Gibbs G. Análise de dados qualitativos

Camila Amaral Moreno Freitas Adriano Maia dos Santos Nília Maria de Brito Lima Prado Sobre os autores

‘ANÁLISE DE DADOS QUALITATIVOS’11 Gibbs G. Análise de dados qualitativos. Porto Alegre, Artmed; 2009. É UMA OBRA inclusa na ‘Coleção Pesquisa Qualitativa’, elaborada por Graham Gibbs, traduzida por Roberto Cataldo Costa e organizada em dez capítulos. O livro consiste em um aporte conceitual, teórico e metodológico imprescindível para subsidiar pesquisadores, professores universitários e estudantes de diversas áreas de graduação, desde as ciências sociais às ciências da saúde, em análises de todos os tipos de dados qualitativos.

No primeiro capítulo, o autor aborda a natureza da análise qualitativa e o processo analítico como elementos capazes de transformar os dados, a fim de que se tornem mais claros e compreensíveis. Para o autor, a pesquisa qualitativa lida com um grande volume de dados que possuem significados e simbolismos, portanto, a análise desvela não somente os temas que são discutidos pelos atores sociais, como também permite identificar as diversas formas de organização das comunicações e dos dados. Nesse processo, é importante verificar os tipos de dados e como serão analisados, bem como desenvolver técnicas adequadas.

Além dessas propostas mais gerais, Gibbs retrata a importância da consciência do pesquisador frente às informações que serão extraídas dos dados, a partir de diversas abordagens metodológicas, desde a descrição rica do material coletado até a aplicação de realismo e construtivismo. Tal abordagem propicia compreender o método, para além da técnica, a sua relação com a filosofia, a epistemologia e a metodologia, compreendendo as teorias de base, e a aplicação e, mesmo, a ressignificação do método (ou métodos) conforme as especificidades do objeto da pesquisa. Explicita, também, a adoção de concepções de caráter mais holístico, que têm como pressupostos teóricos o interpretivismo, a hermenêutica, o construtivismo etc. Por fim, o autor aborda nesse capítulo as questões éticas que estão imbricadas na pesquisa qualitativa, que devem ser priorizadas e tratadas antes do início da coleta de dados.

O segundo capítulo trata da preparação dos dados. Inicialmente, o autor aponta para a necessidade de realizar a transcrição dos dados produzidos a partir de entrevistas, observações ou notas de campo. Para tanto, ressalta que o processo de transcrição demanda tempo e esforço, e deve ser feito manualmente (pelo próprio pesquisador ou por um transcritor) ou a partir de um software que faz reconhecimento de caracteres derivados de entrevistas exploratórias abertas, questões abertas de questionários, textos de jornais, revistas, blogs e sítios da internet, a partir de arquivos de áudio, transcrição de imagens, dados obtidos de redes virtuais, correios eletrônicos, que permitem sistematizar categorias para análise dos dados com maior confiabilidade quanto à preservação do sentido original, ao minimizar equívocos.

Os temas escolhidos estão na ordem do dia, tendo em vista que, na literatura científica, tem-se muitas discussões a respeito da pesquisa qualitativa com o uso de softwares para apoiar o processo, mas ainda é incipiente o detalhamento dos processos metodológicos e das técnicas usadas, integradas às tecnologias com o devido embasamento teórico.

No terceiro capítulo, Gibbs enfatiza a redação como etapa fundamental durante a coleta de dados, e não apenas ao final do trabalho. Iniciar esse processo precocemente, segundo o autor, facilita o desenvolvimento de ideias sobre o que os dados indicam, de que forma eles podem ser analisados e, ainda, quais significados eles carregam. Entre os tipos de redação utilizados na pesquisa qualitativa, o autor aponta quatro prioritários: os diários de pesquisa; as discussões com outros pesquisadores, que agregam informações pertinentes e outros pontos de vista, que contribuam para aprimorar o processo de análise; as notas de campo; e, por fim, os memorandos.

O quarto capítulo apresenta a Codificação e a Categorização temáticas. A codificação, ao indexar o texto, permite que o pesquisador analise os dados de forma estruturada. Para tanto, Gibbs aponta que é importante desenvolver códigos coerentes. Para se codificar, é imprescindível desenvolver um olhar singular e intenso, uma vez que os códigos apresentam uma leitura analítica e teórica acerca do texto examinado. Com os dados codificados, procede-se à categorização, para agrupar o texto que foi codificado e uma metodologia que se utiliza dos aspectos simbólicos e polissêmicos implícitos no discurso, que se podem desvendar, organizar, agrupar e interpretar, a partir das categorias que vão surgindo e sendo reorganizadas durante a análise.

O quinto capítulo apresenta a análise de biografias e narrativas. As narrativas carregam o sentido de determinados eventos na vida das pessoas, e, para o autor, as pessoas podem ser incentivadas a contar suas histórias, especialmente quando o assunto diz respeito a algum evento marcante da vida. As biografias, são produtos mais metódicos e oriundos de solicitações mais específicas, mas também trazem aspectos da vida. Gibbs traz que, ao analisar as narrativas e as biografias, é possível identificar eventos que se sucedem ou que estão atrelados, assim, estas podem ser categorizadas como romances, comédias, tragédias e sátiras.

Após a transcrição e a codificação de dados, estes podem ser organizados hierarquicamente, como mostra o sexto capítulo. Essa forma de organização permite não só manter o controle sobre os dados que são codificados, mas, também, realizar análises entre as próprias hierarquias criadas, minimizar a possibilidade de duplicação de código e auxiliar na percepção de formas de interpretar os dados. Para o autor, é importante voltar às transcrições durante o processo de hierarquização, a fim de assegurar que todos os dados estejam codificados e que se incorporem novos códigos. Após a hierarquização, segue-se à realização de análises comparativas. O uso de tabelas na pesquisa qualitativa facilita uma comparação sistemática do conjunto de dados. Nesse momento, o pesquisador começa a desenvolver explicações e gerar modelos explicativos, que trazem traços importantes do fenômeno.

O sétimo capítulo apresenta a qualidade analítica e ética na pesquisa. De acordo Gibbs, a qualidade dos resultados é marcante em pesquisas qualitativas. A reflexividade que está presente no pesquisador qualitativo faz com que este não seja apenas um observador objetivo investigando um fenômeno, mas que reflita na pesquisa o lugar que ocupa, o que não significa que a pesquisa qualitativa não seja dotada de qualidade. Assim, o autor aponta que as pesquisas qualitativas requerem investimentos metodológicos que assegurem a qualidade da análise de dados. Entre eles, citam-se técnicas de validação, como a triangulação de dados, validação dos entrevistados, comparações e verificação das transcrições e dos códigos. No que concerne à qualidade ética na pesquisa, reforça a necessidade de minimizar ou eliminar danos que possam ocorrer aos participantes.

O oitavo capítulo aborda o uso dos Softwares de Análise de Dados Qualitativos (SADQ), como uma forma eficiente, sistemática e coerente de se gerenciar os dados. É possível, com esse recurso, contar frequência, fazer buscas e analisar os dados ali dispostos, de forma eficiente, consistente e sistemática do gerenciamento de dados, para busca e recuperação da informação.

O banco de dados obtido a partir de um SADQ permite ao pesquisador mais possibilidades que um banco de dados comum, mais facilidade de acesso aos textos codificados, facilita a seleção de trechos específicos, entre outros benefícios. Entres os SADQs mais utilizados por alunos e pesquisados, Gibbs destaca três: Atlas.ti, MAXqda e o NVivo. A escolha do software deve ser baseada no propósito das análises que serão realizadas.

No nono capítulo, Gibbs discute o uso de softwares para busca de palavras e expressões como um aliado do pesquisador, uma vez que diminuem a possibilidade de ocorrência de vieses enquanto se codifica ou se faz leitura exaustiva e análises dos dados. A busca permite ao pesquisador conhecer os dados, identificar trechos semelhantes, verificar se todo o texto está codificado e ainda realizar busca temática. Ainda nesse capítulo, o autor descreve os atributos como dados variáveis relacionados ao contexto e ao indivíduo, que permitem ao pesquisador controlar acessos e buscas através de códigos. Em síntese, após a codificação e a organização em categorias e subcategorias, os processos de busca e recuperação da informação, de busca das citações e falas dos entrevistados, de inferência, de interpretação e de generalização das fontes ficam mais facilitados para a análise qualitativa.

Por fim, o décimo capítulo, intitulado ‘Agrupando tudo’, traz uma breve síntese do que foi apresentado e discutido nos capítulos anteriores. Consoante com os argumentos aqui tratados, o leitor poderá observar em cada capítulo e, sobretudo, nas conclusões de cada um deles, que o foco das indagações é integralmente atingido. Cada capítulo revela as peculiaridades relativas à pesquisa qualitativa, a riqueza da dinâmica e do confronto com a realidade complexa, o aprimoramento e a sistematização do pensamento e dos construtos teóricos e metodológicos necessários para a clarificação e aproximação do pesquisador com o objeto de estudo.

Iniciativas dessa natureza contribuem, sem dúvida, para o estímulo ao debate em torno das alternativas analíticas, teórica e metodologicamente fundamentadas, ampliando o desvelamento do entendimento subjetivo e intersubjetivo, ao tempo que gera reflexões acerca dos conhecimentos e de como estes podem contribuir para o avanço da ciência e da técnica e para um cuidado mais específico com os indivíduos, os grupos e as coletividades, o objeto primordial da pesquisa qualitativa.

Referência

  • 1
    Gibbs G. Análise de dados qualitativos. Porto Alegre, Artmed; 2009.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2020
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