Organização dos serviços urbanos de saúde frente à mudança do clima e ao risco de desastres na América Latina

Organization of urban health services in the face of climate change and disaster risk in Latin America

Carlos Alexandre Rodrigues Pereira Martha Macedo de Lima Barata Sobre os autores

Resumos

Países da América Latina que sofreram com eventos extremos e desastres nas últimas décadas têm buscado alternativas para melhorar a organização e a capacidade de resposta dos serviços de saúde, evitando o impacto que a população sofreria no caso de tais serviços serem afetados. Neste artigo são relatadas experiências de países da América Latina no que se refere à preparação e adaptação às mudanças do clima no setor saúde, que poderiam ser replicadas em outros locais. Espera-se, por meio desta revisão crítica da literatura, que se possa motivar o setor saúde a se reorganizar para que se torne menos vulnerável aos efeitos das mudanças do clima.

Mudanças climáticas; Planejamento urbano; Serviços de saúde; Vulnerabilidade a desastres


Latin American countries that have suffered extreme events and disasters in the last decades have been searching for alternatives to improve the organization and the response capacity of health services, avoiding the impact that the population would suffer in case those services would be affected. This article presents experiences of Latin American countries regarding the preparation and adaptation of the health sector to climate changes. With this critical literature review, we expect to motivate the health sector to reorganize itself in order to become less vulnerable to the effects of climate change.

Climate change; City planning; Health services; Disaster vulnerability


Introdução

O 4º relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas ofereceu uma síntese do conhecimento científico acumulado antes de 2007 sobre as tendências do sistema climático global e dos respectivos impactos sociais e ambientais. Nova síntese está sendo preparada para ser publicada no 5º relatório em 2014. Uma das grandes preocupações é o efeito das mudanças climáticas na ocorrência de eventos extremos que, quando encontram situações de vulnerabilidade, podem tomar proporções de desastres.

No âmbito da saúde pública, considera-se que a mudança do clima representa um fator de perigo na medida em que pode afetar o ambiente e consequentemente a qualidade de vida das pessoas (OPAS, 2009ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPAS). Comunidades resilientes a través de redes de salud seguras frente a desastres en América del Sur. Colômbia: OPAS, 2012.). As mudanças podem exacerbar a necessidade de assistência médica e hospitalar nas cidades, em face da ampliação da incidência de doenças infecciosas e de doenças não transmissíveis, tais como a desnutrição e as enfermidades mentais (OPAS, 2009ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPAS). Comunidades resilientes a través de redes de salud seguras frente a desastres en América del Sur. Colômbia: OPAS, 2012.; COSTELLO ., 2009COSTELLO, A. et al. Managing the health effects of climate change. The Lancet, Londres, v. 373, p. 1693-1733, 2009.; BARATA; LIGETI ., 2011BARATA, M.M.L.; LIGETI, E. Climate Change and Human Health in Cities. In: ROSENZWEIG, C. et al. Climate change and cities: first assessment report of the urban climate change research network. New York: Cambridge University Press, 2011, p. 179-213.). Implementar estratégias que possibilitem manter e melhorar a capacidade do sistema de saúde local para reagir ao risco climático, bem como estabelecer gestão urbana integrada para melhoria dos serviços locais de saúde, transporte, saneamento, habitação, alimentação e educação, dentre outros (BARATA; LIGETI ., 2011BARATA, M.M.L.; LIGETI, E. Climate Change and Human Health in Cities. In: ROSENZWEIG, C. et al. Climate change and cities: first assessment report of the urban climate change research network. New York: Cambridge University Press, 2011, p. 179-213.; FREITAS ., 2012FREITAS, C.M. et al. Socio-environmental vulnerability, disaster risk-reduction and resilience-building: lessons from the earthquake in Haiti and torrential rains in the mountain range close to Rio de Janeiro in Brazil. Ciência e saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n.6, p.1577-1586, 2012.) contribui para reduzir a sensibilidade e aumentar a resiliência e a capacidade de resposta dos cidadãos a possíveis danos e agravos, isto é, reduz a vulnerabilidade da população ao perigo climático (COSTELLO ., 2009COSTELLO, A. et al. Managing the health effects of climate change. The Lancet, Londres, v. 373, p. 1693-1733, 2009.), diminuindo também o risco de desastres.

O crescimento populacional esperado para o período 2000-2080 na América Latina é superior a 1,75%, ficando na média de 2,0% a 2,9% (UNESCO, 2009UNITED NATIONS EDUCATION, SCIENTIFIC AND CULTURAL ORGANIZATION (UNESCO). The United Nations World Water Development Report 3, Case Study Volume: facing the challenges. United Kingdom: UNESCO, 2009.). Este crescimento acelerado contribui para o descompasso entre a variação da população e o estabelecimento de sistemas de proteção social e infraestrutura na região, onde grande contingente da população ainda reside em favelas, isto é, em áreas com precária infraestrutura de saneamento, habitação, acesso à água e saúde pública (UNITED NATIONS HUMAN SETTLEMENTS PROGRAMME, 2003UNITED NATIONS HUMAN SETTLEMENTS PROGRAMME. Improving the lives of 100 Million Slum Dwellers: guide to monitoring target 11. Nairobi: UN-HABITAT, 2003.), e se encontra em situação de maior vulnerabilidade à mudança climática.

A adoção de medidas que auxiliem a aprimorar e manter a qualidade dos serviços de saúde e que melhorem a capacidade de resposta social aos agravos de doenças, potencializadas pelo aquecimento global nas cidades, perpassa por ações de avaliação integrada da vulnerabilidade social, ambiental e de saúde da população urbana e na sua incorporação no planejamento e na gestão urbana, bem como por programas para o fornecimento de serviços de saúde seguros e 'inteligentes'. Políticas e iniciativas inovadoras e exitosas para a redução da vulnerabilidade do sistema de saúde ao risco climático aplicadas na América Latina e que poderão ser adaptadas para serem replicadas em outros locais são aqui apresentadas.

Metodologia

Foi realizada pesquisa bibliográfica de documentos técnico-científicos por meio de consulta a: artigos científicos de bases de dados como o Scielo, Periódicos Capes, PubMed, Bireme; documentos de instituições ligadas à gestão em saúde e em risco de desastres na América Latina, como a Organização Panamericana de Saúde (OPAS), o Centro Regional de Informações Sobre Desastres (CRID), o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (UN-HABITAT), a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e Organização Mundial de Saúde (OMS); e normas e regulamentos dos países da América Latina no que se refere à gestão do risco de desastres, utilizando como palavras chave: vulnerabilidade, mudança do clima, adaptação e serviços de saúde, desastres, e América Latina.

Aqueles documentos que se referiam à situação dos países dessa região no que tange a: medidas de mitigação, preparação e adaptação aos riscos de desastres no setor saúde; políticas públicas de gestão em saúde; e experiências dos países em gestão do risco de desastres e na recuperação pós-desastre, foram considerados e deles retiradas informações sobre os seguintes temas: políticas públicas sobre construções seguras; hospitais seguros; avaliação da vulnerabilidade dos serviços de saúde; hospitais inteligentes; e resposta em saúde aos desastres, assuntos que integram o conteúdo deste trabalho.

Formulação de políticas públicas sobre hospitais seguros na América Latina

Um dos efeitos que a mudança no clima pode causar é o aumento da ocorrência de eventos extremos que, quando encontram populações e ambientes vulneráveis, podem levar a situações de desastres (IPCC, 2012INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE (IPCC). Managing the risks of extreme events and disasters to advance climate change adaptation: a special report of working groups I and II of the intergovernmental panel on climate change. Cambridge, UK; New York, USA: Cambridge University Press, 2012.). Promover estabelecimentos seguros, funcionando em sua máxima capacidade imediatamente após a ocorrência de um desastre, sem perdas na infraestrutura, é essencial para que o impacto de um evento adverso não se agrave pela interrupção dos serviços de saúde, deixando desassistidas as pessoas que deles necessitam. Alguns países têm perdido até 50% da sua capacidade hospitalar em decorrência de eventos de grande magnitude, como terremotos e inundações (OMS, 2009ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE (OMS). Para salvar vidas: hagamos que los hospitales sean seguros en las situaciones de emergencia. [S.l.]: OMS, 2009.).

Este fato tem causado preocupação sobre a vulnerabilidade dos estabelecimentos de saúde e mobilizado governos e organizações no intuito de diminuí-la. Há países que elaboraram regulamentos específicos para segurança de edificações frente a situações de emergência, considerando as ameaças características dos seus territórios.

O Centro Regional de Información sobre Desastres (CRID) reuniu alguns desses regulamentos que se referem às experiências de países latino-americanos (CRID, 2009c______. Legislación. 2009c. Disponível em: <http://www.cridlac.org/cd/CD_Hospitales_Seguros/legislacion.html>. Acesso em: 27 nov. 2012.
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).

Em 1996, o Chile publicou norma oficial sobre desenho sísmico de edifícios, na qual se considera que os hospitais estão entre as edificações de maior importância para sua aplicação (CHILE, 1996CHILE. Instituto Nacional de Normalización. Norma chilena oficial: diseño sísmico de edificios. Santiago: Instituto Nacional de Normalización, 1996. Disponível em: <http://www.cridlac.org/cd/CD_Hospitales_Seguros/pdf/norma_chilena_diseno_sismico.pdf >. Acesso em: 02 out. 2012.
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).

Em 1997, na Colômbia, foi decretada a lei que estabelece normas para projeto, construção e supervisão técnica de edificações resistentes a abalos sísmicos, pela qual os hospitais são definidos como construções de atenção comunitária indispensáveis, cujo funcionamento deve ser garantido durante e após os abalos (CONGRESO DE COLOMBIA, 1997CONGRESO DE COLOMBIA. Ley 400, de 19 de agosto de 1997. Estabelece normas para construções resistentes a abalos sísmicos. Diario Oficial, 25 de agosto de 1997. Disponível em: <http://www.cridlac.org/cd/CD_Hospitales_Seguros/pdf/LEY_400_CO.pdf >. Acesso em: 02 out. 2012.
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).

Em 1998, foi publicada pela Asociación Colombiana de Ingeniería Sísmica (AIS) a Norma NSR 98: Normas Colombianas de Diseño y Construcción Sismo Resistente, contendo os requisitos gerais para resistência às cargas que podem atuar sobre as estruturas em casos de abalos sísmicos (COLÔMBIA, 1998COLOMBIA. Asociación Colombiana de Ingeniería Sísmica. NSR 98: normas colombianas de diseño y construcción sismo resistente, Título B. 1998. Disponível em: <http://www.cridlac.org/cd/CD_Hospitales_Seguros/pdf/NSR_98_CO.pdf>. Acesso em: 02 out. 2012.
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).

Em 2006, na Costa Rica, foi aprovada a Política Institucional de Hospital Seguro, na qual foi estabelecido que sua implementação deveria ocorrer nas diversas etapas do processo de gestão de riscos (prevenção, mitigação, resposta, reabilitação e reconstrução), devendo a norma ser aplicada tanto em novos estabelecimentos quanto em estabelecimentos já existentes (COSTA RICA, 2006COSTA RICA. Política Institucional de Hospital Seguro de La Caja Costarricense De Seguridad Social. 2006. Disponível em: <http://www.cridlac.org/cd/CD_Hospitales_Seguros/pdf/politica_hospital_seguro.pdf>. Acesso em: 02 out. 2012.
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).

Também em 2006, o Peru publicou sua Política Nacional de Hospitais Seguros Frente aos Desastres, fundamentada no Marco de Ação de Hyogo 2005-2015 e nos resultados da Primera Reunión Andina sobre Hospitales Seguros ante Desastres (PERU, 2010PERU. Ministerio de Salud. Politica Nacional de Hospitales Seguros Frente a Los Desastres. Lima: SINCO Editores S.A.C., 2010.).

O Equador publicou, em 2007, sua Política Nacional de Hospitais Seguros, baseada nos compromissos assumidos na Reunión de Ministros de Salud de Latinaomérica y El Caribe e 45º Reunión Del Consejo Directivo de La OPAS/OMS. O documento contém plano de ação para adequações, cuja execução foi prevista para até 2015 (REPUBLICA DEL EQUADOR, 2008REPUBLICA DEL EQUADOR. Ministerio de Salud Pública. Política Nacional de Hospitalares Seguros: programa de hospital seguro. [Internet]. Disponível em: <http://www.cridlac.org/cd/CD_Hospitales_Seguros/pdf/politica_nacional_hospitales_seguros.pdf>. Acesso em: 28 set. 2012.
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).

No dia mundial da saúde em 2009, foram feitas reflexões acerca do papel dos hospitais em situações de desastre ambiental e da necessidade de promover hospitais seguros. Frases como Cuando ocurre un desastre, los hospitales seguros salvan vidas foram divulgadas para mobilização e conscientização do público em geral (CRID, 2009b______. La Campaña 2008-2009. 2009b. Disponível em: <http://www.cridlac.org/cd/CD_Hospitales_Seguros/2008-2009.html>. Acesso em: 02 out. 2012.
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). Políticas, regulamentos, discussões e reflexões são importantes ferramentas para buscar meios de minimizar a vulnerabilidade dos estabelecimentos de saúde para que estes possam tornar-se, verdadeiramente, espaços seguros.

Estudos de vulnerabilidade dos serviços de saúde

Na América Latina têm sido realizados estudos de vulnerabilidade dos estabelecimentos de saúde como medida preventiva ao risco de desastres naturais, dentre os quais o risco climático (COSUDE, 2002AGENCIA SUIZA PARA EL DESARROLLO Y LA COOPERACION (COSUDE). Instrumentos de apoyo para el análisis y la gestión de riesgos naturales: guía para el especialista. Managua: COSUDE, 2002.). Os estudos analisam a probabilidade de perdas entre os componentes dos sistemas de saúde em caso de desastres, baseados nas ameaças naturais e vulnerabilidades dos sistemas (CHILE, 2011CHILE. Guía análisis de riesgos naturales para el ordenamiento territorial. Santiago: CEDOC-SUBDERE, 2011.). Esses estudos são realizados para que seja mantida a integridade e funcionalidade dos sistemas de saúde local mesmo em situações de desastres.

Os estudos contêm a identificação, avaliação e quantificação das vulnerabilidades e ameaças. Para identificação das ameaças, são levados em conta os aspectos ambientais, o histórico de eventos anteriores e sua espacialização, além dos cenários de ocorrência para eventos com características determinadas. A avaliação da vulnerabilidade se baseia na caracterização das instalações e redes de saúde, dos serviços auxiliares, como água e energia, e da mobilidade (CHILE, 2011CHILE. Guía análisis de riesgos naturales para el ordenamiento territorial. Santiago: CEDOC-SUBDERE, 2011.). Esses estudos fornecem informações sobre variáveis relacionadas às fragilidades perante desastres ambientais. Segundo Santander (2012)SANTANDER, A. Avanços em hospitais seguros nos níveis regionais e Global. Nova Friburgo: Cap-Net Brasil, [2012]. 36 slides. [CD-ROM]., podem ser realizados: estudos de riscos, estudos estruturais, estudos arquitetônicos, estudos de equipamentos e serviços vitais, e estudos organizativo-funcionais.

O estudo é 'participativo', envolvendo equipe de especialistas em análise de riscos e representantes do poder público e da sociedade. A interrelação e integração dos 'participantes' durante as fases do estudo levam ao melhor conhecimento da realidade local, ao compartilhamento de conhecimentos e à continuidade e implementação das recomendações resultantes do estudo (COSUDE, 2002AGENCIA SUIZA PARA EL DESARROLLO Y LA COOPERACION (COSUDE). Instrumentos de apoyo para el análisis y la gestión de riesgos naturales: guía para el especialista. Managua: COSUDE, 2002.).

Esses estudos, ainda que complexos, têm sido realizados em diversos países latino-americanos. Alguns exemplos de sua utilização nesses países têm sido documentados e estão disponíveis em sites de organismos voltados à pesquisa sobre gestão de risco de desastres, como o CRID (2009a)CENTRO REGIONAL DE INFORMACIÓN SOBRE DESASTRES (CRID). Casos de estudio. 2009a. Disponível em: <http://www.crid.or.cr/CD/CD_hospitales_Seguros/casos-estudio.html>. Acesso em: 30 set. 2012.
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.

Há registros de estudos realizados em Cuba (SIERRA; OLIVA; MARISY, 1994SIERRA, L.O.; OLIVA, R.; MARISY, J. Análisis de la vulnerabilidad de las construcciones educacionales y de salud en la ciudad de Santiago de Cuba, Cuba. Santiago de Cuba: Centro Nacional de Investigaciones Sismológicas, 1994.), sobre a vulnerabilidade de construções educacionais e de saúde; na Venezuela, sobre a vulnerabilidade do Hospital Dr. Horacio E. Oduber (MALAVER, 2001MALAVER. A. A vulnerability study of the Hospital Dr. Horacio E. Oduber, Aruba. Caracas: Pan American Organization of Health. 2001. Disponível em: <http://www.crid.or.cr/CD/CD_hospitales_Seguros/pdf/doc14139/doc14139.htm>. Acesso em: 30 set. 2012.
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) e sobre a vulnerabilidade do Hospital General de Santa Bárbara Del Zulia a abalos sísmicos (GRASES GALOFRE, 1993GRASES GALOFRE, J. Evaluación de la vulnerabilidad a sismos de instalaciones hospitalarias: aplicación al Hospital General de Santa Bárbara del Zulia. Caracas: Organización Panamericana de la Salud, 1993. Disponível em: <http://www.crid.or.cr/CD/CD_hospitales_Seguros/pdf/doc5242/doc5242.htm>. Acesso em: 30 set. 2012.
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); no Peru, sobre componentes não estruturais do Hospital Nacional Guillermo Almenara Irigoyen (COMUNIDAD ECONÓMICA EUROPEA; PERU, 1997COMUNIDAD ECONÓMICA EUROPEA; PERU. Ministerio de Salud. Instituto Peruano de Seguridad Social; ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD. Hospital Nacional Guillermo Almenara Irigoyen: componente no-estructural. Peru: Comunidad Económica Europea. 1997. Disponível em: <http://www.crid.or.cr/CD/CD_hospitales_Seguros/pdf/doc10537/doc10537.htm>. Acesso em: 30 set. 2012.
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); entre outros. Esses estudos são experiências que podem ser replicadas por outras instituições na tentativa de reduzir as suas vulnerabilidades, para manter a integridade e funcionalidade mesmo em situações de desastres.

Os estudos de vulnerabilidade, de grande importância, são complexos e onerosos (OPAS, 2009ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPAS). Comunidades resilientes a través de redes de salud seguras frente a desastres en América del Sur. Colômbia: OPAS, 2012.), e exigem profissionais habilitados para elaborá-los; por isso, nem sempre são viáveis. Para tornar mais rápida e menos onerosa a avaliação da vulnerabilidade, foi desenvolvido o Índice de Segurança Hospitalar.

Indice de Segurança Hospitalar

O Índice de Segurança Hospitalar é uma ferramenta desenvolvida pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS) para ser um método de avaliação rápido e de baixo custo que ofereça uma ideia imediata da probabilidade de um estabelecimento de saúde continuar funcionando após a ocorrência de um desastre; informação útil aos gestores, que podem estimar sua capacidade de responder a emergências em saúde pública (OPAS, 2009ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPAS). Comunidades resilientes a través de redes de salud seguras frente a desastres en América del Sur. Colômbia: OPAS, 2012.).

Para obter o índice, deve-se aplicar a lista de verificação (padronizada pela OPAS) que avalia componentes relativos a localização geográfica, segurança estrutural, segurança não estrutural e capacidade funcional, por meio de 145 questões. Os valores são repassados para uma planilha eletrônica que contém um modelo matemático que, automaticamente, tabula os resultados e oferece um score final, que representa o índice de segurança do estabelecimento (DIAS; MOTA, 2012DIAS, V.O.; MOTA, P.R.E. Índice de Segurança Hospitalar: experiência bem sucedida. Santana do Livramento: Prefeitura de Santana do Livramento, 2012.). Valores de 0,00 a 0,35 (categoria C) indicam alto risco de colapso; valores entre 0,36 a 0,65 (categoria B) indicam que pode haver prejuízos às estruturas, equipamentos ou serviços; e valores entre 0,66 e 1,00 (categoria A) indicam alta probabilidade de resistir a um desastre (SALLES; CAVALINI, 2012SALLES, M.J.P.; CAVALINI, L.T. Implementação da "estratégia de hospitais seguros frente a desastres" no Brasil: desafios e evidências empíricas. Hygeia, Uberlândia, v. 14, n. 8, p. 81-90, 2012. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.php/hygeia/article/view/17109>. Acesso em: 13 fev. 2013.
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).

Esta é uma ferramenta aplicável à gestão de risco voltada à prevenção de danos em estabelecimentos de saúde e minimização dos custos de sua reparação. Ao identificar as vulnerabilidades, pode-se definir metas e analisar soluções possíveis para que as instalações avaliadas possam funcionar com segurança, ainda que ocorram desastres (DIAS; MOTA, 2012DIAS, V.O.; MOTA, P.R.E. Índice de Segurança Hospitalar: experiência bem sucedida. Santana do Livramento: Prefeitura de Santana do Livramento, 2012.).

O índice não substitui o estudo de vulnerabilidade, contudo oferece um parâmetro inicial para que possam ser priorizados investimentos para melhorar a segurança das instalações. Segundo Van Alphen (2011)VAN ALPHEN, D. Hospitales seguros: cooperación con el sector privado. Organização Panamericana de Saúde: Panamá, 2011., 29 países e territórios na América Latina haviam iniciado a aplicação desse índice àquela época, dentre os quais Bolívia, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, Argentina, Paraguai, Peru, Panamá, Uruguai e Venezuela. O Brasil não estava na lista. Já em março de 2012, representantes de 31 países e territórios das Américas se reuniram para relatar o uso do Índice de Segurança Hospitalar. Verificou-se que nas Américas mais de 1.400 hospitais já haviam sido avaliados pela metodologia, sendo que 51% das instalações estavam na categoria A (o que significa que têm alta probabilidade de continuar funcionando na ocorrência de um desastre), 37% estavam na categoria B (têm probabilidade de não colapsarem, mas podem parar de funcionar), e 12% na categoria C (provavelmente deixariam de operar, pondo em risco a vida de pacientes e profissionais) (LA INICIATIVA, 2012LA INICIATIVA de hospitales seguros em el mundo. Safe hospitals, n.117, 2012. Disponível em: <http://www.paho.org/disasters/newsletter/index.php?option=com_content&view=article&id=495%3Athe-safe-hospitals-initiative-in-the-world&catid=232%3Aissue-117-april-2012-perspective&Itemid=303&lang=es>. Acesso em: 04 out. 2012.
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), mas não foram informados detalhes sobre a proporção de hospitais privados dentre as unidades avaliadas.

Foram encontrados relatos da aplicação do índice em hospitais da Bolívia, Equador, Peru, México, Caribe e Cuba (OPAS, 2009ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPAS). Comunidades resilientes a través de redes de salud seguras frente a desastres en América del Sur. Colômbia: OPAS, 2012.). Sobre a aplicação do índice no Brasil, foram encontrados relatos de sua utilização em um hospital público da cidade de Santana do Livramento - RS (DIAS; MOTA, 2012DIAS, V.O.; MOTA, P.R.E. Índice de Segurança Hospitalar: experiência bem sucedida. Santana do Livramento: Prefeitura de Santana do Livramento, 2012.) e em três hospitais da Região Noroeste do Estado do Rio de Janeiro (SALLES; CAVALINI, 2012SALLES, M.J.P.; CAVALINI, L.T. Implementação da "estratégia de hospitais seguros frente a desastres" no Brasil: desafios e evidências empíricas. Hygeia, Uberlândia, v. 14, n. 8, p. 81-90, 2012. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.php/hygeia/article/view/17109>. Acesso em: 13 fev. 2013.
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).

Embora a maioria dos relatos seja de aplicação do índice em hospitais públicos, têm-se buscado a cooperação com o setor privado, que detém a maioria dos hospitais construídos (VAN ALPHEN, 2011VAN ALPHEN, D. Hospitales seguros: cooperación con el sector privado. Organização Panamericana de Saúde: Panamá, 2011.). Contudo, não foram encontrados muitos relatos da utilização desse índice especificamente em hospitais privados, ou se houve diferença entre os resultados destes e dos hospitais públicos. Sobre este assunto, verificou-se que o Equador incorporou o setor privado no processo de avaliação da segurança hospitalar por meio da Associação dos Hospitais e Clínicas Privadas do Equador, a ASHPE (SAFE, 2013SAFE hospitals, an indicator of countries' progress towards risk reduction. Safe hospitals, n.120, 2013. Disponível em: <http://www.paho.org/disasters/newsletter/index.php?option=com_content&view=article&id=525&Itemid=318&lang=en>. Acesso em: 24 jan. 2014.
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); que Colômbia e Peru incluíram representantes de instituições privadas nos treinamentos oferecidos sobre o tema (OPAS, 2012ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPAS). Comunidades resilientes a través de redes de salud seguras frente a desastres en América del Sur. Colômbia: OPAS, 2012.); que no México foi criado o Comitê Nacional de Avaliação, Diagnóstico e Certificação do Programa Hospital Seguro (CNEDCPHS), que conta com representantes de diversas áreas e instituições, inclusive privadas (MÉXICO, 2012MÉXICO. Programa hospital seguro: protocolo para visitas de evaluación hospitalaria. México: SEGOB, 2012. Disponível em: <http://www.proteccioncivil.gob.mx/work/models/ProteccionCivil/Resource/59/2/images/pveh.pdf>. Acesso em: 24 jan. 2014.
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); e que no Paraguai um hospital privado já foi avaliado, mas sem detalhes dos resultados (OPAS, 2012ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPAS). Comunidades resilientes a través de redes de salud seguras frente a desastres en América del Sur. Colômbia: OPAS, 2012.). Na avaliação dos três hospitais da Região Noroeste do Estado do Rio de Janeiro (Brasil), realizada por Salles e Cavalini (2012)SALLES, M.J.P.; CAVALINI, L.T. Implementação da "estratégia de hospitais seguros frente a desastres" no Brasil: desafios e evidências empíricas. Hygeia, Uberlândia, v. 14, n. 8, p. 81-90, 2012. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.php/hygeia/article/view/17109>. Acesso em: 13 fev. 2013.
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, foram avaliados dois hospitais públicos e um privado. Os três hospitais foram classificados como categoria B, mas o hospital privado teve menores probabilidades de continuar funcionando em uma situação de crise, tanto em termos de componentes estruturais, quanto não estruturais ou funcionais.

Os países das Américas têm voltando sua atenção, também, para a avaliação das condições de segurança de outros tipos de estabelecimentos de saúde, principalmente os de menor complexidade, para que, igualmente, seja assegurado o funcionamento desses estabelecimentos, que são muito relevantes para certas comunidades que encontram neles sua principal fonte de assistência em saúde (LA INICIATIVA, 2012LA INICIATIVA de hospitales seguros em el mundo. Safe hospitals, n.117, 2012. Disponível em: <http://www.paho.org/disasters/newsletter/index.php?option=com_content&view=article&id=495%3Athe-safe-hospitals-initiative-in-the-world&catid=232%3Aissue-117-april-2012-perspective&Itemid=303&lang=es>. Acesso em: 04 out. 2012.
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).

Além disso, um novo desafio foi lançado pela Organização Panamericana de Saúde, com o apoio do Departamento para Desenvolvimento Internacional do Reino Unido, para a consolidação de hospitais seguros, que poderá ser um avanço para a gestão em saúde ambiental: são os Estabelecimentos de Saúde Inteligentes. Esses estabelecimentos têm como foco a redução dos efeitos das mudanças climáticas sobre a saúde, tanto no que se refere à vulnerabilidade aos eventos extremos, como terremotos e inundações, quanto referente ao impacto ambiental causado pelos estabelecimentos de saúde, como o alto consumo de energia, cuja produção, muitas vezes, emite grande quantidade de carbono (ESTABLECIMIENTOS, 2012ESTABLECIMIENTOS de salud inteligentes. Safe hospitals, n.117, 2012. Disponível em: <http://www.paho.org/disasters/newsletter/index.php?option=com_content&view=article&id=492%3Asmart-health-care-facilities&catid=231%3Aissue-117-april-2012-safe-hospitals&Itemid=302&lang=es>. Acesso em: 04 out. 2012.
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).

O projeto de um Estabelecimento de Saúde Inteligente associa as técnicas de redução do risco de desastres com o uso de energia com baixas emissões de carbono. Esse tipo de projeto, além da adaptação e proteção ambiental do setor saúde, traz benefícios econômicos e sociais. Inicialmente, a metodologia está sendo testada em dois hospitais de dois países do Caribe, região que está sendo impactada direta e indiretamente pelas mudanças climáticas e por eventos extremos, como terremotos, inundações, erupções vulcânicas e furacões. A intenção é que esses dois hospitais sirvam de exemplo para outros países, levando à disseminação da metodologia, como medida de adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças do clima (ESTABLECIMIENTOS, 2012ESTABLECIMIENTOS de salud inteligentes. Safe hospitals, n.117, 2012. Disponível em: <http://www.paho.org/disasters/newsletter/index.php?option=com_content&view=article&id=492%3Asmart-health-care-facilities&catid=231%3Aissue-117-april-2012-safe-hospitals&Itemid=302&lang=es>. Acesso em: 04 out. 2012.
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).

Construção de hospitais seguros

O Chile foi fortemente abalado por um terremoto em 27 de fevereiro de 2010, do qual resultou a completa destruição dos Hospitais de Talca, Curicó, Cauquenes, Hualañé, San Antonio de Putaendo, Angol, Chillán, San Carlos e Félix Bulnes e danos em diversos outros estabelecimentos de Atenção Primária à Saúde (RECUPERACIÓN, 2012RECUPERACIÓN acelerada de hospitales: experiencia de Chile. Safe hospitals, n.117, 2012. Disponível em: <http://www.paho.org/disasters/newsletter/index.php?option=com_content&view=article&id=494%3Aaccelerated-recovery-for-hospitals-the-experience-of-chile&catid=231%3Aissue-117-april-2012-safe-hospitals&Itemid=302&lang=es>. Acesso em: 04 out. 2012.
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).

Trinta dias após o evento, foram iniciados os trabalhos de recuperação dos hospitais que tiveram danos irreversíveis. Foram estudadas as técnicas de uso corrente no mundo para construção e operação rápida, com base nos preceitos de Instalação Segura. Aplicou-se a metodologia de 'Construção Acelerada' para reconstrução dos Hospitais de Talca, Chillán, Hualañé, Cauquenes, Curicó, San Antonio de Putaendo, Félix Bulnes e Parral com estratégia antissísmica e tecnologia sanitária aprimorada (FUENZALIDA; TESSMANN; BARRIA, [2011?]FUENZALIDA, L.C.; TESSMANN, P.G.I.; BARRIA, W.A.I. Hospitales de Construcción Acelerada: experiencia chilena post terremoto 2010. [2011?]. Disponível em: <http://www.paho.org/disasters/newsletter/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=121&Itemid=&lang=es>. Acesso em: 04 out. 2012.
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).

No projeto, também foram incluídos itens relativos à segurança contra incêndio, por meio de pintura especial que evita o colapso da estrutura por altas temperaturas. O projeto conta também com revestimento das estruturas com material anti-ignição. Ainda pensou-se na resistência das estruturas e na eficiência energética. Em 294 dias a malha hospitalar foi restabelecida. Foram reconstruídos 26.320 m2, com capacidade para 863 leitos. A população atendida pela nova malha foi de 3.018.131 pessoas. O custo das obras foi de 30.000 milhões de pesos (equivalente a mais de US$ 60 milhões). A utilização da tecnologia de 'Construção Acelerada' permitiu restabelecer, com rapidez, a rede pública de saúde perdida devido ao desastre (FUENZALIDA; TESSMANN; BARRIA, [2011?]FUENZALIDA, L.C.; TESSMANN, P.G.I.; BARRIA, W.A.I. Hospitales de Construcción Acelerada: experiencia chilena post terremoto 2010. [2011?]. Disponível em: <http://www.paho.org/disasters/newsletter/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=121&Itemid=&lang=es>. Acesso em: 04 out. 2012.
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).

O México também tem desenvolvido trabalhos para melhorar a segurança de seus estabelecimentos de saúde. A probabilidade de ocorrência de um abalo sísmico no país é muito alta; estima-se que ainda ocorrerão vários terremotos maiores que 8 graus na escala Richter. Em resposta, o país trabalha há décadas para reduzir o risco de desastres. Recentemente, foi avaliado o grau de segurança de 90 hospitais, utilizando a metodologia do Índice de Segurança Hospitalar. Verificou-se que 70% se enquadram na categoria A (boas condições de segurança), 20% na categoria B (grau médio de segurança) e 10% na categoria C (baixo grau de segurança). Este resultado permite a priorização das ações, voltando a atenção para aquelas instalações que se mostraram mais vulneráveis (PLAN SISMO DE MÉXICO, 2012PLAN sismo de México: um ejemplo a seguir. Safe hospitals, n.117, 2012. Disponível em: <http://www.paho.org/disasters/newsletter/index.php?option=com_content&view=article&id=496%3Aearthquake-plan-for-mexico-an-example-to-follow&catid=231%3Aissue-117-april-2012-safe-hospitals&Itemid=302&lang=es>. Acesso em: 04 out. 2012.
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).

Ações de resposta em saúde a situações de desastre nas cidades

É importante pensar em formas de melhorar a resposta em saúde a situações de desastre não só referente ao atendimento médico e a hospitais seguros, mas também na gestão de abrigos e vigilância sanitário-epidemiológica, tendo em mente que alguns agravos não ocorrem imediatamente após o desastre, mas com o passar dos dias, em decorrência de condições socioambientais que vão se manifestando.

Um exemplo de organização das ações de resposta em saúde em situações de desastre ocorreu em Nova Friburgo (RJ, Brasil), em janeiro de 2011, após chuvas torrenciais que causaram deslizamentos em diversos pontos da cidade. Esse episódio configurou-se como uma das situações de desastre de maior relevância na região (PORTO, 2012PORTO, S. S. Saúde em desastres: a experiência de Nova Friburgo. Nova Friburgo: Cap-Net Brasil, 2012. 30 slides. [CD-ROM].).

O município de Nova Friburgo está localizado na Região Serrana do Estado do Rio de Janeiro, a uma altitude de 846 metros, onde vivem 182.082 habitantes. De todos os estabelecimentos de saúde do município, 65,5% são privados; os demais estabelecimentos (35,5%) são públicos municipais (IBGE, 2012INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Base de dados Cidades@. c2012. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>. Acesso em: 02 out. 2012.
http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwind...
).

Em janeiro de 2011, as chuvas em Nova Friburgo chegaram a 182,8mm. Ocorreram também intensas descargas atmosféricas e fortes ventos. O nível do curso d'água que corta a cidade subiu acima do normal e em vários pontos da cidade houve escorregamento de encostas. Diversos serviços foram afetados, como abastecimento de água, fornecimento de energia, transporte e serviços de saúde. O evento resultou em 429 mortos e 3.220 desabrigados (PORTO, 2012PORTO, S. S. Saúde em desastres: a experiência de Nova Friburgo. Nova Friburgo: Cap-Net Brasil, 2012. 30 slides. [CD-ROM].).

Devido ao contingente de desabrigados e à situação da cidade pós-desastre, era necessário um trabalho efetivo de vigilância sanitária e epidemiológica e de gestão de abrigos. Em resposta a essa situação foram montadas equipes de vigilância, que faziam: o controle da qualidade da água de consumo humano e de alimentos e donativos; o monitoramento e notificação dos focos de doenças como dengue, diarreia e leptospirose; o controle de vetores e animais peçonhentos. O trabalho de vigilância conseguiu conter os agravos de saúde, evitando que os casos de dengue e leptospirose notificados após o desastre evoluíssem a óbito e evitando surtos de diarreia por veiculação hídrica (PORTO, 2012PORTO, S. S. Saúde em desastres: a experiência de Nova Friburgo. Nova Friburgo: Cap-Net Brasil, 2012. 30 slides. [CD-ROM].).

Também foram montadas equipes destinadas a monitorar a condição dos abrigos. Para avaliação, foram utilizados listas de verificação e questionários já preparados para tal situação, utilizados e recomendados pelo Ministério da Saúde, como o instrumento 'Diagnóstico da Situação no Abrigo'. Os abrigos eram revisitados após 50 dias para verificação das condições das pessoas atendidas, no que se refere a trabalho, nutrição, saúde reprodutiva e sexual, violência, amamentação, uso de álcool, tabaco e outras drogas, saúde do adolescente e DST/AIDS, hiperdia e saúde mental. Por meio desse trabalho de avaliação e monitoramento, pôde-se gerir a salubridade nos abrigos e adequar as situações problema, evitando que nesses espaços ocorresse a disseminação de agravos de saúde (PORTO, 2012PORTO, S. S. Saúde em desastres: a experiência de Nova Friburgo. Nova Friburgo: Cap-Net Brasil, 2012. 30 slides. [CD-ROM].).

A vantagem que as cidades têm ao preparar seu sistema de saúde para os efeitos da mudança do clima

Em muitos países da América Latina ocorrem eventos extremos de diferentes formas e intensidades. As inundações são o tipo mais comum de desastre em todo o mundo, sendo um dos desastres ambientais mais devastadores e letais, cujo número de vítimas fatais é superado apenas pelos terremotos. Os desastres podem impactar a saúde de diversas formas: seja causando vítimas, incrementando a ocorrência de doenças, ou aumentando a demanda por serviços de saúde; seja causando perdas e danos em instalações e equipamentos de saúde, ou causando a interrupção de serviços essenciais como água e energia ou interrompendo vias de acesso (OPAS, 2006ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPAS). Comunidades resilientes a través de redes de salud seguras frente a desastres en América del Sur. Colômbia: OPAS, 2012.).

Devido aos impactos negativos e perdas econômicas sobre a infraestrutura de saúde (edificações, equipamentos, vacinas, medicamentos, registros), além de perdas humanas, causados pelos desastres, e à necessidade de se identificar previamente a magnitude do risco a que se está exposto, pressupõe-se que sejam criadas metodologias que possam ser utilizadas para adotar medidas preventivas e preparar as redes de serviços de saúde para esses eventos (OPAS, 2009ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD (OPAS). Comunidades resilientes a través de redes de salud seguras frente a desastres en América del Sur. Colômbia: OPAS, 2012.).

Por mais que não se tenha ferramentas para evitar a ocorrência dos eventos extremos ou do risco climático, é possível evitar os desastres e diminuir a vulnerabilidade da população. E isso passa pela garantia de fornecimento dos serviços de saúde, que são primordiais durante um desastre. Não preparar o setor saúde pode significar perdas de vida, perdas materiais, perdas de recursos públicos e de registros locais. Todo esse desperdício pode ser evitado pelo investimento em estratégias de melhoria das condições dos serviços urbanos de saúde e de preparação para os efeitos das mudanças do clima nas cidades.

O que as experiências relatadas podem representar para o setor de saúde

As experiências relatadas mostram que é possível que o setor de saúde, indubitavelmente estratégico numa situação de desastre ou de emergência, se organize de forma a reduzir o número de perdas humanas e materiais durante essas situações calamitosas. Mostram, ainda, que isso depende de gestão integrada, não só específica para serviços de saúde, mas para o planejamento urbano, que deve envolver conhecimentos da engenharia, dos serviços públicos, das ciências humanas e sociais, e do senso comum.

O trabalho interdisciplinar entre os profissionais de saúde, comunidade e profissionais de outras áreas, como as já citadas, tem se mostrado um caminho viável para a melhoria das condições dos serviços prestados e a garantia de sua continuidade, mesmo durante um desastre. As práticas relatadas se mostraram exitosas e podem ser replicadas em outros locais para a edificação de cidades mais resilientes e de serviços de saúde menos vulneráveis às mudanças do clima.

Além disso, destaca-se a necessidade de envolvimento do setor privado de saúde, que detém a maior parte das unidades de saúde hospitalares construídas na América Latina (VAN ALPHEN, 2011VAN ALPHEN, D. Hospitales seguros: cooperación con el sector privado. Organização Panamericana de Saúde: Panamá, 2011.; PROFUTURO, 2008PROGRAMA DE ESTUDOS DO FUTURO (PROFUTURO). A saúde no Brasil e na América Latina. São Paulo: FIA, 2008.). Os direcionamentos tomados na América Latina para cooperação entre setor público e privado para resposta a desastres e para a avaliação da vulnerabilidade das unidades podem ser os meios para consolidar esse envolvimento. Sem dúvida, os sistemas públicos tem maior responsabilidade na implementação de políticas de prevenção e minimização dos efeitos de desastres, não só sobre a saúde. Também serão eles que terão a maior responsabilidade no socorro e assistência às vítimas e no monitoramento do grau de seguridade do próprio sistema de saúde em caso de desastres. Mas o setor privado não pode se eximir de sua parcela, uma vez que pode contribuir no atendimento à população em situações de graves emergências e danos, como ocorreu no Haiti (VAN ALPHEN, 2011VAN ALPHEN, D. Hospitales seguros: cooperación con el sector privado. Organização Panamericana de Saúde: Panamá, 2011.), suplementando o Estado, que nem sempre tem plena capacidade de suprir toda a demanda por serviços de saúde (PROFUTURO, 2008PROGRAMA DE ESTUDOS DO FUTURO (PROFUTURO). A saúde no Brasil e na América Latina. São Paulo: FIA, 2008.). Ressalte-se que as unidades destinadas a prestar serviços de saúde também podem apresentar vulnerabilidades que, em situação de crise, culminariam em perdas financeiras e humanas.

Considerações finais

Estudos realizados por cientistas do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, apoiados por evidências recentes de ocorrência de eventos climáticos extremos, corroboram a necessidade de adoção de estratégias de adaptação do sistema de saúde para fazer frente ao risco climático. Estas incluem a adoção de medidas para melhoria de infraestrutura e de gestão nos estabelecimentos de saúde existentes, bem como o preparo de seus profissionais para que estejam aptos a responder com eficácia e eficiência à população local. Espera-se que a apresentação e avaliação de ações que estão sendo implantadas em diferentes locais da América Latina possam ser úteis para a sua replicação. Ressalte-se que não basta melhorar e preparar o sistema de saúde local, isto é, além das medidas aqui propostas faz-se necessário ampliar e melhorar o conhecimento, a informação e a percepção da população sobre a respectiva vulnerabilidade ao risco climático.

  • Suporte financeiro: não houve

Referências

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2014

Histórico

  • Recebido
    Jan 2014
  • Aceito
    Ago 2014
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
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