O reconhecimento e o aparecimento público como determinantes para a saúde: diálogos com mulheres transexuais e trabalhadores(as) da saúde

The recognition and public appearance as determinants of health: dialogues with transsexual women and health workers

Pablo Cardozo Rocon Maria Elizabeth Barros Francis Sodré Alexsandro Rodrigues Sobre os autores

Resumo

O acesso à saúde e os elementos do processo saúde-doença da população trans são analisados neste artigo a partir das categorias de análise Reconhecimento e Aparecimento Público de Judith Butler. Partimos da análise de entrevistas com nove mulheres transexuais e sete trabalhadoras(es) de um mesmo serviço de referência para o Processo Transexualizador do Sistema Único de Saúde (SUS). Argumentamos que processos de discriminação e desrespeito ao nome social nos serviços de saúde são efeitos de políticas que regulam o reconhecimento e diferenciam pessoas e indivíduos como vidas vivíveis, a serem protegidas, e vidas que poderão ser perdidas sem a proteção dos serviços de saúde. Tais políticas permeiam os processos saúde-doença na medida em que modulam modos de existência baseados em normas hegemônicas de viver e existir nos gêneros e sexualidades, que podem produzir sofrimento e adoecimento. Normas alicerçadas numa referência cisheteropatriarcal e racista, que patologizam experiências e vivências não centradas na branquitude, na heteronormatividade e na cisnormatividade.

Palavras-chave:
Aparecimento público; Reconhecimento; Acesso à saúde; Processo saúde-doença; Transexualidade

Abstract

Access to health and the elements of the trans population’s health-disease process are analyzed in this article based on Judith Butler’s Public Appearance and Recognition analysis categories. We started from the analysis of interviews with nine transsexual women and seven workers from the same Brazilian transgender health care from the Unified Health System (SUS). We argue that processes of discrimination and disrespect for the social name in health services are effects of policies that regulate the recognition and differentiate people and individuals as liveable lives, to be protected, and lives that may be lost without the protection of health services. These policies permeate the health-disease processes insofar as they modulate modes of existence based on hegemonic norms of living and existing in genders and sexualities, which can produce suffering and illness. Norms based on the cis heteropatriarchal and racist reference, which pathologize experiences not centered on whiteness as a norm, on heteronormativity, and on cisnormativity.

Keywords:
Public appearance; Recognition; Access to health; Health-disease process; Transsexuality

Introdução

Nos últimos anos, uma diversidade de estudos e pesquisas tem problematizado o desrespeito ao nome social, a discriminação nos serviços de saúde e a patologização das transexualidades e travestilidades (Almeida; Murta, 2013ALMEIDA, G.; MURTA, D. Reflexões sobre a possibilidade da despatologização da transexualidade e a necessidade da assistência integral à saúde de transexuais no Brasil. Sexualidad, Salud y Sociedad, Rio de Janeiro, n. 14, p. 380-407, 2013. DOI: 10.1590/S1984-64872013000200017
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; Butler, 2009BUTLER, J. Desdiagnosticando o gênero. Physis, Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, p. 95-126, 2009. DOI: 10.1590/S0103-73312009000100006
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; Ferreira, 2017FERREIRA, B. O. et al. Vivências de travestis no acesso ao SUS. Physis, Rio de Janeiro, v. 27, n. 4, p. 1023-1038, 2017. DOI: 10.1590/S0103-73312017000400009
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; Lionço, 2009LIONÇO, T. Atenção integral à saúde e diversidade sexual no processo transexualizador do SUS: avanços, impasses, desafios. Physis, Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, p. 43-63, 2009. DOI: 10.1590/S0103-73312009000100004
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; Rocon et al, 2016ROCON, P. C. et al. Difficulties experienced by trans people in accessing the unified health system. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 21, n. 8, p. 2517-2526, 2016. DOI: 10.1590/1413-81232015218.14362015
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; Rocon et al, 2019ROCON, P. C. et al. Desafios enfrentados por pessoas trans para acessar o processo transexualizador do sistema único de saúde. Interface, Botucatu, v. 23, p. e180633, 2019. DOI: 10.1590/Interface.180633
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). Esses fatores são determinantes para o não acesso da população trans (transexual e travesti) aos serviços de saúde, contribuindo para processos de adoecimento e sofrimentos entre eles(as) (Rocon et al, 2020aROCON, P. C. et al. Acesso à saúde pela população trans no Brasil: nas entrelinhas da revisão integrativa. Trabalho, educação e saúde, Rio de Janeiro, v. 18, n. 1, p. e0023469, 2020a. DOI: 10.1590/1981-7746-sol00234
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).

Neste artigo, retomamos tais problematizações a partir das discussões de Judith Butler (2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016., 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.) sobre precariedade, reconhecimento e aparecimento público. Entendemos que questões como nome social, transfobia e travestifobia institucionalizadas nas práticas em saúde e a medicalização generalizada das vidas trans via patologização são efeitos de políticas de reconhecimento organizadas por normas sociais que avaliam quais vidas são vivíveis, em detrimento daquelas que jamais serão reconhecidas como vidas.

Analisamos que a busca pelo reconhecimento e aparecimento público (como vidas dignas de proteção) é atravessada por normas que limitam a organização da vida, pressupondo os gêneros como reflexo de estruturas corporais (binarismo dos gêneros) e sexualidades padronizadas e referenciadas a partir da heterossexualidade (heteronormatividade). Assim, problematizamos as possibilidades do aparecimento público como componente do acesso aos serviços de saúde e dos processos saúde-doença.

Metodologia

Este artigo objetiva problematizar como, das relações entre trabalhadores(as) da saúde e pessoas trans (travestis, mulheres e homens transexuais), emergem questões como discriminação, desrespeito à autodeterminação nos gêneros e a patologização das identidades trans. Consideramos estes enquanto efeitos de políticas de reconhecimento, que condicionam o aparecimento público, tomando por referencial teórico o pensamento de Judith Butler.

As problematizações aqui propostas tomam por análise 16 entrevistas realizadas em duas pesquisas empíricas conduzidas por meio de abordagens qualitativas (nove entrevistas com mulheres transexuais e sete com trabalhadores(as) da saúde). Ambas aconteceram no mesmo serviço de saúde, a primeira em 2017 (janeiro a junho) e a segunda em 2019 (setembro a outubro). Isso possibilita analisar as questões como discriminação e patologização das identidades trans na perspectiva de usuárias e trabalhadores(as) em seus encontros no cotidiano do serviço de saúde.

Retomamos neste artigo as entrevistas realizadas e as analisamos com um novo objetivo, num esforço de crítica, de pensar novamente as duas pesquisas num exercício de experimentação, que consiste em “não interpretar, mas experimentar, e a experimentação é sempre o atual, o nascente, o novo, o que está em vias de se fazer” (Deleuze, 2013DELEUZE, G. Conversações. Rio de Janeiro: Editora 34, 2013., p. 136). O exercício de pensar novamente é centrado em compreender os múltiplos efeitos das normas de gênero e sexualidade sobre as vidas das pessoas trans e dos(as) trabalhadores(as) dos serviços transexualizadores. Em tal proposta analítica, diferente de análises anteriores, caminha-se para rotura com discursos de responsabilização individualizada dos(as) trabalhadores(as) pelos processos de marginalização vividos pela população trans nos serviços de saúde.

Nessa direção, este texto traz como novidade pensar o aparecimento público como necessidade de saúde, pelo qual é possível compreender os efeitos das normas de gênero e sexualidade na vida e nos processos de subjetivação dos(as) trabalhadores(as), produzindo modos de viver, trabalhar e cuidar que reverberam em cotidianos de saúde hostis a aqueles(as) não enquadrados na branquitude, heteronormatividade e cisgeneridade.

A primeira pesquisa foi realizada por abordagem qualitativa com entrevistas narrativas gravadas em áudio digital com mulheres transexuais que realizaram cirurgia de redesignação sexual entre 1998 e 2016 (ano em que a pesquisa foi iniciada após submissão ao CEP - Comitê de Ética em Pesquisa - e aprovação). A participação na pesquisa foi definida pela metodologia bola de neve que, segundo Vinuto (2014VINUTO, J. A. Amostragem em bola de neve na pesquisa qualitativa: um debate em aberto. Temáticas, Campinas, v. 22, n. 44, p. 201-218, 2014. DOI: 10.20396/tematicas.v22i44.10977
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), consiste num “tipo de amostragem […] não probabilística, que utiliza cadeias de referência” (p. 203). A participante 1 se configurou como nossa semente, de modo que as demais participações foram a partir das indicações nas entrevistas realizadas.

As nove entrevistas alcançaram saturação teórica, tendo em vista a homogeneidade do grupo de participantes (ex-pacientes de um mesmo serviço de saúde muito específico: o processo transexualizador), os recortes definidos (mulheres que realizaram cirurgia de redesignação sexual num mesmo Hospital Universitário) e o objetivo no momento da realização da pesquisa (analisar desafios para acessar o processo transexualizador bem como serviços para cuidado em saúde no pós-operatório das cirurgias de redesignação sexual). Segundo Fontanella, Ricas e Turato (2008FONTANELLA, B. J. B.; RICAS, J.; TURATO, E.R. Amostragem por saturação em pesquisas qualitativas em saúde: contribuições teóricas. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 24, n. 1, p. 17-27, 2008. DOI: 10.1590/S0102-311X2008000100003
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), a homogeneidade é um dos critérios para aferir o ponto de saturação teórica, e, assim, nortear a finalização da pesquisa. As nove entrevistas realizadas alcançaram a saturação. A saturação teórica ocorre quando as respostas em torno das questões investigadas começam a se repetir, não oferecendo elementos substancialmente novos que justifiquem novas entrevistas.

A segunda pesquisa teve como metodologia a abordagem qualitativa sob inspiração cartográfica. Foram entrevistadas(os) trabalhadores(as) de um ambulatório habilitado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para o processo transexualizador num Hospital Universitário. Teve como objetivo analisar os processos formativos pela experiência no cotidiano do trabalho na clínica transexualizadora a partir de aprovação no CEP. Utilizamos como critério de inclusão a atuação por, no mínimo, um ano no referido serviço.

Nesses termos, todos(as) que se enquadraram no critério (e que consentiram com a participação na pesquisa) foram entrevistados(as), constituindo um grupo de sete trabalhadores(as) participantes. Foram realizadas entrevistas de inspiração cartográfica, gravadas em áudio digital. Segundo Deleuze e Parnet (1998DELEUZE, G.; PARNET, C. Diálogos. São Paulo: Escuta, 1998.) “Qualquer que seja o tom, o procedimento de questões respostas é feito para alimentar dualismos” (p. 29). Autores e autoras trazem problematizações éticas e políticas para a produção de uma pesquisa com entrevistas, pontuando que procedimentos como perguntas pré-definidas e respostas esperadas podem alimentar dualismos.

Numa pesquisa qualitativa que toma por abordagem a perspectiva da cartografia, experimenta-se uma inversão etimológica da palavra metodologia, de modo que o caminho (hódos) é o acompanhamento de processos pelos quais nos encontramos com a meta (metá). De acordo com Passos, Kastrup e Escócia (2009PASSOS, E.; KASTRUP, V.; ESCÓSSIA, L. Apresentação. In: PASSOS, E.; KASTRUP, V.; ESCÓSSIA, L. (Org.). Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulinas, 2009. p. 7-16.), “essa reversão consiste numa aposta na experimentação do pensamento - um método não para ser aplicado, mas para ser experimentado e assumido como atitude” (p. 10-11). Assim, numa entrevista cartográfica, busca-se

Acompanhar a experiência do dizer, considerando e alimentando a circularidade intensiva entre os planos do conteúdo e da expressão, eis o desafio colocado ao manejo cartográfico da entrevista, eis o que buscamos na pesquisa dos processos que faz uso de entrevistas, sejam elas grupais ou individuais. Pensamos na entrevista como experiência compartilhada do dizer que, como vimos, em sua performatividade cria mundo, sempre. (Tedesco, Sade; Caliman, 2013TEDESCO, S. H.; SADE, C.; CALIMAN, L. V. A entrevista na pesquisa cartográfica: a experiência do dizer. Fractal, Niterói, v. 25, n. 2, p. 299-322, 2013. DOI: 10.1590/S1984-02922013000200006
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, p. 316)

As entrevistas abordaram diagnóstico para a transexualidade; discriminação; dificuldades no processo de trabalho; gestão do serviço nos processos transexualizadores; relações entre trabalhadoras(es) e pessoas trans; modos de trabalhar; e os efeitos que o cotidiano de tal ambulatório produzia na vida de trabalhadoras(es) com os gêneros e as sexualidades. Segundo Tedesco, Sade e Caliman (2013TEDESCO, S. H.; SADE, C.; CALIMAN, L. V. A entrevista na pesquisa cartográfica: a experiência do dizer. Fractal, Niterói, v. 25, n. 2, p. 299-322, 2013. DOI: 10.1590/S1984-02922013000200006
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), “1. a entrevista visa não a fala ‘sobre’ a experiência e sim a experiência ‘na’ fala; 2. a entrevista intervém na abertura à experiência do processo do dizer; 3. a entrevista busca a pluralidade de vozes” (p. 304).

Análise

Foram analisados trechos de entrevistas que apresentavam narrativas sobre processos de discriminação e patologização das identidades trans; acesso aos serviços; compreensões sobre o processo saúde-doença; transformações dos corpos; entre outros. Trechos foram selecionados tanto da fala de participantes trans quanto de trabalhadores(as) nas duas pesquisas realizadas.

Estabelecemos como critério de seleção dos trechos a perturbação, entendendo que “o meio comparece perturbando, e não transmitindo informações. Perturbar significa afetar, colocar problema” (Kastrup, 1999KASTRUP, V. A invenção de si e do mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Campinas: Papirus, 1999., p. 115). Para análise, operamos com as categorias reconhecimento, precariedade e aparecimento público de Judith Butler, as tomando como caixa de ferramentas.

As entrevistas foram realizadas após aprovação dos CEP. Todos(as) os(as) participantes concederam as entrevistas mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre-Esclarecido. Como forma de garantia ao anonimato, a caracterização das participações não é a presentada, bem como nomes são omitidos. As falas de trabalhadores(as) são apresentadas como Participante T1, Participante T2, e as falas das usuárias como Participante U1, Participante U2, e assim consecutivamente. Informações como identidade de gênero e orientação sexual foram autodeclaradas.

Resultados e discussão

O Ministério da Saúde brasileiro, articulado com pesquisadores e movimentos sociais, para avançar na materialização de um SUS integral, universal e com justiça social para a população de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT), lançou a Carta dos direitos dos Usuários e Usuárias do SUS em 2009. A Carta instituiu o uso do nome social e o atendimento livre de discriminação (Brasil, 2009BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 675, de 30 de março de 2006. Aprova carta dos direitos dos usuários da saúde, que consolida os direitos e deveres do exercício da cidadania na saúde em todo o país. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 31 mar. 2009.) como direitos no acesso aos serviços de saúde. A Política Nacional de Saúde Integral LGBT foi criada em 2011, corroborando com o documento de 2009 e lançando diretrizes para a organização dos serviços e formação de trabalhadores e trabalhadoras da saúde em consonância com as necessidades dessa população (Brasil, 2013BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio à Gestão Participativa. Política nacional de saúde integral de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Brasília, DF, 2013.).

Entretanto, apesar de os documentos supracitados apontarem como direitos do(a) usuário(a) do SUS o acesso livre de discriminação e com o uso do nome social, encontramos uma realidade diferente nos relatos das participantes:

Eu já ouvi de um colega, assim como eu já ouvi em grupos de WhatsApp, […]: - Ah! Agora a gente tem que ficar usando nome social, eu sou obrigado a saber nome social? […]. Eu ainda tenho que saber o nome social? (Participante T1, 2019, n.p.)

Já passei constrangimento […] Devido a eu estar num lugar […] alguém chamar pelo nome, e você levanta a pessoa: -Ah! Que não sei o que. Aí rola essas gracinhas. Eu sofri muito no passado, por ter essa cara de menina que eu sempre tive. (Participante U8, 2017)

Ah! Eu chegava chorar quando eu não conseguia atendimento, quando eles… […] Às vezes elas, assim no modo de atender, de chamar pelo nome, de não querer chamar pelo nome que a gente gosta. Às vezes não chamavam, esqueciam. (Participante U4, 2017, n.p.)

Muito despreparada [equipe/profissionais de saúde]. Não. Porque eu já me explico antes. Eu chego: - Olha este é meu nome de batismo. E o que acontece. Você vê. […]. Mas, às vezes que, até mesmo se explicando, acontece. Tem gente PQP mesmo, que gosta de [discriminar]. (Participante U5, 2017, n.p.)

Rolava muito constrangimento, porque eu sempre fui muito feminina e quando mostrava a identidade as pessoas ficavam em choque. Elas ficavam assim questionando se realmente era aquilo, sabe? De forma insistente. Então, assim, rolava muito constrangimento por causa disso. (Participante U6, 2017, n.p.)

Os relatos apresentam a permanência da realidade de discriminação vivenciada pela população trans nos serviços de saúde. Como vemos no relato da Participante T1, parece haver uma espécie de dificuldade por parte dos(as) trabalhadores(as) em acolher tais normativas e materializar no cotidiano de saúde o direito ao reconhecimento, o que se reflete na realidade apresentada pelas usuárias.

Essa realidade de discriminação e preconceito nos serviços de saúde também foi evidenciada por uma diversidade de estudos (Almeida; Murta, 2013ALMEIDA, G.; MURTA, D. Reflexões sobre a possibilidade da despatologização da transexualidade e a necessidade da assistência integral à saúde de transexuais no Brasil. Sexualidad, Salud y Sociedad, Rio de Janeiro, n. 14, p. 380-407, 2013. DOI: 10.1590/S1984-64872013000200017
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; Ferreira, 2017FERREIRA, B. O. et al. Vivências de travestis no acesso ao SUS. Physis, Rio de Janeiro, v. 27, n. 4, p. 1023-1038, 2017. DOI: 10.1590/S0103-73312017000400009
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; Mello et al, 2011MELLO, L. et al. Políticas de saúde para lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais no Brasil: em busca de universalidade, integralidade e equidade. Sexualidad, Salud y Sociedad , Rio de Janeiro, n. 9, p. 7-28, 2011. DOI: 10.1590/S1984-64872011000400002
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; Rocon et al, 2019ROCON, P. C. et al. Desafios enfrentados por pessoas trans para acessar o processo transexualizador do sistema único de saúde. Interface, Botucatu, v. 23, p. e180633, 2019. DOI: 10.1590/Interface.180633
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; Romano, 2008ROMANO, V. F. As travestis no programa saúde da família da Lapa. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 17, n. 2, p. 211-219, 2008. DOI: 10.1590/S0104-12902008000200019
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; Souza et al, 2014SOUZA, M. H. T. et al. Itinerários terapêuticos de travestis da região central do Rio Grande do Sul, Brasil. Ciência & saúde coletiva , Rio de Janeiro, v. 19, n. 7, p. 2277-2286, 2014. DOI: 10.1590/1413-81232014197.10852013
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; Souza et al, 2015SOUZA, M. H. T. et al. Violência e sofrimento social no itinerário de travestis de Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 31, n. 4, p. 767-776, 2015. DOI: https://doi.org/10.1590/0102-311X00077514
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). Isso nos permite aferir que essa é uma realidade presente nos serviços de saúde de diferentes estados e regiões do país, favorecendo processos de exclusão e marginalização da população trans dos serviços e equipamentos de saúde (Rocon et al, 2020aROCON, P. C. et al. Acesso à saúde pela população trans no Brasil: nas entrelinhas da revisão integrativa. Trabalho, educação e saúde, Rio de Janeiro, v. 18, n. 1, p. e0023469, 2020a. DOI: 10.1590/1981-7746-sol00234
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).

Contudo, cabe problematizar: por que, mesmo após mais de uma década de normativas que orientam o processo de trabalho no SUS para o respeito às diferenças, ao nome social e o combate à discriminação, a população trans continua vivenciando essa realidade?

Apostamos que tais normas esbarram em condições de aparecimento público nos gêneros e na sexualidade, por isso não são capazes da produção de uma disposição afetiva e do acolhimento às demandas da população trans (nome social e atendimento livre de discriminação) como necessidades em saúde para além das demandas clínicas e biomédicas (cirurgias, hormonioterapia, acompanhamento psicológico e social, entre outros). O que torna necessário olhar para as possibilidades do aparecimento público como uma questão de saúde em duas dimensões: o acesso aos serviços de saúde de maneira ampla e não restrita aos ambulatórios do processo transexualizador e como componente no processo saúde-doença dos indivíduos e coletivos.

Aparecimento público como questão de acesso

Butler (2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016., 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.) discorre sobre um conjunto de normas que produzem uma cisão entre vidas compreendidas como vivíveis e vidas que, segundo a autora, jamais serão vividas, uma vez que nunca foram reconhecidas como tal. Partimos de sua hipótese, segundo a qual todas as vidas estão ligadas por uma condição de precariedade generalizada (Butler, 2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016., 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.), de modo que qualquer vida necessitará de proteção, abrigo, alimento, vestimentas, apoio social e outros elementos que produzem uma profunda dependência coletiva para ser e estar vivo e ser uma vida.

Butler (2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016.) diferencia estar vivo e ser uma vida, entendendo a segunda como uma condição em que nem todos os primeiros serão enquadrados. Segundo a autora,

Vidas são apoiadas e mantidas diferentemente, e existem formas radicalmente diferentes nas quais a vulnerabilidade física humana é distribuída ao redor do mundo. Certas vidas serão altamente protegidas, e a anulação de suas reivindicações à inviolabilidade será suficiente para mobilizar as forças de guerra. Outras vidas não encontrarão um suporte tão rápido e feroz e nem sequer se qualificarão como “passíveis de serem enlutadas”. (Butler, 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019., p. 52)

Para ser uma vida, é preciso que se seja reconhecida como tal sob regimes normativos em que certos enquadramentos epistêmicos não universalizam tal reconhecimento (Butler, 2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016.). Assim, as mesmas normas que diferenciam a condição relatada também serão responsáveis por balizar uma distribuição desigual dos recursos para minimizar a condição de precariedade, de forma que algumas pessoas terão tal condição acentuada, levada ao limite da morte, que poderá não ser enlutada (Butler, 2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016., 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.).

A busca pelo reconhecimento é elemento inerente a todas as vidas, de forma que “[…] não somos identidades separadas na luta pelo reconhecimento […]” (Butler, 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019., p. 65). Ser reconhecido pelo “Outro” é algo sem o qual não podemos existir. O reconhecimento é algo de que todos(as) necessitam e pelo qual são compelidos(as) a lutar. Ser reconhecido(a) é experimentar a mobilização de uma série de esforços coletivos, políticos e institucionais para minimização da precariedade, proteção da violência (Butler, 2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016., 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.) e, neste texto, a garantia do acesso aos serviços de saúde.

Questões como nome social, discriminação e patologização das identidades trans podem, num primeiro momento, parecer menores para trabalhadores e gestores dos serviços da saúde diante das demandas por tecnologias duras (Merhy, 2005MERHY, E. E. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. 2. ed. São Paulo: Hucitec , 2005.) como hormônios, cirurgias, exames, acompanhamentos clínicos, entre outros (como vimos no relato da Participante T1). Contudo, os relatos anteriores das usuárias e a literatura (Rocon et al, 2020aROCON, P. C. et al. Acesso à saúde pela população trans no Brasil: nas entrelinhas da revisão integrativa. Trabalho, educação e saúde, Rio de Janeiro, v. 18, n. 1, p. e0023469, 2020a. DOI: 10.1590/1981-7746-sol00234
https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol002...
) apresentam tais questões como diretamente ligadas à garantia de acesso e permanência nos serviços de saúde, bem como para a produção de saúde.

Assim, pode-se inferir como o direito ao aparecimento público se faz presente nesse processo, uma vez que ser chamado(a)(e) por um nome com que se reconheça, ter respeitadas suas diferenças culturais, físicas, de cor, gênero, sexualidade e etnia, sem serem patologizadas, é determinante no acesso e permanência de diversas populações nos serviços de saúde. Sobre o nome social, Rocon et al (2018ROCON, P. C. et al. O que esperam pessoas trans do sistema único de saúde? Interface, Botucatu, v. 22, n. 64, p. 43-53, 2018. DOI: 10.1590/1807-57622016.0712
https://doi.org/10.1590/1807-57622016.07...
) analisam que

O trânsito nos gêneros realizado pela população trans também acontece no campo da linguagem, tornando a modificação do nome próprio e do gênero nos pronomes de tratamento em elementos constantemente associados às transformações físicas do corpo. (p. 49)

O reconhecimento do nome se configura no reconhecimento do corpo e da vida, que se apresentam e se nomeiam como tal. Sobre esse aspecto, Butler (2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.) aponta o aparecimento público como uma questão de reconhecimento numa forma corpórea, interpelada por normas que ditam uma necessidade de afinidade entre estruturas corporais e perspectivas de gênero de maneira binária. Nessa direção, os relatos das participantes da pesquisa nos mostram como se interseccionam as dificuldades que enfrentam no acesso aos serviços de saúde decorrentes da discriminação, com uma negativa ao seu aparecimento/reconhecimento nas formas corpóreas e vivências nos gêneros que experimentam, muitas vezes em dissidência com as normas binárias.

A respeito da patologização das identidades trans, Lionço (2009LIONÇO, T. Atenção integral à saúde e diversidade sexual no processo transexualizador do SUS: avanços, impasses, desafios. Physis, Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, p. 43-63, 2009. DOI: 10.1590/S0103-73312009000100004
https://doi.org/10.1590/S0103-7331200900...
) e Rocon et al (2016ROCON, P. C. et al. Difficulties experienced by trans people in accessing the unified health system. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 21, n. 8, p. 2517-2526, 2016. DOI: 10.1590/1413-81232015218.14362015
https://doi.org/10.1590/1413-81232015218...
) relatam que favorece os processos de adoecimento e sofrimento dentro da população trans. Receber um diagnóstico que patologize suas vivências e experiências com os gêneros, as sexualidades e modos de vida que produzem é, segundo Butler (2009BUTLER, J. Desdiagnosticando o gênero. Physis, Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, p. 95-126, 2009. DOI: 10.1590/S0103-73312009000100006
https://doi.org/10.1590/S0103-7331200900...
), “[…] ser, de certa maneira, considerado doente, errado, disfuncional, anormal e sofrer uma certa estigmatização em consequência desse diagnóstico” (p. 96).

Butler (2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.) formula que

Caminhar é dizer que esse é um espaço público onde pessoas transgêneras caminham, que esse é um espaço público onde pessoas com várias formas de se vestir, não importa o gênero que lhes seja atribuído ou a religião que eles professem, estão livres para se mover sem ameaça de violência. (p. 59)

A autora analisa que as reivindicações da população trans se ligam diretamente com a busca por um direito de aparecer em público livre de violência (caminhar, percorrer diversos espaços públicos, como o dos equipamentos e serviços de saúde).

Quando se reivindicam o respeito ao nome social, o combate à discriminação e o respeito à diferença nos atendimentos (da recepção aos consultórios, clínicas, setores e repartições dos equipamentos e serviços de saúde), reivindica-se um direito ao aparecimento público no território existencial da saúde pública, sem o qual demandas por prevenção, promoção e reabilitação em saúde não poderão ser respondidas. Desse modo, as necessidades em saúde só se configurarão como tal se os corpos e vidas que as suportam forem reconhecidos (aparecerem pelo reconhecimento) em suas demandas para gestores e trabalhadores de tais serviços.

Nesse sentido, argumentamos que sem aparecimento público e o reconhecimento como uma vida digna de proteção e de cuidado, não há justiça social, integralidade ou universalidade, na medida em que não há o reconhecimento de demandas, ainda não previstas, a serem incorporadas pelas tabelas de procedimentos e serviços dos sistemas de saúde. O direito ao aparecimento é condição sine qua non para produção de equidade que possibilite incorporar novas populações, com suas necessidades específicas e suas diferenças na cobertura universal das políticas de saúde.

Talvez o relato da Participante T1 seja parte dos reflexos das pressões constantes que os serviços de saúde sofrem para incorporação e valorização de saberes relacionados ao trabalho por meio de altas tecnologias, e/ou de uma formação de trabalhadores e trabalhadoras da saúde que hegemonicamente os capacitam para aplicar protocolos, técnicas e procedimentos padronizados segundo manuais de conduta e diagnóstico (Kastrup, 2013KASTRUP, V. Um mergulho na experiência: uma política para a formação dos profissionais de saúde. In: Capazzolo, A. A.; Casetto, S. J.; Henz, A. O. (Org.). Clínica comum: itinerários de uma formação em saúde. São Paulo: Hucitec, 2013. p. 151-162.). Processos que secundarizam ou inviabilizam tecnologias de cuidado formuladas nos últimos anos, como a Política Nacional de Humanização - Humaniza SUS (PNH), que apresentam o acolhimento, o direito à diferença e a lateralização das relações entre usuários(as) e trabalhadores(as) como determinantes para garantia do direito à saúde a todas as populações, política cuja direção ética é a produção do comum (Pasche; Passos, 2010PASCHE, D. F.; PASSOS, E. Inclusão como método de apoio para a produção de mudanças na saúde - aposta da política de humanização da saúde. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 86, p. 423-432, 2010.).

Entendimentos que pormenorizam a importância do uso do nome social, do atendimento livre de discriminação e de uma problematização da dependência dos diagnósticos para o cuidado com a população trans também podem ser produzidos pelo fato de, em geral, trabalhadores e trabalhadoras dos serviços de saúde serem pessoas cisgênero (que supostamente não apresentam divergência com o gênero atribuído ao nascimento), não vivenciando as violações de direitos a que estão expostas as populações trans. Uma trabalhadora relatou:

Eu sou uma mulher, cis, hétero, casada, com filho pequeno. Eu estou totalmente dentro de um padrão socialmente aceito, assim, e eu não sei como me relacionar com outro grupo de pessoas excluídas pela orientação, pela identidade, pela questão racial. (Participante T5, 2019, n.p.)

A trabalhadora discorre sobre dificuldades, em meio a esforços para atender a população trans, por não experienciar determinados processos de exclusão e marginalização social. Talvez por isso Rocon et al (2018ROCON, P. C. et al. O que esperam pessoas trans do sistema único de saúde? Interface, Botucatu, v. 22, n. 64, p. 43-53, 2018. DOI: 10.1590/1807-57622016.0712
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) evidenciaram a presença de trabalhadores e trabalhadoras trans como demanda pela população trans em seus atendimentos nos serviços de saúde, a partir de relatos como “trazer pessoas que tenham a vivência. Que vive isso na pele […] [que não] tem vergonha de chegar até uma travesti” (Rocon et al, 2018ROCON, P. C. et al. O que esperam pessoas trans do sistema único de saúde? Interface, Botucatu, v. 22, n. 64, p. 43-53, 2018. DOI: 10.1590/1807-57622016.0712
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, p. 50). Todavia, encontramos no relato de outra trabalhadora o reconhecimento de si numa posição de precariedade sob violações de direitos em sua condição de mulher, com características construídas socialmente como masculinidades e como negra. Isso parece estabelecer uma ponte que lateraliza sua relação com a população de usuárias trans. Essa trabalhadora relatou:

E aí a gente já parte para outro caminho também, começa a atuar de uma forma diferente, tentando trazer um pouco mais da humanidade para esse trabalho […] E [se dá conta de] que todos nós somos construídos, não são só as pessoas trans, todos nós estamos implicados nessa questão de gênero. Eu, por exemplo, tenho uma característica, que eu sou mulher, mas eu tenho uma característica mais masculina, segundo as pessoas, né? Que falam que o masculino é o que vai lá à frente, que desbrava né? Então, tá. Então eu também sou uma mulher construída de uma forma diferente, mas o quanto eu tive que reprimir isso, até diante do meu parceiro para que a gente consiga viver melhor. E agora, trabalhando com isso eu descubro, hello? Não é isso! [gargalhadas]. […] (Participante T4, 2019, n.p.)

Apesar de não se perceber como pessoa trans, a trabalhadora relata que as violações que experimentou em suas vivências estabelecem uma relação de implicação com as usuárias e os usuários. Tal relato pode remeter a uma aliança a partir da precariedade, como analisa Butler (2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.), afirmando que

A precariedade é a rubrica que une as mulheres, os queer, as pessoas transgêneras, os pobres, aqueles com habilidades diferenciadas, os apátridas, mas também as minorias raciais e religiosas: é uma condição social e econômica, mas não uma identidade (na verdade, ela atravessa essas categorias e produz alianças potenciais entre aqueles que não reconhecem que pertencem uns aos outros). (Butler, 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., p. 65)

Nessa direção, produção de alianças serão determinantes para afirmar-se e performar o aparecimento público nos serviços de saúde. Rocon (2021ROCON, P.C. Clínica (trans)sexualiza(dor)a: processos formativos de trabalhadores da saúde. Salvador: Devires, 2021.) evidencia que a percepção de si numa condição de precariedade pode possibilitar a emergência de uma ética como aliança nos cotidianos do trabalho em saúde.

Como vemos no relato da Participante T4, somente forjando um comum na esfera das relações de produção de saúde, mediada pela sua lateralização e transversalização, será possível fazer inclusão e reposicionar os sistemas de saúde, colocando-os numa rota de afirmação do direito à diferença, inseparável da “criação de novas práticas de saúde, de novos modos de gestão, tarefas inseparáveis da produção de novos sujeitos protagonistas e corresponsáveis” (Pasche; Passos, 2010PASCHE, D. F.; PASSOS, E. Inclusão como método de apoio para a produção de mudanças na saúde - aposta da política de humanização da saúde. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 86, p. 423-432, 2010., p. 428).

Utilizar tecnologias de cuidado, como a apresentada por Pasche e Passos (2010PASCHE, D. F.; PASSOS, E. Inclusão como método de apoio para a produção de mudanças na saúde - aposta da política de humanização da saúde. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 86, p. 423-432, 2010.), possibilita forjar alianças importantes para a produção de práticas e serviços de saúde livres de discriminação e que afirmem a diferença. Ainda assim, isso não descarta o que foi apontado pelas participantes de Rocon et al (2018ROCON, P. C. et al. O que esperam pessoas trans do sistema único de saúde? Interface, Botucatu, v. 22, n. 64, p. 43-53, 2018. DOI: 10.1590/1807-57622016.0712
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) em relação à presença de trabalhadores e trabalhadoras trans nos serviços de saúde como algo fundamental. O direito ao aparecimento nos serviços de saúde pressupõe que a população trans ocupe os diversos espaços da saúde, de usuária a trabalhadora, gestora e pesquisadora, envolvida nas análises, formulações de políticas, no planejamento, gestão e processo de trabalho de tais serviços.

O aparecimento público como componente do processo saúde-doença

Com Judith Butler (2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016., 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.), problematizamos que o reconhecimento como vida vivível como humano é o que organiza esforços para sua proteção e para que sua possível perda seja objeto de comoção e luto. Todas as pessoas estão expostas às condições de vulnerabilidade física. Todas as vidas se constituem precárias na medida em que qualquer corpo necessita de alimento, abrigo, remédios, proteção, segurança etc. “Cada um de nós pode ser sujeito a privação, dano, doença, debilitação ou morte em decorrência de eventos ou processos fora do nosso controle” (Butler, 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., p. 27).

O esforço para ser reconhecido(a) supõe a mobilização de estruturas físicas corporais, produção de discursos, afirmação de verdades em consonância com determinadas normas. Butler (2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.) aponta um alto custo para aqueles que se conformam bem demais com as normas, pois “[…] também as maiorias de gênero que ‘passavam’ como normativas a custos psíquicos e somáticos muito altos” (p. 40) vivenciam condições insuportáveis de existência. A respeito disso, uma trabalhadora relatou:

Então a gente precisa estar o tempo todo [se observando]. E trabalhar com a diversidade, ela te faz isso, ela te faz pensar no mundo, e vê que você pode fazer diferente. Então, quando você vê esses corpos que são sofridos, não são eles, a gente também está nesse processo de sofrimento em sociedade. Eu como mulher, negra, aliás, eu falo sempre o contrário eu como negra e mulher, né? O quanto que eu tive que moldar o meu corpo, meu pensamento, para poder viver melhor em sociedade. Quando na realidade, a sociedade é que tinha que tentar ser o contrário nessa história, né? Mas, enfim, eu acho que é um pouquinho disso daí. (Participante T4, 2019, n.p.)

O relato da Participante T4 é atravessado pelos custos de que nos fala Butler (2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.). Podemos percebê-los na medida em que ela fala sobre a necessidade de moldar seu corpo, reprimir determinados comportamentos na relação com o marido e como sua vivência como negra a inseriu em processos de sofrimento. Assim, o relato nos ajuda a pensar, como analisou Butler (2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.), que algumas pessoas possivelmente pagam com deteriorações em sua saúde para se conformar às normas que balizam as condições de reconhecimento.

Butler (2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.) fala em custos psíquicos para se conformar bem às normas, contudo, quando se analisam as vivências trans em seus processos de transformações corporais, tais custos atravessam as estruturas em dimensões físicas. Ao falar dos sentidos das transformações corporais em um ambulatório do processo transexualizador do SUS, algumas mulheres transexuais relataram:

Eu me sinto mais mulher depois da cirurgia [de redesignação sexual]. Eu me sinto mais confiante, eu me sinto mais livre, eu me sinto mais confortável. Antes eu não ficava pelada na frente de ninguém, hoje eu já fico. (Participante U6, 2017, n.p.)

Só que eu até fiquei com outras pessoas, e passei direto. Entende? Fiquei num vi diferença nenhuma, e eles também não perceberam. Só que tem homens que são espertos. É isso que eu queria saber, porque eu pergunto pro meu marido: Tem diferença? E ele fala que não. Só que eu sou muito curiosa. Entende? Ele fala que não tem diferença nenhuma. Só que assim, na minha cabeça, na hora da penetração, eu acho que vai ter algo diferente. Ele relata que não. Só que assim eu tenho essas dúvidas. (Participante U8, 2017, n.p.)

Tão bom ter seu passaporte de mulher. Essas coisas todas [documentos civis com o gênero autodeclarado]. Eu me sinto realizada. […] Eu me sinto uma mulher. Uma jovem senhora plastificada. Toda pirocada, com várias perucas, toda esticada, e ganho bem. (Participante U9, 2017, n.p.)

Os relatos apresentam uma diversidade de sentidos produzidos por mulheres que realizaram cirurgia de redesignação sexual, que estão diretamente ligados a uma satisfação com os procedimentos transexualizadores, dadas as possibilidades do aparecimento público com seus corpos e gêneros. A Participante U8 ainda cita a questão da passibilidade, que pode ser um termômetro para o sucesso da cirurgia avaliado pelo encontro com o Outro, na medida em que seu corpo é acolhido nas relações de trabalho, amizade, familiares, gênero, afetivas e sexuais, sem ser apontado como monstruoso ou abjeto.

Para Butler (2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.), o Outro é determinante no processo de produção de si, na medida em que nos constituímos na relação com alguém que se dirige a nós, em meio a uma necessidade, um desejo por esse Outro como condição para existir. Rocon et al (2020bROCON, P.C. et al. Vidas após a cirurgia de redesignação sexual: sentidos produzidos para gênero e transexualidade. Ciência & saúde coletiva , Rio de Janeiro, v. 25, n. 6, p. 2347-2356, 2020b. DOI: 10.1590/1413-81232020256.26002018
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), ao analisarem os sentidos produzidos pelas cirurgias de redesignação sexual entre mulheres transexuais, evidenciam que

É preciso que a genitália seja esteticamente bem avaliada pelo outro, como vagina passável, tal qual a da mulher cisgênero. Importa também que ela seja funcional e tal funcionalidade é avaliada pelo signo do prazer, avalizado no encontro com o parceiro sexual. (p. 2354)

Adequar-se às normas que regulam as condições de reconhecimento é poder aparecer publicamente sem risco de que pesem sobre si violações éticas, discriminação e violência física. Contudo, pode haver custos nesses processos de produção de adequação.

Muitas pessoas trans não conseguem acessar os serviços dos processos transexualizadores do SUS, de modo que recorrem a estratégias para transformação de corpo fora do sistema de saúde (Rocon et al, 2020aROCON, P. C. et al. Acesso à saúde pela população trans no Brasil: nas entrelinhas da revisão integrativa. Trabalho, educação e saúde, Rio de Janeiro, v. 18, n. 1, p. e0023469, 2020a. DOI: 10.1590/1981-7746-sol00234
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; Romano, 2008ROMANO, V. F. As travestis no programa saúde da família da Lapa. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 17, n. 2, p. 211-219, 2008. DOI: 10.1590/S0104-12902008000200019
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). Estudos têm evidenciado efeitos experimentados por mulheres transexuais e travestis que relataram problemas de saúde e deformações corporais decorrentes do uso de hormônios sem acompanhamento médico, bem como das aplicações corpóreas de silicone industrial (Rocon et al, 2016ROCON, P. C. et al. Difficulties experienced by trans people in accessing the unified health system. Ciência & saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 21, n. 8, p. 2517-2526, 2016. DOI: 10.1590/1413-81232015218.14362015
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; Romano, 2008ROMANO, V. F. As travestis no programa saúde da família da Lapa. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 17, n. 2, p. 211-219, 2008. DOI: 10.1590/S0104-12902008000200019
https://doi.org/10.1590/S0104-1290200800...
). Contudo, em Rocon et al (2020bROCON, P.C. et al. Vidas após a cirurgia de redesignação sexual: sentidos produzidos para gênero e transexualidade. Ciência & saúde coletiva , Rio de Janeiro, v. 25, n. 6, p. 2347-2356, 2020b. DOI: 10.1590/1413-81232020256.26002018
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), também encontramos relatos de mulheres que realizaram as transformações corporais com o auxílio dos serviços estatais relatando problemas com os resultados que impossibilitam o aparecimento público, por não se apresentarem esteticamente próximos ao previsto pela norma.

Nesse sentido, o aparecimento público parece se configurar como um importante componente nos processos e possibilidades de adoecer ou produzir saúde na população trans. Ser reconhecido(a)(e), aceito(a)(e), acolhido(a)(e), e assim protegido(a)(e) nas redes coletivas, pressupõe viver em conformidade com normas para comportamentos, vestimentas, projetos de vida, pertencimentos a classe social, raça, gênero e sexualidade. Normas fundadas numa referência cisheteropatriarcal e branca (Akotirene, 2020AKOTIRENE, C. Interseccionalidade. São Paulo: Sueli Carneiro, 2020.), em que mulheres transexuais, travestis, homens transexuais, pessoas transmasculinas, gays, lésbicas, negros e negras, dentre outras vivências dissidentes, são hierarquizados(as), excluídos(as) e marginalizados(as) segundo aproximações ou distanciamentos à referência, contribuem para processos de sofrimento, adoecimento, violências e morte por meio da invisibilização pública em suas formas corpóreas.

Considerações finais

Ao longo do artigo exploramos algumas possibilidades de análise que as categorias Aparecimento Público, Precariedade e Reconhecimento de Judith Butler (2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016., 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.) podem oferecer.

Primeiro, problematizamos como o aparecimento público mediado pelo reconhecimento se relaciona diretamente com as condições de acesso. Questões como o uso do nome social e o respeito à autodeterminação nos gêneros são essenciais para a entrada e a permanência da população trans nos serviços de saúde. Assim, o desrespeito a tais questões é produtor de inequidades no acesso, produzindo a marginalização e exclusão da população trans do SUS, resultando diretamente na negação às possibilidades de ser reconhecido, logo, aparecer no território dos serviços de saúde.

Em seguida analisamos como a produção das condições de reconhecimento para o aparecimento público está fortemente ligada ao processo saúde e doença da população trans e como tal discussão pode, em novos estudos, ser ampliada para analisar outras populações, como indicam os relatos da Participante T4. Se atender a tais condições supõe modificar e adaptar corpos e modos de existência às normas, efeitos físicos e psíquicos podem emergir e produzir sofrimento e adoecimento.

Nessa direção, diálogos com Judith Butler (2016BUTLER, J. Quadros de guerra: quando a vida é passível de luto? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2016., 2018BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018., 2019BUTLER, J. Vidas precárias: os poderes do luto e da violência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2019.) auxiliam a pensar o aparecimento público como questão de acesso à saúde e componente dos processos de saúde e doença. Compreender que as questões de raça, gênero e sexualidade, dentre outros marcadores da diferença, são atravessadas por políticas de reconhecimento, políticas que dividem as vidas entre as que importam (merecem proteção, cuidado e esforços para minimizar a precariedade em suas existências) e aquelas que não poderão sequer ser consideradas vidas (não experienciando esforços para seu cuidado e proteção, e cuja perda não é motivo de lamentação).

Tomar tais categorias para análise do acesso aos serviços de saúde e seus possíveis atravessamentos nos processos de saúde e doença solicita acionar tecnologias de cuidado que produzam uma esfera comum entre trabalhadores(as), gestores(as) e usuários(as), que abram espaço para uma relação lateral de reconhecimento mútuo e produção de disposição afetiva. Criar pelo comum dispositivos que possibilitam o agenciamento com a alteridade, a afirmação da diferença e a defesa de uma vida, a fim de que sejam criadas coletivamente as condições de aparecimento e reconhecimento da população trans como vidas vivíveis, dignas de proteção e acolhidas em suas necessidades em saúde de maneira integral, universal e equânime.

Por fim, ao analisar desigualdades de acesso ao SUS e de exposição e experimentação das condições de produzir saúde ou sofrimento e adoecimento, este artigo sugere o aparecimento público como uma categoria de análise necessária a ser considerada em saúde. Como demonstramos neste artigo, as condições de aparecer ou não publicamente (de performar tal aparecimento em meio a políticas de reconhecimento que produzem algumas vidas como mais precárias, marginalizadas e elimináveis) produz diferentes possibilidades de acessar ou não os serviços de saúde, bem como experimentar os processos de saúde e doença.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    12 Nov 2021
  • Revisado
    14 Ago 2021
  • Revisado
    12 Nov 2021
  • Aceito
    01 Dez 2021
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo. Associação Paulista de Saúde Pública. SP - Brazil
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