Neoextrativismo, garimpo e vulnerabilização dos povos indígenas como expressão de um colonialismo persistente no Brasil

Marcelo Firpo de Souza Porto Diogo Rocha Sobre os autores

RESUMO

O artigo, em forma de ensaio, defende que as ameaças de vulnerabilização mais recentes contra os povos indígenas, intensificadas no contexto da pandemia de Covid-19, refletem um colonialismo persistente. Este se atualiza no contexto da inserção semiperiférica do Brasil no sistema-mundo capitalista, neoliberal e globalizado como exportador de commodities produzidas pelos dois setores estratégicos do neoextrativismo, a mineração e o agronegócio. O modelo neoextrativista beneficia principalmente grupos transnacionais e elites nacionais com grande poder econômico e político, além do próprio setor financeiro. Além disso, estabelece conexões com o submundo dos circuitos inferiores e ilegais vinculados a setores como o garimpo, e incluem desde práticas de violência até a lavagem de dinheiro com a participação de grupos locais que, nos últimos tempos, vêm assumindo crescente poder político e institucional. Tais grupos fazem parte do complexo mosaico do fortalecimento de ideologias de extrema-direita nos últimos anos no cenário nacional, que vêm reunindo alianças. O artigo tem por base experiências de pesquisa colaborativa nos últimos anos com o povo Munduruku na região do Médio Tapajós, com reflexões sobre a atual expansão de agenda política anti-indígena.

PALAVRAS-CHAVE
Povos indígenas; Mineração; Economia ambiental; Desenvolvimento e meio ambiente

Introdução: neoextrativismo e garimpo de ouro como expressões de um colonialismo persistente

Este ensaio expõe uma trajetória de pesquisa e reflexão dos autores nos últimos anos sobre as ameaças que os povos indígenas vêm sofrendo nas últimas décadas diante do modelo de desenvolvimento neoextrativista apoiado em setores econômicos como a mineração e o agronegócio. Nosso principal argumento é que os processos de vulnerabilização mais recentes, intensificados no contexto da pandemia de Covid-19, refletem a existência de um colonialismo persistente atualizado no contexto da inserção semiperiférica do Brasil no sistema-mundo capitalista, neoliberal e globalizado11 Wallerstein I. The capitalist world-economy. Cambridge: Cambridge University; 1979., e que se expressa no modelo de desenvolvimento.

Tal modelo simultaneamente intensifica a exploração do trabalho e dos bens comuns, reduzidos no discurso tecnopolítico hegemônico à categoria de ‘recursos naturais’, com a exportação de commodities minerais (como o ferro/aço e o ouro) e agrícolas (como a soja e a proteína animal). Ele beneficia principalmente grupos transnacionais e elites nacionais com grande poder econômico e político, além do próprio setor financeiro que custeia e se aproveita de um intenso fluxo de capitais cada vez mais desregulados. Além disso, as conexões com o submundo dos circuitos inferiores e ilegais (por meio de redes de garimpo ilegal) envolvem desde práticas de violência até a lavagem de dinheiro com a participação de grupos locais que, nos últimos tempos, vêm assumindo crescente poder político e institucional. Tais grupos fazem parte do complexo mosaico do fortalecimento de ideologias de extrema-direita nos últimos anos no cenário nacional que vêm reunindo alianças.

Nosso argumento central é que o neoextrativismo e sua articulação tanto com grupos neoliberais como de extrema-direita criam importantes barreiras para a construção de alternativas mais soberanas, democráticas, inclusivas, sustentáveis e saudáveis de desenvolvimento econômico e social no Brasil e na América Latina. Acreditamos existir uma profunda conexão em escalas locais, nacionais e globais entre o atual modelo de desenvolvimento brasileiro, a degradação ecossistêmica de biomas, como a Amazônia e o Cerrado, a violação de direitos humanos e constitucionais de povos e comunidades tradicionais e camponeses, bem como de trabalhadores nas periferias urbanas. Os processos de vulnerabilização dos povos indígenas, expresso em retrocessos legais, fragilização de políticas públicas, violências e problemas de saúde, estão a se agravar com a atual pandemia de Covid-19, mas não podem ser compreendidos sem relacioná-los ao modelo neoextrativista.

Nosso referencial conceitual apoia-se em três campos interdisciplinares de conhecimento; a saúde coletiva, a ecologia política e as abordagens pós-coloniais, em especial, as Epistemologias do Sul22 Porto MFS, Rocha DF, Fasanello MT. Saúde, ecologias e emancipação: conhecimentos alternativos em tempos de crise(s). São Paulo: Hucitec; 2021., 33 Santos BSS. O Fim do império cognitivo. Coimbra: Almedina; 2018.. Em nossa perspectiva teórica, as várias crises globais atuais fazem parte de uma crise civilizatória mais ampla da modernidade eurocêntrica. Tal crise envolve os limites do Estado, do direito e da ciência que compõem os três eixos estratégicos de realização da emancipação social perseguidos pela modernidade eurocentrada nos últimos séculos, seja pela utopia liberal e a constituição dos mercados capitalistas, seja pela utopia socialista e a ideia de processos reformistas ou revolucionários de construção de uma sociedade comunista.

Para analisar esse quadro complexo, temos trabalhado de forma integrada quatro dimensões de (in)justiça; social, sanitária, ambiental e cognitiva. As duas primeiras são bem conhecidas do campo da saúde coletiva, já as injustiças ambientais têm-se agravado com a degradação dos ecossistemas associada à disseminação de diversos riscos ecológicos globais, como a poluição e as mudanças climáticas, e com os processos de (des)territorialização relacionados com o modelo de desenvolvimento. A junção das injustiças sociais e ambientais faz com que certos territórios, grupos e classes sociais sofram primeiro e de forma mais intensa as consequências negativas do desenvolvimento econômico. Mais que vulneráveis, são grupos vulnerabilizados por processos históricos que se sobrepõem ao colonialismo, ao racismo estrutural, às desigualdades sociais do capitalismo dependente e aos riscos ambientais.

Já a (in)justiça cognitiva, de especial importância para entendermos a persistência das violências contra os povos indígenas, é um conceito central das Epistemologias do Sul. Ela analisa as lutas por emancipação social no Sul Global a partir de dimensões ontológicas e epistêmicas muitas vezes desconsideradas em abordagens críticas sobre a emancipação social. A busca por justiça cognitiva passa por entendermos as justiças sociais, sanitárias e ambientais envolvendo povos e comunidades tradicionais para além da exploração capitalista e de alternativas desenvolvimentistas com políticas redistributivas e de sustentabilidade. A justiça cognitiva coloca em jogo dimensões existenciais relacionadas com concepções outras de desenvolvimento econômico, trabalho, natureza, saúde e espiritualidade, entre outras. Em vários países e regiões multiculturais do Sul Global, especialmente países latino-americanos como o Equador, a Bolívia e, mais recentemente, o Chile, as maiorias indígenas têm feito inscrever no panorama político outras formas de conceber o mundo e a sociedade e, por isso, tensionam por uma forma de democracia que incorpore conhecimentos, saberes e experiências que historicamente foram desprezados pelos Estados coloniais.

A transformação social e a promoção emancipatória da saúde, portanto, passariam por diálogos interculturais e interdisciplinares envolvendo a interação entre um conjunto de saberes, experiências e práticas oriundo tanto da ciência como de sistemas ancestrais e tradicionais. Esse é um pré-requisito para, mais que evitarmos violências, superarmos as exclusões radicais e podermos reconhecer a contribuição da sabedoria indígena para a superação das inúmeras crises em curso em direção à necessária transição civilizatória para sociedades pós-capitalistas e pós-coloniais.

Para avançarmos nessa discussão, temos realizado, nos últimos anos, estudos colaborativos e diálogos com o povo Munduruku na região do Médio Tapajós em um contexto de resistências ante as ameaças produzidas pelo garimpo. Em especial, os efeitos da contaminação por mercúrio e da expansão de infraestruturas como o corredor hidroviário e rodoviário para o escoamento da soja e milho produzidos nas regiões Centro-Oeste e Norte. Com a chegada da pandemia de Covid-19, desde 2020, temos articulado nossas análises com esse grave problema de saúde. Uma primeira contribuição nesse sentido foi um relatório publicado no Observatório da Covid-19 da Fiocruz44 Rocha DF, Porto MFS. A vulnerabilização dos povos indígenas frente ao COVID-19: autoritarismo político e a economia predatória do garimpo e da mineração como expressão de um colonialismo persistente. Observatório Covid-19 Fiocruz, 2020. [acesso em 2021 ago 14]. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/41407.
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. O presente ensaio é, em boa parte, baseado nesse relatório com o aporte de pesquisas em andamento com os Munduruku.

O restante do ensaio está organizado nos seguintes tópicos: discutimos a manutenção de um padrão histórico de colonialismo e subalternização da sociedade brasileira em relação aos povos tradicionais, como indígenas e os de matriz africana. Provocativamente e relacionando ao tema do garimpo, denominamos de padrão-ouro a história de exclusões radicais da sociedade brasileira: uma sociedade branca, de descendência europeia, culta a partir do domínio de referenciais linguísticos e culturais ocidentais, que enxerga o mundo a partir do Norte Global, ou seja, do olhar do colonizador, economicamente dita liberal (embora Estado e iniciativa privada atuem cada vez mais de forma articulada), mas conservadora nos costumes, que silencia e se envergonha de suas raízes ameríndias e africanas. Esse padrão, nos últimos anos de neoliberalismo e neoextrativismo, vem intensificando uma agenda política anti-indígena. Do ponto de vista institucional e do legislativo, inúmeros retrocessos vêm ocorrendo, e incluem a flexibilização para a exploração de Terras Indígenas (TI) e a tese do Marco Temporal ainda em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF).

Na sequência, discutimos como a expansão da mineração, do garimpo e dos impactos do modelo de desenvolvimento neoextrativista expressam a continuidade e o agravamento do colonialismo persistente na política indigenista brasileira. Isso é ilustrado no tópico seguinte com a apresentação do caso do povo Munduruku da região do Tapajós, no Pará. Esse povo vem sofrendo com os inúmeros efeitos do garimpo de ouro na região, incluindo as recentes ondas de violência e ameaças à vida de lideranças. Concluímos o ensaio com algumas reflexões sobre a importância estratégica da defesa da saúde e dos territórios indígenas para o futuro da democracia, da sustentabilidade ambiental e da necessária transição civilizatória. Acreditamos que a mudança do modelo de desenvolvimento neoextrativista necessitará do aprofundamento do diálogo interdisciplinar e intercultural entre a academia, os movimentos sociais e o conjunto da sociedade brasileira com as lutas sociais dos povos indígenas.

A agenda política antiindígena e retrocessos recentes em tempos de Covid-19

Para as epistemologias do Sul, o fim do regime colonial não implicou o fim do colonialismo33 Santos BSS. O Fim do império cognitivo. Coimbra: Almedina; 2018.. Este se articula aos outros dois eixos de dominação e opressão da modernidade, o capitalismo e o patriarcado, cujas consequências marcam as relações entre a sociedade brasileira e os grupos que originariamente habitam o território hoje chamado de Brasil, mas que são subalternizados e discriminados por suas características étnicas e raciais. Ao se afastarem do que chamamos antes de padrão-ouro da sociedade brasileira, povos indígenas e de matriz africana, além de camponeses, tornam-se mais vulneráveis a inúmeras formas de violação dos seus direitos fundamentais, e por isso precisam realizar lutas sociais com mais vigor para vê-los respeitados.

Nas últimas décadas, as lógicas de exclusão radical, violência e subalternização vêm sendo acentuadas pelo modelo neoextrativista puxado por setores como a mineração e o agronegócio, e pela construção de infraestruturas como hidrelétricas, rodovias, hidrovias e portos de exportação. É nesse contexto que o neoextrativismo pode ser compreendido como o modelo de desenvolvimento inserido de forma subalternizada na economia internacional, baseado na apropriação de recursos naturais e apoiado em redes produtivas pouco diversificadas. Porém, agora não transitam apenas na forma de mercadorias, mas também de ativos financeiros, já que, nos mercados de mercadorias e futuros, transacionam-se tanto as extrações atuais quanto aquelas que serão realizadas futuramente, ou seja, também se especula sobre a capacidade de os grupos econômicos multinacionais conseguirem impor seus interesses sobre os territórios55 Gudynas E. Diez tesis urgentes sobre el nuevo extractivismo. In: Centro Andino de Acción Popular – CAAP e Centro Latinoamericano de Ecología Social – CLAES. Extractivismo, política y sociedad. Quito: Centro Andino de Acción Popular: Centro Latino Americano de Ecología Social; 2009..

Devido à rapidez das mudanças nas expectativas e nas pressões sobre as corporações e governos, o neoextrativismo intensifica a degradação ambiental e vulnerabiliza ainda mais os povos que vivem com e dependem da natureza. Com trabalhadoras/es precarizadas/os que vivem nas periferias urbanas sem saneamento, moradia digna e transporte adequados, além dos profissionais de saúde, tais povos e grupos sociais são especialmente vulneráveis a diversos riscos à saúde, inclusive à pandemia de Covid-1944 Rocha DF, Porto MFS. A vulnerabilização dos povos indígenas frente ao COVID-19: autoritarismo político e a economia predatória do garimpo e da mineração como expressão de um colonialismo persistente. Observatório Covid-19 Fiocruz, 2020. [acesso em 2021 ago 14]. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/41407.
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Com relação à atual pandemia e os povos indígenas, estudos recentes indicam sua maior vulnerabilidade66 Santos RV, Pontes AL, Coimbra JR, CEA. Um “fato social total”: COVID-19 e povos indígenas no Brasil. Cad. Saúde Pública. 2020 [acesso em 2021 ago 14]; 36(10):1-5. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102--311X00268220.
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. Organizações indigenistas, ambientalistas, de defesa dos direitos humanos, da saúde pública, ligadas às igrejas e até mesmo os Ministérios Públicos se posicionaram a respeito da urgência de medidas serem coordenadas nacionalmente para evitar a expansão da epidemia e suas consequências mais graves e de curto prazo. Entretanto, apenas medidas parciais foram implementadas sob a forte pressão da sociedade civil e, em parte, acolhidas pelo STF. Diante da fragilidade institucional, diversas medidas vêm sendo realizadas de forma autônoma por organizações indígenas como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) em parceria com universidades e Organizações Não Governamentais. Elas têm sido responsáveis pela criação de redes de promoção, vigilância e cuidado à saúde que buscam integrar práticas populares e técnico-científicas.

Essas disputas adquirem uma feição político-ideológica quando a presidência da República, o Congresso Nacional e setores do judiciário não conseguem estabelecer e coordenar uma agenda mínima de ação. Assim, uma série de fatores conflui para ampliar a vulnerabilização dos povos indígenas brasileiros à Covid-19 e a outros processos que ameaçam suas vidas.

Após a Constituição Cidadã de 1988, diversas pressões continuaram a abalar os direitos conquistados pelos povos e comunidades tradicionais. As tentativas de flexibilização dos territórios indígenas adiante da mineração e do garimpo teve por marco uma ação movida por deputados e senadores do estado de Roraima para sustar a portaria de homologação assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em abril de 2005. Ela criou uma área de 1,7 milhão de hectares que seria de usufruto exclusivo dos povos Wapixana, Ingaricó, Macuxi, Patamona e Taurepangue sob a denominação de TI Raposa Serra do Sol, e a demarcação afetava principalmente produtores de arroz.

Nessa época, o STF colocou 19 condicionantes que definiam as bases para a legitimidade do processo de demarcação, sendo uma delas de especial relevância, o chamado Marco Temporal. Ele estabelecia que os indígenas deveriam estar no território em disputa por ocasião da promulgação da Constituição de 198844 Rocha DF, Porto MFS. A vulnerabilização dos povos indígenas frente ao COVID-19: autoritarismo político e a economia predatória do garimpo e da mineração como expressão de um colonialismo persistente. Observatório Covid-19 Fiocruz, 2020. [acesso em 2021 ago 14]. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/41407.
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. Apesar de o STF ter assumido que essa decisão não seria vinculante, isto é, que só se aplicava àquele caso específico, ela acabou sendo apropriada por outras instituições do Estado de Roraima e está sendo usada como pretexto para negar a demarcação de TI de povos que, ao longo de sua história, foram expulsos ou compulsoriamente transladados de seus territórios tradicionais. Tal interpretação foi recentemente assumida pelo Parecer 001/2017 da Advocacia-Geral da União, que estabeleceu a tese do marco temporal como parâmetro a ser seguido pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em todos os processos de demarcação dali em diante. Essa posição foi questionada tanto pelo Ministério Público Federal quanto pelo movimento indígena e seus parceiros indigenistas, tendo sido interpretada como uma concessão do então presidente Michel Temer aos interesses do agronegócio e da mineração. Posteriormente, os efeitos do parecer foram suspensos em 7 de maio de 2020 pela decisão liminar concedida pelo ministro Edson Fachin, e em breve o STF se posicionará sobre o Marco Temporal, o que tem mobilizado várias manifestações de organizações indígenas e parceiras.

Desde então, surgiram outras ameaças aos direitos fundamentais dos povos indígenas. Além da luta diária pela sobrevivência no contexto da maior ameaça sanitária deste século, eles também estão mobilizados em torno da resistência ao Projeto de Lei (PL) nº 191/2020, proposto pelo governo do presidente Jair Bolsonaro, o qual tem atuado no sentido de desconstruir a política territorial indigenista vigente. Logo no primeiro mês de governo, publicou medida provisória sobre a reorganização do Executivo federal que transferia a Funai para a pasta do Ministério da Agricultura, um ministério que historicamente tem privilegiado o agronegócio. Essa ação foi vetada pelo Congresso Nacional e, posteriormente, sustada por decisão do STF. Porém, continuaram as tentativas de submeter os territórios indígenas à lógica do agronegócio. Isso ocorreu por ocasião do discurso de abertura na Assembleia Geral das Nações Unidas, em setembro de 2019, quando o presidente Jair Bolsonaro abriu espaço para supostos representantes de ‘agricultores indígenas’ não reconhecidos por seus pares no movimento indígena como lideranças de seus povos.

Entre as principais críticas ao PL 191/2020, está o fato de ele excluir do rol de TI todas aquelas que ainda estão em alguma etapa do processo administrativo de demarcação e que, por isso, ainda não foram homologadas. Isso está em consonância com a recente Instrução Normativa (IN) nº 9/2020 da Funai, que também limita a categoria de TI àquelas já homologadas para efeitos de emissão de declaração de limites e resposta a consultas oficiais sobre a existência ou não de TI em determinadas áreas. O PL reduz mais os direitos indígenas ao permitir a mineração, o garimpo, a agricultura com transgênicos, além da construção de aproveitamentos hidrelétricos nesses territórios. Se aprovada, essa lei vai, na prática, transferir para o Executivo a prerrogativa constitucional do Congresso Nacional de autorizar mineração e garimpo em TI. Também impedirá o poder de veto dos povos indígenas sobre essas questões, limitando a consulta a um processo formal de negociação de compensações. O PL também prevê a autorização imediata de todos os requerimentos minerários anteriores à homologação das TI. Isso afetaria diretamente, segundo o Instituto Socioambiental (ISA), 237 TI (175 não homologadas e 62 homologadas), sobre as quais existem cerca de 3.843 requerimentos de pesquisa e lavra na Agência Nacional de Mineração (ANM). Em um primeiro momento, cerca de 25 grupos indígenas em isolamento voluntário ou de recente contato também seriam afetados.

Além dos efeitos do PL 191/2020 e da IN/ Funai/9/2020, que mais diretamente beneficiam interesses de garimpeiros e mineradores, os povos indígenas atualmente ainda enfrentam outra importante tentativa de flexibilização de seus direitos territoriais, a Medida Provisória nº 910/2019. Seu objetivo é ‘modificar a sistemática legal que trata da regularização fundiária das ocupações incidentes sobre terras situadas em áreas da União’. Essa medida acabou não sendo votada e foi substituída pelo PL nº 2.633/20, que foi recentemente aprovado pela Câmara dos Deputados em 3 de agosto de 2021, e aguarda ser apreciado pelo Senado Federal. O PL amplia o tamanho de terras da União que podem ser regularizadas sem vistoria prévia pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), tendo sido chamada pela bancada do agronegócio de ‘PL da Regularização Fundiária’, enquanto ambientalistas, movimentos sociais e indígenas a denominam de ‘PL da Grilagem’. No momento da entrega do artigo, esperava ser apreciado para votação no Senado.

O projeto, assim como a medida provisória que o antecedeu, foi considerado pelo Ministério Público Federal como um ‘estímulo à grilagem de terras públicas’ com potencial para ampliar o desmatamento, intensificar os conflitos territoriais no campo e frear ainda mais a política de reforma agrária no País. Segundo diversas entidades, apesar da flagrante inconstitucionalidade do PL, a sua aprovação pelo Congresso Nacional permitiria que o Incra emitisse títulos sobre as áreas em processo de demarcação, consolidando uma agenda anti-indígena bem como contra outros grupos vulnerabilizados, como quilombolas, comunidades tradicionais e camponeses.

A situação se agrava ainda mais devido à crescente fragilização das agências estatais que atuam nos territórios indígenas, como a já citada Funai, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e até mesmo a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Esse processo tem sido denunciado pela Apib e por outras organizações da sociedade civil, justamente em um momento de pandemia e de necessidade de recursos para que as instituições responsáveis possam atuar mais efetivamente no atendimento da população indígena. Ela é ameaçada tanto pela Covid-19 e por outras doenças preexistentes como a malária, mas também por outros problemas de saúde decorrentes da exposição a subprodutos do garimpo e da mineração, em especial, a intoxicação crônica por mercúrio.

A mineração e o garimpo só não são atualmente legalizados nos territórios indígenas devido à falta da regulamentação necessária, mas está prevista na Constituição. O PL 191/2020, que pretende fazê-lo, considera o licenciamento dessas atividades nas TI como uma prerrogativa exclusiva do Estado. Dessa forma, aliena os povos indígenas do seu direito à consulta prévia, livre e esclarecida tal como previsto na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), hoje incorporada em nosso ordenamento jurídico. Isso vulnerabiliza esses povos em tempos de crises econômicas e sociais, fazendo-os arcar com os custos do desenvolvimento que é dito como necessário para geração de emprego e renda para toda a sociedade nacional, ao mesmo tempo que não se discute seriamente alternativas de desenvolvimento mais sustentáveis e socialmente justas.

O garimpo e a mineração não afetam os territórios indígenas apenas por meio dos impactos diretos relacionados com a perda do território, o desmatamento, a poluição dos rios, a diminuição ou degradação das terras agricultáveis, ou pela redução na variedade e disponibilidade de caça e outros frutos da floresta, dos campos e das águas, importantes para sua alimentação e autocuidado à saúde. Também impulsionam uma série de outras atividades produtivas correlatas que são necessárias à sua manutenção, como a construção civil, a geração e transmissão de energia elétrica, o sistema de transporte dos minérios (como minerodutos, ferrovias e hidrovias), as indústrias de transformação, como a siderúrgica, e a infraestrutura de exportação como portos e complexos portuários. Todos esses empreendimentos intensificam os impactos sobre os territórios localizados nas áreas de influência direta das minas, e sobre territórios de povos e comunidades tradicionais, muitos localizados a milhares de quilômetros de onde o minério é extraído.

No caso do garimpo, as atividades de exploração se articulam a outras economias informais, muitas vezes marginais e ilegais denominadas por Milton Santos de circuitos inferiores do capitalismo77 Santos M. O espaço dividido. São Paulo: EdUSP; 2008.. São atividades que agravam os processos de vulnerabilização e violência relacionados com a extração e o comércio de ouro e envolvem armas, drogas e prostituição. Além disso, o próprio mercúrio é um metal altamente tóxico usado nos processos de concentração do ouro que contamina rios, peixes e, dessa forma, populações indígenas e ribeirinhas. O mercúrio usado no garimpo é de origem estrangeira e, em sua grande maioria, ilegal, já que não obedece à Convenção de Minamata, da qual o Brasil é signatário, sendo comprado sem nota fiscal pelos garimpeiros88 Brasil. Ministério Público Federal. MPF reafirma incoerência de parecer da AGU sobre marco temporal e demarcação de terras indígenas. MPF Notícias. 2018 ago 15. [acesso em 2020 maio 11]. Disponível em: https://bit.ly/2SU2dzt.
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Por esses motivos, a perspectiva de permitir essas atividades dentro dos territórios indígenas pode ter efeitos que atualizam as políticas coloniais de extermínio que todo o ordenamento jurídico elaborado no último século buscou evitar. Se hoje eles alcançaram um equilíbrio legal precário com a atual legislação indigenista, a qual concede direitos que eles têm grande dificuldade de efetivar, a flexibilização dessa legislação em benefício do restante da sociedade, em especial, os grupos econômicos que sustentam o neoextrativismo, é uma forte ameaça ao modo de vida e meios de subsistência dos povos indígenas.

O caso dos Munduruku do Tapajós: conflitos e ameaças relacionados ao garimpo

Os conflitos territoriais vividos no presente pelo povo Munduruku na bacia do rio Tapajós, no Pará, em especial o relacionado com o garimpo, são importantes exemplos de como atividades relativas ao modelo desenvolvimentista e neoextrativista desestruturam o cotidiano indígena nos territórios onde atuam. O primeiro elemento a se levar em consideração nesse tipo de conflito é como dado espaço geográfico é visto pelos diversos agentes que nele interagem.

Para os Munduruku, o Tapajós é simultaneamente território e uma herança legada a eles por Karosakayban, uma divindade fundamental em sua cosmovisão. Já para o Estado brasileiro, o Tapajós é o principal rio de uma bacia hidrográfica, a Tapajós-Teles Pires, que se inicia em Sorriso/MT e tem sua foz no rio Amazonas, na altura de Santarém/PA. Para diversos agentes econômicos, a água é vista enquanto recurso natural, base potencial para hidrelétricas e meio de navegação a partir da instalação de uma hidrovia, e como parte da chamada Província Mineral do Tapajós (PMT), uma área aurífera de cerca de 100 mil quilômetros quadrados considerada uma das maiores jazidas submersas de ouro do mundo99 Coutinho MCN. Província mineral do Tapajós: geologia, metalogenia e mapa previsional para ouro em SIG. Rio de Janeiro: CPRM; 2008..

Um mesmo rio pode ser parte fundamental do modo de vida de um povo, insubstituível por nenhum outro devido ao seu caráter cosmológico e sagrado, ou apenas fonte de riqueza e recursos naturais para empresas e corporações, com o apoio do Estado moderno na estruturação do desenvolvimento. As riquezas dali extraídas se realizam enquanto commodity, reserva de valor ou valor de troca em mercados internacionais hegemonizados pelos países centrais do sistema-mundo11 Wallerstein I. The capitalist world-economy. Cambridge: Cambridge University; 1979..

Os Munduruku tendem a identificar como seus opositores nos conflitos os agentes mais visíveis no território, como os garimpeiros, as empresas da cadeia do garimpo sediadas em cidades como Itaituba e Jacareacanga (PA), e até mesmo o Estado brasileiro. Este assume sistematicamente o papel de tutelar, intermediar e regulamentar os interesses de projetos de desenvolvimento econômico, ou ainda por omissão na fiscalização do garimpo, particularmente o ilegal. Contudo, a atividade do garimpo de ouro só se torna economicamente viável a partir de circuitos globais de troca que articulam diferentes escalas entre os circuitos econômicos superiores e legais do ouro com circuitos inferiores frequentemente ilegais. São dinâmicas complexas e pouco visíveis no nível local onde se realiza o garimpo, e isso dificulta a capacidade de incidência do povo Munduruku nos processos decisórios que os afetam.

Ocasionais e estratégicas alianças com grupos acadêmicos e movimentos ecológicos nacionais e internacionais têm ajudado a impedir a continuidade de certos empreendimentos, como a Usina Hidrelétrica São Luiz do Tapajós, ou amplificam as denúncias desse povo. Porém, têm pouca influência sobre o mercado internacional do ouro, cujos preços são determinados por macrodeterminantes econômicos, muitos deles invisibilizados pela forma como funcionam e se integram com os circuitos inferiores, ignorando os destinos dos povos e dos ecossistemas amazônicos.

Essas múltiplas escalas do conflito ambiental e as dificuldades do povo Munduruku em atuar para muito além da escala territorial mais próxima fazem com que os efeitos das suas ações também sejam limitados, no máximo, às arenas nacionais de decisão. Ocasionalmente, realizam eventuais incursões a Brasília, onde se aliam a outros povos em momentos estratégicos de discussão da legislação territorial (como no caso do julgamento do Marco Temporal), ambiental ou de regularização do garimpo. Já o Brasil tem uma influência limitada na definição das regras globais dos mercados de minerais, embora possua algumas das maiores jazidas do mundo e seja um importante player nesse mercado. Trata-se de uma situação distinta do mercado do petróleo, pois a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) atua como um ativo agente de pressão. No caso do mercado do ouro e de outras commodities, os países consumidores mais poderosos hegemonizam a definição de preços, estimulando a concorrência entre os países produtores.

A falta de soberania é um paradoxo persistente em sociedades ricas em determinadas commodities, porém subalternizadas por estarem inseridas como periféricas no sistema--mundo capitalista, também caracterizadas como de capitalismo dependente1010 Fernandes F. Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina. Rio de Janeiro: Zahar; 1972.. Por seu baixo desenvolvimento tecnológico e social, bem como suas heranças coloniais, tais países acabam tendo de importar outras mercadorias fundamentais, inclusive alimentos, levando-os a sucessivas crises econômicas e sociais decorrentes das oscilações periódicas nas cotações internacionais dessas commodities. Trata-se de uma característica marcante da economia brasileira durante todo o seu período colonial e pós-independência até meados do século XX, quando iniciou sua industrialização com espaços para políticas desenvolvimentistas menos dependentes.

Com a expansão do modelo neoextrativista em fins do século XX e na continuidade do XXI, vem ocorrendo um bloqueio recente a estratégias mais autônomas de desenvolvimento de governos progressistas, por exemplo, a relação Sul-Sul e a inserção do Brasil nos Brics. Esse risco está cada vez mais presente devido ao atual aprofundamento do processo de desindustrialização nacional, das injustiças do comércio internacional de commodities e do papel da ação imperial dos Estados Unidos da América na disputa do controle geopolítico da América perante o crescimento chinês. Nesse sentido, a relevância política e econômica de setores-chave do neoextrativismo (agronegócio e mineração) representa um enorme desafio para a retomada de políticas mais soberanas e menos dependentes para o Brasil e o conjunto da América Latina.

No caso do território Munduruku, estima-se que o garimpo do ouro já ocorresse desde que as primeiras frentes de colonização europeia iniciaram as explorações ali no século XVI. Embora presente desde muito cedo de forma artesanal, com bateia e recursos manuais, as empreitadas garimpeiras intensificaram-se a partir de 1970 quando novas tecnologias foram introduzidas, permitindo a expansão espacial da atividade e a intensificação da extração do ouro em pó. O mercúrio tornou-se desde então um elemento fundamental nesse processo. Tão importante quanto as grandes embarcações e maquinário pesado hoje utilizados no garimpo no Tapajós, esse raro metal, que se apresenta naturalmente em estado líquido, agrega-se facilmente ao ouro em pó formando um composto denominado de amálgama, sendo este posteriormente aquecido para separação do ouro. Entretanto, o mercúrio também é um metal tóxico para a maioria dos seres vivos, inclusive os humanos, e acumula-se na gordura animal após processos de bioacumulação e biomagnificação, fazendo com que os animais que ocupam as posições superiores da cadeia alimentar, inclusive grupos humanos indígenas e ribeirinhos, recebam altas doses através da alimentação principalmente de peixes, o que ocasiona problemas de saúde, como neuropatias e doenças hepáticas, além de impactos no desenvolvimento infantil1111 Wasserman JC, Hacon SS, Wasserman MA. Mundo e Vida. 2001; 2(46):46-53.. Além das comunidades que vivem ao longo dos rios, os próprios garimpeiros são contaminados durante seu processo de trabalho, especialmente durante a queima do amálgama.

Em geral, a economia do garimpo está estruturada em duas classes bem distintas. Os garimpeiros, em geral, são pobres ou empobrecidos, e atuam de maneira informal. Diferentemente das empresas mineradoras e do comércio legal de ouro, eles estão longe dos circuitos superiores de poder e do mercado formal do ouro, o qual se alimenta dos circuitos inferiores e frequentemente ilegais. O horizonte do garimpo artesanal é limitado e de curto prazo para os garimpeiros, voltados à subsistência imediata da família; mas, o garimpo sustenta uma classe política formada pelos donos dos equipamentos que contratam garimpeiros, negociam frentes de garimpo e realizam a fase inicial do comércio de ouro. Essa classe mais poderosa de ‘garimpeiros’ envolve empresários locais com crescente expressão na estrutura política da região e mesmo em âmbito nacional1212 Coelho MC, Wanderley LJ, Costa R. Garimpeiros de ouro e cooperativismo no século XXI. Exemplos nos rios Tapajós, Juma e Madeira no sudoeste da Amazônia brasileira. Confins. Revista franco-brasilera de geografia. 2017 [acesso em 2021 ago 14]; 33. Disponível em: https://doi.org/10.4000/confins.12445.
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Os trabalhadores do garimpo, portanto, muitas vezes oriundos dos próprios povos indígenas e das comunidades ribeirinhas, acabam subordinados a empresários locais que financiam e organizam uma atividade cada vez mais mecanizada e cara. Dependentes de tecnologias como escavadeiras, barcos, combustíveis, mercúrio e outros insumos de alto valor, dificilmente os garimpeiros locais poderiam pagar por conta própria1212 Coelho MC, Wanderley LJ, Costa R. Garimpeiros de ouro e cooperativismo no século XXI. Exemplos nos rios Tapajós, Juma e Madeira no sudoeste da Amazônia brasileira. Confins. Revista franco-brasilera de geografia. 2017 [acesso em 2021 ago 14]; 33. Disponível em: https://doi.org/10.4000/confins.12445.
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. Assim, enquanto um grande contingente de pessoas ligadas à atividade consegue auferir apenas o suficiente para assegurar a própria subsistência, há empresas e pessoas físicas que acumulam ilegalmente licenças para garimpo e auferem lucros significativos, conectando as elites locais com o mercado global do ouro a partir de circuitos que muitas vezes envolvem também atividades ilegais, como o tráfico de drogas, de armas, redes de prostituição e distribuição de bebidas. Dessa forma, o neoextrativismo do garimpo de ouro, em nível local, reproduz as desigualdades e as injustiças que marcam esse mercado em nível global, na relação entre os países envolvidos, porém agravando as características de violência e espoliação típicas do padrão colonial que persiste e se reatualiza.

A economia do garimpo se estrutura às margens da legislação e da economia formal, aproveita-se até os dias de hoje da imagem social do garimpeiro como um trabalhador a serviço da sua família e do garimpo como uma atividade quase artesanal que pode gerar riqueza no curto prazo, uma dimensão simbólica marcante da exploração de metais e pedras preciosas. Foi essa perspectiva que, em 1983, justificou a criação da Reserva Garimpeira do Tapajós pelo Ministério de Minas e Energia (MME). Embora a atividade ainda seja intensiva no uso de mão de obra local, na atualidade, ela cada vez menos corresponde a essa narrativa recorrente. Se, por um lado, grupos políticos locais e nacionais permanecem mobilizando-a para legitimar as tentativas de regularização do garimpo em TI; por outro, os principais beneficiados por uma eventual aprovação dos vários PL nesse sentido seriam os grupos eco-nômicos que já atuam na região e as grandes multinacionais da mineração, como a Vale, a AngloGold Ashanti e a Kinross, gigantes nesse mercado com atuação em diversos países.

É por esse motivo que, embora no passado muitos Munduruku tenham atuado no garimpo, e atualmente alguns membros da etnia ainda participem em posições subalternas nessa cadeia, a partir dos anos 2000, eles começaram a denunciar publicamente seus impactos e do mercúrio sobre as TI já demarcadas (TI Munduruku e Sai Cinza, no alto Tapajós), mas especialmente sobre aquelas em processo de demarcação (Reservas indígenas Praia do Mangue e Praia do Índio e Terras indígenas Sawré Bapin, Sawré Jaybu e Sawré Muybu no Médio Tapajós).

Um marco nessa luta aconteceu naquele ano, quando os Munduruku detiveram garimpeiros em suas terras e servidores da Funai para pressionar o Estado brasileiro a reconhecer o problema1313 Sposati R. Por que a Polícia Federal matou Adenilson Munduruku? Brasil de Fato. 2012 nov 27. [acesso em 2020 maio 11]. Disponível em: https://bit.ly/3NoVPKU.
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. Desde então, as estratégias de ação dos Munduruku sobre o tema tem se multiplicado e diversificado, vão desde articulações com o Ministério Público Federal no Pará (MPF/PA), a projetos de pesquisa cola-borativos com instituições públicas de saúde, como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), passando por projetos de pesquisa arqueológicos conduzidos em conjunto com estudantes Munduruku da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa)1414 Rocha B, Lourdes R. Na Amazônia, as bibliotecas estão sendo incendiadas. El País. 2020 jun 4. [acesso em 2021 abr 10]. Disponível em: https://bit.ly/3ruBjfL.
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, e construção de documentários, como o recente ‘Fio da Meada’ do cineasta brasileiro Silvio Tendler, este tendo por corroteristas dois pesquisadores do Núcleo Ecologias, Epistemologias e Promoção Emancipatória da Saúde (Neepes/Fiocruz).

Por outro lado, tais estratégias de resistência de determinados grupos Munduruku ao garimpo coexistem com outros grupos da mesma etnia que mantêm algum nível de acordo com os garimpeiros. De acordo com Sposati1111 Wasserman JC, Hacon SS, Wasserman MA. Mundo e Vida. 2001; 2(46):46-53.(46), há aldeias no município de Jacareacanga, no alto Tapajós, onde o dinheiro do garimpo, a partir de acordos informais com as lideranças, financiava

Uma casa de apoio em Jacareacanga. Garantiam a geração de energia para a aldeia. [...]. Os alunos que estudam fora eram mantidos com o dinheiro da mensalidade do garimpo, e tudo o que era [era] de toda a comunidade.

Essas diferentes estratégias de sobrevivência perante a devastação causada pelo garimpo, que vão dos acordos à ação direta contra os garimpeiros, passando por articulações com o Estado, a sociedade civil e a mídia, tensionam a vida nos territórios Munduruku, pois estabelecem campos de disputa tanto intraétnicos quanto interétnicos. Ou seja, fracionam a necessária articulação interna em momentos em que as pressões externas demandam uma ação colaborativa. Isso não significa que haja uma separação radical entre as várias aldeias: se a questão do garimpo os divide, outras questões mobilizam articulações, como a luta pela demarcação dos territórios e contra a instalação de barragens ao longo da bacia do rio Tapajós. O Tapajós e o Teles Pires são rios que, pela geologia de seus percursos, apresentam muitas quedas d’água e cachoeiras, o que os torna propícios para a instalação de usinas e pequenas centrais hidrelétricas. Em um levantamento recente feito pelos Munduruku e seus aliados, foram identificados 43 pontos na bacia considerados pelo Estado brasileiro como de grande potencial para esse tipo de usina, que juntas poderiam gerar até 30 MW1515 Munduruku AK, Chaves KA. “Precisamos estar vivos para seguir na luta”: pandemia e a luta das mulheres Munduruku. Mundo Amazônico. 2020 [acesso em 2021 ago 14]; 11(2):179-200. Disponível em: https://doi.org/10.15446/ma.v11n2.88662.
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Essa multiplicidade de conflitos dentro do território do povo Munduruku impõe a necessidade de acordos internos mínimos, e faz com que, mesmo tensionados pelo garimpo em diversas dimensões de seu cotidiano, os Munduruku continuem a construir mecanismos de coesão política ante as várias forças que os pressionam. Há, entretanto, períodos em que as correlações de força políticas e eco-nômicas fazem com que esse tenso equilíbrio interno, e nas relações com os garimpeiros, rompa-se, e a violência assume o lugar da negociação e da denúncia pública.

Foi o que ocorreu em novembro de 2012, quando Adenilson Kirixi Munduruku foi assassinado. O caso se tornou um símbolo da luta dos Munduruku por seu território, e iniciou um longo período de tensionamento, pois os Munduruku, por diversas vezes, denunciaram a leniência do Estado nas investigações e julgamento do caso, e da truculência da Polícia Federal, que, sob a alegação de combater o garimpo ilegal, causou violência nas aldeias do alto Tapajós, como durante a chamada Operação Eldorado1616 Oliveira RM. O jabuti e a anta: povo Munduruku, hidrelétrica, conflito e consulta prévia na bacia do rio Tapajós. Amazônica Revista de Antropologia. 2020 [acesso em 2021 ago 14]; 12(2). Disponível em: http://dx.doi.org/10.18542/amazonica.v12i2.7947.
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, quando o líder indígena Adenilson Kirixi Munduruku foi assassinado.

A mais recente situação de violência no território aconteceu em 25 de março de 2021, quando um grupo de garimpeiros, alguns do próprio povo Munduruku, invadiu e incendiou a sede de três associações Munduruku: Associação das Mulheres Munduruku Wakoborũn, Associação Da’uk e Associação Arikico, sendo que nesta também funcionava o Movimento Munduruku Ipereg Ayu e o Conselho Indígena Munduruku do Alto Tapajós (Cimat), conforme denunciado publicamente pelas entidades em carta pública divulgada na ocasião1616 Oliveira RM. O jabuti e a anta: povo Munduruku, hidrelétrica, conflito e consulta prévia na bacia do rio Tapajós. Amazônica Revista de Antropologia. 2020 [acesso em 2021 ago 14]; 12(2). Disponível em: http://dx.doi.org/10.18542/amazonica.v12i2.7947.
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. Esse evento ocorreu no esteio da intensificação do garimpo no território Munduruku e do fortalecimento político dos grupos pró-garimpo a partir de sinalizações públicas do governo federal de que a atividade seria legalizada e que as ações de fiscalização do Ibama seriam enfraquecidas.

Situações como essa apontam para a complexidade do contexto político e territorial da região, onde a ação estatal, desde o período colonial, tem contribuído para o esgarçamento das relações intraétnicas e para um crescente processo de vulnerabilização daquele povo que o deixa exposto simultaneamente aos riscos ambientais e à violência, muitas vezes fratricida. Esse é o efeito de uma política indigenista que não reconhece a autonomia dos povos indígenas para decidir seu próprio futuro, mas, ao contrário, os pressiona ao difícil dilema entre abandonar seu modo de vida e incorporar--se nas próprias atividades que destroem seus territórios, muitas vezes à revelia das decisões coletivas de seu próprio povo; ou a um desigual e difícil enfrentamento que os leva simultaneamente a conflitos com forças estatais e sociais poderosas. Embora oficialmente não se afirme o extermínio indígena como política de Estado, como no período colonial, ações e omissões políticas têm levado aos mesmos resultados, o que se colocou de forma mais óbvia com a pandemia de Covid-19, mas também ocorre com inúmeras ações, como o apoio ao garimpo, mineração, agronegócio e grilagem de terras na região que estão por detrás do modelo neoextrativista.

Considerações finais: a crise atual exige a superação do modelo de desenvolvimento neoextrativista

Acreditamos que a defesa dos direitos territoriais e da saúde dos povos indígenas implica um aprofundamento do diálogo interdisciplinar e intercultural entre a academia e o conjunto da sociedade brasileira com tais povos, não apenas para defender a sustentabilidade dos ecossistemas e preservar o meio ambiente, mas também para que possamos nos preparar com mais clareza para a necessária transição civilizatória diante das várias crises e injustiças em curso. Entendemos que o atual quadro de degradação ambiental e ameaça aos direitos dos povos indígenas em regiões como a Amazônia encontra-se profundamente conectado ao modelo neoextrativista, dentro do qual está o garimpo de ouro. Esse caso é particularmente relevante para entendermos a especificidade do neoextrativismo e suas consequências políticas, econômicas, sanitárias e ambientais.

Com o fim do acordo de Bretton Woods em 1971, o ouro deixou de ser um lastro financeiro do sistema financeiro internacional para se tornar uma commodity1818 Andrade MLA, Cunha, LMS, Gandra GT. Ouro: de lastro financeiro a commodity. BNDES Setorial, Rio de Janeiro, 2020; (11):27-46.. Essa passagem provoca, em um primeiro momento, um elevado aumento no preço do ouro e uma corrida em várias reservas auríferas no mundo, inclusive no Brasil e na região do Tapajós por meio do garimpo artesanal, que incorpora investimentos em sua mecanização que ampliam seus impactos socioambientais. Como se tratou de um processo pouco regulado pelo Estado e com forte atuação de agentes econômicos dos circuitos inferiores do capitalismo, o neoextrativismo envolvendo o garimpo ilegal possui fortes conexões com atividades ilícitas, o que traz uma dimensão ainda mais violenta para a expansão dessa atividade.

Como o ouro é uma fonte de riqueza com expressão econômica, política e simbólica que assume influências crescentes na política e no Estado, são geradas tensões e contradições entre a visão modernizadora e desenvolvimentista do Estado com os retrocessos do neoextrativismo na continuidade do que denominamos de colonialismo persistente do ‘padrão-ouro’ na região. As violências e as espoliações características das exclusões radicais e das linhas abissais do colonialismo33 Santos BSS. O Fim do império cognitivo. Coimbra: Almedina; 2018. assumem contornos semelhantes aos séculos anteriores a ele nas Américas em pleno século XXI, o que se choca com as pretensões de civilidade do Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido, o neoextrativismo vincula-se à expansão do fascismo social e a grupos de extrema-direita que unem não apenas forças racistas, autoritárias e negacionistas com as do capital financeiro e representantes do neoliberalismo, mas também aquelas assentes em atividades dos circuitos inferiores, como o garimpo e comércio de ouro, a grilagem de terras, a segurança privada e os grupos de extermínio. No contexto urbano, também encontramos expressões similares dos circuitos inferiores no crescimento não apenas do narcotráfico, mas também das milícias e grupos político-ideológicos que pregam, contraditoriamente, o uso da violência contra a criminalidade e que se opõem aos grupos que defendem os direitos humanos.

Acreditamos que, ao discutirmos a economia e a ecologia política do neoextrativismo no Brasil, poderemos contribuir para a compreensão das dinâmicas econômicas, políticas e culturais que desembocaram no abismo do fascismo social em curso no País, principalmente após a retirada inconstitucional da presidenta Dilma Rousseff em 2016. Estava em curso, sem muita clareza à época, o crescimento de grupos de extrema-direita que alcançaram um poder político-institucional inédito desde a última eleição presidencial com o apoio de forças políticas como o agronegócio que, pouco antes, formavam o governo de coalização do Partido dos Trabalhadores. Ao longo do artigo, buscamos apresentar elementos que buscam conectar o modelo neoextrativista e as recentes mudanças político-institucionais em curso, que se caracterizam por serem claramente anti-indígenas.

Por isso, a crise democrática, socioambiental e sanitária em curso exigirá, para além da busca por soberania econômica e tecnológica, e de lutas antirracistas, a busca por alternativas ao modelo desenvolvimentista e neoextrativista. Trata-se de lutas por justiça cognitiva que exigem novas formas de pensar e sentir, de articular razão e afeto, de coracionar22 Porto MFS, Rocha DF, Fasanello MT. Saúde, ecologias e emancipação: conhecimentos alternativos em tempos de crise(s). São Paulo: Hucitec; 2021., e isso faz parte dos desafios da academia nesta e nas próximas gerações.

Os desafios para superar tais problemas não são fáceis, mas passam necessariamente por uma transição para economias e formas de organização social mais harmoniosas entre sociedade e natureza. O caso dos povos indígenas e da luta dos Munduruku pela demarcação de suas terras e o enfrentamento do garimpo de ouro representa mais que um caso isolado de resistência. Podemos aprender com eles a reinventar outras formas de territorialidade, de políticas públicas e economias mais solidárias em direção a outros futuros possíveis mais justos, inclusivos e sustentáveis, ainda que difíceis de imaginar no atual cenário desenvolvimentista, neoextrativista e conservador. Por isso, sugerimos a todos que lerem este ensaio que assistam ao média-metragem ‘Garimpo, natureza e conflitos ambientais no Médio Tapajós’1919 Neepes/Fiocruz; Associação Pariri Munduruku; Produtora Couro de Rato. Garimpo, natureza e conflitos ambientais no Médio Tapajós: Diálogos Interculturais. YouTube, Canal Neepes em Movimento. [acesso em 2021 dez 20]. Disponível em: https://bit.ly/3J89WCa.
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(https://bit.ly/3J89WCa), construído em uma parceria entre o Neepes/Fiocruz, a Associação Pariri e a produtora audiovisual Couro de Rato. Nele, trazemos as vozes dos próprios Munduruku e sua sabedoria para que todos/as possamos compreender o que está realmente em jogo no rio Tapajós nesse momento.

Uma maneira de explicitar esse problema foi recentemente formulada a nós pelos Munduruku em trabalho de campo por meio da seguinte questão: por que os Pariwat (homens brancos) matam e morrem tanto por ouro se não vemos sua aplicação nos produtos que são usados no cotidiano? Os Munduruku sabem que o uso ornamental em cordões e pulseiras representa apenas uma parcela ínfima do ouro garimpado na região. Para onde então estaria indo esse ouro, e quais interesses eles servem? Responder essa pergunta aos Munduruku significa também respondermos a nós mesmos: até quando e o que precisamos fazer para deixar de matar e morrer por riquezas materiais que impedem a vida no planeta e a felicidade de tantos seres humanos?

  • Suporte financeiro: Programa Inova Fiocruz e VPAAPS/Fiocruz via projeto ‘Aprimoramento do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, através do desenvolvimento de estudos, estudos técnicos, pesquisas científicas e ações estratégicas, essenciais para a diversificação, ampliação e qualidade dos serviços de saúde prestados aos indígenas’. A tradução para o inglês recebeu também o apoio parcial do ‘Foment Program ENSP 2021’
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    Orcid (Open Researcher and Contributor ID).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    15 Ago 2021
  • Aceito
    23 Dez 2021
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