população, sendo um dos distritos que apresenta maior proporção de habitantes em ZEIS na cidade1717. Ludermir AB, Lewis G, Valongueiro SA, Araújo TVB, Araya R. Violence against women by their intimate partner during pregnancy and postnatal depression: a prospective cohort study. Lancet. 2010;376(9744):903-10. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(10)60887-2
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No estudo de coorte foram conduzidas três fases de coleta de dados. As duas primeiras ocorreram nos anos de 2005 e 2006. Na primeira fase, todas as grávidas (n = 1.133), com idade de 18 a 49 anos, com 31 semanas ou mais de gestação, cadastradas na Estratégia de Saúde da Família (ESF) do Distrito Sanitário II do Recife foram consideradas elegíveis. Os contatos com as gestantes que não faziam o pré-natal na Unidade de Saúde da Família (USF) e com aquelas que não realizavam pré-natal com regularidade foram feitos no domicílio. Essas gestantes foram identificadas a partir dos registros dos agentes comunitários de saúde e incluídas no estudo.

Das 1.133 mulheres elegíveis, 1.121 (98,9%) foram entrevistadas e, dessas, 1.057 foram re-entrevistadas no pós-parto (segunda fase). Para a presente pesquisa, terceira fase da coorte, foram entrevistadas 644 (61,5%) mulheres que participaram da segunda fase. Entre a segunda e a terceira fase cinco mulheres foram a óbito, 391 não foram encontradas por mudança de endereço e 17 recusaram-se a permanecer na pesquisa. Dentre as crianças, quatro foram a óbito. Duas crianças que foram doadas a outras famílias, duas que moravam com outros familiares e cinco pares de gêmeos foram excluídas do estudo com suas respectivas mães. A população do estudo foi constituída por 631 pares mãe-criança.

Os dados foram coletados por profissionais de nível superior, treinadas e com experiência em pesquisa sobre saúde da mulher, da criança, ou violência. No treinamento, foram enfatizadas questões éticas e a necessidade de coleta de informações precisas. Foram realizadas entrevistas simuladas, sendo também realizado estudo piloto no Distrito Sanitário VI do Recife. As entrevistas foram realizadas, em sua maioria, nas residências das participantes de maneira reservada, ou em outro local conveniente para a mulher. Não houve entrevista direta às crianças e as informações foram referidas pela mãe.

A PEM foi avaliada pela escala de conflitos Parent-Child Conflict Tactics Scale, adaptada e validada para o Brasil por Reichenheim e Moraes2222. Reichenheim ME, Moraes CL. Adaptação transcultural do instrumento Parent-Child Conflict Tactics Scales (CTSPC) utilizado para identificar a violência contra a criança. Cad Saude Publica. 2003;19(6):1701-12. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2003000600014
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. A escala contém 22 itens, que investigam a violência doméstica na prática educativa parental a partir de resposta às situações que ocorrem no cotidiano. No preenchimento da escala, o respondente deve informar a ocorrência de alguns comportamentos adotados junto à criança. A escala avalia a prática educativa em três dimensões: disciplina não violenta (práticas disciplinares alternativas à punição corporal), agressão psicológica (atos verbais e simbólicos cuja intenção é causar medo ou dor psicológica) e agressão física (castigos corporais e punições físicas). A dimensão agressão física é subdividida em punição corporal, maus tratos físicos menores e maus tratos físicos graves. Neste estudo, os dois tipos de maus tratos físicos foram agrupados na escala de agressão física.

Para análise da Parent-Child Conflict Tactics Scale, foi considerado caso positivo de PEM violenta a reposta “sim” das mulheres em pelo menos um dos itens da escala de agressão psicológica ou de agressão física. Dessa forma, as frequências de violência (física e psicológica) correspondem à confirmação de pelo menos um ato de violência praticado contra a criança em um período recordatório de 12 meses. A análise da disciplina não violenta ocorreu da mesma forma, avaliando a ocorrência ou não de determinado comportamento, considerando como caso positivo a afirmação de pelo menos um dos itens da respectiva escala.

As questões sobre VPI tiveram como referência o questionário do Estudo Multipaíses sobre a Saúde da Mulher e Violência Doméstica, conduzido pela Organização Mundial da Saúde. Definiu-se como parceiro íntimo o namorado, companheiro ou ex-companheiro com o qual as mulheres mantivessem relações afetivo-sexuais, independentemente da união formal ou da coabitação. A violência por parceiro íntimo referiu-se aos últimos 12 meses e foi identificada por atos concretos de violência psicológica, física e sexual infligidos à mulher pelo parceiro. A violência física foi caracterizada como: agressão física ou uso de objetos ou armas para produzir lesões; violência psicológica, como comportamentos ameaçadores, humilhações e insultos; e violência sexual, como relações sexuais impostas por meio de força física ou ameaças e imposição de atos que foram considerados humilhantes. Mulheres que responderam “sim” a pelo menos uma das questões que compõem cada tipo de violência foram consideradas como caso positivo. Informações adicionais sobre os métodos do estudo estão relatadas em outras publicações1717. Ludermir AB, Lewis G, Valongueiro SA, Araújo TVB, Araya R. Violence against women by their intimate partner during pregnancy and postnatal depression: a prospective cohort study. Lancet. 2010;376(9744):903-10. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(10)60887-2
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,2626. Silva EP, Ludermir AB, Araújo TVB, Valongueiro SA. Frequência e padrão da violência por parceiro íntimo antes, durante e depois da gravidez. Rev Saude Publica. 2011;45(6):1044-53. https://doi.org/10.1590/S0034-89102011005000074
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Foram também analisadas as seguintes covariáveis das crianças: idade (6-8; > 8 anos), sexo (masculino; feminino), escolaridade (≤ 2º ano; ≥ 3º ano) e ter frequentado creche anteriormente ao ensino escolar (sim; não) e das mães: idade (≤ 27 anos; ≥ 28 anos), raça/cor (branca; não branca), com parceiro (não; sim), anos de estudo (entre 0 e 4; ≥ 5) e renda mensal (maior que um salário mínimo [equivalente a R$678 à época do estudo]; menor que um salário mínimo ou sem renda).

Os dados foram digitados no programa EpiInfo versão 3.5.3 para Windows, com dupla entrada de dados e por digitadores diferentes. Posteriormente, o aplicativo Validate foi utilizado para checar os erros de digitação e foram realizadas a limpeza e verificação da consistência dos dados. Para a análise estatística foi utilizado o programa SPSS versão 15 para Windows. Foram estimadas as prevalências da VPI (física, psicológica e sexual) que ocorreram de maneira exclusiva ou sobreposta, além da prevalência da PEM na modalidade disciplina não violenta e na dimensão física e psicológica. Inicialmente, realizou-se a análise bivariada para identificar a presença de possíveis associações das covariáveis estudadas com a exposição – VPI – e com o desfecho – PEM. A associação entre a VPI e a PEM foi estimada pela razão de prevalência bruta e ajustada. A significância estatística foi avaliada pelo teste Qui-quadrado, considerando o intervalo de confiança a 95% e o valor do p < 0,05. A regressão log-binominal foi utilizada para analisar a independência da associação de VPI com a PEM. As covariáveis incluídas no modelo foram aquelas descritas na literatura como potenciais fatores de confusão e que, no presente estudo, mostraram-se associadas com a PEM e a VPI com valor de p < 0,10.

A pesquisa cumpriu os requisitos éticos exigidos pela Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal de Pernambuco (Parecer 194.672). Todas as participantes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

Como resultado da natureza longitudinal do estudo de coorte original, 408 entrevistadas no pós-parto não foram re-entrevistadas no presente estudo (Tabela 1). No entanto, a comparação entre elas não mostrou diferenças estatisticamente significantes em relação à VPI e às variáveis demográficas e socioeconômicas.

Tabela 1
Comparação das características socioeconômicas, demográficas e violência pelo parceiro íntimo das mulheres que participaram (N = 644) e não participaram (N = 408) da terceira etapa. Recife, PE, 2013-2014.

Em relação à prática educativa materna, 91,4% das entrevistadas referiram uso de pelo menos um ato de agressão psicológica, enquanto 82,4% ao menos um ato de agressão física. O uso de disciplina não violenta foi referido por 97,6% das mulheres como estratégia educativa, coexistindo com estratégias violentas de disciplinamento. Na análise da PEM, considerou-se como PEM violenta os casos de agressão física ou psicológica. A prevalência de PEM violenta foi 93,8% (Tabela 2).

Tabela 2
Prevalência dos tipos de violência cometida pelo parceiro íntimo contra a mulher, nos últimos 12 meses, e da prática educativa materna. Recife, PE, 2013-2014.

Sobre a prevalência da VPI, 24,4% das mulheres referiram ter sofrido ao menos um dos tipos de violência no último ano, predominando a violência psicológica (11,7%). A VPI foi posteriormente agrupada em sim e não (Tabela 3). A distribuição das características socioeconômicas e demográficas maternas e das crianças indicou que a maioria das mulheres estudadas possuíam 28 anos ou mais de idade (86,7%), eram não brancas (82,2%), e viviam com um parceiro (80,7%). Predominaram ainda as mulheres com cinco ou mais anos de estudo (83,9%) e sem renda ou com renda inferior a um salário mínimo (66,4%). A respeito das características das crianças, mais da metade tinha idade entre seis e oito anos (52,9%) e era do sexo feminino (50,9%), a maioria não frequentou creche anteriormente ao ensino escolar (88,4%) e cursava o terceiro ano, ou mais, do ensino fundamental I (76,9%).

Tabela 3
Distribuição das características socioeconômicas e demográficas das mulheres e demográficas das crianças e sua associação com a violência cometida pelo parceiro íntimo contra a mulher. Recife, PE, 2013-2014.

Na análise bivariada das características socioeconômicas e demográficas das mulheres e demográficas das crianças com a VPI (Tabela 3), as mulheres que tinham crianças com idade entre seis e oito anos e que frequentaram creche apresentaram associação estatisticamente significante com a VPI. As mulheres com menor escolaridade foram as que mais relataram ter sofrido VPI (Tabela 3).

A análise bivariada da PEM com as características socioeconômicas e demográficas das mulheres e demográficas das crianças (Tabela 4) mostrou que as mulheres com menos anos de estudo agrediam mais fisicamente os seus filhos e que as crianças mais novas (seis a oito anos de idade) foram mais agredidas fisicamente (RP = 1,42; IC95% 1,0–2,0; p = 0,04).

Tabela 4
Associação das características socioeconômicas e demográficas da mulher e demográficas da criança com a prática educativa materna. Recife, PE, 2013-2014.

Na análise da associação entre a VPI e a PEM, os resultados indicam que as crianças cujas mães relataram ter sofrido VPI apresentaram uma probabilidade duas vezes maior de sofrer agressão psicológica (p = 0,04) (Tabela 5).

Tabela 5
Associação da violência cometida por parceiro íntimo, nos últimos 12 meses, com a prática educativa materna. Recife, PE, 2013-2014.

DISCUSSÃO

Neste estudo foi encontrada uma prevalência de 24,4% de mulheres vítimas de VPI nos últimos 12 meses. Dentre os tipos de violência, a psicológica foi a mais prevalente, com 11,7%. Violência física exclusiva ou psicológica associada à sexual foi a de menor prevalência, 2,4%. Garcia-Moreno et al.1010. Garcia-Moreno C, Jansen HA, Ellsberg M, Heise L, Watts CH. Prevalence of intimate partner violence: findings from the WHO multi-country study on women’s health and domestic violence. Lancet. 2006;368(9543):1260-9. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(06)69523-8
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, no Estudo Multipaíses, encontraram prevalência de violência física e sexual, nos últimos 12 meses, de 8,3% e 2,8% na cidade de São Paulo e de 12,9% e 5,6% na Zona da Mata de Pernambuco. Schraiber et al.2525. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL, França-Junior I, Diniz S, Portella AP, Ludermir AB, et al. Prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo em regiões do Brasil. Rev Saude Publica. 2007;41(5):797-807. https://doi.org/10.1590/S0034-89102007000500014
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, analisando dados desse mesmo estudo, encontraram prevalências de violência psicológica, no último ano, de 18,7% e 24,2%, respectivamente, para São Paulo e Pernambuco. A etapa anterior da coorte à qual este artigo se vincula2626. Silva EP, Ludermir AB, Araújo TVB, Valongueiro SA. Frequência e padrão da violência por parceiro íntimo antes, durante e depois da gravidez. Rev Saude Publica. 2011;45(6):1044-53. https://doi.org/10.1590/S0034-89102011005000074
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, estimou a VPI em 22,6% no puerpério. Por tipo de violência as prevalências foram: 12,1%, 19,3% e 3,7%, para violência física, psicológica e sexual, respectivamente.

Nos estudos sobre violência, as prevalências de VPI sofrem influência de fatores diversos, como os culturais e socioeconômicos1010. Garcia-Moreno C, Jansen HA, Ellsberg M, Heise L, Watts CH. Prevalence of intimate partner violence: findings from the WHO multi-country study on women’s health and domestic violence. Lancet. 2006;368(9543):1260-9. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(06)69523-8
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,2525. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL, França-Junior I, Diniz S, Portella AP, Ludermir AB, et al. Prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo em regiões do Brasil. Rev Saude Publica. 2007;41(5):797-807. https://doi.org/10.1590/S0034-89102007000500014
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,2626. Silva EP, Ludermir AB, Araújo TVB, Valongueiro SA. Frequência e padrão da violência por parceiro íntimo antes, durante e depois da gravidez. Rev Saude Publica. 2011;45(6):1044-53. https://doi.org/10.1590/S0034-89102011005000074
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e expressam a importância das questões de gênero para sua compreensão77. D’Oliveira AFPL, Schraiber LB, França-Junior I, Ludermir AB, Portella AP, Diniz CS, et al. Fatores associados à violência por parceiro íntimo em mulheres brasileiras. Rev Saude Publica. 2009;43(2):299-310. https://doi.org/10.1590/S0034-89102009005000013
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. A violência entre parceiros íntimos envolve a construção histórica de relações de poder que demarcam características do masculino e do feminino, configurando uma relação hierárquica entre homem e mulher33. Cortez MB, Souza L, Queiroz SS. Violência entre parceiros íntimos: uma análise relacional. Rev Psicol Polit. 2010;10(20):227-43.. Nesse contexto, a VPI também expressa uma desigualdade de gênero.

Dentre os tipos de violência, uma maior frequência de violência psicológica é um achado comum aos estudos referidos1010. Garcia-Moreno C, Jansen HA, Ellsberg M, Heise L, Watts CH. Prevalence of intimate partner violence: findings from the WHO multi-country study on women’s health and domestic violence. Lancet. 2006;368(9543):1260-9. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(06)69523-8
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,2525. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL, França-Junior I, Diniz S, Portella AP, Ludermir AB, et al. Prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo em regiões do Brasil. Rev Saude Publica. 2007;41(5):797-807. https://doi.org/10.1590/S0034-89102007000500014
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,2626. Silva EP, Ludermir AB, Araújo TVB, Valongueiro SA. Frequência e padrão da violência por parceiro íntimo antes, durante e depois da gravidez. Rev Saude Publica. 2011;45(6):1044-53. https://doi.org/10.1590/S0034-89102011005000074
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. Em nossos resultados, a violência física exclusiva foi menos frequente, sendo acrescentada à violência psicológica ou acompanhada da sexual. Já a violência sexual não foi encontrada de maneira isolada, mas sempre sobreposta às outras formas de violência (física ou psicológica). Schraiber et al.2525. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL, França-Junior I, Diniz S, Portella AP, Ludermir AB, et al. Prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo em regiões do Brasil. Rev Saude Publica. 2007;41(5):797-807. https://doi.org/10.1590/S0034-89102007000500014
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consideram comum a violência sexual estar, geralmente, acompanhada de violência física. No entanto, a violência sexual se caracteriza também em casos em que a mulher se sinta coagida, praticando a relação sexual sob influência do medo da atitude do companheiro diante de sua recusa.

A frequência de VPI observada mostrou valor semelhante ao de estudos anteriores2525. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL, França-Junior I, Diniz S, Portella AP, Ludermir AB, et al. Prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo em regiões do Brasil. Rev Saude Publica. 2007;41(5):797-807. https://doi.org/10.1590/S0034-89102007000500014
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,2626. Silva EP, Ludermir AB, Araújo TVB, Valongueiro SA. Frequência e padrão da violência por parceiro íntimo antes, durante e depois da gravidez. Rev Saude Publica. 2011;45(6):1044-53. https://doi.org/10.1590/S0034-89102011005000074
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. É importante salientar que nos estudos sobre violência pode ocorrer sub-registro dos eventos, pois, uma vez que se trata de um tema delicado e sensível, pode ocasionar constrangimento ou receio sobre as informações relatadas. Relembrar a violência sofrida pode ser uma experiência difícil, causando medo e vergonha, tornando a mulher indisponível para falar sobre o tema. Admite-se2525. Schraiber LB, D’Oliveira AFPL, França-Junior I, Diniz S, Portella AP, Ludermir AB, et al. Prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo em regiões do Brasil. Rev Saude Publica. 2007;41(5):797-807. https://doi.org/10.1590/S0034-89102007000500014
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que, ao mesmo tempo em que a mulher dificilmente relataria episódios de violência que não ocorreram – dada a condição de vergonha, culpa e estigmatização – por outro lado, pelos mesmos motivos, esconder os fatos pode ser algo frequente.

Outro resultado deste estudo aponta que, mesmo com a possibilidade de omissão quanto à PEM em relação ao filho em idade escolar, houve alta prevalência de PEM violenta (93,8%), tanto na modalidade agressão física (82,4%) quanto na modalidade agressão psicológica (91,4%). Em Minas Gerais, percentual elevado de violência psicológica (95,6%) e violência física (94,4%) também foram encontrados2121. Peruhype RC, Halboth NV, Alves PAB. Uso da violência doméstica como prática educativa: conhecendo a realidade em Diamantina – MG/Brasil. Textos Contextos. 2011;10(1):170-8..

O disciplinamento infantil que perpassa pela violência aparece em outras pesquisas com prevalência importante. Estudo de Vitolo et al.2828. Vitolo YLC, Fleitlich-Bilyk B, Googman R, Bordin IAS. Crenças e atitudes educativas dos pais e problemas de saúde mental em escolares. Rev Saude Publica. 2005;39(5):716-24. https://doi.org/10.1590/S0034-89102005000500004
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revelou freqüência de 43,3% para punição física; bater foi a atitude mais habitual, mencionada por 36,1% dos entrevistados. Os autores observaram que os pais/educadores que possuíam a crença de que apanhar era educativo tinham maiores chances de agredirem fisicamente os filhos em comparação com os que acreditavam que a punição era desnecessária, com frequências de 64,8% e 42,5%, respectivamente (p = 0,002; OR = 2,5; IC95% 1,4–4,5).

Castigos corporais foram relatados por 88,1% dos participantes de uma pesquisa que entrevistou crianças e adolescentes2929. Weber LND, Viezzer AP, Brandenburg OJ. O uso de palmadas e surras como prática educativa. Estud Psicol (Natal). 2004;9(2):227-37. https://doi.org/10.1590/S1413-294X2004000200004
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. Os pesquisadores ressaltam que a passagem da punição para o abuso é muito tênue e que o abuso pode ser consequência tanto da falta de conhecimento de outras estratégias educativas quanto dos malefícios que as práticas educativas coercivas podem causar a criança.

O desconhecimento sobre as questões relacionadas ao desenvolvimento infantil pode estar associado à reprodução de práticas educativas punitivas, o que se alia à compreensão tradicional de educar que associa punição à educação, levando à reprodução de modelos educacionais aprendidos na família e na cultura, dificultando a mudança da conduta educacional na direção de práticas educativas adequadas1919. Patias ND, Siqueira AC, Dias ACG. Práticas educativas e intervenção com pais: a educação como proteção ao desenvolvimento dos filhos. Mudanças Psicol Saude. 2013;21(1):29-40. https://doi.org/10.15603/2176-1019/mud.v21n1p29-40
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.

Este estudo alerta para a ocorrência de violência naturalizada nas atitudes diárias das figuras parentais. As mulheres que apresentaram PEM violenta também fizeram uso de disciplina não violenta (97,6%). Sani2424. Sani AI. Práticas educativas parentais em mulheres vítimas e não vítimas de violência conjugal. Psic Teor Pesq. 2011;27(4):429-37. https://doi.org/10.1590/S0102-37722011000400006
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também encontrou resultado semelhante, ao comparar as práticas educativas de mulheres vítimas e não vítimas de violência às práticas consideradas adequadas (como dar conselhos e explicar à criança o que ela fez de errado) não se distinguiram nos dois grupos; em contrapartida, maus-tratos e punições se distinguiram, apresentando maior frequência entre as mulheres vitimadas.

Nesta pesquisa, constatamos que a exposição à VPI interferiu no comportamento materno em relação ao filho, aumentando o risco do uso de práticas educativas violentas. A relação entre VPI e uma maternagem mais violenta é consistente com outras pesquisas11. Casanueva C, Martin SL, Runyan DK. Repeated reports for child maltreatment among intimate partner violence victims: findings from the National Survey of Child and Adolescent Well-Being. Child Abuse Negl. 2009;33(2):84-93. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2007.04.017
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,2727. Taylor CA, Guterman NB, Lee SJ, Rathouz PJ. Intimate partner violence, maternal stress, nativity, and risk for maternal maltreatment of young children. Am J Public Health. 2009;99(1):175-83. https://doi.org/10.2105/AJPH.2007.126722
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. Em estudo que analisou o comportamento de mulheres que sofreram violência de seu parceiro, Levendosky e Graham-Bermann1313. Levendosky AA, Graham-Bermann SA. Behavioral observations of parenting in battered women. J Fam Psychol. 2000;14(1):80-94. https://doi.org/10.1037/0893-3200.14.1.80
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observaram que a violência foi um preditor significativo na parentalidade materna, concluindo que abuso físico e psicológico interferiam na maternagem, sendo o abuso psicológico o mais danoso, relacionando-se ao comportamento antissocial na criança.

A literatura1515. Levendosky AA, Huth-Bocks AC, Shapiro DL, Semel MA. The impact of domestic violence on the maternal-child relationship and preschool-age children’s functioning. J Fam Psychol. 2003;17(3):275-87. https://doi.org/10.1037/0893-3200.17.3.275
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,2424. Sani AI. Práticas educativas parentais em mulheres vítimas e não vítimas de violência conjugal. Psic Teor Pesq. 2011;27(4):429-37. https://doi.org/10.1590/S0102-37722011000400006
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,2727. Taylor CA, Guterman NB, Lee SJ, Rathouz PJ. Intimate partner violence, maternal stress, nativity, and risk for maternal maltreatment of young children. Am J Public Health. 2009;99(1):175-83. https://doi.org/10.2105/AJPH.2007.126722
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discute as implicações da VPI na maternagem. Ela pode afetar negativamente o funcionamento psicológico da mulher, gerando níveis de estresse superiores ao de mulheres não vítimas de violência1414. Levendosky AA, Graham-Bermann SA. Parenting in battered women: the effects of domestic violence on women and their children. J Fam Violence. 2001;16(2):171-92. https://doi.org/10.1023/A:1011111003373
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,1515. Levendosky AA, Huth-Bocks AC, Shapiro DL, Semel MA. The impact of domestic violence on the maternal-child relationship and preschool-age children’s functioning. J Fam Psychol. 2003;17(3):275-87. https://doi.org/10.1037/0893-3200.17.3.275
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. Seu efeito traumático pode influenciar no comportamento parental e na capacidade de cuidado1414. Levendosky AA, Graham-Bermann SA. Parenting in battered women: the effects of domestic violence on women and their children. J Fam Violence. 2001;16(2):171-92. https://doi.org/10.1023/A:1011111003373
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, aumentando a possibilidade de desenvolverem depressão, de maltratarem seus filhos e de serem negligentes2727. Taylor CA, Guterman NB, Lee SJ, Rathouz PJ. Intimate partner violence, maternal stress, nativity, and risk for maternal maltreatment of young children. Am J Public Health. 2009;99(1):175-83. https://doi.org/10.2105/AJPH.2007.126722
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. Está associada à inabilidade em responder às necessidades do filho com sensibilidade e afetividade, e ao aumento da hostilidade e da desvinculação, refletindo o afeto desregulado das mães1616. Levendosky AA, Leahy KL, Bogat GA, Davidson WS, Von Eye A. Domestic violence, maternal parenting, maternal mental health, and infant externalizing behavior. J Fam Psychol. 2006;20(4):544-52. https://doi.org/10.1037/0893-3200.20.4.544
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. Dessa forma, a experiência normalizadora da violência pode motivar a sua repetição na relação mãe-filho2424. Sani AI. Práticas educativas parentais em mulheres vítimas e não vítimas de violência conjugal. Psic Teor Pesq. 2011;27(4):429-37. https://doi.org/10.1590/S0102-37722011000400006
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.

Os filhos são muito vulneráveis às respostas e ao afeto da mãe, essa ao ser vítima de violência, além de desenvolver sintomas físicos1818. Meltzer H, Doos L, Vostanis P, Ford T, Goodman R. The mental health of children who witness domestic violence. Child Fam Soc Work. 2009;14(4):491-501. https://doi.org/10.1111/j.1365-2206.2009.00633.x
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, pode também apresentar quadros depressivos44. Dawson G, Ashman SB, Panagiotides H, Hessl D, Self J, Yamada E, et al. Preschool outcomes of children of depressed mothers: role of maternal behavior, contextual risk and children’s brain activity. Child Dev. 2003;74(4):1158-75. https://doi.org/10.1111/1467-8624.00599
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,66. Deave T, Heron J, Evans J, Emond A. The impact of maternal depression in pregnancy on early child development. BJOG. 2008;115(8):1043-51. https://doi.org/10.1111/j.1471-0528.2008.01752.x
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,1717. Ludermir AB, Lewis G, Valongueiro SA, Araújo TVB, Araya R. Violence against women by their intimate partner during pregnancy and postnatal depression: a prospective cohort study. Lancet. 2010;376(9744):903-10. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(10)60887-2
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e sintomas de estresse pós-traumáticos88. Fujiwara T, Okuyama M, Izumi M. The impact of childhood abuse history, domestic violence and mental health symptoms on parenting behaviour among mothers in Japan. Child Care Health Dev. 2012;38(4):530-7. https://doi.org/10.1111/j.1365-2214.2011.01272.x
https://doi.org/10.1111/j.1365-2214.2011...
,1515. Levendosky AA, Huth-Bocks AC, Shapiro DL, Semel MA. The impact of domestic violence on the maternal-child relationship and preschool-age children’s functioning. J Fam Psychol. 2003;17(3):275-87. https://doi.org/10.1037/0893-3200.17.3.275
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. A parentalidade dessas mulheres pode ser comprometida e expressa por respostas inadequadas às necessidades da criança.

Sobre o uso de métodos disciplinares, Sani2323. Sani AI. Mulher e mãe no contexto de violência doméstica. Ex aequo. 2008;(18):123-33. ressalta que o uso de estratégias coercivas para lidar com os filhos podem ser uma forma de minimizar ou evitar atos mais severos por parte do companheiro sobre a criança.

Como prática educativa, punições físicas e castigos corporais são ineficazes e ainda prejudicam o menor por produzirem consequências negativas para o seu desenvolvimento. Na aplicação de punição corporal, uma vez que esta é geralmente acompanhada por um discurso dos pais de que amam a criança e o que estão fazendo é pelo bem dela, pode levar a associação entre dor e amor, ensinando-lhe a utilizar o mesmo método em outras situações da vida ou ainda levá-lo a suportar situações aversivas que deveriam ser finalizadas2929. Weber LND, Viezzer AP, Brandenburg OJ. O uso de palmadas e surras como prática educativa. Estud Psicol (Natal). 2004;9(2):227-37. https://doi.org/10.1590/S1413-294X2004000200004
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. Além disso, essas práticas podem provocar na criança sentimentos negativos como hostilidade, medo e ansiedade, e no desenvolvimento de comportamento agressivo1616. Levendosky AA, Leahy KL, Bogat GA, Davidson WS, Von Eye A. Domestic violence, maternal parenting, maternal mental health, and infant externalizing behavior. J Fam Psychol. 2006;20(4):544-52. https://doi.org/10.1037/0893-3200.20.4.544
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e antissocial55. Day VP, Telles LEB, Zoratto PH, Azambuja MRF, Machado DA, Silveira MB, et al. Violência doméstica e suas diferentes manifestações. Rev Psiquiatr Rio Gd Sul. 2003;25 Suppl 1:9-21. https://doi.org/10.1590/S0101-81082003000400003
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,1111. Grogan-Kaylor A. Corporal punishment and the growth trajectory of children’s antisocial behavior. Child Maltreat. 2005;10(3):283-92. https://doi.org/10.1177/1077559505277803
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. A violência psicológica, por sua vez, pode produzir sentimento de culpa, vergonha, raiva, isolamento social, aspectos psicossomáticos, fobias, repetição de pesadelos, comprometimento na saúde mental, entre outros efeitos na criança77. D’Oliveira AFPL, Schraiber LB, França-Junior I, Ludermir AB, Portella AP, Diniz CS, et al. Fatores associados à violência por parceiro íntimo em mulheres brasileiras. Rev Saude Publica. 2009;43(2):299-310. https://doi.org/10.1590/S0034-89102009005000013
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.

Devido às perdas da coorte, nosso estudo teve algumas limitações. No entanto, para minimizar o efeito das perdas e a subestimação da violência, foram adotadas medidas como a seleção de entrevistadoras do sexo feminino treinadas para abordar a temática de acordo com preceitos éticos apropriados ao tema. A redução do número de participantes, em relação ao período anterior da coleta de dados, poderia ter influenciado nas estimativas da VPI. No entanto, quando comparamos as mulheres entrevistadas na segunda etapa do estudo de coorte com as que não participaram do presente estudo, não encontramos diferença estatisticamente significante em relação à VPI e às variáveis demográficas e socioeconômicas.

O presente estudo, ao mesmo tempo em que apresenta limitações, representa uma pesquisa cujo tema ainda é pouco investigado, o da relação da VPI com outras formas de violência. Contribui com a literatura ao abordar o problema em dois aspectos: a mulher vítima de violência pelo parceiro e a criança agredida pela mãe, expondo tanto a violência que se expressa na desigualdade de gênero e relações de poder, quanto a que se naturaliza nas relações parentais, reproduzindo-se nas práticas educativas.

A pesquisa indica que atos violentos podem ocorrer mutuamente, em que o agredido pode ser também um agressor e que práticas educativas violentas, ao mesmo tempo que se difundem, se disfarçam de práticas disciplinares socialmente permitidas.

Os resultados alertam para a necessidade de oferecer esclarecimentos às mulheres, pelos profissionais da Estratégia de Saúde da Família, sobre os cuidados maternos, orientando-as acerca das repercussões desses cuidados na criança, e dos riscos que o contexto de violência oferece para a saúde física e mental tanto da mulher quanto da criança.

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  • Financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq – Processo 475240/2011) e Universidade Federal de Pernambuco (UFPE – Processo 23076.045552/2016-34).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Abr 2017

Histórico

  • Recebido
    25 Nov 2015
  • Aceito
    12 Abr 2016
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
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