RESUMO
O estado de São Paulo adotou um programa de incentivo financeiro para hospitais filantrópicos. O objetivo deste estudo foi analisar o desempenho dos hospitais participantes desse programa em 2012. Foram analisados os indicadores de desempenho segundo o porte hospitalar e o porte municipal, empregando-se o modelo de desempenho do Proadess (Avaliação de Desempenho do Sistema de Saúde). Encontrou-se diferença no desempenho dos hospitais segundo porte: os hospitais de pequeno porte apresentaram resultados desfavoráveis com relação aos indicadores de acesso, eficiência e efetividade. Esse resultado corrobora a necessidade de reavaliar programas de incentivo financeiro para hospitais de pequeno porte configurados como hospitais gerais.
PALAVRAS-CHAVE
Administração hospitalar; Serviços de saúde; Indicadores de serviços; Gestão em saúde; Serviços hospitalares
Introdução
No estado de São Paulo, hospitais filantrópicos e, em especial, as Santas Casas de Misericórdia são responsáveis por importante parcela da assistência hospitalar ofertada ao Sistema Único de Saúde (SUS)11 Bittar OJNV, Mendes JDV, Magalhães A. Rede Hospitalar no Estado de São Paulo: mapear para regular [monografia]. São Paulo. SESSP; 2011. 54p.. Em 2012, do total de hospitais que prestaram atendimento ao SUS, mais de 66% das instituições eram de natureza filantrópica, segundo análise dos dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES)22 Ramos MCA, Cruz LP, Kishima VC, et al. Avaliação de desempenho de hospitais que prestam atendimento pelo sistema público de saúde, Brasil. Rev. Saúde Pública. Universidade de São Paulo, 2015..
A elevação dos custos da assistência hospitalar (decorrente das transições demográfica e epidemiológica), o avanço tecnológico e a necessidade de aperfeiçoamento da qualidade da assistência prestada pelas Santas Casas e pelos hospitais filantrópicos levaram à proposição de um programa de apoio financeiro a essas instituições11 Bittar OJNV, Mendes JDV, Magalhães A. Rede Hospitalar no Estado de São Paulo: mapear para regular [monografia]. São Paulo. SESSP; 2011. 54p.. Esse programa foi pactuado e aprovado na Comissão Intergestores Bipartite (CIB) do estado de São Paulo, em 2007 e 2009, tendo como objetivos apoiar financeiramente entidades filantrópicas responsáveis por serviços de saúde hospitalares de referência regional do SUS e aperfeiçoar a organização regional e a qualidade da assistência hospitalar. O número de hospitais participantes foi estabelecido segundo o porte populacional de cada Região de Saúde (RS): até 80.000 habitantes, um hospital; de 80.000 a 200.000 habitantes, dois hospitais; de 200.000 a 400.000 habitantes, três hospitais; e mais de 400.000 habitantes, quatro hospitais, independentemente de estarem sob gestão estadual ou municipal33 São Paulo (Estado). Deliberação CIB nº 232, de 27 de novembro de 2007. Aprovar o Programa Pró-Santa Casa - 2008. Diário Oficial do Estado. 2017 Dez. 11.,44 São Paulo (Estado). Deliberação CIB nº 51, de 17 de setembro de 2009. Nota Técnica sobre o Programa Pró-Santa Casa 2. Este programa substitui o atual Programa Pró-Santa Casa. Diário Oficial do Estado. 2009 Set. 23.. O valor total do incentivo a ser concedido também foi fixado tendo por base os mesmos critérios populacionais: regiões com até 80 mil habitantes, R$ 30.000,00 mensais; regiões com entre 80 e 200 mil habitantes, R$ 100.000,00 mensais; regiões com entre 200 e 400 mil habitantes, R$ 200.000,00 mensais; e regiões com mais de 400 mil habitantes, R$ 450.000,00 mensais33 São Paulo (Estado). Deliberação CIB nº 232, de 27 de novembro de 2007. Aprovar o Programa Pró-Santa Casa - 2008. Diário Oficial do Estado. 2017 Dez. 11.,44 São Paulo (Estado). Deliberação CIB nº 51, de 17 de setembro de 2009. Nota Técnica sobre o Programa Pró-Santa Casa 2. Este programa substitui o atual Programa Pró-Santa Casa. Diário Oficial do Estado. 2009 Set. 23..
Foi pactuado que essas Unidades Hospitalares Filantrópicas (UHF) deveriam apresentar critérios mínimos para serem contempladas por esse incentivo financeiro: mais de 30 leitos hospitalares, demonstrar abrangência regional ou microrregional e conformidade com as normas e os procedimentos com as instâncias de vigilâncias, auditoria e outros. Foram excluídos do programa hospitais que prestassem atendimento predominante a pacientes crônicos e psiquiátricos e aqueles que realizassem apenas assistência ambulatorial. Foram estabelecidas como condições obrigatórias para a inclusão dos hospitais no programa a disponibilização de 100% dos leitos SUS para o órgão de regulação competente e os demais procedimentos ambulatoriais definidos e priorizados pela Comissão Intergestores Regional (CIR) correspondente33 São Paulo (Estado). Deliberação CIB nº 232, de 27 de novembro de 2007. Aprovar o Programa Pró-Santa Casa - 2008. Diário Oficial do Estado. 2017 Dez. 11.,44 São Paulo (Estado). Deliberação CIB nº 51, de 17 de setembro de 2009. Nota Técnica sobre o Programa Pró-Santa Casa 2. Este programa substitui o atual Programa Pró-Santa Casa. Diário Oficial do Estado. 2009 Set. 23..
Os valores financeiros a serem repassados seriam compartilhados entre os gestores: 70% do gestor estadual e 30% dos gestores municipais. A seleção das UHF beneficiadas foi delegada às CIR, assim como a definição dos valores correspondentes de incentivo dentro do limite estabelecido por RS33 São Paulo (Estado). Deliberação CIB nº 232, de 27 de novembro de 2007. Aprovar o Programa Pró-Santa Casa - 2008. Diário Oficial do Estado. 2017 Dez. 11..
A figura 1 mostra a distribuição dos hospitais selecionados, segundo as RS e o Departamento Regional de Saúde (DRS), para 2012.
Distribuição espacial de Unidades Hospitalares Filantrópicas (UHF) do programa de incentivo financeiro por Região de Saúde (RS) e por Departamento Regional de Saúde (DRS), segundo porte hospitalar. Estado de São Paulo, 2012
A descrição e a análise dos indicadores de desempenho hospitalar dessas UHF contempladas pelo incentivo financeiro contribuiriam para direcionar a reformulação dos critérios de eleição adotados. Torna-se, portanto, oportuno investigar o desempenho dessas instituições, reconhecer elementos qualificadores, visando à promoção de ajustes para subsidiar a formulação de novas políticas de incentivos.
O objetivo deste estudo foi analisar o desempenho dos hospitais participantes do programa de incentivo financeiro aos hospitais filantrópicos no estado de São Paulo, em 2012.
Métodos
Foi realizado estudo descritivo de corte transversal com dados secundários. Em 2012, o estado de São Paulo era organizado em 64 RS, todas elas com CIR constituídas. Todas as RS indicaram unidades hospitalares filantrópicas para participar do auxílio financeiro, com exceção da Região Metropolitana de São Paulo, onde apenas uma das seis CIR indicou unidade hospitalar.
O presente estudo contemplou a descrição dos indicadores de todas as UHF incluídas no programa de incentivo financeiro em 2012.
Foram descritos os indicadores de desempenho selecionados e as variáveis de porte hospitalar e porte municipal. A variável porte hospitalar foi organizada segundo o estrato de número de leitos por UHF, adotando-se para a composição dos estratos a orientação indicada pelo Ministério da Saúde (MS)55 Brasil. Coordenação de Assistência Médica e Hospitalar. Secretaria Nacional de Ações Básicas de Saúde. Conceitos e Definições em Saúde. Brasil. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 1997.,66 Brasil. Secretaria Nacional de Ações Básicas de Saúde. Coordenação de Assistência Médica e Hospitalar. Portaria no 2.224, de 6 de dezembro de 2002. Conceitos e Definições em Saúde. Diário Oficial da União. Brasil. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 1977.: pequeno porte, menor ou igual a 50 leitos; médio porte, de 51 a 150 leitos; e grande porte, com mais de 150 leitos (Portaria GM nº 2.224, de dezembro de 2002). A variável porte municipal foi organizada segundo estratos de número de habitantes por município: pequeno porte - menos de 50.000 habitantes; médio porte - de 50.000 a menos de 100.000 habitantes; grande porte - 100.000 habitantes ou mais.
Os indicadores de desempenho descritos foram selecionados segundo os critérios de qualidade estabelecidos por McGlynn77 Mcglynn EA. Selecting Common Measures of Quality and System Performance. Medical Care, California.2003; 41(supl.):39-47.: confiabilidade, factibilidade, usos e limitações. Os indicadores foram classificados segundo as subdimensões, adaptadas do modelo proposto pela Avaliação de Desempenho do Sistema de Saúde (Proadess)88 Viacava F, Almeida C, Caetano R, et al. Uma metodologia de avaliação do desempenho do sistema de saúde brasileiro. Ciênc. Saúde Colet. Associação Brasileira de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. 2004; 9(3): 711-724.. As subdimensões adotadas para análise da dimensão desempenho foram acesso, adequação, efetividade e eficiência. Os indicadores utilizados foram: acesso - número de procedimentos ambulatoriais por mês, número de internações e número de partos por mês; eficiência - taxa de ocupação hospitalar, média de permanência, proporção entre o valor do programa de incentivo e o valor pago pela produção SUS; efetividade - percentual de Internações por Condições Sensíveis à Atenção Básica (ICSAB); e adequação - taxa de mortalidade hospitalar e taxa de cesárea (quadro 1).
As principais fontes de dados foram: CNES99 Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde [internet]. Departamento de Informática do SUS (Datasus) [acesso em 2012 dez 5]. Disponível em: http://www.cnes.datasus.gov.br/.
http://www.cnes.datasus.gov.br/... , Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS)1010 Ministério da Saúde (Brasil). Tabnet [internet]. Departamento de Informática do SUS (Datasus). [acesso em 2017 jun 10]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sia/cnv/qisp.def.
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftoht... , Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS)1111 Ministério da Saúde (Brasil). Tabnet [internet]. Departamento de Informática do SUS (Datasus). [acesso em 2017 jun 10]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sih/cnv/qisp.def.
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftoht... . Os dados demográficos foram obtidos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)1212 Ministério da Saúde (Brasil). Tabnet [internet]. Departamento de Informática do SUS (Datasus). [acesso em 2012 dez 10]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?ibge/cnv/popsp.def.
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftoht... .
As medidas estatísticas utilizadas para a descrição dos indicadores foram: mediana, percentil 25 (P25), percentil 75 (P75). A análise dos indicadores foi realizada segundo o porte hospitalar e o porte municipal.
Os dados utilizados nesse estudo foram obtidos nos sistemas de informação oficiais, disponíveis para acesso público. Os dados relativos às instituições que compõem esse programa de auxílio financeiro foram fornecidos pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SESSP)1313 São Paulo. Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Matriz de Indicadores de Saúde do Estado de São Paulo, 2012 [internet]. [acesso em 2017 maio 5]. Disponível em: http://www.saude.sp.gov.br/ses/perfil/gestor/informacoes-de-saude/matriz-de-indicadores-de-saude-atualizado/.
http://www.saude.sp.gov.br/ses/perfil/ge... , também com acesso público.
Resultados
Do total de 112 UHF, 13 (12%) eram de pequeno porte, 72 (64%) de médio porte e 27 (24%) de grande porte (tabela 1). Os indicadores foram analisados por dimensão segundo o porte hospitalar e o porte municipal. Observou-se que foram indicadas pela CIR uma UHF de pequeno porte, em um município de grande porte, e uma UHF de grande porte, localizada em um município de pequeno porte. No grupo de municípios de porte médio não se encontrou nenhum hospital de pequeno porte beneficiado.
Distribuição de hospitais do programa de incentivo segundo número de leitos, por porte populacional municipal, estado de São Paulo, 2012
Na análise dos indicadores de desempenho, observou-se que os três indicadores de acesso (número de procedimentos ambulatoriais por mês, número de internações por mês e número de partos por mês) apresentaram relação positiva com o porte da UHF e com o porte do município: quanto maior o indicador, maior o porte hospitalar (tabela 2). Essa relação se manteve após análise estratificada por municípios (tabela 3): hospitais de grande porte em municípios grandes apresentaram número de internações por mês 8,5 vezes maior, e indicador de número de partos por mês 8,9 vezes superior.
Distribuição das medianas (percentil 25 - P25 - e percentil 75 - P75) dos indicadores de desempenho por porte hospitalar dos hospitais do programa de incentivo. Estado de São Paulo, 2012
Distribuição das medianas dos indicadores de desempenho segundo porte municipal e porte hospitalar dos hospitais do programa de incentivo, São Paulo, 2012
O percentual de ICSAB, indicador de efetividade, foi 1,7 vezes maior em UHF de pequeno porte (27,7%) em relação às de grande porte (16%). Na análise estratificada por município, essas UHF de pequeno porte em municípios pequenos apresentaram um percentual11 Bittar OJNV, Mendes JDV, Magalhães A. Rede Hospitalar no Estado de São Paulo: mapear para regular [monografia]. São Paulo. SESSP; 2011. 54p., 8 vezes maior de ICSAB em relação aos hospitais de grande porte em municípios grandes. Nos municípios grandes, o desempenho do ICSAB manteve-se pior em UHF de pequeno porte.
Na sub dimensão eficiência, a taxa de ocupação foi mais elevada em UHF de grande porte (79,6%), e o desempenho da UHF de pequeno porte foi 2,1 vezes menor. Com relação às médias de permanência, as diferenças segundo o porte não foram tão expressivas: as UHF de maior porte apresentaram 1,5 vezes maior média de permanência do que as de menor porte, resultado que não se modificou com a análise estratificada por porte de município. A mediana da proporção do valor do benefício com relação ao valor aprovado pela produção SUS do hospital foi quatro vezes maior nos hospitais de pequeno porte em comparação com os de grande porte. Chama atenção que em um quarto dos hospitais de pequeno porte esse valor foi superior a 55%. Após estratificar a análise por porte de municípios, essa diferença se manteve, e observou-se que uma UHF de pequeno porte localizada em um município de grande porte apresentou maior percentual - 57,4%.
No tocante aos indicadores de adequação, a taxa de mortalidade hospitalar observada como menor no grupo de hospitais de pequeno e médio porte aumenta em 2,5 vezes quando esses hospitais se localizam em municípios maiores. Essa mesma relação não foi verificada para o grupo dos hospitais de grande porte. A mediana de taxa de cesárea apresentou menor variação com relação ao porte hospitalar, com variação de 51,5% em pequeno porte, para 57,5% em grande porte. Foi possível observar que a maior de taxa de cesárea ocorreu em uma UHF de grande porte em município de pequeno porte (86,5%).
Discussão
O objetivo desse programa de incentivo para hospitais filantrópicos foi apoiar financeiramente as entidades filantrópicas que realizassem a prestação de serviços de saúde, como hospitais gerais, que se constituíam em referências regionais, além de aperfeiçoar a organização territorial e a qualidade da assistência hospitalar. A estratégia de seleção desses hospitais que seriam contemplados pelo incentivo se deu por meio da indicação das CIR, com o emprego de critérios de eleição pactuados em CIB. A distribuição segundo o porte hospitalar das UHF contempladas pelo programa de incentivo financeiro mostrou que a indicação priorizou os hospitais de médio e grande porte. No entanto, aproximadamente, 12% foram UHF de pequeno porte. As UHF de pequeno porte hospitalar apresentaram desempenho desfavorável, em especial, nos indicadores de acesso, efetividade e eficiência. No Brasil, e também no estado de São Paulo, estudos apontaram piores avaliações de desempenho entre os hospitais de pequeno porte11 Bittar OJNV, Mendes JDV, Magalhães A. Rede Hospitalar no Estado de São Paulo: mapear para regular [monografia]. São Paulo. SESSP; 2011. 54p.,22 Ramos MCA, Cruz LP, Kishima VC, et al. Avaliação de desempenho de hospitais que prestam atendimento pelo sistema público de saúde, Brasil. Rev. Saúde Pública. Universidade de São Paulo, 2015.,1414 Mendes JDV, Cecilio MAM, Osiano VLRL. Hospitais de Pequeno Porte no SUS do estado de São Paulo. Boletim Epidemiológico Paulista. São Paulo. 2014; (11):127-128.,1515 Cunha LF, Bahia L. Construção de hospitais de pequeno porte como política de saúde: um caso emblemático no estado de Maranhão, Brasil. Journal of Management and Primary Health Care, América do Norte. 2014; 6(2): 248-254..
O desempenho observado dos indicadores de acesso foi relacionado positivamente aos portes hospitalar e municipal, ou seja, quanto maior o porte, melhor o desempenho. Esse resultado é esperado e determinado pela estrutura hospitalar existente, ou seja, pela capacidade instalada das UHF de maior porte e pela maior demanda em municípios com porte populacional maior1616 Souza RR, Mendes JDV, Barros, coordenadores. Pactuação em saúde. In: Vinte anos do SUS São Paulo. São Paulo. Secretaria de Estado da Saúde; 2008. p. 69-80.,1717 Bittar OJNV. Produtividade em hospitais de acordo com alguns indicadores hospitalares. Revista de Saúde Pública. Faculdade de Saúde Pública. Universidade de São Paulo. 1996; 30(1):53-60. Entretanto, destaca-se que as UHF gerais de pequeno porte apresentaram uma oferta de serviços muito restrita, que poderia ser mais bem organizada no sistema de serviços de saúde regional. Como já foi apontado em outras publicações, esses hospitais não apresentam economia de escala, existindo, também, relação direta entre a qualidade e a quantidade de procedimentos11 Bittar OJNV, Mendes JDV, Magalhães A. Rede Hospitalar no Estado de São Paulo: mapear para regular [monografia]. São Paulo. SESSP; 2011. 54p.,22 Ramos MCA, Cruz LP, Kishima VC, et al. Avaliação de desempenho de hospitais que prestam atendimento pelo sistema público de saúde, Brasil. Rev. Saúde Pública. Universidade de São Paulo, 2015.,1414 Mendes JDV, Cecilio MAM, Osiano VLRL. Hospitais de Pequeno Porte no SUS do estado de São Paulo. Boletim Epidemiológico Paulista. São Paulo. 2014; (11):127-128.,1515 Cunha LF, Bahia L. Construção de hospitais de pequeno porte como política de saúde: um caso emblemático no estado de Maranhão, Brasil. Journal of Management and Primary Health Care, América do Norte. 2014; 6(2): 248-254..
O indicador de efetividade, percentual de ICSAB, foi maior nos hospitais de pequeno porte, mesmo quando localizados em municípios maiores. Esse resultado foi semelhante ao encontrado em 2013, no universo dos hospitais do estado de São Paulo com menos de 50 leitos, em que o percentual de ICSAB foi de 29%14. A oferta de serviços em hospitais gerais de pequeno porte contribui para internações desnecessárias22 Ramos MCA, Cruz LP, Kishima VC, et al. Avaliação de desempenho de hospitais que prestam atendimento pelo sistema público de saúde, Brasil. Rev. Saúde Pública. Universidade de São Paulo, 2015.. Essa elevada proporção de internações de casos mais simples, muitas vezes desnecessárias, pode apontar que o atendimento de urgência de casos com baixa complexidade, que deveriam ser resolvidos na rede de atenção básica, foi realizado por esses pequenos hospitais. Adicionalmente, o elevado percentual de ICSAB pode indicar falha na qualidade e falta de articulação na Rede Regional de Atenção à Saúde (RRAS)1818 Nedel FB, Facchini LA, Martín-Mateo M, et al. PSF e condições sensíveis à atenção primária. Revista de Saúde Pública. Faculdade de Saúde Pública. Universidade de São Paulo. 2008; (42):1041-1052..
No que se refere aos indicadores de taxa de ocupação, indicador de eficiência, o desempenho de todas as UHF foi inferior ao encontrado para todas as unidades hospitalares com atendimento do SUS no estado em 2013 (67%). Com relação aos hospitais de pequeno porte, o desempenho foi semelhante11. O resultado de pior desempenho desse indicador em hospitais de pequeno porte, em comparação com os de grande porte, corrobora os achados em outros estudos conduzidos no estado de São Paulo11 Bittar OJNV, Mendes JDV, Magalhães A. Rede Hospitalar no Estado de São Paulo: mapear para regular [monografia]. São Paulo. SESSP; 2011. 54p.,22 Ramos MCA, Cruz LP, Kishima VC, et al. Avaliação de desempenho de hospitais que prestam atendimento pelo sistema público de saúde, Brasil. Rev. Saúde Pública. Universidade de São Paulo, 2015.,1414 Mendes JDV, Cecilio MAM, Osiano VLRL. Hospitais de Pequeno Porte no SUS do estado de São Paulo. Boletim Epidemiológico Paulista. São Paulo. 2014; (11):127-128.. A aparente ociosidade de leitos, demonstrada por taxas de ocupação abaixo de 80%, deve ser examinada considerando-se as diferenças existentes entre as diversas clínicas, que refletem a mudança dos perfis demográfico e epidemiológico e a existência de grandes desigualdades regionais, não apenas na oferta total de leitos, mas, também, na sua complexidade e resolubilidade. A economia de escala pode ser encontrada em hospitais com mais de 100 leitos, em decorrência da relação direta entre qualidade e quantidade1616 Souza RR, Mendes JDV, Barros, coordenadores. Pactuação em saúde. In: Vinte anos do SUS São Paulo. São Paulo. Secretaria de Estado da Saúde; 2008. p. 69-80.,1919 Bittar OJNV. Indicadores de qualidade e quantidade em saúde. São Paulo. Revista de Administração em Saúde. Associação Brasileira de Medicina Preventiva e Administração em Saúde. São Paulo. 2001 Jul-Set; 3(12):21-28..
O custo de financiamento de hospitais de pequeno porte é desproporcionalmente elevado em relação à sua baixa eficiência11 Bittar OJNV, Mendes JDV, Magalhães A. Rede Hospitalar no Estado de São Paulo: mapear para regular [monografia]. São Paulo. SESSP; 2011. 54p.,1515 Cunha LF, Bahia L. Construção de hospitais de pequeno porte como política de saúde: um caso emblemático no estado de Maranhão, Brasil. Journal of Management and Primary Health Care, América do Norte. 2014; 6(2): 248-254.. Outro indicador de eficiência utilizado foi o montante do valor destinado pelo programa de incentivo sobre o valor financeiro recebido pela produção SUS, que foi muito superior para as UHF de pequeno porte em comparação com as de grande porte - quatro vezes maior. Em 25% das UHF de pequeno porte, esse recurso correspondeu a mais da metade do valor financeiro recebido pela produção SUS, resultado que indica dificuldades na sustentabilidade dessas UHF e sua dependência do programa de incentivo para a manutenção de sua operação. Adicionalmente, a distribuição das proporções encontradas evidencia a necessidade de rever o critério atual: a distribuição proporcional do número de hospitais contemplados segundo o porte das regiões, fator que poderia ter levado a distorções na indicação de hospitais. Em uma das RS ocorreu a indicação de um hospital filantrópico de pequeno porte, mesmo havendo outros hospitais públicos de maior porte na região, apenas para completar a cota de UHF contempladas por RS. Esse resultado aponta para a fragilidade do critério de eleição das UHF beneficiadas por esse programa.
Com relação aos indicadores de adequação, chamou atenção o pior desempenho em uma UHF de pequeno porte em município grande. A mortalidade institucional encontrada foi duas vezes maior em UHF de pequeno porte, localizada em município de maior porte, em relação às UHF localizadas em município de pequeno porte. Esse resultado não era o esperado. Na avaliação da mortalidade hospitalar, a preocupação deve estar voltada para a identificação dos óbitos que poderiam ser evitados pela atuação do hospital, mas também reflete as características de gravidade da demanda. Em hospitais que apresentam maior complexidade, essa taxa poderia se apresentar elevada devido à gravidade dos casos atendidos2020 Travassos C, Noronha JC, Martins M. Mortalidade hospitalar como indicador de qualidade: uma revisão. Ciênc. Saúde Colet. Associação Brasileira de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. 1999; (4):367-381., no entanto, tal análise deve ser realizada com cautela, uma vez que apenas uma única UHF de pequeno porte foi contemplada com o programa de incentivo em um município de grande porte. As taxas de mortalidade institucional podem ser consideradas como um possível indicador para discriminar serviços com desempenho diferenciado na qualidade do processo de cuidado ao paciente2020 Travassos C, Noronha JC, Martins M. Mortalidade hospitalar como indicador de qualidade: uma revisão. Ciênc. Saúde Colet. Associação Brasileira de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. 1999; (4):367-381.,2121 Martins M, Blais R, Leite IC. Mortalidade hospitalar e tempo de permanência: comparação entre hospitais públicos e privados na região de Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. Cad. saúde pública. Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca. Rio de Janeiro; 2004; 20(supl.2):S268-S282..
Os hospitais de médio porte e grande porte apresentaram maior taxa de cesárea, independentemente do porte do município. Uma das UHF de grande porte localizada em município de pequeno porte apresentou uma taxa de cesárea aproximadamente seis vezes maior do que o que é preconizado pela Organização Mundial da Saúde2222 World Health Organization. Appropriate technology for birth. Lancet. 1985; 326(8452):436-437..
Cabe levantar algumas limitações relativas às fontes de dados utilizadas. A maior delas refere-se ao CNES. Essa fonte de dados nem sempre acompanha as mudanças, alterações que ocorrem nas instituições, o que, como consequência, pode causar distorções em alguns dos indicadores de desempenho selecionados2323 Escrivão JRA. Uso da informação na gestão de hospitais públicos. Ciênc. Saúde Colet. Associação Brasileira de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. 2007; 12(3):655-666..
Outra limitação é relativa aos dados de produção utilizados que foram os aprovados pelo sistema SIA e SIH, podendo haver diferenças entre os procedimentos apresentados pelo prestador e os aprovados, ou seja, é possível que a produção tenha sido superior à obtida2424 Rede Interagencial de Informações para a Saúde - RIPSA. Indicadores Básicos para a Saúde no Brasil. 2.ed. Brasília, DF. 2008..
Atender às necessidades de saúde da população deve ser sempre o objetivo central de um sistema de saúde. Os serviços de saúde são parte integrante do sistema, cujo desempenho influencia as condições de vida e os determinantes de saúde2525 Buss PM, Pellegrini Filho A. Saúde e seus Determinantes Sociais. Physis. Instituto de Medicina Social. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 2007; 17(1):77-93.. O enfrentamento de uma condição de saúde deve ser feito proporcionando às pessoas o ciclo completo de atendimento a ela, ou seja, em rede de atenção à saúde1616 Souza RR, Mendes JDV, Barros, coordenadores. Pactuação em saúde. In: Vinte anos do SUS São Paulo. São Paulo. Secretaria de Estado da Saúde; 2008. p. 69-80.. Os auxílios financeiros aos serviços de saúde precisam considerar o contexto regional, os serviços de saúde existentes e sua forma de organização. O hospital é um ponto de atenção dessas redes, cabendo aos gestores públicos definir o papel da instituição na rede e monitorar a sua atuação.
Um programa de auxílio financeiro a serviços de saúde deve ter como objetivo central melhorar a saúde da população, ponderando sempre as características do território em que o serviço está localizado. O papel que ele deve e precisaria desempenhar seria estabelecido a partir de um planejamento regional que levasse em consideração, além de suas estruturas física e de recursos humanos, o conjunto de oferta de serviços de saúde do território, as condições de acesso e o contexto regional. Dessa forma, conforme proposto pelo programa de incentivo, a indicação das instituições a serem contempladas por esse auxílio financeiro deveria continuar sendo atribuição das CIR. Porém, os critérios de indicação e dos valores financeiros a serem auferidos a cada hospital, assim como a pertinência de financiamento de hospitais de pequeno porte, precisariam ser revistos.
Conclusões
Este resultado corrobora a necessidade de reavaliar programas de incentivo financeiro, principalmente para hospitais de pequeno porte configurados como hospitais gerais. O programa de incentivo financeiro deveria ser direcionado para UHF que apresentassem bom desempenho e articulação com os demais pontos de atenção da rede, em uma relação mais favorável de investimento e qualidade da atenção.
- Suporte financeiro: não houve
Agradecimentos
Aos Professores Doutores Olímpio José Nogueira Viana Bittar, Oziris Simões e Arnaldo Sala pelas contribuições fundamentais agregadas a este trabalho.
Referências
- 1Bittar OJNV, Mendes JDV, Magalhães A. Rede Hospitalar no Estado de São Paulo: mapear para regular [monografia]. São Paulo. SESSP; 2011. 54p.
- 2Ramos MCA, Cruz LP, Kishima VC, et al. Avaliação de desempenho de hospitais que prestam atendimento pelo sistema público de saúde, Brasil. Rev. Saúde Pública. Universidade de São Paulo, 2015.
- 3São Paulo (Estado). Deliberação CIB nº 232, de 27 de novembro de 2007. Aprovar o Programa Pró-Santa Casa - 2008. Diário Oficial do Estado. 2017 Dez. 11.
- 4São Paulo (Estado). Deliberação CIB nº 51, de 17 de setembro de 2009. Nota Técnica sobre o Programa Pró-Santa Casa 2. Este programa substitui o atual Programa Pró-Santa Casa. Diário Oficial do Estado. 2009 Set. 23.
- 5Brasil. Coordenação de Assistência Médica e Hospitalar. Secretaria Nacional de Ações Básicas de Saúde. Conceitos e Definições em Saúde. Brasil. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 1997.
- 6Brasil. Secretaria Nacional de Ações Básicas de Saúde. Coordenação de Assistência Médica e Hospitalar. Portaria no 2.224, de 6 de dezembro de 2002. Conceitos e Definições em Saúde. Diário Oficial da União. Brasil. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 1977.
- 7Mcglynn EA. Selecting Common Measures of Quality and System Performance. Medical Care, California.2003; 41(supl.):39-47.
- 8Viacava F, Almeida C, Caetano R, et al. Uma metodologia de avaliação do desempenho do sistema de saúde brasileiro. Ciênc. Saúde Colet. Associação Brasileira de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. 2004; 9(3): 711-724.
- 9Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde [internet]. Departamento de Informática do SUS (Datasus) [acesso em 2012 dez 5]. Disponível em: http://www.cnes.datasus.gov.br/
» http://www.cnes.datasus.gov.br/ - 10Ministério da Saúde (Brasil). Tabnet [internet]. Departamento de Informática do SUS (Datasus). [acesso em 2017 jun 10]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sia/cnv/qisp.def
» http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sia/cnv/qisp.def - 11Ministério da Saúde (Brasil). Tabnet [internet]. Departamento de Informática do SUS (Datasus). [acesso em 2017 jun 10]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sih/cnv/qisp.def
» http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sih/cnv/qisp.def - 12Ministério da Saúde (Brasil). Tabnet [internet]. Departamento de Informática do SUS (Datasus). [acesso em 2012 dez 10]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?ibge/cnv/popsp.def
» http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?ibge/cnv/popsp.def - 13São Paulo. Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Matriz de Indicadores de Saúde do Estado de São Paulo, 2012 [internet]. [acesso em 2017 maio 5]. Disponível em: http://www.saude.sp.gov.br/ses/perfil/gestor/informacoes-de-saude/matriz-de-indicadores-de-saude-atualizado/
» http://www.saude.sp.gov.br/ses/perfil/gestor/informacoes-de-saude/matriz-de-indicadores-de-saude-atualizado/ - 14Mendes JDV, Cecilio MAM, Osiano VLRL. Hospitais de Pequeno Porte no SUS do estado de São Paulo. Boletim Epidemiológico Paulista. São Paulo. 2014; (11):127-128.
- 15Cunha LF, Bahia L. Construção de hospitais de pequeno porte como política de saúde: um caso emblemático no estado de Maranhão, Brasil. Journal of Management and Primary Health Care, América do Norte. 2014; 6(2): 248-254.
- 16Souza RR, Mendes JDV, Barros, coordenadores. Pactuação em saúde. In: Vinte anos do SUS São Paulo. São Paulo. Secretaria de Estado da Saúde; 2008. p. 69-80.
- 17Bittar OJNV. Produtividade em hospitais de acordo com alguns indicadores hospitalares. Revista de Saúde Pública. Faculdade de Saúde Pública. Universidade de São Paulo. 1996; 30(1):53-60
- 18Nedel FB, Facchini LA, Martín-Mateo M, et al. PSF e condições sensíveis à atenção primária. Revista de Saúde Pública. Faculdade de Saúde Pública. Universidade de São Paulo. 2008; (42):1041-1052.
- 19Bittar OJNV. Indicadores de qualidade e quantidade em saúde. São Paulo. Revista de Administração em Saúde. Associação Brasileira de Medicina Preventiva e Administração em Saúde. São Paulo. 2001 Jul-Set; 3(12):21-28.
- 20Travassos C, Noronha JC, Martins M. Mortalidade hospitalar como indicador de qualidade: uma revisão. Ciênc. Saúde Colet. Associação Brasileira de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. 1999; (4):367-381.
- 21Martins M, Blais R, Leite IC. Mortalidade hospitalar e tempo de permanência: comparação entre hospitais públicos e privados na região de Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. Cad. saúde pública. Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca. Rio de Janeiro; 2004; 20(supl.2):S268-S282.
- 22World Health Organization. Appropriate technology for birth. Lancet. 1985; 326(8452):436-437.
- 23Escrivão JRA. Uso da informação na gestão de hospitais públicos. Ciênc. Saúde Colet. Associação Brasileira de Saúde Coletiva. Rio de Janeiro. 2007; 12(3):655-666.
- 24Rede Interagencial de Informações para a Saúde - RIPSA. Indicadores Básicos para a Saúde no Brasil. 2.ed. Brasília, DF. 2008.
- 25Buss PM, Pellegrini Filho A. Saúde e seus Determinantes Sociais. Physis. Instituto de Medicina Social. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 2007; 17(1):77-93.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
Jan-Mar 2018
Histórico
- Recebido
28 Jun 2017 - Aceito
12 Nov 2017