RESUMO
OBJETIVO
Testar se há associação entre posição socioeconômica da infância e medidas de índice de massa corporal, circunferência da cintura e presença de obesidade geral e abdominal na vida adulta.
MÉTODOS
Análise transversal em estudo de coorte de base populacional, incluindo amostra de adultos (22–63 anos) residentes em Florianópolis, Sul do Brasil. A posição socioeconômica da infância foi analisada por meio da escolaridade dos pais e mães dos participantes. Estatura, peso e circunferência da cintura foram aferidos por entrevistadores previamente treinados. Foram empregadas regressões linear e logística com ajuste para fatores de confusão, e estratificação dos dados segundo sexo.
RESULTADOS
Dos 1.222 adultos avaliados, 20,4% (IC95% 18,1–22,8) apresentaram obesidade geral e 24,8% (IC95% 22,4–27,4), obesidade abdominal. As médias de índice de massa corporal e circunferência da cintura entre mulheres foram, respectivamente, 1,2 kg/m2 (IC95% -2,3– -0,04) e 2,8 cm (IC95% -5,3– -0,2) menores entre aquelas de maior posição socioeconômica na infância. Entre os homens, a circunferência da cintura foi 3,9 cm (IC95% 1,0–6,8) maior nos indivíduos de maior posição socioeconômica na infância. Em relação à obesidade, mulheres de maior posição socioeconômica na infância tiveram menores chances de obesidade abdominal (OR = 0,56; IC95% 0,34–0,90), não tendo sido observada tal associação entre os homens.
CONCLUSÕES
A posição socioeconômica na infância tem influência sobre índice de massa corporal, circunferência da cintura e obesidade em adultos, com diferença na direção da associação conforme o sexo. A maior posição socioeconômica entre os homens e a menor posição socioeconômica entre as mulheres estiveram associadas aos maiores indicadores de adiposidade.
Adulto; Obesidade, epidemiologia; Fatores de Risco; Fatores Socioeconômicos; Estudos Transversais
INTRODUÇÃO
A obesidade é considerada um problema de saúde pública em razão de sua alta prevalência, dos expressivos impactos negativos que produz tanto em nível individual quanto coletivo, incluindo sua vinculação a outros agravos à saúde, como problemas ortopédicos, apneia do sono e maiores riscos para doenças crônicas e cardiovasculares2626. World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Geneva: WHO; 2000 [cited 2017 Oct 18]. (Technical Report Series, 894). Available from: http://www.who.int/nutrition/publications/obesity/WHO_TRS_894/en/
http://www.who.int/nutrition/publication... . A prevalência da obesidade é elevada e crescente no Brasil, com aumento da ordem de quatro vezes no sexo masculino e de duas vezes no sexo feminino entre 1974/1975 e 2008/2009, passando de 2,8% para 12,5% nos homens e de 8,0% para 16,9% nas mulheres1111. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. POF- Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009. Rio de Janeiro: IBGE; 2010.. Em âmbito internacional, isso coloca o Brasil entre os 10 países com maior prevalência de excesso de peso corporal no mundo, e no terceiro lugar entre os países que apresentaram o maior incremento no número de pessoas obesas de 1980 até 2008 (20 milhões), ficando atrás apenas dos Estados Unidos (56 milhões) e da China (42 milhões)2323. Stevens GA, Singh GM, Lu Y, Danaei G, Lin JK, Finucane MM, et al. National, regional, and global trends in adult overweight and obesity prevalences. Popul Health Metr. 2012;10(1):22. https://doi.org/10.1186/1478-7954-10-22
https://doi.org/10.1186/1478-7954-10-22... .
Estudos indicam que a posição socioeconômica está fortemente associada com a ocorrência da obesidade11. Aitsi-Selmi A, Batty GD, Barbieri MA, Silva AA, Cardoso VC, Goldani MZ, et al. Childhood socioeconomic position, adult socioeconomic position and social mobility in relation to markers of adiposity in early adulthood: evidence of differential effects by gender in the 1978/79 Ribeirao Preto cohort study. Int J Obes (Lond). 2013;37(3):439-47. https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64
https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64... ,77. Gigante DP, Victora CG, Matijasevich A, Horta BL, Barros FC. Association of family income with BMI from childhood to adult life: a birth cohort study. Public Health Nutr. 2013;16(2):233-9. https://doi.org/10.1017/S1368980012003229
https://doi.org/10.1017/S136898001200322... ,1313. Khlat M, Jusot F, Ville I<italic>.</italic> Social origins, early hardship and obesity: a strong association in women, but not in men? Soc Sci Med. 2009;68(9):1692-9. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2009.02.024
https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2009... . Entretanto, a maior parte dos trabalhos que avalia essa relação está restrita à aferição da posição socioeconômica (PS) na vida adulta, embora algumas investigações tenham igualmente mostrado o importante papel de condições socioeconômicas adversas no período intrauterino e início da vida sobre o estado nutricional de adultos66. Gigante DP, Minten GC, Horta BL, Barros FC, Victora CG. Nutritional evaluation follow-up of the 1982 birth cohort, Pelotas, Southern Brazil. Rev Saude Publica. 2008;42 Supl 2:60-9. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000900009
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200800... ,88. González D, Nazmi A, Victora CG. Childhood poverty and abdominal obesity in adulthood: a systematic review. Cad Saude Publica. 2009;25 Supl 3:S427-40. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2009001500008
https://doi.org/10.1590/S0102-311X200900... . Postula-se que a exposição a condições socioeconômicas adversas nos primeiros anos de vida influencia a composição corporal em fases mais tardias do ciclo vital. A infância é considerada um período crítico de desenvolvimento, no qual o tipo de ingestão dietética, características ambientais e a presença de infecções podem afetar o crescimento e o peso corporal futuros44. Brisbois TD, Farmer AP, McCargar LJ. Early markers of adult obesity: a review. Obes Rev. 2012;13(4):347-67. https://doi.org/10.1111/j.1467-789X.2011.00965.x
https://doi.org/10.1111/j.1467-789X.2011... ,1818. Pudrovska T, Logan ES, Richman A. Early-life social origins of later-life body weight: the role of socioeconomic status and health behaviors over the life course. Soc Sci Res. 2014;46:59-71. https://doi.org/10.1016/j.ssresearch.2014.02.007
https://doi.org/10.1016/j.ssresearch.201... ,2121. Senese LC, Almeida ND, Fath AK, Smith BT, Loucks EB. Associations between childhood socioeconomic position and adulthood obesity. Epidemiol Rev. 2009;31(1):21-51. https://doi.org/10.1093/epirev/mxp006
https://doi.org/10.1093/epirev/mxp006... .
Os resultados de associações entre PS na infância e obesidade em adultos são, em sua maioria, oriundos de estudos realizados em países de renda elevada44. Brisbois TD, Farmer AP, McCargar LJ. Early markers of adult obesity: a review. Obes Rev. 2012;13(4):347-67. https://doi.org/10.1111/j.1467-789X.2011.00965.x
https://doi.org/10.1111/j.1467-789X.2011... ,88. González D, Nazmi A, Victora CG. Childhood poverty and abdominal obesity in adulthood: a systematic review. Cad Saude Publica. 2009;25 Supl 3:S427-40. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2009001500008
https://doi.org/10.1590/S0102-311X200900... ,2121. Senese LC, Almeida ND, Fath AK, Smith BT, Loucks EB. Associations between childhood socioeconomic position and adulthood obesity. Epidemiol Rev. 2009;31(1):21-51. https://doi.org/10.1093/epirev/mxp006
https://doi.org/10.1093/epirev/mxp006... . Entre as escassas pesquisas realizadas no Brasil11. Aitsi-Selmi A, Batty GD, Barbieri MA, Silva AA, Cardoso VC, Goldani MZ, et al. Childhood socioeconomic position, adult socioeconomic position and social mobility in relation to markers of adiposity in early adulthood: evidence of differential effects by gender in the 1978/79 Ribeirao Preto cohort study. Int J Obes (Lond). 2013;37(3):439-47. https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64
https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64... ,66. Gigante DP, Minten GC, Horta BL, Barros FC, Victora CG. Nutritional evaluation follow-up of the 1982 birth cohort, Pelotas, Southern Brazil. Rev Saude Publica. 2008;42 Supl 2:60-9. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000900009
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200800... ,77. Gigante DP, Victora CG, Matijasevich A, Horta BL, Barros FC. Association of family income with BMI from childhood to adult life: a birth cohort study. Public Health Nutr. 2013;16(2):233-9. https://doi.org/10.1017/S1368980012003229
https://doi.org/10.1017/S136898001200322... ,99. González DA, Nazmi A, Yudkin JS, Victora CG. Life-course socio-economic factors, skin colour and abdominal obesity in adulthood in a Brazilian birth cohort. Public Health Nutr. 2009;12(11):2225-35. https://doi.org/10.1017/S1368980009990607
https://doi.org/10.1017/S136898000999060... ,2222. Silva AAM, Vasconcelos AGG, Bettiol H, Barbieri MA. Socioeconomic status, birth weight, maternal smoking during pregnancy and adiposity in early adult life: an analysis using structural equation modeling. Cad Saude Publica. 2010;26(1):15-29. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2010000100003
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201000... , os resultados não são consistentes e diferem entre os sexos e conforme o critério diagnóstico de obesidade. Particularmente entre as mulheres, as associações são mais consistentes, com a grande maioria dos resultados sugerindo maior frequência de obesidade entre aquelas com menor PS na infância. Entre os homens, no entanto, a literatura internacional não parece ter um consenso nas associações; já os poucos trabalhos realizados em duas coortes no Brasil (Pelotas e Ribeirão Preto), indicam que melhor PS no início do ciclo vital associa-se com maior ocorrência de obesidade na vida adulta11. Aitsi-Selmi A, Batty GD, Barbieri MA, Silva AA, Cardoso VC, Goldani MZ, et al. Childhood socioeconomic position, adult socioeconomic position and social mobility in relation to markers of adiposity in early adulthood: evidence of differential effects by gender in the 1978/79 Ribeirao Preto cohort study. Int J Obes (Lond). 2013;37(3):439-47. https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64
https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64... ,66. Gigante DP, Minten GC, Horta BL, Barros FC, Victora CG. Nutritional evaluation follow-up of the 1982 birth cohort, Pelotas, Southern Brazil. Rev Saude Publica. 2008;42 Supl 2:60-9. https://doi.org/10.1590/S0034-89102008000900009
https://doi.org/10.1590/S0034-8910200800... ,77. Gigante DP, Victora CG, Matijasevich A, Horta BL, Barros FC. Association of family income with BMI from childhood to adult life: a birth cohort study. Public Health Nutr. 2013;16(2):233-9. https://doi.org/10.1017/S1368980012003229
https://doi.org/10.1017/S136898001200322... ,99. González DA, Nazmi A, Yudkin JS, Victora CG. Life-course socio-economic factors, skin colour and abdominal obesity in adulthood in a Brazilian birth cohort. Public Health Nutr. 2009;12(11):2225-35. https://doi.org/10.1017/S1368980009990607
https://doi.org/10.1017/S136898000999060... ,2222. Silva AAM, Vasconcelos AGG, Bettiol H, Barbieri MA. Socioeconomic status, birth weight, maternal smoking during pregnancy and adiposity in early adult life: an analysis using structural equation modeling. Cad Saude Publica. 2010;26(1):15-29. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2010000100003
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201000... .
Além de não ser claro o efeito de aspectos socioeconômicos da infância sobre a obesidade em adultos em países de renda média e baixa, inexiste consenso sobre qual a melhor forma de prevenção dessa doença sob uma perspectiva populacional22. Bambra CL, Hillier FC, Cairns J-M, Kasim A, Moore HJ, Summerbell CD. How effective are interventions at reducing socioeconomic inequalities in obesity among children and adults? Two systematic reviews. Public Health Res. 2015;3(1). https://doi.org/10.3310/phr03010
https://doi.org/10.3310/phr03010... . Nesse sentido, a identificação de fatores precoces que influenciam o perfil epidemiológico de obesidade tem o potencial de subsidiar o desenvolvimento de estratégias mais eficientes para enfrentar esse problema, seja em âmbito populacional ou em determinados subgrupos. O objetivo deste estudo foi testar se a PS na infância está associada com medidas de índice de massa corporal (IMC), circunferência da cintura (CC) e presença de obesidade geral e abdominal na vida adulta.
MÉTODOS
Foi realizada análise transversal de dados oriundos do estudo de coorte EpiFloripa Adulto, cuja linha de base contemplou amostra representativa de adultos (20 a 59 anos de idade), residentes na zona urbana de Florianópolis, capital do estado de Santa Catarina, Brasil, em 2009. Na primeira onda de coleta de dados, a população do estudo incluiu 1.720 adultos. Detalhes sobre amostragem, população de estudo e outros aspectos metodológicos encontram-se em artigo publicado previamente33. Boing AC, Peres KG, Boing AF, Hallal PC, Silva NN, Peres AM. EpiFloripa Health Survey: the methodological and operational aspects behind the scenes. Rev Bras Epidemiol. 2014;17(1):147-62. https://doi.org/10.1590/1415-790X201400010012ENG
https://doi.org/10.1590/1415-790X2014000... .
Para o cálculo do tamanho da amostra da linha de base do estudo, considerou-se uma população finita de 249.530 indivíduos, um nível de confiança de 95%, prevalência para desfechos desconhecidos de 50%, erro amostral de quatro pontos percentuais, efeito de delineamento de 2,0, além de 10% para correção de ausência de resposta e 20% para controle de fatores de confusão. Com base nos cálculos, o número mínimo de entrevistas ficou em 1.613, considerando uma taxa de resposta de 80% e coeficiente de variação não superior a 11% para as estimativas de prevalência33. Boing AC, Peres KG, Boing AF, Hallal PC, Silva NN, Peres AM. EpiFloripa Health Survey: the methodological and operational aspects behind the scenes. Rev Bras Epidemiol. 2014;17(1):147-62. https://doi.org/10.1590/1415-790X201400010012ENG
https://doi.org/10.1590/1415-790X2014000... .
A seleção da amostra foi realizada em dois estágios. A unidade primária de amostragem foi composta pelos setores censitários de Florianópolis, com estratificação segundo a renda média do chefe da família. No segundo estágio, utilizaram-se os domicílios como unidades. Em 2009, foram considerados elegíveis para entrar no estudo todos os adultos de 20–59 anos de idade que residiam nos domicílios selecionados. Os adultos institucionalizados ou com impedimento físico ou mental para responder o questionário foram excluídos da pesquisa.
O presente estudo utilizou dados dos participantes provenientes do primeiro seguimento da coorte, realizado em 2012, na qual a idade dos participantes variou entre 22 e 63 anos. Essa coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas individuais, face a face, conduzidas nos domicílios dos indivíduos entrevistados em 2009. Foram consideradas recusas ou perdas os adultos que se negaram a participar ou que não foram localizados pelos entrevistadores após, no mínimo, quatro tentativas telefônicas de agendamento e outras quatro visitas ao domicílio (pelo menos uma no período noturno e uma no final de semana).
A variável de exposição principal foi a PS da infância, medida por meio da escolaridade dos pais e obtida mediante a aplicação de duas perguntas: “Seu pai estudou na escola?” e “Até que série/ano seu pai completou na escola?”. A escolaridade da mãe foi obtida utilizando-se as mesmas perguntas. As informações sobre escolaridade foram registradas em anos de estudo completados com sucesso. Destaca-se que, neste estudo, foram utilizados dados do primeiro seguimento da coorte pelo fato de que a variável de exposição foi coletada apenas em 2012.
Devido à amplitude da idade entre os membros da coorte e ao aumento na escolarização das coortes mais recentes (com indivíduos mais velhos apresentando pais com menos anos de estudo) (Tabela 1), a variável escolaridade dos pais e das mães foi construída levando-se em consideração a idade do participante. Por exemplo, para os participantes de maior idade (52–63 anos), a mediana de anos de estudo dos pais e mães utilizada na criação da variável PS foi de quatro anos, enquanto para os mais novos (22–31 anos) foi de 11 anos. A PS da infância foi então definida em: 1) baixa, quando a escolaridade dos pais foi menor ou igual à mediana e 2) alta, nas ocasiões em que a escolaridade dos pais foi maior que a mediana. Foram utilizadas ambas as escolaridades da mãe e do pai dos participantes, incluídas separadamente nas estatísticas.
Mediana de anos de estudo dos pais, mães e dos próprios participantes de acordo com a idade do participante. Florianópolis, SC, 2012.
As demais variáveis econômicas e sociodemográficas (sexo, idade e escolaridade atual do participante) foram empregadas neste estudo para ajuste das análises, tendo sido igualmente coletadas por meio de questionário aplicado aos respondentes. O sexo do participante foi registrado como masculino ou feminino. A idade foi calculada a partir da diferença entre a data de nascimento e aquela de realização da entrevista, sendo categorizada posteriormente em grupos de 10 anos. A escolaridade do participante foi registrada em anos completos de estudo com sucesso, sendo posteriormente dividida em quatro categorias (0 a 4; 5 a 8; 9 a 11; e 12 ou mais anos de estudo).
Os desfechos foram o IMC e a CC avaliados como variáveis contínuas, e as prevalências de obesidade geral e abdominal. A obesidade geral foi definida utilizando-se os valores de peso e estatura. Para a obesidade abdominal, utilizaram-se os valores da CC. Os dados de peso corporal e CC foram coletados na linha de base e no primeiro seguimento e o valor da estatura apenas na linha de base. Para o presente estudo, foram utilizados os dados de peso corporal e CC de 2012 e dados de estatura coletados em 2009. A aferição do peso corporal foi realizada por meio de uma balança digital (marca GAMA Italy Professional®, modelo HCM 5110M, com resolução de 100 gramas e capacidade de 150 kg, calibrada antes do início da pesquisa) com os entrevistados descalços e vestindo roupas leves, conforme procedimento padrão descrito na literatura2525. World Health Organization. Physical status: the use and interpretation of anthropometry. Geneva: WHO; 1995 [cited 2017 Oct 18]. (Technical Report Series, 854). Available from: http://www.who.int/childgrowth/publications/physical_status/en/
http://www.who.int/childgrowth/publicati... . A estatura foi aferida por meio de estadiômetro portátil, com capacidade máxima de 200 cm e graduação de 1 mm, seguindo procedimento padrão para a sua determinação1515. Lohman TG, Roche AF, Martorell R. Anthropometric standardization reference manual. Champaign: Human Kinetics Books; 1988.. Por sua vez, a CC foi aferida com uma fita antropométrica inextensível (marca Sanny, capacidade máxima 200 cm e graduação de 1 mm) com o indivíduo em posição ereta. A medida foi tomada na parte mais estreita do tronco abaixo da última costela. Para indivíduos sem cintura visível, foi medido o perímetro no ponto médio entre a crista ilíaca e a última costela. A leitura da medida foi realizada no momento da expiração1515. Lohman TG, Roche AF, Martorell R. Anthropometric standardization reference manual. Champaign: Human Kinetics Books; 1988.. Foram excluídos os indivíduos impossibilitados de permanecer em pé, as gestantes e as que tiveram filhos nos seis meses anteriores à pesquisa.
O diagnóstico nutricional de obesidade geral foi definido de acordo com o critério da Organização Mundial de Saúde2525. World Health Organization. Physical status: the use and interpretation of anthropometry. Geneva: WHO; 1995 [cited 2017 Oct 18]. (Technical Report Series, 854). Available from: http://www.who.int/childgrowth/publications/physical_status/en/
http://www.who.int/childgrowth/publicati... para valores de IMC ≥ 30 kg/m2, sendo utilizado o mesmo ponto de corte para ambos os sexos. A obesidade abdominal foi definida de acordo com o sexo, segundo os valores da CC, classificada de acordo com os pontos de corte: obesidade nos homens ≥ 102 cm e obesidade nas mulheres: ≥ 88 cm2525. World Health Organization. Physical status: the use and interpretation of anthropometry. Geneva: WHO; 1995 [cited 2017 Oct 18]. (Technical Report Series, 854). Available from: http://www.who.int/childgrowth/publications/physical_status/en/
http://www.who.int/childgrowth/publicati... .
As análises foram realizadas no programa estatístico Stata, versão 13.0. O IMC e a CC estão descritos por médias e desvios padrão e a obesidade geral e abdominal foram apresentadas por percentuais e respectivos intervalos de confiança de 95%. A análise multivariável dos dados foi feita por meio de regressão linear e logística e os resultados considerados com significância estatística quando apresentaram valor de p < 0,05. No total, foram construídos três modelos: o primeiro com a análise bruta da relação entre PS da infância e marcadores de obesidade na vida adulta; o segundo, ajustado para idade do participante; e o terceiro incluindo, além da idade, a escolaridade atual no ajuste. Foram realizadas análises de interação com a variável sexo como possível modificadora de efeito nas associações (quando p < 0,05). Posteriormente, em todas as análises, os dados foram estratificados de acordo com o sexo. Todas as estimativas foram ajustadas para os pesos amostrais, considerando-se o efeito de delineamento da amostra (2009) e a probabilidade de localização dos participantes no seguimento da coorte (2012).
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (Parecer 351/08 e 1772/11) e todos os participantes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.
RESULTADOS
No ano de 2012, 1.222 pessoas com idades entre 22 e 63 anos foram avaliadas no primeiro seguimento da coorte (71,1% da linha de base), sendo 57,3% da amostra composta por mulheres. Além disso, a mediana da escolaridade atual foi de 11 anos (p25–p75 = 9–15). Ao fazer a comparação dos participantes da linha de base do estudo com os do primeiro seguimento da coorte, verificou-se uma perda maior de homens e de indivíduos mais jovens, mas não foram encontradas diferenças nas duas amostras em relação à escolaridade e estado nutricional (Tabela 2).
A média de IMC e CC, assim como a prevalência de obesidade geral e abdominal em homens e mulheres são apresentadas na Tabela 3. Diferenças na amostra de acordo com a prevalência de obesidade geral e abdominal foram observadas em relação à idade e escolaridade atual, sendo os maiores percentuais de obesos detectados nas categorias de maior idade e menos anos de estudo (Tabela 3).
Distribuição da amostra segundo a média de índice de massa corporal (IMC) e circunferência da cintura (CC) e prevalência de obesidade geral e abdominal segundo características dos participantes. Florianópolis, SC, 2012.
Termos de interação com a variável sexo foram verificados nas associações de IMC, CC, obesidade geral e abdominal com a escolaridade paterna e IMC, CC e obesidade abdominal com a variável escolaridade materna, sendo, portanto, os resultados apresentados separadamente para homens e mulheres.
Na Tabela 4, observa-se que os valores de IMC e CC foram maiores entre os homens de maior PS e entre as mulheres de menor PS. Após ajuste para idade, os valores de IMC entre mulheres foram cerca de 1,6 kg/m2 (IC95% -2,7– -0,5) menores e as médias de CC foram cerca de 4,4 cm menores (IC95% -6,9– -1,9) nas filhas de pais com mais anos de estudo. No sexo masculino, a associação teve sentido inverso, em que a CC foi aproximadamente 4 cm maior (IC95% 1,1–6,6) nos indivíduos cujos pais estavam na categoria de maior escolaridade. No terceiro modelo de regressão, que incluiu a variável escolaridade atual, o IMC foi 1,2 kg/m2 (IC95% -2,3– -0,04) e a CC 2,8 cm (IC95% -5,3– -0,2) menor nas mulheres e a CC dos homens se manteve aproximadamente 4 cm maior (IC95% 1,0–6,8) nas categorias de pais com maior escolaridade.
Os resultados de regressão logística (Tabela 5) mostram o mesmo padrão de associação. Entre as mulheres, maior PS foi fator de proteção para obesidade. Nos modelos ajustados para idade, a maior escolaridade do pai foi associada com menores chances de obesidade geral (OR = 0,51; IC95% 0,29–0,88) e abdominal (OR = 0,48; IC95% 0,30–0,76). Ao incluir a escolaridade atual no modelo, essa diferença se manteve apenas para obesidade abdominal (OR = 0,56; IC95% 0,34–0,90). No sexo masculino, maior PS aumentou a chance de obesidade geral e abdominal, mas as diferenças entre os grupos não tiveram significância estatística.
DISCUSSÃO
Os resultados deste estudo mostram diferenças entre os sexos. Mulheres com menor PS na infância tiveram maiores médias de IMC e CC, enquanto nos homens a associação foi oposta, para os quais foram encontrados maiores valores de CC naqueles com maior PS na infância. Ao analisar os desfechos obesidade geral e abdominal, os resultados mantiveram o mesmo padrão de associação; no entanto, apenas para obesidade abdominal entre as mulheres foi observada significância estatística após ajuste para escolaridade da vida adulta.
Entre as mulheres, os resultados são consistentes com a maior parte dos trabalhos sobre o tema, independentemente do local de realização do estudo e do critério utilizado para definir a PS da infância11. Aitsi-Selmi A, Batty GD, Barbieri MA, Silva AA, Cardoso VC, Goldani MZ, et al. Childhood socioeconomic position, adult socioeconomic position and social mobility in relation to markers of adiposity in early adulthood: evidence of differential effects by gender in the 1978/79 Ribeirao Preto cohort study. Int J Obes (Lond). 2013;37(3):439-47. https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64
https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64... ,77. Gigante DP, Victora CG, Matijasevich A, Horta BL, Barros FC. Association of family income with BMI from childhood to adult life: a birth cohort study. Public Health Nutr. 2013;16(2):233-9. https://doi.org/10.1017/S1368980012003229
https://doi.org/10.1017/S136898001200322... ,88. González D, Nazmi A, Victora CG. Childhood poverty and abdominal obesity in adulthood: a systematic review. Cad Saude Publica. 2009;25 Supl 3:S427-40. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2009001500008
https://doi.org/10.1590/S0102-311X200900... . Quanto aos homens, a literatura ainda aponta resultados controversos nessa associação. Alguns estudos encontram menores valores de IMC ou CC nos indivíduos com maior PS na infância, outros mostram associação nula, enquanto outros mostram resultados similares aos da presente pesquisa, na qual as medidas analisadas são maiores em indivíduos de maior PS na infância88. González D, Nazmi A, Victora CG. Childhood poverty and abdominal obesity in adulthood: a systematic review. Cad Saude Publica. 2009;25 Supl 3:S427-40. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2009001500008
https://doi.org/10.1590/S0102-311X200900... ,2121. Senese LC, Almeida ND, Fath AK, Smith BT, Loucks EB. Associations between childhood socioeconomic position and adulthood obesity. Epidemiol Rev. 2009;31(1):21-51. https://doi.org/10.1093/epirev/mxp006
https://doi.org/10.1093/epirev/mxp006... . Destaca-se que a maior parte dos estudos que encontram associação direta foi realizada em países de renda média, como Brasil e China, o que parece mostrar diferença no padrão de associação conforme a renda do país de residência11. Aitsi-Selmi A, Batty GD, Barbieri MA, Silva AA, Cardoso VC, Goldani MZ, et al. Childhood socioeconomic position, adult socioeconomic position and social mobility in relation to markers of adiposity in early adulthood: evidence of differential effects by gender in the 1978/79 Ribeirao Preto cohort study. Int J Obes (Lond). 2013;37(3):439-47. https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64
https://doi.org/10.1038/ijo.2012.64... ,77. Gigante DP, Victora CG, Matijasevich A, Horta BL, Barros FC. Association of family income with BMI from childhood to adult life: a birth cohort study. Public Health Nutr. 2013;16(2):233-9. https://doi.org/10.1017/S1368980012003229
https://doi.org/10.1017/S136898001200322... ,1212. Kavikondala S, Jiang CQ, Zhang WS, Cheng KK, Lam TH, Leung GM, et al. Intergenerational ‘mismatch’ and adiposity in a developing population: the Guangzhou biobank cohort study. Soc Sci Med. 2010;70(6):834-43. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2009.11.009
https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2009... . Ainda na presente pesquisa, ao se analisar o desfecho obesidade geral e abdominal, não foram encontradas quaisquer associações no sexo masculino, o que corrobora outros estudos que sugerem associações com obesidade entre mulheres, mas não em homens1414. Lee H, Harris KM, Lee J. Multiple levels of social disadvantage and links to obesity in adolescence and young adulthood. J Sch Health. 2013;83(3):139-49. https://doi.org/10.1111/josh.12009
https://doi.org/10.1111/josh.12009... ,2020. Schumann B, Kluttig A, Tiller D, Werdan K, Haerting J, Greiser KH. Association of childhood and adult socioeconomic indicators with cardiovascular risk factors and its modification by age: the CARLA Study 2002-2006. BMC Public Health. 2011;11:289. https://doi.org/10.1186/1471-2458-11-289
https://doi.org/10.1186/1471-2458-11-289... . No entanto, ao considerar que a média de CC foi de cerca de 4 cm maior nos filhos de pais de maior escolaridade, a PS parece não afetar as categorias extremas, mas tem efeito sobre a média de CC. Diversos estudos, inclusive a presente pesquisa, podem não encontrar associação ao analisar a obesidade em função do tratamento estatístico (categorização ou transformação, por exemplo) dado às variáveis da análise.
Diferentes correntes teóricas associam a PS da infância com a obesidade na vida adulta. Uma delas baseia-se no fato de que a infância é um período crítico de desenvolvimento, em que piores condições socioeconômicas podem acarretar alterações fisiológicas em longo prazo44. Brisbois TD, Farmer AP, McCargar LJ. Early markers of adult obesity: a review. Obes Rev. 2012;13(4):347-67. https://doi.org/10.1111/j.1467-789X.2011.00965.x
https://doi.org/10.1111/j.1467-789X.2011... ,1818. Pudrovska T, Logan ES, Richman A. Early-life social origins of later-life body weight: the role of socioeconomic status and health behaviors over the life course. Soc Sci Res. 2014;46:59-71. https://doi.org/10.1016/j.ssresearch.2014.02.007
https://doi.org/10.1016/j.ssresearch.201... . Nesse sentido, estudos indicam que a exposição a condições adversas durante a infância, como infecções frequentes e menor ingestão energética e proteica, promove uma série de mecanismos que poupam a energia recebida e geram estresse, promovendo aumento crônico dos níveis de cortisol, aumento da atividade inflamatória e alterações do metabolismo, com consequências para toda a vida1616. Pearlin LI, Schieman S, Fazio EM, Meersman SC. Stress, health, and the life course: some conceptual perspectives. J Health Soc Behav. 2005;46(2):205-19. https://doi.org/10.1177/002214650504600206
https://doi.org/10.1177/0022146505046002... ,2424. Stringhini S, Polidoro S, Sacerdote C, Kelly RS, Veldhoven K, Agnoli C, et al. Life-course socioeconomic status and DNA methylation of genes regulating inflammation. Int J Epidemiol. 2015;44(4):1320-30. https://doi.org/10.1093/ije/dyv060
https://doi.org/10.1093/ije/dyv060... .
Outra teoria postula que o ambiente em que se vive no começo da vida promoverá ou não melhores oportunidades e estilos de vida. Crianças com baixa condição socioeconômica apresentam menos oportunidades de prática de esportes e têm menos acesso a locais para prática de atividade física, além de serem menos participativas nas atividades físicas dentro das escolas. Essa relação com o aumento excessivo de peso na vida adulta vem do fato de que, além de a prática regular de exercício quando criança contribuir com menor peso, indivíduos sedentários tendem a manter tal hábito. Indivíduos cujo histórico familiar é de melhor PS são os que mais praticam atividade física1717. Pudrovska T, Anishkin A. Early-life socioeconomic status and physical activity in later life: evidence from structural equation models. J Aging Health. 2013;25(3):383-404. https://doi.org/10.1177/0898264312468601
https://doi.org/10.1177/0898264312468601... ,1818. Pudrovska T, Logan ES, Richman A. Early-life social origins of later-life body weight: the role of socioeconomic status and health behaviors over the life course. Soc Sci Res. 2014;46:59-71. https://doi.org/10.1016/j.ssresearch.2014.02.007
https://doi.org/10.1016/j.ssresearch.201... . Outro fator relacionado à infância se refere à alimentação nessa fase da vida, o que pode influenciar escolhas alimentares futuras e o próprio peso corporal. Estudos demonstram que o consumo alimentar de uma dieta com mais vegetais na vida adulta está relacionado com melhor PS da infância1010. Hare-Bruun H, Togo P, Andersen LB, Heitmann BL. Adult food intake patterns are related to adult and childhood socioeconomic status. J Nutr. 2011;141(5):928-34. https://doi.org/10.3945/jn.110.133413
https://doi.org/10.3945/jn.110.133413... ,1818. Pudrovska T, Logan ES, Richman A. Early-life social origins of later-life body weight: the role of socioeconomic status and health behaviors over the life course. Soc Sci Res. 2014;46:59-71. https://doi.org/10.1016/j.ssresearch.2014.02.007
https://doi.org/10.1016/j.ssresearch.201... .
Na presente pesquisa, foram encontradas diferenças entre os sexos na magnitude e direção de associação da PS na infância com a obesidade. Esse fato pode ser explicado pela implicação que a desvantagem socioeconômica tem sobre o peso corporal, com efeito mais forte entre as mulheres1919. Pudrovska T, Reither EN, Logan ES, Sherman-Wilkins KJ. Gender and reinforcing associations between socioeconomic disadvantage and body mass over the life course. J Health Soc Behav. 2014;55(3):283-301. https://doi.org/10.1177/0022146514544525
https://doi.org/10.1177/0022146514544525... , o que inclui a diferença de padrões físicos impostos aos homens e às mulheres1313. Khlat M, Jusot F, Ville I<italic>.</italic> Social origins, early hardship and obesity: a strong association in women, but not in men? Soc Sci Med. 2009;68(9):1692-9. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2009.02.024
https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2009... . É possível supor que existem demandas culturais específicas, pelas quais o excesso de peso corporal é revestido de conotação negativa especialmente entre as mulheres. Tais demandas podem atingir principalmente as mulheres de melhor PS e que dispõem de mais recursos para o cuidado da aparência corporal1313. Khlat M, Jusot F, Ville I<italic>.</italic> Social origins, early hardship and obesity: a strong association in women, but not in men? Soc Sci Med. 2009;68(9):1692-9. https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2009.02.024
https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2009... . Além disso, homens fazem menos controle do peso, e potencialmente acabam menos influenciados por questões relacionadas ao controle dos pais sobre hábitos saudáveis na infância, que inclui o seguimento de uma dieta balanceada1010. Hare-Bruun H, Togo P, Andersen LB, Heitmann BL. Adult food intake patterns are related to adult and childhood socioeconomic status. J Nutr. 2011;141(5):928-34. https://doi.org/10.3945/jn.110.133413
https://doi.org/10.3945/jn.110.133413... .
Outra questão a ser discutida é a transição nutricional que o Brasil atravessa no momento. Em países de renda elevada, homens e mulheres de menor PS são mais obesos, enquanto nos países de média e baixa renda ocorre o oposto. No Brasil, os dados de inquéritos nacionais realizados desde a década de 1970 até 2008–2009 mostram que a obesidade nos homens sempre se manteve mais prevalente entre aqueles de maior PS1111. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. POF- Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009. Rio de Janeiro: IBGE; 2010.. Nas mulheres, o perfil de obesidade vem se alterando, aumentando nos últimos anos entre aquelas de menor PS e atingindo atualmente prevalências similares1111. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. POF- Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009. Rio de Janeiro: IBGE; 2010., o que também corrobora essa diferença entre os sexos na associação da obesidade com a PS.
Grande parte dos estudos sobre essa temática analisam somente as características socioeconômicas do pai como forma de medição da PS da infância, sendo a profissão a variável mais comum. O uso apenas de características paternas pode ser uma limitação, visto que outros aspectos do ambiente na infância não são analisados e poderiam também explicar essa associação1919. Pudrovska T, Reither EN, Logan ES, Sherman-Wilkins KJ. Gender and reinforcing associations between socioeconomic disadvantage and body mass over the life course. J Health Soc Behav. 2014;55(3):283-301. https://doi.org/10.1177/0022146514544525
https://doi.org/10.1177/0022146514544525... . O presente estudo, apesar de analisar apenas a escolaridade como variável de PS, utilizou ambas as escolaridades dos pais e mães dos indivíduos, visto que suas influências em aspectos de saúde dos filhos podem ser distintas. A escolaridade do pai está mais relacionada à renda familiar e com a aquisição de bens e produtos, enquanto a da mãe tende a ter mais influência na educação e, consequentemente, nos hábitos de vida dos filhos55. Carvalho IMM, Almeida PH. Família e proteção social. Sao Paulo Perspec. 2003;17(2):109-22. https://doi.org/10.1590/S0102-88392003000200012
https://doi.org/10.1590/S0102-8839200300... . Na presente pesquisa, as associações variaram em magnitude ao utilizar a escolaridade do pai e da mãe como exposição, não sendo possível distinguir qual delas exerce maior efeito sobre os desfechos, apesar de a escolaridade do pai mostrar ter mais efeito sobre a CC.
O desenho transversal com informações sobre a escolaridade dos pais referidas pelos próprios participantes é uma limitação do estudo. Apesar de possível perda de precisão, essas informações são relativamente estáveis ao longo do tempo e os resultados encontrados são menos afetados pelo viés de memória. Adicionalmente, outros estudos também têm utilizado informações socioeconômicas da família com base em relatos na vida adulta, e apresentaram resultados consistentes com o de pesquisas que coletaram esses dados sob uma perspectiva longitudinal88. González D, Nazmi A, Victora CG. Childhood poverty and abdominal obesity in adulthood: a systematic review. Cad Saude Publica. 2009;25 Supl 3:S427-40. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2009001500008
https://doi.org/10.1590/S0102-311X200900... . Outra limitação do presente estudo se refere à ausência de dados que poderiam ser utilizados nas análises ajustadas da pesquisa, referentes à infância dos entrevistados, como renda familiar no nascimento e paridade.
Como pontos fortes, o estudo contemplou, em sua linha de base, amostra representativa de adultos de Florianópolis, que teve uma alta taxa de resposta, e incluiu os pesos amostrais com a probabilidade de localização em 2012 para reduzir a possibilidade de viés de seguimento. Destaca-se que não houve diferenças entre as duas amostras quanto à escolaridade dos participantes do estudo. Além disso, são poucos os trabalhos com essa temática realizados em países de renda média e baixa, incluindo o Brasil.
Em conclusão, a PS dos pais na infância tem influência sobre IMC, CC e diagnóstico de obesidade em adultos, indicando que políticas públicas com foco na infância podem ser utilizadas na prevenção da obesidade também em adultos. Estudos acerca da efetividade de políticas mostram que é necessário o desenvolvimento de intervenções que possam ser incorporadas nas práticas de saúde existentes e que se mantenham em longo prazo, sendo mais efetivas que ações específicas e desenvolvidas durante um curto período22. Bambra CL, Hillier FC, Cairns J-M, Kasim A, Moore HJ, Summerbell CD. How effective are interventions at reducing socioeconomic inequalities in obesity among children and adults? Two systematic reviews. Public Health Res. 2015;3(1). https://doi.org/10.3310/phr03010
https://doi.org/10.3310/phr03010... . Além disso, os resultados dessa pesquisa indicam que ações voltadas aos grupos populacionais que desde a infância estão mais propensos à obesidade devem considerar diferenças relacionadas ao sexo. A maior parte das políticas atuais são desenvolvidas para grupos de menor posição socioeconômica, e especialmente para mulheres22. Bambra CL, Hillier FC, Cairns J-M, Kasim A, Moore HJ, Summerbell CD. How effective are interventions at reducing socioeconomic inequalities in obesity among children and adults? Two systematic reviews. Public Health Res. 2015;3(1). https://doi.org/10.3310/phr03010
https://doi.org/10.3310/phr03010... . Políticas públicas podem focar os meninos de maior e meninas de menor PS, que são os grupos mais propensos à obesidade na vida adulta.
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- Financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq – Processos 485327/2007-4 e 477061/20109).
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
26 Fev 2018
Histórico
- Recebido
10 Jul 2016 - Aceito
3 Fev 2017