Desigualdades macrorregionais na atenção primária ao Diabetes Mellitus: comparação dos três ciclos do PMAQ-AB

Clarissa Galvão da Silva Lopes Thiago Augusto Hernandes Rocha Érika Bárbara Abreu Fonseca Thomaz Aline Sampieri Tonello Núbia Cristina da Silva Rocha Karlinne Maria Martins Duarte Rejane Christine de Sousa Queiroz Sobre os autores

RESUMO

O objetivo do estudo foi identificar desigualdades macrorregionais relacionadas à estrutura e ao processo de trabalho para o atendimento do Diabetes Mellitus (DM) na Atenção Primária à Saúde (APS) ao longo dos três ciclos do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) no Brasil. Trata-se de um estudo ecológico, longitudinal, de abrangência nacional, com dados secundários dos três ciclos do PMAQ-AB. Os dados foram comparados entre as macrorregiões brasileiras utilizando o teste t com a correção de Bonferroni. As regiões Norte e Nordeste apresentaram os menores percentuais de adequação nos itens de estrutura: dependências da unidade (<74%), acessibilidade ao cadeirante (<63%), horário especial de funcionamento (<16%), equipe ampliada (<12%) e insumos (<89%) em todos os ciclos do PMAQ-AB, quando comparadas às demais regiões. Já os itens relacionados ao processo de trabalho apresentaram pouca variação entre as regiões, e os que apresentaram percentuais médios ≤ 75% de adequação foram: agenda especializada (41%, 33%, 41%), apoio matricial (58%, 72%, 70%), oferta e resolubilidade de ações (62%, 64%, 75%) e educação permanente (35%, 42%, 58%). Ainda existe a necessidade de investimentos na estrutura e em melhorias no processo de trabalho das equipes, principalmente nas macrorregiões Norte e Nordeste.

PALAVRAS-CHAVE
Diabetes Mellitus; Avaliação em saúde; Estrutura dos serviços; Atenção Primária à Saúde

Introdução

O Diabetes Mellitus (DM) é considerado um grave problema de saúde pública. A sua prevalência tem aumentado devido a uma combinação de vários fatores, entre eles, a mudança no estilo de vida, com predominância de dietas hipercalóricas, e o processo de envelhecimento acelerado da população, principalmente nos países em desenvolvimento11 Sociedade Brasileira de Diabetes. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2017-2018. São Paulo: Editora Clannad; 2017.. O aumento da morbidade e a elevação das taxas de mortalidade relacionados ao DM fizeram com que essa Doença Crônica Não Transmissível (DCNT) fosse incluída como um dos eixos prioritários na Atenção Primária à Saúde (APS)22 Arruda GO, Schmidt DB, Marcon SS. Internações por diabetes mellitus e a Estratégia Saúde da Família, Paraná, Brasil, 2000 a 2012. Ciênc. Saúde Colet. 2018; 23(2):543-55..

A APS exerce um papel fundamental na prevenção das complicações agudas e crônicas ocasionadas pela doença e na diminuição do número de hospitalizações e óbitos22 Arruda GO, Schmidt DB, Marcon SS. Internações por diabetes mellitus e a Estratégia Saúde da Família, Paraná, Brasil, 2000 a 2012. Ciênc. Saúde Colet. 2018; 23(2):543-55.. Dessa forma, o Sistema Único de Saúde (SUS) deve priorizar políticas e diretrizes voltadas para o cuidado e o controle da doença, levando em consideração as características regionais do País e as necessidades de saúde de suas populações33 Albuquerque MV, Viana ALD, Lima LD, et al. Desigualdades regionais na saúde: mudanças observadas no Brasil de 2000 a 2016. Ciênc. Saúde Colet. 2017 [acesso em 2020 jul 27]; 22(4):1055-1064. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232017002401055&lng=en.
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. Nesse contexto, a organização brasileira em regiões e em redes de saúde ganhou destaque frente à complexidade na prestação de serviços de saúde, tendo em vista as desigualdades regionais e sociais, as competências federal, estadual e municipal e, ainda, a participação de setores privados e não governamentais na elaboração e entrega dos serviços para a sociedade44 Bousquat A, Giovanella L, Campos EMS, et al. Primary health care and the coordination of care in health regions: Managers’ and users’ perspective. Ciênc. Saúde Colet. 2017; 22(4):1141-54..

Assim, a avaliação dos serviços de saúde se torna imprescindível para o monitoramento e a organização das políticas de saúde. Nesse contexto, o Ministério da Saúde implantou, em 2011, o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB), a fim de monitorar e avaliar os resultados alcançados pela APS no território brasileiro, com o objetivo de melhorar o acesso e a qualidade desses serviços55 Brasil. Ministério da Saúde, Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde. Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade – PMAQ. Brasília, DF: MS; 2015.. Até o momento, já foram realizados 3 ciclos do programa. O 1º ciclo em 2011/12, o 2º ciclo em 2013/14 e o 3º ciclo em 2015/17.

Estudos utilizando os dados do PMAQ-AB vêm sendo desenvolvidos com temas como o rastreamento do câncer de colo uterino66 Barcelos MRB, Lima RCD, Tomasi E, et al. Qualidade do rastreamento do câncer de colo uterino no Brasil: avaliação externa do PMAQ. Rev. Saúde Pública. 2017; (51):1-13., a qualidade da atenção pré-natal na rede básica de saúde77 Tomasi E, Fernandes PAA, Fischer T, et al. Qualidade da atenção pré-natal na rede básica de saúde do Brasil: Indicadores e desigualdades sociais. Cad. Saúde Pública. 2017. [acesso em 2020 nov 20]; 33(3):1-11. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2017000305001&lng=es&nrm=iso&tlng=pt.
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e relativos à organização do cuidado em saúde para as condições crônicas, tais como diabetes, hipertensão, tuberculose e hanseníase88 Garnelo L, Lucas ACS, Parente RCP, et al. Organização do cuidado às condições crônicas por equipes de Saúde da Família na Amazônia. Saúde debate. 2014; 38(esp):158-72.. Especificamente com relação ao DM, destacam-se o estudo de Neves et al.99 Neves RG, Duro SMS, Muñiz J, et al. Estrutura das unidades básicas de saúde para atenção às pessoas com diabetes: Ciclos I e II do programa nacional de melhoria do acesso e da qualidade. Cad. Saúde Pública. 2018 [acesso em 2020 set 20]; 34(4):e00072317. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2018000405003&lng=pt.
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, que descreveu a estrutura necessária às pessoas com DM atendidas na APS com dados dos dois primeiros ciclos do PMAQ-AB, e o de Tomasi et al.1010 Tomasi E, Cesar MADC, Neves RG, et al. Diabetes care in Brazil program to improve primary care access and quality-PMAQ. J. ambul. care manage. 2017; 40(2):S12-23., que buscou descrever a adequação da estrutura da APS e do processo de trabalho, bem como aspectos do cuidado percebidos pelos usuários com DM. Com relação ao 3º ciclo do PMAQ-AB, ainda não foi conduzido nenhum estudo com os dados referentes à avaliação da estrutura e do processo de trabalho voltados para o enfretamento do DM dentro da APS.

Sabendo que o custeio da APS foi modificado pela Portaria nº 2.979/20191111 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.979, de 12 de novembro de 2019. Institui o Programa Previne Brasil, que estabelece novo modelo de financiamento de custeio da Atenção Primária à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde, por meio da alteração da Portaria de Consolidação no 6/GM/MS, de 28 de setembro de 2017. Diário Oficial da União. 12 Nov 2019. e que a Emenda Constitucional (EC) 95/20161212 Brasil. Constituição, 1988. Emenda Constitucional nº 95, de 15 de dezembro de 2016. Altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências. Diário Oficial da União. 15 Nov 2016. diminuiu o financiamento da saúde, as desigualdades regionais na saúde podem se tornar ainda mais evidentes. As regiões Norte e Nordeste são as mais afetadas no atendimento da APS, dadas as fortes desigualdades regionais nas condições de vida e de oferta de serviços de saúde, como a elevada concentração de profissionais e de ações de saúde nos espaços urbanos; insuficiência de recursos, barreiras geográficas e dificuldade de integração entre os serviços33 Albuquerque MV, Viana ALD, Lima LD, et al. Desigualdades regionais na saúde: mudanças observadas no Brasil de 2000 a 2016. Ciênc. Saúde Colet. 2017 [acesso em 2020 jul 27]; 22(4):1055-1064. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232017002401055&lng=en.
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,1313 Garnelo L, Lima JG, Rocha ESC, et al. Acesso e cobertura da Atenção Primária à Saúde para populações rurais e urbanas na região norte do Brasil. Saúde debate. 2018 [acesso em 2021 jan. 21]; 42(esp1):81-99. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-11042018000500081&lng=en&nrm=iso&tlng=pt.
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Nesse contexto, reconhecendo que o território brasileiro possui profundas desigualdades regionais decorrentes de heranças históricas, de estrutura política e econômica33 Albuquerque MV, Viana ALD, Lima LD, et al. Desigualdades regionais na saúde: mudanças observadas no Brasil de 2000 a 2016. Ciênc. Saúde Colet. 2017 [acesso em 2020 jul 27]; 22(4):1055-1064. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232017002401055&lng=en.
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, faz-se necessária a condução de estudos longitudinais e de abrangência nacional que possibilitem a análise da evolução da situação da APS no atendimento ao portador de DM nas macrorregiões geopolíticas do Brasil. Dessa forma, o presente estudo teve como objetivo identificar as desigualdades macrorregionais relacionadas à estrutura e ao processo de trabalho para o atendimento do DM na APS ao longo dos três ciclos do PMAQ-AB no Brasil.

Material e métodos

Trata-se de um estudo ecológico, longitudinal, de abrangência nacional, baseado em dados secundários da avaliação externa dos três ciclos do PMAQ-AB (2012, 2014 e 2017)1414 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ): manual instrutivo. Brasília, DF: MS; 2012. relacionados à estrutura das Unidades Básicas de Saúde (UBS) e ao processo de trabalho das equipes de Atenção Básica (eAB). Os dados foram adquiridos no banco de dados do Ministério da Saúde, com os microdados de cada ciclo avaliativo, disponíveis gratuitamente em meio eletrônico no endereço: http://aps.saude.gov.br/ape/pmaq.

Este estudo fez parte da pesquisa ‘Avaliação externa e censo das Unidades Básicas de Saúde – PMAQ-AB’, realizada pelo Ministério da Saúde sob coordenação dos seguintes consórcios institucionais: Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Universidade Federal do Piauí (UFPI), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e Universidade Federal de Sergipe (UFS).

Os dados utilizados foram referentes aos dois módulos da avaliação externa do PMAQ-AB: o módulo I, com dados sobre a estrutura das UBS, e o módulo II, relacionado ao processo de trabalho das eAB. As informações foram coletadas por entrevistadores treinados através de entrevista, com auxílio de tablets para o armazenamento dos dados, em visita à UBS, acompanhados por um profissional da eAB para observação in loco da existência de vários itens na UBS. As questões relativas ao processo de trabalho foram respondidas por um profissional das equipes que aderiram ao PMAQ-AB1414 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ): manual instrutivo. Brasília, DF: MS; 2012..

No 1º Ciclo, a avaliação externa ocorreu no período de maio de 2012 a abril de 2013, com dados obtidos de 13.919 UBS e 17.202 eAB. O 2º Ciclo aconteceu no período de dezembro de 2013 a março de 2014, com dados de 24.055 UBS e de 29.778 eAB. E, por fim, o 3º Ciclo, que se deu no período de maio a setembro de 2018, com 38.865 eAB distribuídas em 30.346 UBS.

Para o presente estudo, as variáveis foram selecionadas em razão de suas relações com o atendimento às pessoas com DM coletadas nos três ciclos avaliativos. Posteriormente, foi realizada a agregação de variáveis para a construção de cada indicador, sumarizado no quadro 1, referente à estrutura da UBS e ao processo de trabalho das eAB.

Quadro 1
Variáveis de estrutura da UBS e de processo de trabalho das eAB para o atendimento ao DM na APS

A unidade de análise foi a UBS. Para aquelas que possuíam mais de uma equipe, foi utilizada a média percentual das variáveis do processo de trabalho de todas as equipes. Para a análise estatística dos dados, foi utilizado o software IBM SPSS Statistics 21. Na análise, foram agregados os indicadores de estrutura e processo de trabalho de cada ciclo, para o nível da UBS, a partir do código do Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES). Em seguida, realizou-se o empilhamento dos dados dos três ciclos em um único banco de dados, para o nível da unidade da federação, e foram apresentadas as médias e os Desvios-Padrão (DP) por macrorregiões geográficas do País.

Para as comparações das médias entre as macrorregiões, ao longo dos três ciclos, utilizou- se o teste t com a correção de Bonferroni, com nível de significância de 5%. Na interpretação das tabelas, as diferenças entre as proporções entre as macrorregiões brasileiras Norte (N), Nordeste (NE), Centro-Oeste (CO), Sudeste (SE) e Sul (S) foram apresentadas através do uso de diferentes letras alfabéticas sobrescritas por linhas, logo após cada média. Assim, letras iguais indicam a ausência de diferença estatisticamente relevante entre as médias das macrorregiões geográficas, e letras diferentes indicam diferenças estatisticamente significantes entre elas1515 Rocha TAH. Gestão de recursos humanos e resultados em saúde: um estudo da atenção primária à saúde brasileira entre 2012-2014. [tese]. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais; 2019. 219 p..

Para a elaboração do material cartográfico, utilizou-se o software Quantum Gis versão 3.10, disponibilizado de forma gratuita pelos seus servidores. A distribuição espacial dos dados foi realizada a partir da classificação de adaptação de Hartz1616 Hartz ZMA. Avaliação em Saúde: dos modelos conceituais à prática na análise da implantação de programas. Rio de Janeiro: Fiocruz; 1997., categorizada em: adequada, quando verificada a presença de 80 a 100% dos itens na UBS; parcialmente adequada (60 a 79% dos itens); pouco adequada (40 a 59% dos itens); e inadequada (menos de 40% dos itens). As macrorregiões brasileiras foram apresentadas segundo as variáveis de estrutura da UBS e de processo de trabalho das eAB em cada um dos ciclos do PMAQ-AB.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Pelotas sob o parecer número 38/12, em 10 de maio de 2012, e seguiu integralmente os preceitos éticos preconizados pela Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.

Resultados

Dos dez itens analisados referentes à estrutura da UBS, os indicadores sobre a oferta de horário especial e equipe ampliada apresentaram os menores percentuais de adequação nos três ciclos do PMAQ-AB, e em todas as macrorregiões.

Observou-se que 50% das UBS do Brasil encontravam-se com dependências adequadas no 1º ciclo, sendo as menores proporções nas regiões Norte (38%) e Nordeste (42%), enquanto as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste apresentaram-se estatisticamente semelhantes (55%, 54%, 54%, respectivamente). No 2º ciclo, as UBS brasileiras alcançaram 75% de adequação, destacando-se a macrorregião Sul (82%), que também se manteve no 3º ciclo, com maior percentual de adequação (72%) entre as macrorregiões (tabela 1).

Tabela 1
Média (%) e Desvio-Padrão (DP) das variáveis de estrutura das UBS para o atendimento ao DM, agregadas por macrorregião. Brasil, 2012, 2014 e 2017

No 1º ciclo do PMAQ-AB, apenas um terço (34%) das UBS tinha estrutura adequada para acessibilidade ao cadeirante. Esse item, no entanto, apresentou melhores médias nos dois ciclos seguintes, alcançando no 3º ciclo 68% de adequação das UBS brasileiras (tabela 1). Quando se analisa por macrorregiões, percebe-se que os menores percentuais aparecem no Norte (18%, 41% e 53%) e no Nordeste, nos três ciclos (22%, 46% e 63%), respectivamente; enquanto a região Sul apresentou os maiores percentuais (43%; 71% e 81%) (tabela 1).

Os itens com percentuais médios mais baixos em todos os ciclos do PMAQ-AB no Brasil foram: oferta de horário especial, com diferenças estatisticamente significantes entre todas as macrorregiões, especialmente no 3º ciclo (SE, 25%; N, 16%; NE, 13%; S, 11% e CO, 9%), e equipe ampliada, que apresentou, no 3º ciclo, médias semelhantes para as regiões N e NE (4%), e estatisticamente diferentes para as regiões CO (5%), SE (12%) e S (14%) (tabela 1).

Nos três ciclos do PMAQ-AB, a maior oferta de UBS com 8 horas de funcionamento por dia foi encontrada na região Sudeste (82%, 89% e 99%), assemelhando-se, apenas no 3º ciclo, à região Sul. Enquanto isso, a região Nordeste apresentou as menores médias (52%, 66% e 98%), assemelhando-se às regiões Sul e CO, no 2º ciclo. Com relação aos insumos para o atendimento ao paciente com DM, destacaram-se, positivamente, as regiões S e SE no 1º ciclo (92%), Sul no 2º ciclo (95%) e Centro-Oeste, com apenas 86% de adequação, no 3º ciclo. Para essa variável, a região Norte apresentou as piores médias (83%, 84% e 79%) (tabela 1).

Na variável equipamentos e materiais para o atendimento à pessoa com DM, houve um aumento no percentual médio ao longo dos três ciclos (44%, 67% e 75%), porém, as regiões Norte (70%) e Nordeste (72%) não alcançaram a média nacional no último ciclo. A variável existência de Agentes Comunitários de Saúde (ACS) apresentou percentuais elevados em todas as macrorregiões, nos três ciclos do PMAQ-AB (tabela 1).

A figura 1 apresentou a distribuição espacial das variáveis de estrutura das UBS, nos 3 ciclos. Apenas a variável dias de funcionamento se manteve adequada para todos os ciclos, em todas as regiões. Em contrapartida, as variáveis horário especial e equipe ampliada permaneceram inadequadas para todas as regiões, em todos os ciclos. Ressalta-se a melhoria da classificação das variáveis acessibilidade ao cadeirante, sinalização das ações e dos serviços e hora de funcionamento no decorrer dos três ciclos.

Figura 1
Distribuição espacial das variáveis de estrutura das Unidades Básicas de Saúde. Brasil, 2012, 2014 e 2017

As variáveis de processo de trabalho avaliadas foram apresentadas na tabela 2. Os indicadores planejamento da equipe e oferta e resolubilidade de ações apresentaram pouca variação de percentuais médios entre as regiões nos três ciclos. Destacaram-se os indicadores agenda especializada e educação permanente com percentuais que se mantiveram abaixo de 60% em todas as regiões ao longo dos ciclos.

Tabela 2
Média (%) e Desvio-Padrão (DP) das variáveis de processo de trabalho das eAB para o atendimento ao DM, agregadas por macrorregião. Brasil, 2012, 2014 e 2017

As variáveis planejamento e apoio institucional se comportaram de forma bastante similar em todas as macrorregiões do Brasil, sem diferenças estatisticamente significantes nos três ciclos PMAQ-AB (tabela 2), o que também pode ser observado com relação a: agenda especializada, no 3º ciclo; oferta e resolubilidade de ações, no 1º ciclo; e atenção à pessoa com DM, no 1º e no 2º ciclos.

Com relação ao indicador ações educativas, no 1º ciclo, as regiões Norte, Nordeste e Sudeste apresentaram os maiores valores percentuais (76%, 74% e 74%, respectivamente), sem diferenças estatísticas entre elas. Já no 3º ciclo, foram observados valores próximos entre todas as regiões, variando de 95% a 96% (tabela 2).

Esta pesquisa demonstrou que a variável planejamento da equipe teve o melhor desempenho em todas as regiões, nos três ciclos PMAQ-AB, atingindo o nível adequado. Apoio institucional e atendimento de urgência saíram de parcialmente adequados, no 1º ciclo, em todo o País, para adequados, no 2º ciclo, e mantiveram-se assim no 3º ciclo. As ações educativas também evoluíram em todo o País, atingindo o patamar adequado no 3º ciclo (figura 2).

Figura 2
Distribuição espacial das variáveis de processo de trabalho das Unidades Básicas de Saúde. Brasil, 2012, 2014 e 2017

A variável apoio matricial evoluiu de pouco adequado ou inadequado no 1º ciclo para parcialmente adequado no 3º ciclo. O mesmo não aconteceu com as variáveis Educação permanente e Agenda especializada, que se mantiveram pouco adequadas no 3º ciclo (figura 2). Destaca-se, ainda, que a variável organização dos prontuários foi a única que piorou ao longo dos três ciclos, antes, com a presença de 80% a 100%, e, em 2017, atingiu de 60% a 79% dos itens, em todas as regiões (figura 2).

Discussão

Os achados mostraram que os indicadores de estrutura das UBS para o atendimento às pessoas com DM foram heterogêneos na comparação entre as macrorregiões brasileiras. As variáveis de estrutura se apresentaram, mais frequentemente, inadequadas ou pouco adequadas, especialmente no 1º ciclo PMAQ-AB, quando comparadas às de processo de trabalho. As variáveis ‘horário especial’ e ‘equipe especializada’ permaneceram inadequadas ao longo dos três ciclos em todo o território nacional, enquanto a variável ‘dias de funcionamento’ apresentou os melhores resultados e se manteve adequada em todos os períodos e em todas as regiões. A variável ‘hora de funcionamento’ foi a que apresentou a maior divergência no 1º ciclo do PMAQ-AB, com diferenças estatisticamente significantes, mas alcançando adequação em todas as regiões no 3º ciclo.

A maioria das variáveis relativas ao processo de trabalho das equipes para o atendimento de pessoas com DM apresentou percentuais médios acima de 60%, principalmente no 3º ciclo, com poucas diferenças entre as regiões. Apenas ‘apoio matricial’, ‘agenda especializada’ e ‘educação permanente’ apresentaram resultados inadequados ou pouco adequados no decorrer dos ciclos. Ressaltam-se, ainda, maiores percentuais de adequação para o atendimento às pessoas portadoras de DM nas regiões Sul e/ou Sudeste, e menores nas regiões Norte e/ou Nordeste.

Esses achados demonstram que a incorporação das recomendações normativas11 Sociedade Brasileira de Diabetes. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2017-2018. São Paulo: Editora Clannad; 2017.,1717 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: diabetes mellitus. v. 36. Brasília, DF: MS; 2013., associadas ou não a uma estrutura inadequada, ainda permanecem distantes no trabalho das eAB. Descobertas semelhantes foram encontradas, também, em estudo com dados do PMAQ-AB entre 2012 e 2018, que avaliou a estrutura e o processo de trabalho no cuidado à criança, assinalando maiores percentuais de adequação ao processo de trabalho e maiores deficiências estruturais, com heterogeneidade entre as regiões1818 Santos DMAD, Alves CMC, Rocha TAH, et al. Estrutura e processo de trabalho referente ao cuidado à criança na Atenção Primária à Saúde no Brasil: estudo ecológico com dados do Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica 2012-2018. Epidemiol. Serv. Saúde. 2021; 30:(1)..

Os pontos fortes da pesquisa incluíram o número amostral elevado, com grande poder estatístico, visto que, a cada ciclo, houve maior adesão das eAB ao processo avaliativo e, consequentemente, maior número de UBS avaliadas. Trata-se, ainda, de um estudo ecológico envolvendo todo o território brasileiro, que permitiu a comparação das condições estruturais e de processo de trabalho das UBS entre as macrorregiões brasileiras e em diferentes momentos das condições de saúde brasileiras.

As limitações do estudo incluem a utilização de dados secundários com a possibilidade de registro inadequado dos dados nos diversos bancos (viés de aferição), mudanças nas formulações das perguntas nos instrumentos ao longo dos três ciclos do PMAQ-AB, indução das equipes e superestimação dos resultados, visto que a adesão ao PMAQ-AB era voluntária e pode ter sido influenciada pela adesão seletiva de equipes e unidades de saúde mais bem organizadas. Outra limitação foi o uso apenas dos indicadores de estrutura e processo de trabalho, sem análise dos indicadores dos resultados, que refletem a avaliação da assistência prestada pela APS aos usuários.

Como o DM exige uma organização de políticas públicas que atuem de forma efetiva na atenção aos seus portadores e familiares e que facilitem o acesso aos serviços de saúde, a necessidade de avaliação dos serviços torna-se imprescindível. Assim, a avaliação da qualidade deve ser realizada a partir da utilização de indicadores representativos dos aspectos estrutura, processo e resultado1919 Donabedian A. Basic approaches to assessment: structure, process and outcome. In: Explorations in Quality Assessment and Monitoring. Ann Arbor, Michigan: Health Adiministration Press. 1980; (I):77-125., o que condiz com as prerrogativas do PMAQ-AB, programa considerado uma das estratégias do governo federal para a melhoria do atendimento aos usuários da APS e como importante ferramenta de gestão.

As maiores barreiras de acesso ao cuidado de pessoas com DM estão nas regiões Norte e Nordeste, como foi observado para a maioria dos indicadores estruturais, com exceção do indicador ‘dias de funcionamento’. O estudo que buscou analisar como transformações socioeconômicas, de oferta e complexidade de serviços de saúde expressam-se nas regiões também destacou as regiões Norte e Nordeste como as mais atingidas, tanto pelas fortes desigualdades nas condições de vida quanto na oferta de serviços de saúde33 Albuquerque MV, Viana ALD, Lima LD, et al. Desigualdades regionais na saúde: mudanças observadas no Brasil de 2000 a 2016. Ciênc. Saúde Colet. 2017 [acesso em 2020 jul 27]; 22(4):1055-1064. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232017002401055&lng=en.
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As dependências da UBS nos dois primeiros ciclos mostraram-se 50% e 75% adequadas. No mesmo período, um estudo demonstrou aumento na proporção de UBS com materiais (3,9% para 7,8%) e estrutura física (15,3% para 23,3%) adequados para a atenção às pessoas com diabetes, porém, ainda considerados insuficientes1010 Tomasi E, Cesar MADC, Neves RG, et al. Diabetes care in Brazil program to improve primary care access and quality-PMAQ. J. ambul. care manage. 2017; 40(2):S12-23..

Em geral, a estrutura das UBS e o processo de trabalho apresentam maior adequação em municípios de grande porte populacional, dotados com maiores investimentos, resultando em maior capacidade de manutenção e sustentabilidade2020 Machado PMDO, Lacerda JTD, Colussi CF, et al. Estrutura e processo de trabalho para as ações de alimentação e nutrição na Atenção Primária à Saúde no Brasil, 2014. Epidemiol. Serv. Saúde. 2021; 30(2): e2020635.. Discute-se aqui a necessidade de se analisar melhor a distribuição do conjunto dos recursos públicos aplicados no SUS, visto que os diferentes estados e municípios possuem níveis de receitas próprias bem distintos e apresentam valores bem diferenciados nas aplicações per capita com recursos próprios, o que acaba influenciando a distribuição das transferências federais para a saúde entre as diferentes macrorregiões brasileiras2121 Piola SF. Transferências de Recursos Federais do Sistema Único de Saúde para Estados, Distrito Federal e Municípios: os desafios para a implementação dos critérios da Lei Complementar no 141/2012. Texto para Discussão. Brasília, DF: Ipea; 2017..

Segundo relatórios do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, em 2014, os recursos das transferências para AB cujas regiões Norte e Nordeste contam com 36,3% da população brasileira e receberam, em 2014, quase 46% das transferências do MS para esse bloco2121 Piola SF. Transferências de Recursos Federais do Sistema Único de Saúde para Estados, Distrito Federal e Municípios: os desafios para a implementação dos critérios da Lei Complementar no 141/2012. Texto para Discussão. Brasília, DF: Ipea; 2017.. Apesar disso, a região Norte apresentou os menores percentuais médios de insumos em todos os ciclos, enquanto as regiões Sul e Sudeste apresentaram os maiores percentuais. Resultado similar demonstrou que apenas 9,4% das UBS foram consideradas com estrutura adequada ao DM, com maiores proporções também na região Sudeste (15,9%)1010 Tomasi E, Cesar MADC, Neves RG, et al. Diabetes care in Brazil program to improve primary care access and quality-PMAQ. J. ambul. care manage. 2017; 40(2):S12-23.. Nessa análise, os autores consideraram os seguintes insumos como essenciais no atendimento às pessoas com DM: balança de 150 kg; esfigmomanômetro; estetoscópio adulto; fita métrica; glicosímetro; kit de monofilamentos, oftalmoscópio e tiras de glicemia capilar.

Em contrapartida, no presente estudo, foram apresentados percentuais de adequação superiores ao estudo de Neves et al.1010 Tomasi E, Cesar MADC, Neves RG, et al. Diabetes care in Brazil program to improve primary care access and quality-PMAQ. J. ambul. care manage. 2017; 40(2):S12-23.. Tal diferença pode ser atribuída pela composição diferente do indicador ‘insumos’, pois os itens balança antropométrica de 150 kg; esfigmomanômetro; estetoscópio adulto; glicosímetro; kit de monofilamentos e oftalmoscópio fizeram parte do indicador ‘equipamentos e materiais’, que apresentaram percentuais menores de adequação quando comparados aos insumos.

Portanto, a presença desses insumos impacta no cuidado às pessoas portadoras do DM, pois eles auxiliam os profissionais da saúde no exame físico, na avaliação laboratorial e na estratificação do risco cardiovascular do paciente, através das medidas antropométricas, da medição da pressão arterial, do exame dos pés e do exame de fundo do olho1717 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: diabetes mellitus. v. 36. Brasília, DF: MS; 2013.. Outro achado relativo ao cuidado com os pacientes com DM foi encontrado em estudo de Muzy et al.2222 Muzy J, Campos MR, Emmerick I, et al. Prevalência de diabetes mellitus e suas complicações e caracterização das lacunas na atenção à saúde a partir da triangulação de pesquisas. Cad. Saúde Pública. 2021; 37(5):e00076120., segundo o qual a realização incipiente do exame de fundo de olho teve os menores índices para a região Norte, o que explica as altas taxas de retinopatia diabética e cegueira no Brasil.

Estudo realizado com dados do 1º ciclo do PMAQ-AB, também para analisar a estrutura das UBS brasileiras, demonstrou pior escore médio (0,524) relacionado à subdimensão ‘instalações e insumos’ e melhor pontuação para ‘turnos de funcionamento’, com 0,8652222 Muzy J, Campos MR, Emmerick I, et al. Prevalência de diabetes mellitus e suas complicações e caracterização das lacunas na atenção à saúde a partir da triangulação de pesquisas. Cad. Saúde Pública. 2021; 37(5):e00076120., utilizando análise fatorial e calculado escore padronizado, sendo 1 o melhor escore. Os melhores escores também estiveram nas regiões de maior desenvolvimento socioeconômico (Sudeste e Sul), destacando-se a região Sul (9,3%), enquanto a região Nordeste tinha o maior número de UBS (14.638) classificadas como regulares (55,7%) e apenas 2,8% na classificação referência2222 Muzy J, Campos MR, Emmerick I, et al. Prevalência de diabetes mellitus e suas complicações e caracterização das lacunas na atenção à saúde a partir da triangulação de pesquisas. Cad. Saúde Pública. 2021; 37(5):e00076120..

A acessibilidade ao cadeirante apresentou proporções baixas nos três ciclos do PMAQ-AB, situação que se mostra preocupante, visto que o DM pode levar a amputações de membros e até cegueira, o que requer espaços adaptados para elas dentro das UBS, como, por exemplo, banheiros adaptados, barras de apoio, corrimão, rampas, larguras das portas, sinalizações e piso antiderrapante2323 Bousquat A, Giovanella L, Fausto MCR, et al. Tipologia da estrutura das unidades básicas de saúde brasileiras: os 5 r. Cad. Saúde Pública. 2017; 33(8):1-15.. As proporções mais elevadas nos três ciclos na região Sul podem ser explicadas pelo Plano Diretor de Acessibilidade de Porto Alegre, que instituiu normas gerais e critérios básicos destinados a promover a acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, em 20112424 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual de estrutura física das unidades básicas de saúde: saúde da família. 2. ed. Brasília, DF: MS, 2008..

No ano de 2012, embora tenha sido lançado o ‘Manual de Identidade Visual’2525 Porto Alegre. Lei Complementar nº 678, de 22 de agosto de 2011. Institui o plano diretor de acessibilidade de Porto Alegre. Prefeitura municipal de Porto Alegre, 2011 ago 22; Seção 1:18. com aplicações na rede do SUS, não foi observada maior efetividade quanto à sinalização, principalmente na região Norte. Estudo desenvolvido no estado do Paraná verificou que a sinalização na UBS, para orientar os pacientes, era insuficiente, cabendo maiores investimentos em tecnologia dura: placas, cartazes, painéis, informativos e outros, já que são condições favorecedoras da acessibilidade, principalmente com uma linguagem acessível aos usuários2626 Brasil. Ministério da Saúde, Força Nacional do SUS. Manual de Identidade Visual. versão 1.0. Brasília, DF: MS; 2012..

As elevadas proporções de dias de funcionamento se encontraram de acordo com a atual Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), que recomenda o funcionamento da UBS com carga horária mínima de 40 horas/semanais, no mínimo, cinco dias da semana2727 Rocha NB, Franchin AT, Gasparetto A, et al. Conhecimento sobre acolhimento com classificação de risco pela equipe da Atenção Básica. Espaç. saúde. 2017; 18(1):72.. Estudo utilizando dados do 2º ciclo do PMAQ-AB encontrou que 84,2% dos profissionais referem atendimento nos cinco dias ou mais por semana, indicando que essas UBS podem ser consideradas como as mais acessíveis, e, ainda, 84,9% dos usuários entrevistados afirmaram que esse horário supre as suas necessidades de saúde2828 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Política Nacional de Atenção Básica. Diário Oficial da União. 21 Set 2017..

As regiões Sudeste e Norte tiveram maiores percentuais no atendimento em horários especiais, porém, ainda baixos em todos os ciclos. Estudo que avaliou a APS na perspectiva dos usuários revelou que estes gostariam de horários que facilitassem seus atendimentos, como no período da noite, aos sábados ou nos finais da semana, principalmente por fazerem parte da população trabalhadora e que tem a maior prevalência de DM2929 Silva LAN, Harayama RM, Fernandes FDP, et al. Acesso e acolhimento na Atenção Básica da região Oeste do Pará. Saúde debate. 2019; 43(122):742-54.. Na tentativa de apoiar a implantação do horário estendido de funcionamento nas UBS, o Ministério da Saúde lançou o programa Saúde na Hora, em 2019, em todo o território brasileiro, viabilizando o custeio aos municípios e Distrito Federal com o objetivo de ofertar ações de saúde em horários mais flexíveis para a população3030 Figueiredo DCMM, Shimizu HE, Ramalho WM. A Acessibilidade da Atenção Básica no Brasil na avaliação dos usuários. Cad. Saúde Coletiva. 2020; 28(2):288-301..

Nos dois últimos ciclos, a existência de pelo menos um ACS nas UBS apresentou percentuais médios elevados em todas as regiões (com valores acima de 97%), nos dois últimos ciclos. A presença do ACS nas equipes é fundamental para o cuidado continuado dos usuários diagnosticados com DM, pois realiza visitas domiciliares, informa aos usuários sobre as datas e horários de consultas e exames agendados, entre outras atribuições. Ainda, sob treinamento específico de um profissional de nível superior da saúde e com equipamentos adequados, pode realizar a medição da pressão arterial e da glicemia capilar, bem como realizar técnicas limpas de curativo, encaminhando o paciente para a unidade de saúde de referência sempre que necessário3131 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 930, de 15 de maio de 2019. Institui o Programa “Saúde na Hora”, que dispõe sobre o horário estendido de funcionamento das Unidades de Saúde da Família, altera a Portaria nº 2.436/GM/MS, de 2017, a Portaria de Consolidação no 2/GM/MS, de 2017. Diário Oficial da União. 15 Maio 2019..

Assim, percebe-se que a Estratégia de Agentes Comunitários de Saúde (EACS) e a Estratégia Saúde da Família foram preponderantes na organização da atenção à saúde, justificando os elevados percentuais de ACS em todas as regiões, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, onde se começou a inserção do ACS nas práticas de promoção da saúde e prevenção de doenças, desenvolvidas no âmbito domiciliar e em nível local, tendo em vista a vulnerabilidade e os riscos dessa população3232 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017..

Apesar da relevância das atividades do ACS, com as modificações estabelecidas na PNAB, esse profissional foi considerado dispensável na composição das equipes, devido à não obrigatoriedade de cobertura com ACS para 100% da população, restrita a áreas de grande dispersão territorial, áreas de risco e vulnerabilidade social, com um máximo de 750 pessoas por ACS, considerando, ainda, critérios epidemiológicos e socioeconômicos3131 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 930, de 15 de maio de 2019. Institui o Programa “Saúde na Hora”, que dispõe sobre o horário estendido de funcionamento das Unidades de Saúde da Família, altera a Portaria nº 2.436/GM/MS, de 2017, a Portaria de Consolidação no 2/GM/MS, de 2017. Diário Oficial da União. 15 Maio 2019..

O planejamento das atividades apresentou resultados satisfatórios em todas as regiões e nos três ciclos do PMAQ-AB, corroborando estudo realizado no ano de 2012, cujos achados revelaram que a maior parte das equipes avaliadas em todas as regiões do País declarou realizar atividades de planejamento, destacando os municípios com mais de 100.000 habitantes, com 88,3% na região Centro-Oeste e 95,8% na região Sul3333 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria Executiva. Programa de Agentes Comunitário de Saúde (PACS). Brasília, DF: MS; 2001.. Assim, o planejamento do atendimento às pessoas portadoras de DM precisa compreender tanto a programação de determinadas atividades quanto a sua resolutividade sobre a saúde dessas pessoas e o impacto das ações planejadas sobre os indicadores de saúde da população3434 Cruz MM, Souza RBC, Torres RMC, et al. Usos do planejamento e autoavaliação nos processos de trabalho das equipes de Saúde da Família na Atenção Básica. Saúde debate. 2014; 38(esp):124-39..

Acredita-se que a gestão municipal é responsável pelas ações voltadas ao controle do DM na APS. Assim, os aspectos estruturais e organizacionais necessários ao funcionamento das UBS, bem como a garantia das condições adequadas ao provimento das ações por parte dos profissionais de saúde, devem ser considerados prioritários para a prevenção e o controle do DM, além da redução da morbimortalidade e dos custos associados à doença3535 Silocchi C, Junges JR. Equipes de atenção primária: dificuldades no cuidado de pessoas com doenças crônicas não transmissíveis. Trab. Educ. Saúde. 2017; 15(2):599-615..

A proposta do Apoio Institucional (AI) e do Apoio Matricial (AM) está baseada no princípio da educação permanente e contribui para a troca de conhecimento e atendimento compartilhado entre os diferentes profissionais das eAB e especialistas, ampliando o acesso da população aos cuidados em saúde2020 Machado PMDO, Lacerda JTD, Colussi CF, et al. Estrutura e processo de trabalho para as ações de alimentação e nutrição na Atenção Primária à Saúde no Brasil, 2014. Epidemiol. Serv. Saúde. 2021; 30(2): e2020635.. Dessa forma, são estratégias fundamentais no processo de cuidar do portador de DM, principalmente no processo terapêutico.

No presente estudo, observou-se que os percentuais de AI e AM foram muito baixos, diferindo de um estudo também utilizando os dados do 1º ciclo, no qual foram analisados os dados relativos às equipes brasileiras que receberam alguma atividade de AI, correspondendo a 14.306 equipes (84%), e de AM, correspondendo a 14.489 equipes (85%)3636 Borges DDB, Lacerda JTD. Ações voltadas ao controle do Diabetes Mellitus na Atenção Básica: proposta de modelo avaliativo. Saúde debate. 2018; 42(116):162- 178.. No 2º ciclo, a região Norte foi a que obteve menor apoio, possivelmente por ser uma região que apresenta grandes distâncias, com acesso dificultado aos vários municípios, Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) baixo e número insuficiente de profissionais, estrutura e recursos3737 Santos AF, Machado ATGM, Reis CMR, et al. Institutional and matrix support and its relationship with primary healthcare. Rev. Saúde Pública. 2015. [acesso em 2020 abr 18]; 49:54. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0034-89102015000100241&script=sci_Arttext.
https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S00...
.

Problemas relativos à ‘organização dos prontuários’ se mostraram evidentes, principalmente no 3º ciclo, corroborando estudo realizado na região Nordeste, mostrando que acúmulo de prontuários, extravio, prontuários avulsos por paciente e dificuldades para conservação podem estar associados a um acréscimo significativo no número de usuários atendidos nas UBS3838 Sobrinho DF, Machado ATGM, Lima AMLD, et al. Compreendendo o Apoio Matricial e o resultado da certificação de qualidade nas áreas de atenção à criança, mulher, diabetes/hipertensão e saúde mental. Saúde debate. 2014; 38(esp):83-93..

O ‘atendimento de urgência’ apresentou percentuais acima de 90% para todas as regiões no 3º ciclo, sugerindo adesão e consonância com a Política Nacional de Atenção às Urgências (PNAU), que destaca o primeiro cuidado às urgências e emergências como um dos objetivos da AB, em ambiente adequado, até a transferência a outros pontos de atenção, quando necessário3939 Mendes MAL, Santos ES. Organização dos prontuários dos pacientes em uma unidade básica de saúde de Maceió. Rev. Portal Saúde e Soc. 2018; 3(1):710-20..

Baixos percentuais de ‘agenda especializada’ e de ‘oferta e resolubilidade de ações’ foram observados nas UBS, nos três ciclos e em todas as regiões. Nesse sentido, o usuário diagnosticado com DM deve ser encaminhado para diversas especialidades quando o profissional julgar necessário, mediante o risco de desenvolvimento de complicações crônicas4040 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.600, de 7 de julho de 2011. Reformula a Política Nacional de Atenção às Urgências e institui a Rede de Atenção às Urgências no Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 7 Jul 2011..

A variável ‘atenção à pessoa com DM’ teve percentuais melhores no último ciclo, revelando melhorias no cadastramento e na vinculação dos usuários às UBS. Ademais, destaca-se o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022, que pode ter contribuído para melhorar o processo de trabalho frente aos usuários com DM, para a prevenção e para o controle das DCNT4141 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: diabetes mellitus. v. 36. Brasília, DF: MS; 2013..

De forma geral, verificou-se um panorama de avanços favoráveis ao atendimento de pessoas com DM no decorrer dos três ciclos do PMAQ-AB. Cabe indagar como serão os próximos anos frente à contenção de gastos imposta pela Emenda Constitucional nº 951212 Brasil. Constituição, 1988. Emenda Constitucional nº 95, de 15 de dezembro de 2016. Altera o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o Novo Regime Fiscal, e dá outras providências. Diário Oficial da União. 15 Nov 2016., que pode acarretar a redução do acesso a bens e serviços de saúde por parte das populações mais empobrecidas, podendo aumentar essas disparidades regionais evidenciadas no presente estudo.

Conclusões

O estudo evidenciou que houve diferenças na estrutura e no processo de trabalho para o atendimento ao DM na APS entre as macrorregiões brasileiras e que, apesar dos avanços ao longo dos três ciclos do PMAQ-AB, as desigualdades foram persistentemente desfavoráveis nas macrorregiões Norte e Nordeste.

  • Suporte financeiro: não houve
  • *
    Orcid (Open Researcher and Contributor ID).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    22 Maio 2021
  • Aceito
    23 Dez 2021
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