RESUMO
OBJETIVO
Investigar se características da estrutura das unidades básicas de saúde e do processo de trabalho das equipes de atenção básica estão associadas ao número de internações por condições sensíveis à atenção primária.
MÉTODOS
Neste estudo ecológico, foram analisados dados de municípios brasileiros relativos a características sociodemográficas, de cobertura de programas assistenciais, de estrutura das unidades básicas de saúde e processo de trabalho das equipes de atenção básica. Os dados foram obtidos do primeiro ciclo do Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica, do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e do Programa das Nações Unidas. Estimaram-se as associações por meio de coeficientes de regressão binomial negativa (β) e respectivos intervalos de confiança a 95%, com abordagem hierarquizada em três blocos (alpha = 5%).
RESULTADOS
Na análise ajustada, para o desfecho em 2013, no bloco distal, a cobertura do Programa Bolsa Família (β = -0,001) e de plano privado (β = -0,01) apresentaram associação negativa; e o índice de desenvolvimento humano (β = 1,13), a proporção de pessoa idosa (β = 0,05) e de menor de cinco anos (β = 0,05) e a cobertura da Estratégia de Agentes Comunitários de Saúde (β = 0,002) mostraram associação positiva com internações por condições sensíveis à atenção primária. No bloco intermediário, apresentaram associação negativa o horário mínimo (β = -0,14) e a disponibilidade de vacina (β = -0,16); e associação positiva, a disponibilidade de medicamentos (β = 0,16). No bloco proximal, apenas a variável apoio matricial (β = 0,10) mostrou associação positiva. Na análise ajustada do número de internações por condições sensíveis à atenção primária em 2014, as variáveis apresentaram o mesmo sentido de associação de 2013.
CONCLUSÕES
Características da estrutura das unidades básicas de saúde e do processo de trabalho das equipes de atenção básica impactam no número de internações por condições sensíveis à atenção primária nos municípios brasileiros.
Atenção Primária à Saúde, organização & administração; Admissão do Paciente; Avaliação de Processos e Resultados (Cuidados de Saúde); Avaliação de Programas e Projetos de Saúde; Estudos Ecológicos
INTRODUÇÃO
A taxa de internações por condições sensíveis à atenção primária (ICSAP) representa um indicador de acesso e qualidade da atenção primária à saúde (APS)1717. Nedel FB, Facchini LA, Bastos JL, Martín-Mateo M. Conceptual and methodological aspects in the study of hospitalizations for ambulatory care sensitive conditions. Cienc Saude Coletiva. 2011;16 Supl 1:1145-54. https://doi.org/10.1590/S1413-81232011000700046
https://doi.org/10.1590/S1413-8123201100... ,2121. Rosano A, Loha CA, Falvo R, Zee J, Ricciardi W, Guasticchi G, et al. The relationship between avoidable hospitalization and accessibility to primary care: a systematic review. Eur J Public Health. 2013;23(3):356-60. https://doi.org/10.1093/eurpub/cks053
https://doi.org/10.1093/eurpub/cks053... ,2323. Van Loenen T, Berg MJ, Westert GP, Faber MJ. Organizational aspects of primary care related to avoidable hospitalization: a systematic review. Fam Pract. 2014;31(5):502-16. https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053
https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053... . Estudos internacionais mostram que fatores associados às maiores taxas de ICSAP são: sexo masculino, senilidade, residir em área rural, baixa renda e desvantagem socioeconômica11. Ansari Z, Haider SI, Ansari H, Gooyer T, Sindall C. Patient characteristics associated with hospitalisations for ambulatory care sensitive conditions in Victoria, Australia. BMC Health Serv Res. 2012;12:475. https://doi.org/10.1186/1472-6963-12-475
https://doi.org/10.1186/1472-6963-12-475... ,22. Balogh RS, Ouellette-Kuntz H, Brownell M, Colantonio A. Factors associated with hospitalisations for ambulatory care-sensitive conditions among persons with an intellectual disability: a publicly insured population perspective. J Intellect Disabil Res. 2013;57(3):226-39. https://doi.org/10.1111/j.1365-2788.2011.01528.x
https://doi.org/10.1111/j.1365-2788.2011... .
No Brasil, estudo transversal identificou maior probabilidade de ICSAP em pessoas do sexo feminino, em menores de cinco anos, com menor escolaridade, história de consulta médica de emergência no mês anterior e de hospitalização no ano anterior1515. Nedel FB, Facchini LA, Martín-Mateo M, Vieira LAS, Thume E. Family Health Program and ambulatory care-sensitive conditions in Southern Brazil. Rev Saude Publica. 2008;42(6):1041-52. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000600010
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200800... . Em uma coorte de adultos, foram observadas maiores taxas de ICSAP em pessoas com mais de 60 anos e cor não branca; mas não foram identificadas diferenças entre os sexos88. Gonçalves MR, Hauser L, Prestes IV, Schmidt MI, Duncan BB, Harzheim E. Primary health care quality and hospitalizations for ambulatory care sensitive conditions in the public health system in Porto Alegre, Brazil. Fam Pract. 2016;33(3):238-42. https://doi.org/10.1093/fampra/cmv051
https://doi.org/10.1093/fampra/cmv051... .
Há indícios que a expansão da Estratégia Saúde da Família (ESF) está associada com tendência de redução desse indicador44. Ceccon RF, Meneghel SN, Viecili PRN. Hospitalization due to conditions sensitive to primary care and expansion of the Family Health Program in Brazil: an ecological study. Rev Bras Epidemiol. 2014;17(4):968-77. https://doi.org/10.1590/1809-4503201400040014
https://doi.org/10.1590/1809-45032014000... ,77. Dourado I, Oliveira VB, Aquino R, Bonolo P, Lima-Costa MF, Medina MG et al. Trends in primary health care-sensitive conditions in Brazil: the role of the Family Health Program (Project ICSAP-Brazil). Med Care. 2011;49(6):577-84. https://doi.org/10.1097/MLR.0b013e31820fc39f
https://doi.org/10.1097/MLR.0b013e31820f... ,1010. Lentsck MH, Latorre MRDO, Mathias TAF. Trends in hospitalization due to cardiovascular conditions sensitive to primary health care. Rev Bras Epidemiol. 2015:18(2):372-84. https://doi.org/10.1590/1980-5497201500020007
https://doi.org/10.1590/1980-54972015000... ,1212. Macinko J, Oliveira VB, Turci MA, Guanais FC, Bonolo PF, Lima-Costa MF. The influence of primary care and hospital supply on ambulatory care-sensitive hospitalizations among adults in Brazil, 1999-2007. Am J Public Health. 2011;101(10):1963-70. https://doi.org/10.2105/AJPH.2010.198887
https://doi.org/10.2105/AJPH.2010.198887... . Assim, apesar de as taxas de ICSAP ainda serem altas comparadas às de outros países2424. Viana ALA, rocha JSY, Elias PE, Ibañez N, Novaes MH. Modelos de atenção básica nos grandes municípios paulistas: efetividade, eficácia, sustentabilidade e governabilidade. Cienc Saude Coletiva. 2006; 11(3):577-606. https://doi.org/10.1590/S1413-81232006000300009
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600... , registrou-se diminuição de mais de 5% ao ano, entre 2008 e 2014, no Brasil1212. Macinko J, Oliveira VB, Turci MA, Guanais FC, Bonolo PF, Lima-Costa MF. The influence of primary care and hospital supply on ambulatory care-sensitive hospitalizations among adults in Brazil, 1999-2007. Am J Public Health. 2011;101(10):1963-70. https://doi.org/10.2105/AJPH.2010.198887
https://doi.org/10.2105/AJPH.2010.198887... . É possível que apenas o aumento da cobertura não seja suficiente para a redução consistente desse indicador. No entanto, poucos são os estudos que analisam características da qualidade da atenção, envolvendo elementos de estrutura e processo de trabalho na APS.
A associação dessas características com indicadores de ICSAP não estão bem estabelecidas. Gonçalves et al.88. Gonçalves MR, Hauser L, Prestes IV, Schmidt MI, Duncan BB, Harzheim E. Primary health care quality and hospitalizations for ambulatory care sensitive conditions in the public health system in Porto Alegre, Brazil. Fam Pract. 2016;33(3):238-42. https://doi.org/10.1093/fampra/cmv051
https://doi.org/10.1093/fampra/cmv051... não encontraram associação entre a qualidade dos serviços na APS e as taxas de ICSAP. Um estudo ecológico espanhol não encontrou associação significativa com o número de médicos por habitante, mas mostrou que a carga de trabalho (horária) do médico apresenta associação direta significativa com internações sensíveis, e sugere como sendo resultado do comprometimento da qualidade do cuidado ofertada ao paciente1313. Magán P, Alberquilla A, Otero A, Ribera JM. Hospitalizations for ambulatory care sensitive conditions and quality of primary care: their relation with socioeconomic and health care variables in the Madrid regional health service (Spain). Med Care. 2011;49(1):17-23. https://doi.org/10.1097/MLR.0b013e3181ef9d13
https://doi.org/10.1097/MLR.0b013e3181ef... .
Assim, frente à necessidade de melhor examinar a relação entre características da APS e ICSAP, a hipótese deste trabalho é que quanto melhor a estrutura e o processo de trabalho na APS, menor o número de ICSAP, mesmo após ajuste para variáveis sociodemográficas e de cobertura de programas assistenciais.
MÉTODOS
O estudo é ecológico, com dados populacionais disponíveis em diferentes bases. A população do estudo consistiu de 5.565 municípios brasileiros, 38.812 Unidades Básicas de Saúde (UBS) e amostra de 17.202 equipes de atenção básica (EAB) existentes no ano de 2012. A partir desses dados, foram construídos indicadores agregados para o nível municipal.
Todas as variáveis utilizadas neste estudo são descritas na Figura. Detalhes sobre a construção dos indicadores são apresentados no Quadro. O desfecho foi o número de ICSAP de 2012 e 2013, obtidos do Sistema de Internações Hospitalares (SIH) do SUS. Adicionalmente foram calculadas as taxas e proporções de ICSAP, de 2012 a 2014. As variáveis sociodemográficas foram procedentes do IBGEaa Ministério da Saúde (BR), DATASUS. Informações de Saúde - TABNET: demográficas e socioeconômicas. Dados oriundos do Censo Demográfico de 2010 e projeções intercensitárias do IBGE. [citado 18 set 2015]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=0206 e do PNUDbb Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento; Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada; Fundação João Pinheiro. Índice de Desenvolvimento Humano Municipal Brasileiro. Brasília (DF): PNUD, IPEA, FJP, 2013 [citado 18 set 2015]. (Série Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013). Disponível em: http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/library/idh1/o-idh-brasileiro0.html : proporção da população idosa (> 60 anos) e de menores de cinco anos, coeficiente de Gini e Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM).
Esquema do modelo teórico explicativo para investigação de fatores associados à taxa de ICSAP em três blocos hierarquizados.
Os indicadores de cobertura de programas assistenciais dos municípios – cobertura do Programa Bolsa Família (PBF), da Estratégia de Agentes Comunitários de Saúde (EACS) e da ESF – foram obtidos do Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB).
Os dados de estrutura das UBS foram oriundos do módulo I do primeiro ciclo da Avaliação Externa do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB), por meio de observação in loco. O processo de trabalho na APS foi obtido por entrevista com as EAB que aderiram ao PMAQ-AB. As variáveis de processo de trabalho foram encaminhamento para consulta especializada, visita domiciliar e apoio matricial. Os dados do PMAQ-AB foram coletados por questionário eletrônico, utilizando tabletscc Ministério da Saúde(BR), Secretaria de Asssitência à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ): manual instrutivo. Brasília (DF); 2012 [citado 18 set 2015]. Disponível em: http://dab.saude.gov.br/portaldab/biblioteca.php?conteudo=publicacoes/pmaq . Após a coleta, os dados foram validados e enviados para o banco de dados centralizado pelo Ministério da Saúde, que, posteriormente, os disponibilizou no site do Departamento de Atenção Básicacc Ministério da Saúde(BR), Secretaria de Asssitência à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ): manual instrutivo. Brasília (DF); 2012 [citado 18 set 2015]. Disponível em: http://dab.saude.gov.br/portaldab/biblioteca.php?conteudo=publicacoes/pmaq .
Para a análise estatística dos dados, foi utilizado o software Stata 12.0 (Stata Corp., College Station, TX, USA). Inicialmente, foram tabulados três bancos de dados. O primeiro correspondeu aos dados dos municípios; o segundo, às questões do Módulo I do PMAQ-AB; e o terceiro, às variáveis de processo de trabalho das EAB. Em seguida, as variáveis de estrutura e processo de trabalho foram agregadas para o nível do município, estimando-se a média percentual das variáveis por município. A variável usada para o linkage dos dados foi o código do IBGE.
A análise descritiva estimou: médias (X) ± desvios-padrão (DP), bem como medianas (Md) e desvios interquartílicos (Q1 e Q3), além de valores mínimo (mín.) e máximo (máx.).
As análises univariável e multivariável foram realizadas por meio de regressão binomial negativa, considerando-se a população municipal. Calcularam-se os coeficientes de regressão (β) e respectivos intervalos de confiança a 95% (IC95%).
Para a modelagem, utilizou-se abordagem hierarquizada em três blocos. O bloco distal correspondeu às variáveis sociodemográficas e de cobertura de programas assistenciais. O bloco intermediário apresentou variáveis de estrutura das UBS nos municípios. O bloco proximal foi composto por características do processo de trabalho das EAB (Figura).
Na análise ajustada, inicialmente, todas as variáveis do bloco distal foram incluídas no modelo, permanecendo as variáveis cujo p < 0,10. Na sequência, incluíram-se no modelo as variáveis do bloco intermediário, removendo-se as variáveis desse bloco com valor de p > 0,10, ajustadas para as variáveis que vieram do bloco anterior. O mesmo procedimento foi repetido para o bloco proximal, ajustado para as variáveis dos blocos anteriores.
Alpha de 5% foi utilizado como critério de significância estatística. Para tanto, as estimativas de regressão e IC95% foram verificadas no seu bloco correspondente. Todas as análises considerando as variáveis do bloco proximal (processo de trabalho) foram ponderadas para as desiguais probabilidades de seleção. Isso porque nos blocos anteriores utilizou-se a totalidade da população (municípios e UBS), mas no bloco proximal, apenas uma amostra (por autoinclusão). Como a proporção de adesão das EAB ao PMAQ-AB foi diferente entre os municípios brasileiros, as estimativas foram ponderadas pelo inverso da probabilidade de adesão. Essa variável foi construída como a razão entre o total de EAB existentes pelo número de equipes que aderiram no município.
Em cumprimento à Resolução do Conselho Nacional de Saúde, o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Pelotas (Ofício 38/12, em 10/5/2012). Todas as pessoas entrevistadas assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
RESULTADOS
Entre os indicadores do nível distal, destaca-se o coeficiente de Gini médio de 0,5 e IDHM médio de 0,6 (ambos com DP = 0,07). A proporção da população idosa teve média de 12,1% e de menores de cinco anos, 7,4%. A cobertura do PBF apresentou média de 80,7% (DP = 18,1%), da EACS, média de 90,2% (DP = 23,2%) e da ESF, média de 81,9% (DP = 29%). A taxa média de planos privados de saúde nos municípios foi de 8,4% (DP = 11,4%) (Tabela 1).
Em 2012, os municípios brasileiros tinham, em média, pelo menos um médico/equipe em 81,8% das UBS. O percentual médio, por município, de UBS com equipe mínima completa era de 65,0%; de UBS que funcionavam em horário mínimo foi de 87,1% e com pelo menos 75% dos imunobiológicos, 57,1%. O pior indicador desse nível foi a disponibilidade de medicamentos: apenas uma média de 4,1% das UBS, por município, tinham 80% ou mais dos medicamentos consultados. Das EAB que aderiram ao PMAQ-AB, em média, 56,6% das equipes por município garantiam o encaminhamento para consulta especializada, 99,3% realizavam visita domiciliar e 84,1% recebiam apoio matricial (Tabela 1).
O número absoluto, a taxa e a proporção de ICSAP diminuíram, conforme apresentado na Tabela 2. A média da taxa de ICSAP passou de 169,2 (DP = 128,5) em 2012 para 154,3/10.000 habitantes (DP = 122,1) em 2014 (Tabela 2).
A análise não ajustada para o desfecho em 2013 e 2014 mostrou a direção da associação semelhante. Apresentou associação negativa significante a proporção de menores de cinco anos, a cobertura de plano privado de saúde, o horário mínimo e disponibilidade de vacinas. Mostrou associação positiva significativa a proporção de maiores de 60 anos, a cobertura do PBF, da EACS e da ESF, a disponibilidade de medicamentos e o apoio matricial (Tabela 3).
Na análise ajustada de 2013, no bloco distal, municípios com maior cobertura do PBF (β = -0,001) e maior cobertura de plano privado (β = -0,01) apresentaram menor número de ICSAP. Municípios com maior IDHM (β = 1,13), maior proporção de pessoa idosa (β = 0,05), maior proporção de menor de cinco anos (β = 0,05) e maior cobertura da EACS (β = 0,002) mostraram maior número dessas internações.
No bloco intermediário, municípios com UBS funcionando pelo menos em horário mínimo (β = -0,14) e com pelo menos 75% das vacinas disponíveis (β = -0,16) apresentaram menor número de ICSAP. Municípios com pelo menos 80% dos medicamentos disponíveis mostraram maior número de internações (β = 0,16).
No bloco proximal, apenas a variável apoio matricial (β = 0,10) mostrou uma associação positiva e significante, o que indica que municípios com mais equipes que recebem apoio matricial têm maior número de internações (Tabela 3).
Na análise ajustada de 2014, as variáveis do bloco distal e do intermediário apresentaram o mesmo sentido de associação da ajustada de 2013. Apenas no bloco proximal, o apoio matricial perdeu a significância estatística (β = 0,10; p = 0,092) (Tabela 3).
DISCUSSÃO
Após ajuste para variáveis sociodemográficas e de cobertura de programas assistenciais, variáveis de estrutura de UBS (horário mínimo, disponibilidade de medicamentos e de vacinas) e processo de trabalho das EAB (apoio matricial) mostraram-se associadas ao número de ICSAP.
Os indicadores de ICSAP tiveram decréscimo conforme encontrado em outros estudos, que relacionaram essa redução a uma melhor cobertura dos serviços de saúde nos últimos anos77. Dourado I, Oliveira VB, Aquino R, Bonolo P, Lima-Costa MF, Medina MG et al. Trends in primary health care-sensitive conditions in Brazil: the role of the Family Health Program (Project ICSAP-Brazil). Med Care. 2011;49(6):577-84. https://doi.org/10.1097/MLR.0b013e31820fc39f
https://doi.org/10.1097/MLR.0b013e31820f... ,1111. Maciel AG, Caldeira AP, Diniz FJLS. Impacto da Estratégia Saúde da Família sobre o perfil de morbidade hospitalar em Minas Gerais. Saude Debate. 2014;38 Nº Espec: 319-30. https://doi.org/10.5935/0103-1104.2014S024
https://doi.org/10.5935/0103-1104.2014S0... ,1717. Nedel FB, Facchini LA, Bastos JL, Martín-Mateo M. Conceptual and methodological aspects in the study of hospitalizations for ambulatory care sensitive conditions. Cienc Saude Coletiva. 2011;16 Supl 1:1145-54. https://doi.org/10.1590/S1413-81232011000700046
https://doi.org/10.1590/S1413-8123201100... . Observou-se uma grande dispersão desse indicador nos municípios. O número de ICSAP apresenta significativa variação geográfica33. Busby J, Purdy S, Hollingworth W. A systematic review of the magnitude and cause of geographic variation in unplanned hospital admission rates and length of stay for ambulatory care sensitive conditions. BMC Health Serv Res. 2015;15:324. https://doi.org/10.1186/s12913-015-0964-3
https://doi.org/10.1186/s12913-015-0964-... , tornando nosso estudo oportuno ao desvendar as características dos serviços primários de saúde associadas ao número de ICSAP.
Sobre os programas assistenciais analisados, apesar de a cobertura da ESF não ter sido associada aos menores indicadores de ICSAP e de a cobertura do EACS mostrar associação com o maior número de internações, outros artigos mostram que a implantação da ESF parece estar associada com a redução de ICSAP1111. Maciel AG, Caldeira AP, Diniz FJLS. Impacto da Estratégia Saúde da Família sobre o perfil de morbidade hospitalar em Minas Gerais. Saude Debate. 2014;38 Nº Espec: 319-30. https://doi.org/10.5935/0103-1104.2014S024
https://doi.org/10.5935/0103-1104.2014S0... ,1212. Macinko J, Oliveira VB, Turci MA, Guanais FC, Bonolo PF, Lima-Costa MF. The influence of primary care and hospital supply on ambulatory care-sensitive hospitalizations among adults in Brazil, 1999-2007. Am J Public Health. 2011;101(10):1963-70. https://doi.org/10.2105/AJPH.2010.198887
https://doi.org/10.2105/AJPH.2010.198887... . Dourado et al.77. Dourado I, Oliveira VB, Aquino R, Bonolo P, Lima-Costa MF, Medina MG et al. Trends in primary health care-sensitive conditions in Brazil: the role of the Family Health Program (Project ICSAP-Brazil). Med Care. 2011;49(6):577-84. https://doi.org/10.1097/MLR.0b013e31820fc39f
https://doi.org/10.1097/MLR.0b013e31820f... mostram que variáveis socioeconômicas reduzem o impacto da ESF na diminuição das internações.
Essas estratégias são as principais fontes de acesso a serviços primáriosdd Ministério da Saúde (BR). Portaria Nº 2.488 de 21 de outubro de 2011. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), Brasília (DF); 2011 [citado 18 set 2015]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt2488_21_10_2011.html ; logo, esperava-se encontrar menor número de ICSAP em municípios com maior cobertura. Duas possíveis explicações são aventadas: primeiro, a cobertura de ESF no país pode estar sendo superestimada; segundo, o resultado encontrado pode ser reflexo da maior frequência de problemas de saúde na população dos municípios cobertos pela EACS, pois ela é direcionada para localidades mais vulneráveis, com altos índices de exclusão do acesso aos serviços de saúde e dentro de uma rede assistencial desarticulada e com pouca estrutura2424. Viana ALA, rocha JSY, Elias PE, Ibañez N, Novaes MH. Modelos de atenção básica nos grandes municípios paulistas: efetividade, eficácia, sustentabilidade e governabilidade. Cienc Saude Coletiva. 2006; 11(3):577-606. https://doi.org/10.1590/S1413-81232006000300009
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600... , o que justificaria maior número de internações. Por ora, é importante reconhecer o papel articulador do agente comunitário de saúde na atenção básica e reforçar atividades de educação permanente e de supervisão de suas ações para a garantia da efetividade de suas práticas55. Costa SM, Araújo FF, Martins LV, Nobre LLR, Araújo FM, Rodrigues CAQ. Agente Comunitário de Saúde: elemento nuclear das ações em saúde. Cienc Saude Coletiva. 2013:18(7): 2147-56. https://doi.org/10.1590/S1413-81232013000700030
https://doi.org/10.1590/S1413-8123201300... .
A associação inversa significante com o PBF sugere que municípios com maior porcentagem de famílias atendidas por programa de transferência de renda têm menor número de internações. A análise descritiva mostra que, em média, 80% das famílias dos municípios com critérios para acompanhamento do PBF estão cobertas pelo programa, garantindo melhor condição de renda às famílias pobres e extremamente pobres beneficiadas. Ressaltamos que, dadas as características do PBF, sua cobertura é um importante indicador de vulnerabilidade social, com a população exposta a uma diversidade das situações de pobreza e desigualdades sociais2424. Viana ALA, rocha JSY, Elias PE, Ibañez N, Novaes MH. Modelos de atenção básica nos grandes municípios paulistas: efetividade, eficácia, sustentabilidade e governabilidade. Cienc Saude Coletiva. 2006; 11(3):577-606. https://doi.org/10.1590/S1413-81232006000300009
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600... . Essa população pode residir em municípios com insuficiente estrutura da rede de serviços de saúde especializada, o que leva a não acessar os serviços em decorrência da inexistência de oferta e não da ausência de necessidade dos indivíduos.2424. Viana ALA, rocha JSY, Elias PE, Ibañez N, Novaes MH. Modelos de atenção básica nos grandes municípios paulistas: efetividade, eficácia, sustentabilidade e governabilidade. Cienc Saude Coletiva. 2006; 11(3):577-606. https://doi.org/10.1590/S1413-81232006000300009
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600... Dessa forma, estudo sugere que a resolução de problemas socioeconômicos nas zonas mais pobres pode impactar o número de ICSAP22. Balogh RS, Ouellette-Kuntz H, Brownell M, Colantonio A. Factors associated with hospitalisations for ambulatory care-sensitive conditions among persons with an intellectual disability: a publicly insured population perspective. J Intellect Disabil Res. 2013;57(3):226-39. https://doi.org/10.1111/j.1365-2788.2011.01528.x
https://doi.org/10.1111/j.1365-2788.2011... .
Como as internações computadas referem-se somente a hospitalizações públicas, já esperávamos que municípios com maior cobertura média de plano privado de saúde tivessem menor número de internações, pelo desvio de internações para a rede privada. Esse resultado foi verificado. O maior número de internações em municípios com maior proporção de idosos e de crianças menores de cinco anos também foi encontrada em outro estudo, que mostra taxas maiores de ICSAP nos extremos das idades1515. Nedel FB, Facchini LA, Martín-Mateo M, Vieira LAS, Thume E. Family Health Program and ambulatory care-sensitive conditions in Southern Brazil. Rev Saude Publica. 2008;42(6):1041-52. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000600010
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200800... .
Com relação aos indicadores de estrutura da UBS, não identificamos associação entre a razão de médicos e ICSAP. A associação com esse indicador é inconclusiva na literatura e deve ser analisada com cautela, pois não reflete o número potencial de usuários por médico1616. Nedel FB, Facchini LA, Martín M, Navarro A. Características da atenção básica associadas ao risco de internar por condições sensíveis à atenção primária: revisão sistemática da literatura. Epidemiol Serv Saude. 2010;19(1):61-75. https://doi.org/10.5123/S1679-49742010000100008
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201000... . Ao apurar aspectos estruturais, revisão sistemática encontrou associação entre maior carga de trabalho (horária) do médico e maiores taxas de ICSAP2323. Van Loenen T, Berg MJ, Westert GP, Faber MJ. Organizational aspects of primary care related to avoidable hospitalization: a systematic review. Fam Pract. 2014;31(5):502-16. https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053
https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053... . Os autores também identificaram que a disponibilidade de enfermeiros diminui a taxa de internação para alguns diagnósticos, como asma, e aumenta a taxa para o diabetes, apesar de esse risco diminuir quando o atendimento é acompanhado por um agente comunitário de saúde2323. Van Loenen T, Berg MJ, Westert GP, Faber MJ. Organizational aspects of primary care related to avoidable hospitalization: a systematic review. Fam Pract. 2014;31(5):502-16. https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053
https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053... .
Verificou-se associação entre o horário de funcionamento mínimo e um menor número de internações. Uma revisão sistemática mostra que a maioria dos estudos encontra associação inversa entre indicadores de acesso e as ICSAP1515. Nedel FB, Facchini LA, Martín-Mateo M, Vieira LAS, Thume E. Family Health Program and ambulatory care-sensitive conditions in Southern Brazil. Rev Saude Publica. 2008;42(6):1041-52. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000600010
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200800... ,2121. Rosano A, Loha CA, Falvo R, Zee J, Ricciardi W, Guasticchi G, et al. The relationship between avoidable hospitalization and accessibility to primary care: a systematic review. Eur J Public Health. 2013;23(3):356-60. https://doi.org/10.1093/eurpub/cks053
https://doi.org/10.1093/eurpub/cks053... .
Dentre as hospitalizações que podem ser evitadas estão aquelas decorrentes de doenças preveníveis por imunização. O aumento das coberturas vacinais tem reduzido a morbimortalidade infantil das doenças-alvo99. Guimarães TMR, Alves JGB, Tavares MMF. Impacto das ações de imunização pelo Programa Saúde da Família na mortalidade infantil por doenças evitáveis em Olinda, Pernambuco, Brasil. Cad Saude Publica. 2009;25(4):868-76. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2009000400018
https://doi.org/10.1590/S0102-311X200900... . Logo, pode-se explicar o menor número de ICSAP nos municípios com pelo menos 75% dos imunobiológicos disponíveis, pela melhor disponibilidade de vacinas.
A disponibilidade de medicamentos foi o pior indicador de estrutura. A indisponibilidade de medicamentos prejudica o acesso a esse recurso e, apesar da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME) ampliar o acesso gratuito, o suprimento ainda é insuficiente e desigual no país1818. Paniz VM, Fassa AG, Facchini LA, Bertoldi AD, Piccini RX, Tomasi E, et al. Acesso a medicamentos de uso contínuo em adultos e idosos nas regiões Sul e Nordeste do Brasil. Cad Saude Publica. 2008;24(2):267-80. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2008000200005
https://doi.org/10.1590/S0102-311X200800... . Fragilidades na seleção e utilização da RENAME em muitos municípios brasileiros podem justificar esse achado e alertar os gestores para investimentos na gestão da assistência farmacêutica1414. Magarinos-Torres R, Pepe VLE, Oliveira MA, Osorio-de-Castro CGS. Medicamentos essenciais e processo de seleção em práticas de gestão da Assistência Farmacêutica em estados e municípios brasileiros. Cienc Saude Coletiva. 2014;19(9):3859-68. https://doi.org/10.1590/1413-81232014199.12162013
https://doi.org/10.1590/1413-81232014199... .
A análise de regressão ajustada mostrou que o número de ICSAP foi maior em municípios com pelo menos 80% de medicamentos disponíveis, apesar de o acesso e o uso racional de medicamentos serem fundamentais para evitar internações e mortesee World Health Organization. Promoting rational use of medicines: core components. Geneva: WHO; 2002 [citado 18 set 2015]. (WHO Police Perspectives on Medicines, 5). Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/67438/1/WHO_EDM_2002.3.pdf . Estudo revela aumento do número de internações hospitalares decorrentes de efeitos adversos e intoxicações por medicamentos e mostra uma tendência crescente de problemas relacionados ao uso de medicamentos por idosos2121. Rosano A, Loha CA, Falvo R, Zee J, Ricciardi W, Guasticchi G, et al. The relationship between avoidable hospitalization and accessibility to primary care: a systematic review. Eur J Public Health. 2013;23(3):356-60. https://doi.org/10.1093/eurpub/cks053
https://doi.org/10.1093/eurpub/cks053... , mas essa evidência não é suficiente para explicar o maior número de internações. Sugerimos que o indicador disponibilidade de medicamentos não seja o mais adequado para explicar o número de ICSAP, pelo fato de não medir acesso, nem utilização de medicamentos, além da possibilidade de causalidade reversa – primeiro a internação e depois a necessidade de uso de medicamento. Além disso, municípios mais bem estruturados teriam maior oferta de serviços e insumos de saúde, inclusive consultas médicas, medicamentos e leitos hospitalares. A associação observada pode ser resultante da possibilidade de acesso ao leito hospitalar em municípios com melhor estrutura de serviços de saúde. Deve-se atentar também que, nesses municípios, a ESF encontra grande dificuldade para se afirmar como modelo prioritário, devido à oferta da alta complexidade e elevada cobertura hospitalar2424. Viana ALA, rocha JSY, Elias PE, Ibañez N, Novaes MH. Modelos de atenção básica nos grandes municípios paulistas: efetividade, eficácia, sustentabilidade e governabilidade. Cienc Saude Coletiva. 2006; 11(3):577-606. https://doi.org/10.1590/S1413-81232006000300009
https://doi.org/10.1590/S1413-8123200600... .
Das características de processo de trabalho, a equipe de ESF receber apoio matricial foi a única que mostrou associação direta com o desfecho. Essa ferramenta de gestão assegura a retaguarda especializada às EAB, mas a escassez de serviços especializados induz sua utilização equivocada de forma substitutiva, o que pode distorcer sua função66. Cunha GT, Campos GWS. Apoio matricial e Atenção Primária em Saúde. Saude Soc. 2011;20(4):961-70. https://doi.org/10.1590/S0104-12902011000400013
https://doi.org/10.1590/S0104-1290201100... .
Uma atividade importante do cuidado da equipe de atenção é garantir aos usuários os cuidados de outros pontos de atenção quando necessário2222. Terraza Núñez R, Vargas Lorenzo I, Vásquez Navarrete ML. La coordinación entre niveles asistenciales: una sistematización de sus instrumentos y medidas. Gac Sanit. 2006;20(6):485-95. https://doi.org/10.1157/13096516
https://doi.org/10.1157/13096516... . Como quase a totalidade das equipes (99,6%) informou realizar visitas domiciliares, o indicador pode não ter sido capaz de identificar associações. Porém, esse resultado, somado à não associação das ICSAP com o encaminhamento do usuário para consulta especializada e a associação contrária com o apoio matricial, leva-nos a questionar a qualidade do processo de trabalho das equipes.
Uma revisão sistemática2323. Van Loenen T, Berg MJ, Westert GP, Faber MJ. Organizational aspects of primary care related to avoidable hospitalization: a systematic review. Fam Pract. 2014;31(5):502-16. https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053
https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053... traz fortes evidências de que a continuidade do cuidado diminui o risco de ICSAP em todas as idades e em diferentes países. Porém, aponta a falta de evidências do efeito positivo de outros aspectos organizacionais da APS nas ICSAP2323. Van Loenen T, Berg MJ, Westert GP, Faber MJ. Organizational aspects of primary care related to avoidable hospitalization: a systematic review. Fam Pract. 2014;31(5):502-16. https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053
https://doi.org/10.1093/fampra/cmu053... .
Um estudo de coorte no Sul do Brasil concluiu que serviços primários de qualidade abaixo do ideal parecem não ter impacto nas ICSAP. Os autores sugerem que, para diminuir as ICSAP, deve-se investir na qualidade da APS e na reorganização do processo de trabalho, constituindo efetivamente a APS como coordenadora da rede88. Gonçalves MR, Hauser L, Prestes IV, Schmidt MI, Duncan BB, Harzheim E. Primary health care quality and hospitalizations for ambulatory care sensitive conditions in the public health system in Porto Alegre, Brazil. Fam Pract. 2016;33(3):238-42. https://doi.org/10.1093/fampra/cmv051
https://doi.org/10.1093/fampra/cmv051... .
Esse estudo apresentou algumas limitações. A análise de regressão não foi estratificada por faixa etária para ICSAP, nem por tipo de internação. No entanto, foram ajustadas para a proporção dos extremos das idades. Ainda sim, sugerimos análises futuras estratificadas para melhor compreensão das relações em questão.
Dados oriundos dos Sistemas de Informação de Saúde têm fragilidades, tanto em relação ao diagnóstico da internação quanto à codificação de diagnóstico pela CID. Entretanto, por apresentar boa proporção de informações válidas, são considerados uma importante base de dados2020. Rehem TCMSB, Oliveira MRF, Ciosak SI, Egry EY. Record of hospitalizations for ambulatory care sensitive conditions: validation of the hospital information system. Rev Lat Am Enfermagem. 2013;21(5):1159-64. https://doi.org/10.1590/S0104-11692013000500020
https://doi.org/10.1590/S0104-1169201300... .
Os dados foram coletados por avaliadores previamente treinados e havia estratégias de validação e checagem. Apesar disso, no módulo I a coleta foi realizada através de observação da UBS e pode apresentar problemas de padronização. Os dados do módulo II foram coletados através de entrevistas com profissional da EAB, situação que pode levar ao viés, já que se tratava de um processo avaliativo.
As questões relativas ao processo de trabalho podem estar superestimadas, já que a adesão ao PMAQ-AB pode estar condicionada a uma melhor situação das equipes de saúde. Na tentativa de equilibrar a diferença de adesão entre os municípios, realizamos a ponderação das variáveis do bloco proximal através da variável peso na análise de regressão. Para as variáveis do nível municipal e da UBS, não houve viés de seleção, já que foram coletados dados para toda a população do estudo.
O estudo dispôs de uma grande amostra, o que garante maior precisão das estimativas. A regressão por meio da binomial negativa possibilita o ajuste do número de internações pelo tamanho da população do município e a análise de regressão hierarquizada em três blocos permitiu a redução de viés de confundimento.
O estudo ecológico não permite fazer inferência para o nível individual. O interesse do efeito ecológico nesse estudo é atestar se ICSAP resultam de interações entre fatores sociodemográficos, de cobertura de programas assistenciais, de estrutura e de processo de trabalho da APS.
Há resultados aparentemente contraditórios, como a associação do menor número de ICSAP com os indicadores “municípios com pelo menos 80% dos medicamentos disponíveis” e “municípios com maior população com PBF”. Porém, os indicadores apontam municípios com problemas de infraestrutura na oferta de serviços e de insumos (medicamentos). Se os municípios não ofertam esses recursos e têm poucos leitos hospitalares, consequentemente, haverá menos internações, porque as pessoas terão mais barreiras para superar e para obter acesso a esses recursos (medicamentos e internações) em outros locais, mais distantes do seu local de moradia. Assim, os achados são plausíveis.
Conclui-se que características da estrutura das UBS e do processo de trabalho das EAB impactam no número de ICSAP nos municípios brasileiros. Investimentos direcionados para a qualificação das ações na APS potencialmente reduzirão as ICSAP.
Agradecimentos
Aos pesquisadores e instituições que participaram da etapa de Avaliação Externa do PMAQ-AB.
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- Financiamento: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Maranhão (FAPEMA): bolsa de mestrado e apoio à publicação de artigos (ARTIGO-02436/17, Edital 10/2017).
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
17 Ago 2017
Histórico
- Recebido
16 Mar 2016 - Aceito
30 Ago 2016