Panorama epidemiológico de dezoito anos de internações por trauma em UTI no Brasil

Maicon Henrique Lentsck Ana Paula Sayuri Sato Thais Aidar de Freitas Mathias Sobre os autores

RESUMO

OBJETIVO

Analisar a magnitude e a tendência das taxas de internação por lesões traumáticas em unidades de terapia intensiva (UTI) no Brasil de 1998 a 2015.

MÉTODOS

Estudo ecológico de séries temporais com dados do Sistema de Informações Hospitalares. A análise de tendência das taxas de internação segundo diagnóstico, sexo e idade foi realizada por modelos de regressão linear generalizada e procedimento de Prais-Winsten.

RESULTADOS

As taxas foram mais elevadas para os homens, mas o crescimento das internações por trauma para as mulheres influenciou a razão das taxas entre os sexos. As quedas e os acidentes de transporte foram as causas mais frequentes dos traumas. Houve aumento de 3,6% ao ano, em média, nas taxas de internação por trauma em UTI no Brasil, maior na região Norte (8%; IC95% 6,4–9,6), entre as mulheres (5,4%; IC95% 4,5–6,3) e pessoas com 60 anos ou mais (5,5%; IC95% 4,7–6,3). Entre as causas do trauma, as quedas (4,5%; IC95% 3,5–5,5) e complicações assistenciais (5,4%; IC95% 4,5–6,3) foram as mais importantes. Por outro lado, as taxas de mortalidade hospitalar por trauma em UTI declinaram 1,7% ao ano, em média (IC95% 2,1–1,3).

CONCLUSÃO

O aumento das internações por trauma em UTI no Brasil pode ser resultado de alguns fatores, como a ocorrência crescente de acidentes e violências, a implementação do atendimento pré-hospitalar e também a melhoria no acesso à assistência, com maior número de leitos em UTI. Soma-se a isso o envelhecimento da população, pois observou-se aumento mais acentuado das internações em pessoas com 60 anos de idade ou mais.

Ferimentos e Lesões, epidemiologia; Unidades de Terapia Intensiva, tendências; Cuidados Críticos; Estudos de Séries Temporais

INTRODUÇÃO

Os traumas decorrentes de causas externas continuam a ser o principal motivo de morte e incapacidades em pessoas de 5 a 29 anos11. World Health Organization. Global status report on road safety 2018: supporting a decade of action. Geneva: WHO; 2018 [cited 2018 Dec 7]. Available from: https://www.who.int/violence_injury_prevention/road_safety_status/2018/en/
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, embora o envelhecimento possa estar influenciando o aumento das taxas de internação por trauma em idosos. Na Espanha, entre 2000 e 2010, o aumento anual nas taxas em idosos foi de 1,1% para homens e 0,9% para mulheres22. Civera E, Pérez K, Santamariña-Rubio E, Novoa AM, Olabarria M. Incidence trends of injury among the elderly in Spain, 2000-2010. Inj Prev. 2014;20(6):401-7. https://doi.org/10.1136/injuryprev-2014-041199
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; nos EUA, as internações por trauma representaram 4,4% do total entre 2000 e 2011, com declínio para crianças e jovens e estabilidade para idosos33. DiMaggio CJ, Ayoung-Chee P, Shinseki M, Wilson C, Marshall G, Lee DC, et al. Traumatic injury in the United States: in patient epidemiology 2000-2011. Injury. 2016;47(7):1393-403. https://doi.org/10.1016/j.injury.2016.04.002
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. Em 2015, o trauma representou 10,1% da carga global de doenças44. Haagsma JA, Graetz N, Bolliger I, Naghavi M, Higashi H, Mullany EC, et al. The global burden of injury: incidence, mortality, disability-adjusted life years and time trends from the Global Burden of Disease study 2013. Inj Prev. 2016;22(1):3-18. https://doi.org/10.1136/injuryprev-2015-041616
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. A depender da gravidade, ele ocasiona sequelas ou até a morte.

Em 2017, o estudo da carga global de doenças, lesões e fatores de risco ( Global Burden of Disease – GBD) estimou que somente traumas não fatais por quedas e acidentes de trânsito geraram incapacidades em curto e longo prazo em 226,2 milhões de pessoas55. GDB 2017 Disease and Injury Incidence and Prevalence Collaborators. Global, regional, and national incidence, prevalence, and years lived with disability for 354 diseases and injuries for 195 countries and territories, 1990-2017: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2017. Lancet. 2018;392(10159):1789-858. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)32279-7
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. Já as lesões fatais representaram 8% da mortalidade no mundo, vitimando 4,48 milhões de pessoas, com um aumento de 2,3% em relação aos dados de 2007 e uma taxa de mortalidade global de 57,9 por 100.000 habitantes66. GDB 2017 Causes of Death Collaborators. Global, regional, and national age-sex-specific mortality for 282 causes of death in 195 countries and territories, 1980-2017: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2017. Lancet. 2018;392(10159):1736-88. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)32203-7
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. Nesse mesmo ano, o trauma foi responsável por 11,9% dos 1,65 bilhões de anos potenciais de vida perdidos66. GDB 2017 Causes of Death Collaborators. Global, regional, and national age-sex-specific mortality for 282 causes of death in 195 countries and territories, 1980-2017: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2017. Lancet. 2018;392(10159):1736-88. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)32203-7
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.

Além do incremento, existe tendência de elevação na gravidade das lesões traumáticas. No Canadá, de 2002 a 2009 o crescimento das internações por traumas graves em pessoas com 65 anos de idade ou mais foi de 22% e de 10% entre os jovens77. Hill AD, Pinto R, Nathens AB, Fowler RA. Age-related trends in severe injury hospitalization in Canada. J Trauma Acute Care Surg. 2014;77(4):608-13. https://doi.org/10.1097/TA.0000000000000412
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. A tendência de intensificação da gravidade nos diferentes tipos de trauma também ocorreu na Espanha22. Civera E, Pérez K, Santamariña-Rubio E, Novoa AM, Olabarria M. Incidence trends of injury among the elderly in Spain, 2000-2010. Inj Prev. 2014;20(6):401-7. https://doi.org/10.1136/injuryprev-2014-041199
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. O acréscimo de traumas graves exige aprimoramento na organização dos serviços de saúde e especialização da equipe multiprofissional, sendo necessária internação em unidades de terapia intensiva (UTI). Para conhecer a morbidade por trauma no Brasil, analisou-se o Sistema de Informações Hospitalares (SIH) do Sistema Único de Saúde (SUS), o banco de dados sobre internações no país, e observou-se que as hospitalizações por causas externas aumentaram 37,3% entre 2002 e 2011, com predomínio das quedas (41%) e dos acidentes de trânsito (15%)88. Mascarenhas MDM, Barros MBA. Evolução das internações hospitalares por causas externas no sistema público de saúde – Brasil, 2002 a 2011. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(1):19-29. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000100003
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.

Parte importante das vítimas de trauma precisa de cuidado intensivo, essencial para sua sobrevivência99. Timmers KS, Verhofstad MH, Leenen LP. Intensive care organisation: should there be a separate intensive care unit for critically injured patients? World J Crit Care Med. 2015;4(3):240-3. https://doi.org/10.5492/wjccm.v4.i3.240
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. Nos Estados Unidos, em 2013, 33,8% dos traumatizados foram internados em UTI, com incidência maior em pessoas com 80 anos de idade ou mais (7,8 para cada 1.000 habitantes)1010. Prin M, Li G. Complications and in-hospital mortality in trauma patients treated in intensive care units in the United States, 2013. Inj Epidemiol. 2016;3(1):18. https://doi.org/10.1186/s40621-016-0084-5
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. Estudar essas hospitalizações em UTI torna-se imprescindível para o planejamento e organização da assistência ao trauma e para o desenvolvimento de programas de prevenção1111. Laksmi PVM, Tripathy JP, Tripathy N, Singh S, Bhatia D, Jagnoor J, et al. A pilot study of a hospital-based injury surveillance system in a secondary level district hospital in India: lessons learnt and way ahead. Inj Epidemiol. 2016;3(1):24. https://doi.org/10.1186/s40621-016-0090-7
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Com o aumento dos acidentes de trânsito e da violência, principalmente das agressões1212. Reichenheim ME, Souza ER, Moraes CL, Mello Jorge MHP, Silva CMFP, Minayo MCS. Violence and injuries in Brazil: the effect, progress made, and challenges ahead. Lancet. 2011;377(9781):1962-75. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60053-6
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, em especial nos grandes aglomerados urbanos, é possível que as internações por traumas em UTI apresentem também tendência crescente. O cuidado intensivo, especialmente as internações, representam proporcionalmente o maior custo da rede de atenção para o setor saúde e para a sociedade. Considerando o fardo das lesões traumáticas no perfil de morbimortalidade na população e que parte importante das vítimas é hospitalizada, entende-se que as taxas de internação em UTI devem ser analisadas no Brasil, identificando-se as tendências desse evento em regiões e estados, assim como o perfil por sexo, idade, tipo de causa externa que originou a internação, tempo de permanência e mortalidade hospitalar. Esses estudos podem servir de apoio para o planejamento e monitoramento de políticas públicas. Portanto, o objetivo deste estudo foi analisar a magnitude e a tendência das taxas de internação em UTI por lesões traumáticas no Brasil de 1998 a 2015.

MÉTODOS

Estudo ecológico de séries temporais com dados de internações hospitalares por trauma em UTI financiadas pelo SUS, para as competências de apresentação das autorizações de internação hospitalar (AIH) no SIH-SUS de janeiro de 1998 a dezembro de 2015 no Brasil. A escolha do início da série se justifica pela utilização da 10ª revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10) para morbidade hospitalar no Brasil e pela época da publicação da portaria que instituiu a exigência de registro do código da natureza da lesão no campo “diagnóstico principal” e da causa externa no “diagnóstico secundário” na AIH1313. Ministério da Saúde (BR). Portaria nº 142, de 13 de novembro de 1997. Dispõe sobre o preenchimento de Autorização de Internação Hospitalar-AIH, em casos com quadro compatível com causas externas. Diario Oficial Uniao. 17 nov 1997; Seção 1:26499 . O final da série retrata as últimas internações disponibilizadas no momento da coleta de dados.

Por meio do endereço eletrônico do Departamento de Informática do SUS (DATASUS), foram gerados arquivos mensais para cada ano da série e estado. Foram selecionados os registros com menção de uso de UTI e com diagnóstico principal de lesões e envenenamentos (capítulo XIX da CID-10) nos agrupamentos: traumas da cabeça (S00–S09); pescoço (S10–S19); tórax (S20–S29); abdome, dorso, coluna lombar e pelve (S30–S39); membros superiores (S40–S69); membros inferiores (S70–S99); múltiplas regiões do corpo (T00–T07); regiões não especificadas (T08–T14); efeito de corpo estranho através de orifício natural (T15–T19); queimaduras e corrosões (T20–T32); efeitos do frio (T33–T35); intoxicação por drogas, medicamentos e substâncias biológicas (T36–T50); efeitos tóxicos de substâncias não medicinais (T51–T65); outros efeitos de causas externas (T66–T78); algumas complicações precoces de traumatismo (T79); complicações de cuidados médicos e cirúrgicos (T80–T88) e sequelas de traumatismos (T90–T98). Esta seleção resultou em um banco de dados com 790.884 internações. Os dados de população foram coletados no endereço eletrônico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base nos censos populacionais, contagens populacionais e estimativas intercensitárias.

As internações por lesões traumáticas foram analisadas por meio de números absolutos, relativos e diferença relativa. Foram calculadas taxas por 100.000 habitantes, estratificadas por sexo, idade e causa externa, segundo regiões e estados, padronizadas pelo método direto, tendo como referência a população do censo de 2010. As internações por causas externas correspondem ao diagnóstico secundário e são codificadas no capítulo XX da CID-10 (V01–Y98). Houve perda de 7.542 dessas internações (0,9%) por falta de registro. Calcularam-se as médias de permanência e taxas de mortalidade hospitalar a cada 100 internações por lesões traumáticas.

A análise da tendência foi realizada por meio de regressão linear generalizada, que considera as taxas de internação como variável dependente (Y) e os anos-calendário como variável independente (X). A fim de corrigir o efeito da autocorrelação temporal de primeira ordem dos resíduos, utilizou-se o procedimento de Prais-Winsten, o qual, pelo teste de Durbin-Watson, avalia a manifestação da autocorrelação. A interpretação do teste se dá por uma medida que varia de 0 a 4, em que 2 significa inexistência de autocorrelação serial1414. Antunes JLF, Cardoso MRA. Uso da análise de séries temporais em estudos epidemiológicos. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(3):565-76. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000300024
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As séries foram suavizadas por média móvel de terceira ordem. Posteriormente, foi realizada sua transformação logarítmica e construídos diagramas de dispersão e autocorrelação. Foi aplicado o modelo autorregressivo de Prais-Winsten, que identificou se o comportamento das taxas foi estável (p > 0,05), decrescente (p < 0,05 e coeficiente de regressão β1negativo) ou crescente (p < 0,05 e coeficiente de regressão β1positivo). Após a modelagem foi calculada a variação média percentual anual das taxas de internação no período para o coeficiente de regressão por meio do cálculo (-1 + 10^b)x100, e os respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%), pela fórmula b±tEP, onde t é o valor tabelado do teste t e EP o valor do erro-padrão do coeficiente de regressão1515. Santos MAS, Oliveira, MM, Andrade SSCA, Nunes ML, Malta DC, Moura L. Non-communicable chronic disease hospital morbidity trends in Brazil, 2002-2012. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(3):389-98. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000300005
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. As tabelas foram apresentadas com os dados de 1998, 2007 e 2015, e a diferença relativa calculada entre os anos extremos. Para a tendência, foi utilizado o Stata (versão 13). O estudo foi dispensado de análise pelo comitê de ética em pesquisa, conforme Portaria nº 466 de 2012 do Conselho Nacional de Saúde, por se tratarem de dados secundários e de acesso público.

RESULTADOS

Entre 1998 e 2015, enquanto as taxas de internação por todas as causas no Brasil pelo SUS diminuíram 28,5%, as internações em UTI aumentaram 21,4% ( Tabela 1 ). Quando as taxas de internação em UTI são analisadas por diagnóstico principal, observa-se crescimento maior para afecções originadas no período perinatal (acréscimo de 173,8%), seguidas das internações por traumas, com 91,8% de aumento ( Tabela 2 ). As internações por traumas aumentaram principalmente nas regiões Norte e Nordeste – 296,9% e 167,1%, respectivamente. Já a mortalidade hospitalar diminuiu 25,1%, destacando-se a região Norte, com queda de 33,5% ( Tabela 1 ). Os traumas de cabeça, quadril e coxa foram os mais frequentes, com taxas de 9,7 e 6,9 por 100.000 habitantes, respectivamente. Os maiores aumentos no período estudado foram das queimaduras e corrosões (4.566,7%) e complicações de cuidados médicos e cirúrgicos (466,7%) ( Tabela 2 ).

Tabela 1
Taxas de internação hospitalar por todas as causas e clínicas, por todas as causas em UTI e por trauma em UTI e taxas de mortalidade por trauma em UTI, segundo grandes regiões e ano. Brasil, 1998, 2007 e 2015.
Tabela 2
Taxas de internação por todas as causas em UTI segundo diagnóstico principal de internação e ano. Brasil, 1998, 2007 e 2015.

As taxas de internação por trauma em UTI no Brasil quase dobraram, passando de 17,1/100.000 habitantes em 1998 para 32,8/100.000 habitantes em 2015, um aumento médio de 3,6% ao ano (IC95% 2,8–4,3) ( Figura ). Mesmo apresentando menores taxas de internação, o crescimento foi maior para a região Norte (8,0% ao ano, IC95% 6,4–9,6) e para os estados de Roraima (21,7% ao ano, IC95% 7,4–37,8), Bahia (12,7% ao ano, IC95% 9,3–16,3) e Rondônia (11,9% ao ano, IC95% 0,0–25,3). Apenas para o estado da Paraíba houve declínio de 2,8% ao ano (IC95% 4,2–1,3). Não houve tendência das taxas para a região Centro-Oeste (IC95% -1,3–3,3), devido à oscilação das altas taxas no estado de Goiás. As regiões Sul e Sudeste detêm as mais elevadas taxas de internação no país, com 50,4/100.000 e 36,0/100.000 habitantes, respectivamente, em 2015. Mesmo com aumento médio anual 3,3%, menor do que os observados para as regiões Norte e Nordeste (8% e 5,3% respectivamente), chamam atenção, nas regiões Sul e Sudeste, as taxas elevadas no Paraná, Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais (69,1; 45,6; 42,3 e 39,8, respectivamente) em 2015 ( Tabela 3 , Figura ).

Figura
Taxas de internação por 100.000 habitantes por trauma em UTI. Brasil e regiões, 1998–2015.

Tabela 3
Taxas de internação por trauma em UTI, variação média anual, intervalo de confiança (IC95%) e tendência. Brasil, grandes regiões e estados, 1998 a 2015.

A taxas de internação por traumas em UTI são duas vezes mais elevadas para os homens, mas o aumento foi maior para as mulheres (em média, 5,4% ao ano, IC95% 4,5–6,3) do que para eles (3,8% ao ano, IC95% 3,1–4,5), o que influenciou a diminuição da razão das taxas no período. O crescimento médio anual foi maior para pessoas de 60 anos de idade ou mais (5,5%, IC95% 4,7–6,3) ( Tabela 4 ).

Tabela 4
Taxas de internação por trauma em UTI, segundo sexo, idade, causa externa da lesão, média de permanência e mortalidade hospitalar, variação média anual, intervalo de confiança (IC95%) e tendência. Brasil, 1998–2015.

As quedas, acidentes de transporte e outros traumas acidentais foram as causas externas que mais provocaram internações em UTI no ano de 2015, com taxas de 10,8; 6,8 e 7,0/100.000 habitantes, respectivamente. As taxas de internação de motociclistas e pedestres foram as que mais aumentaram (4,3% e 4%, respectivamente). Todas as causas externas que motivaram internação em UTI apresentaram crescimento no período, como as complicações assistenciais (5,1%), outros traumas acidentais (4,6%) e as quedas (4,5%). Houve aumento na média de permanência em UTI (1,5% ao ano, IC95% 1,0–2,1); entretanto, a mortalidade hospitalar diminuiu em média 1,7% ao ano (IC95% 2,1–1,3) ( Tabela 4 ).

DISCUSSÃO

A análise epidemiológica das hospitalizações financiadas pelo SUS no Brasil mostrou que houve declínio das internações por todas as causas no período, mas houve aumento daquelas em UTI. De 1998 a 2015, o trauma representou a quarta causa de internações em UTI. Com exceção das afecções perinatais, o crescimento relativo das taxas de internação por trauma nessas unidades foi o mais elevado e ocorreu em todas as regiões do país, com médias anuais de crescimento maiores para a Norte e menores para a Centro-Oeste. Outra modificação foi observada em relação ao sexo e à idade, pois o aumento médio das taxas foi maior para mulheres e idosos.

Apesar das características heterogêneas do perfil de morbimortalidade populacional, de variação da estrutura e capacidade das UTI e da organização do atendimento em saúde1010. Prin M, Li G. Complications and in-hospital mortality in trauma patients treated in intensive care units in the United States, 2013. Inj Epidemiol. 2016;3(1):18. https://doi.org/10.1186/s40621-016-0084-5
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, as internações por trauma em UTI no sistema público de saúde brasileiro assemelham-se a dados internacionais1616. Heim C. Bosisio F, Roth A, Bloch J, Borens O, Daniel RT, et al. Is trauma in Switzerland any different? Epidemiology and patterns of injury in major trauma – a 5-year review from a Swiss trauma centre. Swiss Med Wkly, 2014;144:w13958. https://doi.org/10.4414/smw.2014.13958.
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. Estudo suíço sobre hospitalizações intensivas, entre 2008 e 2012, identificou que os traumas representaram 44,3% do total, sendo mais prevalentes os cerebrais (64,4%) e torácicos (59,8%), sendo os acidentes de trânsito (40,4%) e as quedas (34,4%) as principais causas1616. Heim C. Bosisio F, Roth A, Bloch J, Borens O, Daniel RT, et al. Is trauma in Switzerland any different? Epidemiology and patterns of injury in major trauma – a 5-year review from a Swiss trauma centre. Swiss Med Wkly, 2014;144:w13958. https://doi.org/10.4414/smw.2014.13958.
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O aumento observado nas causas externas de internação por trauma em UTI observado é semelhante ao perfil de morbidade hospitalar por essas causas no Brasil entre 2002 e 2011: aumento anual de 2,1% para acidentes de transporte, 2,7% para quedas e 8,3% para demais causas externas88. Mascarenhas MDM, Barros MBA. Evolução das internações hospitalares por causas externas no sistema público de saúde – Brasil, 2002 a 2011. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(1):19-29. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000100003
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. O aumento das internações por quedas destaca-se pelo contínuo aumento de idosos na população brasileira e da incidência do agravo nessa população88. Mascarenhas MDM, Barros MBA. Evolução das internações hospitalares por causas externas no sistema público de saúde – Brasil, 2002 a 2011. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(1):19-29. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000100003
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. Estudo sobre o tema identificou tendência crescente nas taxas de internação e de mortalidade no Brasil de 1996 a 2012. As internações aumentaram de 2,58 para 41,37 a cada 10.000 idosos1717. Abreu DROM, Novaes ES, Oliveira RR, Mathias TAF, Marcon SS. Fall-related admission and mortality in older adults in Brazil: trend analysis. Cienc Saude Coletiva. 2018;23(4):1131-41. https://doi.org/10.1590/1413-81232018234.09962016
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Levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostrou aumento de 50,3% nos acidentes de trânsito em rodovias federais, acréscimo de 34,5% nas mortes e de 50% nos feridos1818. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Acidentes de trânsito nas rodovias federais brasileiras: caracterização, tendências e custos para a sociedade. Brasília, DF: IPEA; 2015 [cited 2018 Jul 20]. Available from: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatoriopesquisa/150922_relatorio_acidentes_transito.pdf
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. Dados similares aos identificados nesse estudo, embora com métodos diferentes, apresentam-se coerentes com a crescente urbanização, aumento no número de veículos e consequente aumento nos acidentes de trânsito no Brasil.

Outras causas externas que aumentaram foram as complicações assistenciais e outras causas acidentais. As primeiras abrangem eventos adversos ocorridos durante a prestação de serviço de saúde, e as segundas, outros eventos acidentais, como os domésticos, de trabalho, de práticas esportivas e lazer, as inalações, os envenenamentos acidentais e as queimaduras. A real dimensão desses problemas pode estar subestimada, pois são poucos os estudos brasileiros que os abordam. Diante da magnitude e crescimento das taxas de internação por trauma no Brasil, informações advindas do SIH-SUS tornam-se fundamentais por sua relevância enquanto causa de morbidade em UTI.

Indivíduos do sexo masculino, adultos jovens e idosos, compuseram os grupos com maiores taxas de internação. A predominância masculina e de adultos jovens para essas internações foi demonstrada no Canadá, em que a razão entre os sexos foi de 1,75 internação masculina para cada uma feminina1919. Garland A, Olafson K, Ramsey CD, Yogendran M, Fransoo R. Epidemiology of critically ill patients in intensive care units: a population-based observational study. Crit Care. 2013;17(5):R212. https://doi.org/10.1186/cc13026
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. Embora no presente estudo o crescimento das taxas entre as mulheres tenha diminuído a razão entre os sexos, isso não representa maior acesso masculino aos serviços de saúde, mas maior exposição às causas externas, com maior propensão dos homens a acidentes de trânsito e de trabalho2020. Mahran DG, Farouk O, Qayed MH, Berraud A. Pattern and trend of injuries among trauma unit attendants in upper Egypt. Traum Mon, 2016;21(2):e20967. https://doi.org/10.5812/traumamon.20967
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, 2121. Oliveira NLB, Souza EM, Cunha GZ. Mortality in traffic accidents: temporary trend between 1996 and 2012. Cien Cuid Saude. 2017;16(4). https://doi.org/10.4025/cienccuidsaude.v16i4.38343
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. O aumento das taxas entre idosos, por sua vez, pode ser explicado pela maior ocorrência de quedas1717. Abreu DROM, Novaes ES, Oliveira RR, Mathias TAF, Marcon SS. Fall-related admission and mortality in older adults in Brazil: trend analysis. Cienc Saude Coletiva. 2018;23(4):1131-41. https://doi.org/10.1590/1413-81232018234.09962016
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. Os fatores que levaram ao aumento das internações por trauma em UTI podem compreender desde a diversidade na estrutura dos serviços de urgência e emergência – fato que pode determinar acesso diverso aos leitos hospitalares em cada região e estado brasileiro – às mudanças sociodemográficas, urbanização e crescimento da frota de veículos nas vias públicas, que, por sua vez, interferem na quantidade e gravidade das causas externas.

A exigência de atendimento pré-hospitalar (APH) rápido e eficaz para estabilizar, diagnosticar e determinar a complexidade de tratamento definitivo2222. Goldwasser RS, Lobo MSC, Arruda EF, Angelo SA, Silva JRP, Salles AA, et al. Difficulties in access and estimates of public beds in intensive care units in the state of Rio de Janeiro. Rev Saude Publica. 2016;50:19. https://doi.org/10.1590/S1518-8787.2016050005997
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torna-se determinante para que a vítima de trauma chegue até a UTI. Nesse contexto, houve expansão dos pontos de atenção do APH na rede de urgência e emergência. As unidades de pronto atendimento (UPA) cresceram de 101 em 2011 para 446 em 2016, proporcionalmente em maior quantidade na região Sudeste e menor na Norte2323. O’Dwyer G, Konder MT, Reciputti LP, Lopes MGM, Agostinho DF, Alves GF. The process of implementation of emergency care units in Brazil. Rev Saude Publica. 2017;51:125. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2017051000072
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. O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) passou de uma cobertura de 35% em 2003 para 75,9% em 2015, sendo maior na região Sul e menor na Norte2424. O’Dwyer G, Konder MT, Reciputti LP, Macedo C, Lopes MGM. O processo de implantação do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência no Brasil: estratégias de ação e dimensões estruturais. Cad Saude Publica. 2017;33(7):e00043716. https://doi.org/10.1590/0102-311X00043716
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. A organização dos serviços de urgência de forma articulada em rede pode tornar o atendimento ao traumatizado menos fragmentado ao utilizar, além das estruturas de APH, unidades de nível secundário para estabilizar vítimas e regular o atendimento, além da qualificação do atendimento de urgência hospitalar, ampliação de leitos de UTI e atenção domiciliar2525. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Especializada. Manual instrutivo da Rede de Atenção às Urgências e Emergências no Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, DF; 2013 [cited 2018 Jul 20]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_instrutivo_rede_atencao_urgencias.pdf
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.

Assim como o aumento do acesso ao APH, a expansão de leitos intensivos no Brasil influencia as internações por trauma em UTI. Em 2012, havia 13 leitos de UTI por 100.000 habitantes2626. Rhodes A, Moreno RP. Intensive care provision: a global problem. Rev Bras Ter Intensiva. 2012;24(4):322-5. https://doi.org/10.1590/S0103-507X2012000400005
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, índice que passou para 21,9/100.000 em 20162727. Associação de Medicina Intensiva Brasileira. Censo AMIB 2016. São Paulo: AMIB; 2016 [cited 2018 Aug 12]. Available from: http://www.amib.com.br/pdf/Analise_de_Dados_v4_1.20.1095_AMIB_Atualizado_by_AM_24Fev17_TemplateAMIB.pdf
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, porém com desigualdades regionais importantes: 27,8/100.000 na região Sudeste e 13,7/100.000 na Norte. Mudanças regionais também são identificadas entre países com variações consideráveis. Nos EUA existem 25 leitos de UTI por 100.000 habitantes, enquanto na Europa são 11,5/100.0002828. Rhodes A, Ferninande P, Flaatten H, Guidet B, Metnitz PG, Moreno RP. The variability of critical care bed numbers in Europe. Intensive Care Med. 2012;38(10):1647-53. https://doi.org/10.1007/s00134-012-2627-8
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.

Considera-se que a diferença das taxas de internação por trauma em UTI entre as regiões demonstra uma mudança na oferta de leitos de UTI no Brasil, o que é sugerido pela tendência crescente nas regiões Norte e Nordeste. A utilização dos leitos muitas vezes é resultado da oferta e, em momentos da alta demanda ou limitação de recursos, traumatizados podem não ser admitidos. Além disso, o aumento de leitos em regiões mais populosas por vezes não é uma resposta a mudanças populacionais, mas sim a pressões financeiras2929. Wallace DJ, Angus DC, Seymour CW, Barnato AE, Kahn JM. Critical care bed growth in the United States: a comparison of regional and national trends. Am J Respir Care Med. 2015;191(4):410-6. https://doi.org/10.1164/rccm.201409-1746OC
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.

No Brasil, os parâmetros de planejamento dos serviços hospitalares seguem evidências científicas, protocolos, análises de estrutura e rendimentos, exemplos consolidados e modelos de simulação3030. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Regulação, Avaliação e Controle. Critérios e parâmetros para o planejamento e programação de ações e serviços de saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde parâmetros SUS. Brasília (DF); 2015 [cited 2018 Jul 21]. (Série Parâmetros SUS, v.1). Available from: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2015/outubro/02/ParametrosSUS.pdf
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, porém não consideram a dinâmica de acesso aos leitos e as especificidades de gestão em cada UTI2222. Goldwasser RS, Lobo MSC, Arruda EF, Angelo SA, Silva JRP, Salles AA, et al. Difficulties in access and estimates of public beds in intensive care units in the state of Rio de Janeiro. Rev Saude Publica. 2016;50:19. https://doi.org/10.1590/S1518-8787.2016050005997
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. Para o dimensionamento adequado de leitos, leva-se em conta o número de internações esperadas, que se reflete em uma proporção ideal de leitos, dividida por faixas etárias, tipo de leito e UTI3030. Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Regulação, Avaliação e Controle. Critérios e parâmetros para o planejamento e programação de ações e serviços de saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde parâmetros SUS. Brasília (DF); 2015 [cited 2018 Jul 21]. (Série Parâmetros SUS, v.1). Available from: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2015/outubro/02/ParametrosSUS.pdf
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. Já para garantir a estabilidade no sistema de regulação de leitos, o tempo de espera e a gestão do fluxo de pacientes devem ser considerados prioridades não só para o acesso ao leito intensivo, mas também para gerenciar sua ocupação com qualidade2222. Goldwasser RS, Lobo MSC, Arruda EF, Angelo SA, Silva JRP, Salles AA, et al. Difficulties in access and estimates of public beds in intensive care units in the state of Rio de Janeiro. Rev Saude Publica. 2016;50:19. https://doi.org/10.1590/S1518-8787.2016050005997
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.

Além da diferença na estrutura dos serviços de APH e de leitos de UTI entre as regiões brasileiras, a diferença na magnitude das taxas de internação por trauma nessas unidades pode ser atribuída à maior urbanização, desenvolvimento econômico e longevidade nas regiões Sul e Sudeste88. Mascarenhas MDM, Barros MBA. Evolução das internações hospitalares por causas externas no sistema público de saúde – Brasil, 2002 a 2011. Epidemiol Serv Saude. 2015;24(1):19-29. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000100003
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. A possibilidade de desigualdade de acesso e qualidade dos serviços de saúde pode ser aventada, dada a incidência do agravo nas populações, a forma de ocupação dos leitos de UTI e a própria definição de leito intensivo em cada região1919. Garland A, Olafson K, Ramsey CD, Yogendran M, Fransoo R. Epidemiology of critically ill patients in intensive care units: a population-based observational study. Crit Care. 2013;17(5):R212. https://doi.org/10.1186/cc13026
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.

Considera-se ainda que as diferenças entre hospitais, perfis de internação e tipo da assistência prestada265podem estar relacionadas com o acesso e o desfecho das doenças graves no Brasil. Nesse sentido, é positivo o decréscimo na mortalidade por traumas em UTI, sobretudo para os que sobrevivem até o contato com o APH e o hospital. A implantação e estruturação do SAMU, especialização dos serviços de urgência e emergência e melhora nos equipamentos e procedimentos são fatores determinantes para a mudança no perfil de internação hospitalar em geral e em UTI. Certamente a qualidade do cuidado hospitalar oferecido também pode impactar na mortalidade, sobretudo na mortalidade tardia, pois as intervenções podem ter efeitos complexos e variáveis no tempo de internação3131. Clark DE, Qian J, Winchell RJ, Betensky RA. Hazard regression models of early mortality in trauma centers. J Am Coll Surg. 2012;215(6):841-9. https://doi.org/10.1016/j.jamcollsurg.2012.08.023
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.

Outros fatores podem influenciar o perfil de morbidade hospitalar em UTI por traumas e determinar impacto nas taxas ao longo dos anos estudados, como aspectos da sociedade no período, aumento da renda e expectativa de vida, melhorias de indicadores sociais e implementação de políticas de prevenção aos fatores comuns a todos os traumas, como sobre o trânsito e mobilidade (Código de Trânsito Brasileiro, Estatuto da Cidade e Lei de Mobilidade Urbana), violência (Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências) e cuidado (Política Nacional de Segurança do Paciente e Estatuto do Idoso). Mesmo com diferenças entre as regiões e estados brasileiros, esses fatores são relevantes para o desenvolvimento social e determinam mudanças no comportamento individual e coletivo.

Entre 1999 e 2013, o Brasil apresentou grande aumento no número de automóveis e motocicletas, o que se tornou um problema do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, qualidade de vida e saúde, sobretudo quando políticas públicas reforçam um padrão de mobilidade e urbanização vinculado ao transporte individual3232. Lima Neto VC, Carvalho CHR, Balbim RN. Mobilidade urbana: o Brasil em transformação. O papel do IPEA na construção do pacto da mobilidade. Brasília, DF: IPEA; 2015 [cited 2018 Jul 20]. (Texto para discussão, 2148). Available from: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/TDs/td_2148.pdf
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. Essa urbanização forte e rápida sem investimentos na infraestrutura e industrialização gera problemas sociais que se expressam em acidentes de trânsito e violências, com consequências coletivas e geracionais.

Este estudo reitera a importância dos bancos de dados do SUS – neste caso, o SIH-SUS – como ferramenta de monitoramento das ocorrências do trauma, determinando interpretação indireta e complementar do sistema de atendimento intra-hospitalar e de fatores que interferem nas taxas, como os sociais e demográficos. Mesmo que alguns determinantes influenciem nas internações por trauma em UTI, são necessárias análises futuras sobre eles com diversas fontes de dados, explorando, por exemplo, a gravidade do trauma de indivíduos atendidos em prontos-socorros ou em hospitais de referência que são encaminhados para a UTI, assim como análises somente das causas externas dessas internações.

Destaca-se a qualidade heterogênea dos dados do SIH-SUS ao longo da série como a principal limitação do estudo, já que erros de preenchimento dos dados demográficos e da codificação das causas externas podem influenciar em sua interpretação. A principal conclusão deste estudo diz respeito ao aumento da morbidade hospitalar por trauma em UTI no Brasil no período de 1998 a 2015, que contrastou com a diminuição das internações hospitalares gerais por todas as causas. A tendência de aumento observada não foi homogênea entre estados e regiões brasileiras. Os resultados evidenciaram aumento de internações por trauma em mulheres, embora o predomínio seja ainda em homens, além de crescimento importante de internações em idosos.

O panorama epidemiológico analisado mostra a trágica situação do aumento dos acidentes de transporte e das quedas e remete à realidade de que as internações por traumas em UTI representam apenas a ponta do iceberg da ocorrência de traumas no Brasil. Se essa tendência não mudar, a demanda por leitos especializados será crescente, com alto impacto para a sociedade, devido às consequências como sequelas ou óbito, e para o setor público, pela necessidade de aumento das instalações e leitos de UTI.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Set 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    5 Set 2018
  • Aceito
    23 Jan 2019
Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo São Paulo - SP - Brazil
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