Bases teóricas para promoção da saúde e resistência camponesa: um novo horizonte metodológico

Theoretical bases for peasant health promotion and resistance: a new methodological horizon

Pedro Henrique Barbosa de Abreu Herling Gregorio Aguilar Alonzo Sobre os autores

RESUMO

O agronegócio vem historicamente promovendo a submissão da produção, economia e vida das famílias camponesas, gerando graves danos sanitários a essa parcela da população brasileira. No entanto, a resistência do campesinato perante esse secular processo evidencia que a organização das famílias e comunidades camponesas e o resgate participativo dos conhecimentos agroecológicos locais podem fundamentar estratégias de promoção da saúde que busquem mudanças concretas nesse contexto sanitário vulnerável. O objetivo deste trabalho foi apresentar pilares que fundamentaram o processo capitalista de submissão camponesa no Brasil e abordagens teórico-prático-epistemológicas que permitem sua superação. Para isso, foram apresentados tanto referenciais para pesquisas e ações que subsidiem famílias e comunidades camponesas em um processo social de autorreconhecimento, autovalorização e utilização dos seus conhecimentos e suas práticas para uma transição agroecológica emancipatória, quanto a experiência ampliada de promoção da saúde desenvolvida por meio desses referenciais em Lavras-MG. A estrutura metodológica participativa apresentada permitiu o desenvolvimento, nesse município, dos passos iniciais e fundamentais de um processo social de organização camponesa em torno de seu modo de vida e economia, tendo a agroecologia como fator determinante para a saúde e para a construção de um contexto mais justo, favorável e promissor.

PALAVRAS-CHAVES
Promoção da saúde; Trabalhadores rurais; Salutogênese; Agroecologia

ABSTRACT

Agribusiness has historically promoted the submission of production, economy, and life of peasant families, causing serious health damage to this portion of the Brazilian population. However, the peasantry’s resistance to this secular process shows that the organization of families and communities and the participatory rescue of local agroecological knowledge can support health promotion strategies that seek concrete changes in this vulnerable health context. The objective of this work is to present bases that founded the capitalist process of peasant submission in Brazil and also theoretical-practical-epistemological approaches that allow its overcoming. For this, references for research and actions that subsidize peasant families and communities in a social process of self-recognition, self-valorization, and use of their knowledge and practices for an emancipatory agroecological transition are presented, as well as the health promotion expanded experience developed through these references in Lavras-MG, Brazil. The participatory methodological structure presented allowed the development of the initial and fundamental steps of a social process of peasant organization around their way of life and economy, with agroecology as a determining factor for health and for the construction of a fairer, more favorable, and more promising context.

KEYWORDS
Health promotion; Rural workers; Salutogenesis; Agroecology

Introdução

O termo ‘agricultura familiar’ foi institucionalizado no Brasil em 1995, quando da promulgação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf )11 Brasil. Resolução nº 2.191, de 24 de agosto de 1995. Crédito Rural – Institui o Programa Nacional da Agricultura Familiar (PRONAF). Diário Oficial da União. 24 Ago 1995.,22 Picolotto EL. Os atores da construção da categoria agricultura familiar no Brasil. Rev. Econ. Sociol. Rural. 2014; 52(1):63-83.. Segundo Picolotto22 Picolotto EL. Os atores da construção da categoria agricultura familiar no Brasil. Rev. Econ. Sociol. Rural. 2014; 52(1):63-83., o reconhecimento formal desse termo veio como a culminância de um processo de disputa – que se desenrolou durante as décadas de 1980 e 1990 – entre setores acadêmicos, sindicatos rurais e o Estado brasileiro, para estabelecer conceitualmente quem era a família-trabalhadora proprietária de pequenas áreas de terra que se mantinha social e economicamente ativa (apesar das profundas dificuldades) ante o processo histórico de desenvolvimento capitalista da agricultura.

Como consequência desse processo de conceituação, que resumiu a complexidade do campesinato brasileiro aos aspectos referentes a seu modo de produção e à sua ‘modernização’ sob parâmetros externos, a agricultura familiar passou a ser oficialmente definida e entendida pelo Estado sob um caráter puramente produtivo-mercadológico33 Brasil. Lei nº. 11.326, de 24 de julho de 2006. Estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais. Diário Oficial da União. 24 Jul 2006.. O rompimento, portanto, desse complexo, geracional, cultural e autônomo modo de vida e economia, por meio da introjeção conceitual, política e prática da ‘agricultura familiar’ – como reprodutora de um ‘pequeno agronegócio’ – nas unidades camponesas de produção44 Krauser RR. A agroecologia e o plano camponês. Candiota: Instituto Cultural Padre Josimo; 2015., tem trazido importantes danos sanitários a essa parcela da população brasileira. Assim, aos já amplamente identificados, documentados e divulgados impactos à saúde da população camponesa decorrentes do uso de agrotóxicos55 Instituto Nacional de Câncer. Posicionamento do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva acerca dos agrotóxicos. Rio de Janeiro: INCA; 2015 [acesso em 2018 jun 8]. Disponível em: http://www1.inca.gov.br/inca/Arquivos/comunicacao/posicionamento_do_inca_sobre_os_agrotoxicos_06_abr_15.pdf.
http://www1.inca.gov.br/inca/Arquivos/co...
,66 Carneiro FF, Augusto LGS, Rigotto RM, et al., organizadores. Dossiê ABRASCO: um alerta sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde. Rio de Janeiro: EP-SJV; 2015.,77 Brasil. Ministério da Saúde. Relatório Nacional de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos. Brasília, DF: MS; 2016. [acesso em 2016 out 11]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/agrotoxicos_otica_sistema_unico_saude_v1_t.1.pdf.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
,88 Abreu PHB. O agricultor familiar e o uso (in)seguro de agrotóxicos no município de Lavras, MG. [dissertação]. [Campinas]: Universidade Estadual de Campinas; 2014. 206 p.
(uma das tecnologias do pacote produtivo do modelo do agronegócio), somam-se os danos que ocorrem como consequência da retirada da autonomia familiar sobre os aspectos da produção e economia da unidade produtiva; da desestabilização causada pela dependência técnica, tecnológica, de conhecimentos, de produtos e créditos externos; e da dominação e supressão das tradições geracionais e bases culturais camponesas (que envolvem a produção de alimentos em equilíbrio com o meio ambiente local).

No entanto, movimentos organizados de camponeses e camponesas passaram, a partir da década de 1990, a disputar (pela negação) esse entendimento conceitual e político. Expoente dessa organização e disputa, o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) se posiciona de forma contrária à dicotomia inerente ao conceito de agricultura familiar, “onde o camponês é atrasado e o agricultor familiar é moderno”99 Silva VI. Classe camponesa: modo de ser, de viver e de produzir. Porto Alegre: Instituto Cultural Padre Josimo; 2014. [acesso em 2022 mar 14]. Disponível em: https://www.academia.edu/17561869/Classe_camponesa_modo_de_ser_de_viver_e_de_produzir.
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. Para autores intrínsecos desse movimento social, a transformação conceitual e prática do(a) camponês(a) em agricultor(a) familiar tem tido como intenção e consequência o “desmonte da cultura e da identidade das famílias camponesas”99 Silva VI. Classe camponesa: modo de ser, de viver e de produzir. Porto Alegre: Instituto Cultural Padre Josimo; 2014. [acesso em 2022 mar 14]. Disponível em: https://www.academia.edu/17561869/Classe_camponesa_modo_de_ser_de_viver_e_de_produzir.
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. Tal identidade apresenta elementos práticos e subjetivos, como a ligação com a terra; o sentimento de pertencimento a um território (povoado ou comunidade); a relação direta com a natureza; a relação próxima com vizinhos; os valores comunitários; o trabalho familiar; e uma lógica autônoma (baseada em recursos locais e interesses/demandas familiares) de produção de alimentos, o chamado sistema camponês de produção44 Krauser RR. A agroecologia e o plano camponês. Candiota: Instituto Cultural Padre Josimo; 2015..

É nesse sentido, portanto, que pesquisas e ações em saúde coletiva voltadas para a promoção da saúde de populações camponesas impactadas pela submissão de seu modo de produção e vida pelo agronegócio (e, consequentemente, pelo uso de agrotóxicos) precisam tanto apreender as bases históricas, teórico-práticas e epistemológicas que fundamentaram a construção de tal submissão, quanto buscar referenciais transformadores, participativos e resolutivos para a construção de novas bases teóricas, metodológicas e epistemológicas de pesquisa e ação.

Para isso, tais bases inovadoras devem estruturar caminhos de pesquisa-ação que subsidiem a família e a comunidade camponesa em um processo social de autorreconhecimento, autovalorização e utilização dos seus conhecimentos e suas práticas produtivas, econômicas e culturais – tradicionalmente sustentáveis dos pontos de vista agrícola, ecológico e sanitário. Foi nesse sentido que o artigo ‘Salutogênese-Camponês a Camponês: uma metodologia para promoção da saúde de populações expostas a agrotóxicos’1010 Abreu PHB, Alonzo HGA. Salutogênese-Camponês a Camponês: uma metodologia para promoção da saúde de populações expostas a agrotóxicos. Saúde debate. 2018 [acesso em 2022 mar 14]; 42(esp4):261-74. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/bBvpcNhb5bf9mpKgcvGxYcK/abstract/?lang=pt.
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– um relato da experiência das cinco primeiras atividades dos trabalhos de campo da pesquisa de doutorado ‘Construção de um processo participativo de Promoção da Saúde para a superação do modelo do agronegócio: a experiência camponesa a partir da Salutogênese e da Agroecologia em Lavras – MG’1111 Abreu PHB. Construção de um processo social participativo de Promoção da Saúde para a superação do modelo do agronegócio: a experiência camponesa a partir da Salutogênese e da Agroecologia em Lavras – MG. [tese]. [Campinas]: Universidade Estadual de Campinas; 2018. 412 p., buscou apresentar caminhos e instrumentos de estruturação e desenvolvimento de uma metodologia fundamentada no referencial teórico-prático do paradigma salutogênico de promoção da saúde e da metodologia social de disseminação horizontal e autônoma da agroecologia conhecida como camponês a camponês.

Assim, neste ensaio, entendendo-se a importância e a relevância da continuidade, ampliação e aprofundamento do tema1111 Abreu PHB. Construção de um processo social participativo de Promoção da Saúde para a superação do modelo do agronegócio: a experiência camponesa a partir da Salutogênese e da Agroecologia em Lavras – MG. [tese]. [Campinas]: Universidade Estadual de Campinas; 2018. 412 p., são apresentados tanto os precedentes históricos sobre as quais foram construídas a submissão da produção, economia, vida e saúde das famílias camponesas brasileiras ao modelo capitalista do agronegócio, quanto bases teórico-práticas complementares e potencializadoras utilizadas para a implantação de um novo horizonte metodológico de promoção da saúde com camponeses e camponesas no município de Lavras, em Minas Gerais.

Os pilares capitalistas da submissão camponesa

A caricatura inferiorizada do camponês

Como todo processo, a ‘modernização’ dos modos de vida e economia camponesa nos moldes e interesses coloniais capitalistas teve, antes de estar plenamente estruturada e com ações e rumos totalmente definidos, etapas precedentes de construção. Dessa forma, o que foi chamada Revolução Verde, a partir do final da década de 1960, e que consiste em um processo estruturado de transferência de pacotes tecnológicos das indústrias químicas e mecânicas dos países dominantes para os campos agrícolas dos países dominados1212 Hazel PBR. Green Revolution. In: Mokyr J, organizador. The Oxford encyclopedia of economic history: v. 2. New York: Oxford University Press; 2003. p. 478-80.,1313 Ponting C. Uma história verde do mundo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 1995., teve como antecedentes constitutivos no Brasil: a construção do camponês (em toda sua diversidade) como ‘ser inferior’ (Jeca Tatu, bicho do mato, capiau, caipira da roça etc.) por intelectuais pertencentes às oligarquias/ burguesias agrárias e à nascente burguesia urbana; e, também, a construção do controle ‘por dentro’ (por meio da intrusão direta da ciência e técnica agrária capitalista) do modo de produção camponês, do trabalho familiar e do conhecimento local e intergeracional.

A partir dos primeiros anos do século XX, começou a ser trabalhada a unificação das diferenças e, principalmente, das semelhanças que envolviam a autonomia de vida e produção da diversa população camponesa brasileira sob uma única ‘caricatura’1414 Ribeiro D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras; 2006.. Os principais responsáveis por essa construção ideológica do campesinato autônomo como atrasado e inferior; como responsável pelos problemas sociais e sanitários do País; e como parasita da terra e do Estado – visão que fundamentou, a partir de então, as políticas e ações públicas e privadas – foram os intelectuais e escritores brasileiros de origem oligárquica-burguesa, educados na ou sob as bases de conhecimento da Europa Ocidental capitalista1414 Ribeiro D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras; 2006.,1515 Klanovicz J. O Brasil no mundo rural doente: a construção do agricultor na literatura em dois momentos da história brasileira (1914 e 1970). Luso-Braz. review. 2007 [acesso em 2022 mar 14]; 44(1):45-59. Disponível em: https://muse.jhu.edu/article/219127.
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. Nesse sentido, tanto Klanovicz1515 Klanovicz J. O Brasil no mundo rural doente: a construção do agricultor na literatura em dois momentos da história brasileira (1914 e 1970). Luso-Braz. review. 2007 [acesso em 2022 mar 14]; 44(1):45-59. Disponível em: https://muse.jhu.edu/article/219127.
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quanto Darcy Ribeiro1414 Ribeiro D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras; 2006. descrevem o ‘intelectual-fazendeiro’1414 Ribeiro D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras; 2006. Monteiro Lobato como peça-chave para a construção do camponês como ‘ser inferior’. Segundo Klanovicz1515 Klanovicz J. O Brasil no mundo rural doente: a construção do agricultor na literatura em dois momentos da história brasileira (1914 e 1970). Luso-Braz. review. 2007 [acesso em 2022 mar 14]; 44(1):45-59. Disponível em: https://muse.jhu.edu/article/219127.
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, para Lobato,

O atraso da nação se devia aos parasitas caboclos, aos lavradores ignorantes, pobres, infelizes e, principalmente, doentes. Lobato, membro da elite paulista do início do século XX e articulista d´O Estado de São Paulo, criou em 1914 o personagem Jeca Tatu com o intuito de representar a população lavradora nacional sob a ótica da doença. [...] Ele vivia a maior parte do tempo de cócoras, ‘sem disposição para o trabalho’; era ignorante e sua mulher não passava de uma ‘sarcopta [sic] fêmea cheia de filhos’. A rigor, Jeca Tatu era a elaboração patronal do brasileiro pobre do início do século XX e nessa perspectiva, figura detestável, horrível, repugnante, porém necessária para a manutenção das próprias elites51(46)46 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Agropecuário 2006. Rio de Janeiro: IBGE; 2009. [acesso em 2017 abr 6]. Disponível em: http://www.mma.gov.br/estruturas/sds_dads_agroextra/_arquivos/familia_censoagro2006_65.pdf.
http://www.mma.gov.br/estruturas/sds_dad...
. [Grifos do autor].

[...] Talvez seja por isso que Lobato afirmava que o Jeca Tatu [...] era um urupê de pau podre e sua vida resumia-se ao convívio com poucos animais domésticos numa propriedade rural de alguns alqueires de terra mal-aproveitados economicamente1515 Klanovicz J. O Brasil no mundo rural doente: a construção do agricultor na literatura em dois momentos da história brasileira (1914 e 1970). Luso-Braz. review. 2007 [acesso em 2022 mar 14]; 44(1):45-59. Disponível em: https://muse.jhu.edu/article/219127.
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(51)
.

Essa imagem histórica (caricata e depreciativa) do camponês e seus modos de vida e produção, construída como arcaica, improdutiva e negativa tanto para o desenvolvimento do País quanto para a própria saúde e economia familiar camponesa, disseminou-se, então, por diversos meios de comunicação e entretenimento ao longo do século XX, sendo hoje a base e o pano de fundo das atuais estratégias de marketing para ‘popularização’ e avanço continuado do agronegócio. Como exemplo e essência geral dessas estratégias, o modelo de produção capitalista-latifundiário é apresentado como tecnologia superior ao sistema produtivo camponês de base socioecológica (‘Agro é Tech’); como modelo fundamental de produção, ‘voltado para a vida e alimentação da população’ (‘Agro é Pop’); e como modo totalizante da sociedade, da cultura e da economia do País (‘Agro é Tudo’)1616 Fundação Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro: Observatório Brasileiro de Hábitos Alimentares. As verdades inconvenientes que a campanha “Agro Pop” tenta esconder. [acesso em 2018 out 30]. Disponível em: https://obha.fiocruz.br/index.php/2017/02/22/as--verdades-inconvenientes-que-campanha-agro-pop--tenta-esconder/.
https://obha.fiocruz.br/index.php/2017/0...
.

O campesinato brasileiro (abarcando pequenos proprietários, trabalhadores rurais sem posse de terra – empregados temporários, parceiros, meeiros, posseiros etc. – indígenas aldeões e quilombolas), juntamente aos seus conhecimentos produtivos geracionais (repletos, inclusive, de constantes inovações), à sua cultura e à sua economia, foi, portanto, ideologicamente estabelecido, por meio de um processo ativo de determinação social, como ser inferior, passível e até necessitado de ações e intervenções do Estado, da ciência e do setor privado para modernizar seu modo de vida ‘atrasado’.

A (re)produção da ciência agrária capitalista

Paralelamente, vinham sendo construídas, desde o final do século XIX, as primeiras estruturas de (re)produção de conhecimentos e práticas das ciências agrícolas no Brasil, que, alguns anos mais tarde, fundamentariam as teorias e as práticas do processo ‘modernizador’ do campesinato. Essa ciência, oriunda e baseada nas formas de produção que atendiam e representavam os interesses mercantis dos países centrais do capitalismo e da elite periférica brasileira, teve como primeira experiência concreta a fundação do Instituto Agronômico de Campinas (IAC)1717 Coelho FMG. A arte das orientações técnicas no campo: concepções e métodos. Viçosa: Suprema; 2014.. No entanto, os resultados iniciais apresentados pelo IAC desagradaram em grande parte seus mantenedores. Isso porque Franz Wilhelm Dafert, químico austríaco contratado como diretor do IAC pelos Barões do Café do estado de São Paulo, mesmo buscando a otimização dos resultados produtivos e econômicos de seus financiadores, apontou como causas dos problemas de produtividade e dos impactos à capacidade de regeneração e manutenção do solo o uso predatório da terra nos extensos latifúndios, o trabalho escravo e o distanciamento dos donos em relação à produção, já que estes viviam nas cidades1717 Coelho FMG. A arte das orientações técnicas no campo: concepções e métodos. Viçosa: Suprema; 2014..

Tais críticas e questionamentos inconvenientes às bases da ordem econômica, social e política da oligarquia-burguesia latifundiária que comandava o País não foram repetidos nas escolas agrícolas com raízes e inspirações estadunidenses (fundadores, pesquisadores e professores) instaladas no início do século XX em Minas Gerais. Tanto a Escola Agrícola de Lavras (atual Universidade Federal de Lavras – Ufla), fundada em 1908 por missionários--professores da Igreja Presbiteriana do Sul dos Estados Unidos1818 Dias JC. A terra prometida de Lavras. São Paulo: Barleus; 2009., quanto a Escola Superior de Agricultura e Veterinária (atual Universidade Federal de Viçosa – UFV), “criada por um americano apaixonado pelas possibilidades civilizatórias de uma escola científico-técnica para o melhoramento da agricultura no Brasil”1717 Coelho FMG. A arte das orientações técnicas no campo: concepções e métodos. Viçosa: Suprema; 2014.(49), em 1922, não apresentavam em seus programas curriculares e em seus projetos de pesquisa temas que questionassem e buscassem formar profissionais com pensamento crítico em relação às estruturas latifundiárias e monocultoras1717 Coelho FMG. A arte das orientações técnicas no campo: concepções e métodos. Viçosa: Suprema; 2014.,1818 Dias JC. A terra prometida de Lavras. São Paulo: Barleus; 2009.. Analisando a trajetória inicial da Escola Superior de Agricultura e Veterinária, Coelho1717 Coelho FMG. A arte das orientações técnicas no campo: concepções e métodos. Viçosa: Suprema; 2014. aponta que:

À medida que o mundo social não era questionado, o conhecimento técnico comprometia-se com o aprimoramento da ordem existente sem tocar nas bases estruturais latifundistas [...]. As possibilidades abertas pelas mudanças técnicas eram interessantes, desde que não tocassem na capacidade de controle político das oligarquias sobre a terra e o trabalho no campo. Por isso, pode-se dizer que esse arranjo institucional permitiu a construção de forte identidade de propósitos entre a escola e as elites agrárias1717 Coelho FMG. A arte das orientações técnicas no campo: concepções e métodos. Viçosa: Suprema; 2014.(49).

Nesse mesmo sentido, além de (re)produzir ciência-técnica para o desenvolvimento produtivo e econômico dos cultivos das elites latifundiárias, as principais escolas agrícolas do Brasil foram criadas para que os filhos desta mesma elite – além de outros poucos que haviam ascendido socialmente por meio da escolaridade em um País majoritariamente analfabeto – formassem-se para aplicar os conhecimentos técnicos adquiridos nas terras de seus pais e/ou patrões1717 Coelho FMG. A arte das orientações técnicas no campo: concepções e métodos. Viçosa: Suprema; 2014.. Dessa forma, até a década de 1940, a ciência agrária ‘nacional’ e a construção ideológica e social do campesinato brasileiro como um ser/povo inferior vinham fortalecendo a estrutura e a economia capitalista dos grandes concentradores de terra do País, mas ainda não haviam, de maneira substancial, permitido a modernização-conversão capitalista da produção, economia e vida camponesa.

A assistência técnica rural como método de invasão cultural

Uma solução efetiva para desestruturar e dominar os modos de produção e vida camponesa, fazendo com que estas fossem atreladas e submetidas por completo à economia capitalista (ao mercado, aos créditos e à produtos e tecnologias como insumos e máquinas), precisava ser colocada em prática de modo a alterar e comprometer ‘por dentro’ a autonomia do trabalho familiar camponês. Tal solução prática, que permitiria à ciência agrária capitalista desenvolver efetivamente seu papel colonial, ao passar a controlar e subjugar o trabalho e os conhecimentos camponeses, já vinha sendo realizada nos Estados Unidos. De lá, então, foi adaptada e trazida ao Brasil, em 1948, por Nelson Rockefeller, por intermédio da Associação Internacional Americana (AIA), a Extensão Rural1919 Fonseca MTL. A extensão rural no Brasil, um projeto educativo para o capital. São Paulo: Loyola; 1985..

Sobre os primórdios estadunidenses, Fonseca1919 Fonseca MTL. A extensão rural no Brasil, um projeto educativo para o capital. São Paulo: Loyola; 1985. relata que a Extensão Rural:

[...] fornecia uma proposta teórico-metodológica para se conseguir, em menor prazo, que os habitantes de ‘áreas tradicionais ou subdesenvolvidas’ modificassem seus comportamentos pela adoção de práticas consideradas cientificamente válidas para a solução de seus problemas e consequentemente o alcance do desenvolvimento econômico-social1919 Fonseca MTL. A extensão rural no Brasil, um projeto educativo para o capital. São Paulo: Loyola; 1985.(46). [Grifo do autor].

Convém lembrar mais uma vez que, nesta perspectiva, o desenvolvimento econômico--social é entendido como uma passagem da sociedade do tipo tradicional [...] para um tipo de sociedade onde predominam padrões de lucro, neutralidade afetiva, universalismo, especialização e soluções técnico-científicas para os problemas comuns1919 Fonseca MTL. A extensão rural no Brasil, um projeto educativo para o capital. São Paulo: Loyola; 1985.(46).

Não por coincidência, Nelson Rockefeller escolheu Minas Gerais para ser a experiência e a referência brasileira em extensão dos conhecimentos acadêmicos-científicos para o meio rural. As Escolas Agrícolas de Lavras e de Viçosa, após algumas décadas de existência, vinham não apenas (re)produzindo conhecimentos e técnicas alinhadas aos interesses do mercado e das empresas capitalistas (em especial as estadunidenses) como também vinham realizando experiências prévias de disseminação dessa ciência, por meio de exposições nacionais e da publicação e distribuição de revistas, livros e cartilhas agropecuárias1717 Coelho FMG. A arte das orientações técnicas no campo: concepções e métodos. Viçosa: Suprema; 2014.,1818 Dias JC. A terra prometida de Lavras. São Paulo: Barleus; 2009.. Com o estabelecimento, então, nesse estado, da tríade pesquisa-ensino-extensão rural capitalista, a Associação de Crédito e Assistência Rural (Acar – MG) pôde – sendo “uma instituição cuja prática tinha em vista a difusão de produtos e métodos de cultivos exigidos pela chamada, na época, de ‘agricultura moderna’”1717 Coelho FMG. A arte das orientações técnicas no campo: concepções e métodos. Viçosa: Suprema; 2014.(85) e contando, para isso, com todo aparato estatal e empresarial capitalistas – dar início ao processo de introjeção, ao modo de produção camponês, de artifícios de ‘melhoria e desenvolvimento’ que desconsideravam e subjugavam suas técnicas e conhecimentos tradicionais e sua autoexploração equilibrada do trabalho familiar2020 Chayanov AV. Teoria dos sistemas econômicos não capitalistas. In: Carvalho HM, organizador. Chayanov e o campesinato. São Paulo: Expressão Popular; 2014. p. 89-137.. Assim, a Extensão Rural logrou atrelar, enfim, em grande parte, o trabalho, a economia e a vida camponesa à economia capitalista, por meio do círculo vicioso da compra de tecnologia externa/ crédito para pagar seus custos.

Klanovicz1515 Klanovicz J. O Brasil no mundo rural doente: a construção do agricultor na literatura em dois momentos da história brasileira (1914 e 1970). Luso-Braz. review. 2007 [acesso em 2022 mar 14]; 44(1):45-59. Disponível em: https://muse.jhu.edu/article/219127.
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aponta como a Extensão Rural no Brasil, sob o discurso da modernização do inferiorizado camponês e como componente prático de intrusão das teorias e técnicas da ciência capitalista, completou as ferramentas de desestruturação e submissão do povo camponês, permitindo o acesso do poder capitalista ao trabalho autorregulado e autônomo da produção camponesa familiar2020 Chayanov AV. Teoria dos sistemas econômicos não capitalistas. In: Carvalho HM, organizador. Chayanov e o campesinato. São Paulo: Expressão Popular; 2014. p. 89-137. e, também, a seus conhecimentos geracionais. Segundo o autor,

os ‘jecas’ sucessivamente redefinidos por instituições de assistência técnica e extensão rural não passavam de agricultores coagidos pelo Estado a inserir suas propriedades na economia capitalista, transformar técnicas de produção e éticas de trabalho1515 Klanovicz J. O Brasil no mundo rural doente: a construção do agricultor na literatura em dois momentos da história brasileira (1914 e 1970). Luso-Braz. review. 2007 [acesso em 2022 mar 14]; 44(1):45-59. Disponível em: https://muse.jhu.edu/article/219127.
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. [Grifo do autor].

Dessa forma, a construção precedente e interconectada da “inferioridade camponesa” e do controle do trabalho e dos conhecimentos familiares e comunitários por meio da ciência--extensão rural capitalistas formou a estrutura em que se fundamentou (e a qual aprofundou radicalmente) a Revolução Verde.

Referenciais teóricopráticos para novas abordagens metodológicas em promoção da saúde camponesa

Agroecologia

A Carta de Ottawa2121 Brasil. Ministério da Saúde. Projeto Promoção da Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2001. trouxe, em 1986, as bases conceituais da promoção da saúde, como um campo de conhecimento e prática capaz de dar sustentação a processos de melhoria das condições de vida e saúde de populações subjugadas e destituídas do controle de seus próprios contextos, recursos e autonomia. No entanto, a promoção da saúde carece, em qualquer contexto e população com a qual se intencione seu desenvolvimento, de uma busca e operacionalização teórico-metodológica que possibilite a concretização e os efeitos sanitários resolutivos de seu conceito democrático e horizontal2222 Eriksson M, Lindström B. A salutogenic interpretation of the Ottawa Chartrer. Health Promotion International. 2008; 23(2):190-99..

No caso de populações camponesas submetidas à subjugação e impactos da lógica, estrutura e ações do agronegócio capitalista, a base teórica e operacional de estruturação de uma estratégia de promoção da saúde deve viabilizar um processo de construção da autoapreensão camponesa de seu contexto e da valorização e utilização de seus conhecimentos e recursos no processo de mudança das condições de dominação, exploração e adoecimento de seu modo particular de vida, produção e economia1010 Abreu PHB, Alonzo HGA. Salutogênese-Camponês a Camponês: uma metodologia para promoção da saúde de populações expostas a agrotóxicos. Saúde debate. 2018 [acesso em 2022 mar 14]; 42(esp4):261-74. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/bBvpcNhb5bf9mpKgcvGxYcK/abstract/?lang=pt.
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. Para isso, o conceito da promoção da saúde deve ser entrelaçado com a teoria, a prática e a práxis de um modelo de produção e conhecimento que seja coerente com o modo de vida e economia camponesa, permitindo sua reestruturação e potencialização. Ou seja, uma estratégia metodológica de promoção da saúde que se intencione resolutiva (profunda e amplamente), buscando a emancipação do pensamento e vida camponesa, deve estruturar, viabilizar e apoiar um processo de transição para o modelo agroecológico.

Autores como Navolar et al.2323 Navolar TS, Rigon AS, Philippi JMS. Diálogo entre agroecologia e promoção da saúde. Rev. bras. Promoção Saúde. 2010; 23(1):69-79., Azevedo e Pelicioni2424 Azevedo E, Pelicioni MCF. Promoção da saúde, sustentabilidade e agroecologia: uma discussão intersetorial. Saúde Soc. 2011; 20(3):715-29.,2525 Azevedo E, Pelicioni MCF. Agroecologia e promoção da saúde no Brasil. Rev Panam Salud Publica. 2012; 31(4):290-95. e o próprio Ministério da Saúde do governo brasileiro (2016) – por meio das ‘Diretrizes nacionais para a vigilância em saúde de populações expostas a agrotóxicos’2626 Brasil. Ministério da Saúde. Diretrizes nacionais para a vigilância em saúde de populações expostas a agrotóxicos. Brasília: MS; 2016. [acesso em 2016 out 11]. Disponível em: http://portalsaude.saude.gov.br//images/pdf/2016/fevereiro/24/Diretrizes-VSPEA.pdf.
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– indicam tanto a agricultura e o sistema agroalimentar como fatores indissociáveis à conformação das condições de vida das populações rurais quanto a agroecologia como área que intercomplementa e fortalece o conceito, as estratégias e as práticas em promoção da saúde. Isso porque esse modelo de produção agrícola (e, também, modo de vida) permite o (re) desenvolvimento do equilíbrio camponês em relação ao meio ambiente local, ao seu modo de economia familiar e às suas relações sociais e culturais, promovendo, assim, a autonomia dessas populações subjugadas pelo agronegócio e expostas, direta ou indiretamente, a agrotóxicos2323 Navolar TS, Rigon AS, Philippi JMS. Diálogo entre agroecologia e promoção da saúde. Rev. bras. Promoção Saúde. 2010; 23(1):69-79.,2424 Azevedo E, Pelicioni MCF. Promoção da saúde, sustentabilidade e agroecologia: uma discussão intersetorial. Saúde Soc. 2011; 20(3):715-29.,2525 Azevedo E, Pelicioni MCF. Agroecologia e promoção da saúde no Brasil. Rev Panam Salud Publica. 2012; 31(4):290-95..

Segundo Wezel2727 Wezel A, Bellon S, Doré T, et al. Agroecology as a science, a movement and a practice. A review. Agron. Sustain. Dev. 2009; 29(4):503-15., o Brasil é o país onde a agroecologia vem sendo mais nítida e decisivamente definida e utilizada como movimento e ação social (política), prática (técnicas agroecológicas) e produção de conhecimento e tecnologia (ciência). Assim, entendida como práxis que promove o diálogo horizontal e a ação conjunta entre indivíduos, comunidades e entidades camponesas, acadêmicas e institucionais2828 Altieri M. Agroecologia: bases científicas para uma agricultura sustentável. São Paulo: Expressão Popular; 2012., a agroecologia no Brasil dispõe de fundamentação, experiências e potencial para a emancipação do pensamento e do modo de vida camponês; e, ao mesmo tempo, para construção e viabilização de processos sociais, culturais, ecológicos e sanitários para a superação do modelo dominante do agronegócio.

Nesse sentido, um trabalho de pesquisa científica que pretenda desenvolver um processo coletivo de resgate, implementação e disseminação da agroecologia deve se basear em métodos que direcionem a promoção da saúde para mudanças práticas, reais e profundas e que permitam uma interpretação científica/ filosófica descolonizada e descolonizadora2828 Altieri M. Agroecologia: bases científicas para uma agricultura sustentável. São Paulo: Expressão Popular; 2012..

Método Analético

Ao propor o Método Analético como filosofia e prática científica para a estruturação de caminhos para a libertação/emancipação do povo latino-americano, Enrique Dussel2929 Dussel ED. Método para uma filosofia da libertação. São Paulo: Edições Loyola; 1986. reforça a importância e a necessidade do Método Dialético de Marx3030 Marx K. O capital: crítica da economia política: livro I. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 2003. para a superação – pelos trabalhadores e trabalhadoras organizados – das relações e formas de dominação e exploração impostos pela burguesia capitalista. Complementarmente, entretanto, ele afirma ser necessário o desenvolvimento de um momento anterior (o momento analético), em que os que vivem e trabalham sob a colonialidade do poder capitalista3131 Quijano A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino--americanas. Buenos Aires: CLACSO; 2005. – ou seja, aqueles que são subjugados e explorados tanto pela burguesia local dependente (periférica) quanto pelos países e corporações dominantes (que negam, desde sua posição central no capitalismo, a cultura e o modo de vida ‘inferior e atrasado’ da periferia do mundo, impondo a sua ‘modernidade’) – precisam se autorreconhecer como não organicamente pertencentes (exteriores, ainda que invariavelmente internalizados pela dominação colonial do sistema) à totalidade da sociedade capitalista, para, a partir daí, negar a negação imposta (momento dialético) pelo capitalismo burguês2929 Dussel ED. Método para uma filosofia da libertação. São Paulo: Edições Loyola; 1986..

No caso e exemplo do campesinato brasileiro, o momento analético, como proposto por Dussel2929 Dussel ED. Método para uma filosofia da libertação. São Paulo: Edições Loyola; 1986., deve trabalhar inicialmente o autoentendimento da família camponesa como tal (sua cultura; seu modo de vida e economia; seu modo de produção próprio e seus conhecimentos tradicionais/geracionais; seus direitos e desejos; as explorações que sofrem; e as suas pautas para a mudança do contexto de exploração), a partir de sua própria palavra e percepção. Isso é fundamental, segundo o autor, para que os trabalhadores e trabalhadoras possam, de fato, autodefinir-se e, a partir daí, definir os rumos de sua ampla descolonialidade2929 Dussel ED. Método para uma filosofia da libertação. São Paulo: Edições Loyola; 1986..

Sendo esse, portanto, um método que intenciona mudanças práticas, reais e profundas, que permitam uma interpretação científica/ filosófica que promova e dissemine essa autêntica emancipação; e, também, sendo esse o caminho escolhido para fundamentar, implementar e analisar um processo de pesquisa e ação de promoção da saúde de populações camponesas dominadas e impactadas pelo modelo capitalista do agronegócio, faz-se necessária a estruturação de um processo que se utilize de metodologias camponesas, paradigmas sanitários e desenhos de estudo que viabilizem a operacionalização do que é cientificamente definido por Dussel como “saber situar-se para que, das condições de possibilidade da revelação, pudéssemos aceder a uma reta interpretação da palavra do outro”2929 Dussel ED. Método para uma filosofia da libertação. São Paulo: Edições Loyola; 1986.(208), sendo que, “o tema a ser pensado, a palavra reveladora a ser interpretada ser-lhe--ão dados na história do processo concreto da própria libertação”2929 Dussel ED. Método para uma filosofia da libertação. São Paulo: Edições Loyola; 1986.(198).

Salutogênese e Metodologia social Camponês a Camponês

Entendendo a agroecologia e o Método Analético como referenciais teórico-práticos para a edificação de processos sociais de emancipação/ libertação por meio do autorreconhecimento e disponibilização de experiências, saberes e práticas de famílias camponesas e de suas comunidades, fica nítido que uma transição agroecológica não pode acontecer pela simples transmissão hierarquizada de práticas e tecnologias por meio das ‘vias clássicas’ de assistência técnica e extensão rural, de pesquisas científicas e de ações públicas que desvalorizam saberes tradicionais e que não permitem o protagonismo camponês no processo. Nesse mesmo sentido, tanto as orientações patogênicas de prevenção de doenças e proteção da saúde quanto os programas de promoção da saúde que não se baseiam em conteúdos teóricos que buscam desenvolver a saúde como “[...] um conceito positivo, que enfatiza os recursos sociais e pessoais [...]”2121 Brasil. Ministério da Saúde. Projeto Promoção da Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2001.(20), são insuficientes para dar sustentação teórica e operacional a tais processos de transição agroecológica com camponeses que vêm sofrendo o processo ativo de subalternização de seu modo de vida, cultura e economia. Isso porque, de modo geral, essas orientações e programas sanitários buscam caracterizar pessoas e comunidades por meio de seus problemas, debilidades e incompetências, e não mediante promoção e visibilização das experiências, conhecimentos e inovações (incluindo as agroecológicas) disponíveis entre os próprios camponeses e camponesas.

Foi com o intuito metodológico, portanto, de estruturar e desenvolver um caminho (fundamentado teórica e praticamente) de promoção da saúde de famílias e comunidades rurais que vivem em contextos de exploração e impactos gerados do modelo do agronegócio que o artigo ‘Salutogênese-Camponês a Camponês: uma metodologia para promoção da saúde de populações expostas a agrotóxicos’1010 Abreu PHB, Alonzo HGA. Salutogênese-Camponês a Camponês: uma metodologia para promoção da saúde de populações expostas a agrotóxicos. Saúde debate. 2018 [acesso em 2022 mar 14]; 42(esp4):261-74. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/bBvpcNhb5bf9mpKgcvGxYcK/abstract/?lang=pt.
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apresentou tanto a sinergia quanto a complementariedade entre o paradigma salutogênico e a Metodologia Camponês a Camponês (CaC) de disseminação da agroecologia. Conforme abordado no artigo1010 Abreu PHB, Alonzo HGA. Salutogênese-Camponês a Camponês: uma metodologia para promoção da saúde de populações expostas a agrotóxicos. Saúde debate. 2018 [acesso em 2022 mar 14]; 42(esp4):261-74. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/bBvpcNhb5bf9mpKgcvGxYcK/abstract/?lang=pt.
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, a Salutogênese apresenta-se como paradigma de promoção da saúde que busca disponibilizar práticas, características e conhecimentos positivos próprios (recursos de saúde) das pessoas de uma determinada população e localidade, por meio da identificação e da apropriação, pessoal e comunitária, desses recursos. Tal processo, segundo Antonovsky3232 Antonovsky A. Unraveling the mystery of health: how people manage stress and stay well. San Francisco: Jossey-Bass; 1987.,3333 Antonovsky A. The salutogenic model as a theory to guide health promotion. Health Promotion International. 1996; 11(1):11-18., tem a capacidade de gerar componentes cognitivos, comportamentais e motivacionais (sentidos de compreensão, de manejo e de significação respectivamente) que, sendo fortalecidos “retroalimentam a capacidade das pessoas de identificar e de se apropriar de novos recursos presentes em seu ser e em sua comunidade”1010 Abreu PHB, Alonzo HGA. Salutogênese-Camponês a Camponês: uma metodologia para promoção da saúde de populações expostas a agrotóxicos. Saúde debate. 2018 [acesso em 2022 mar 14]; 42(esp4):261-74. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/bBvpcNhb5bf9mpKgcvGxYcK/abstract/?lang=pt.
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. Além disso, como modo de operacionalização do paradigma salutogênico de promoção da saúde no contexto em questão, a Metodologia CaC – que tem como origem e base conceitual-prática as concepções e métodos da educação popular de Paulo Freire3434 Giménez EH. Campesino a Campesino: Voces de Latinoamérica Movimiento Campesino para la Agricultura Sustentable. Managua: SIMAS; 2008. – apresenta instrumentos e tecnologias sociais capazes de desenvolver processos de transição agroecológica horizontais e autônomos e, consequentemente, de promover a emancipação camponesa3434 Giménez EH. Campesino a Campesino: Voces de Latinoamérica Movimiento Campesino para la Agricultura Sustentable. Managua: SIMAS; 2008.,3535 Sosa MA, Jaime AMR, Lozano DRA, et al. Revolução agroecológica: o movimento de camponês a camponês da ANAP em Cuba. São Paulo: Expressão Popular; 2013.,3636 Pan Para el Mundo. Construyendo procesos De Campesino a Campesino. Lima: ESPIGAS; 2006.,3737 Bienert M, Herrera ML, Morales YA, et al. De Campesino a Campesino: Metodología, pedagogía y mo-vimiento para el desarrollo sostenible de la agricultura familiar campesina. Managua: EDISA; 2010.. Por meio de princípios, passos e métodos3535 Sosa MA, Jaime AMR, Lozano DRA, et al. Revolução agroecológica: o movimento de camponês a camponês da ANAP em Cuba. São Paulo: Expressão Popular; 2013. (sumarizados no quadro 1) que permitem o desenvolvimento do intercâmbio e do apoio mútuo entre camponeses e camponesas, a CaC vem viabilizando a implementação e disseminação da agroecologia em pequenas e grandes escalas em comunidades e regiões rurais de diferentes países da América Latina e do mundo, sendo identificada pela organização internacional de movimentos sociais do campo Via Campesina como “a melhor forma das famílias camponesas desenvolverem e compartilharem suas próprias tecnologias e seus próprios sistemas de agricultura ecológica”3838 La Vía Campesina. De Maputo a Jacarta: 5 anos de Agroecología en La Vía Campesina. Jakarta: LVC; 2013.(13).

Quadro 1
Princípios, passos estruturantes e métodos (atividades e ferramentas/instrumentos) da Metodologia CaC

No entanto, a continuidade dos trabalhos de campo da pesquisa1111 Abreu PHB. Construção de um processo social participativo de Promoção da Saúde para a superação do modelo do agronegócio: a experiência camponesa a partir da Salutogênese e da Agroecologia em Lavras – MG. [tese]. [Campinas]: Universidade Estadual de Campinas; 2018. 412 p., entre outubro e dezembro de 2017 – por meio de atividades (posteriores às atividades que embasaram o artigo anteriormente publicado1010 Abreu PHB, Alonzo HGA. Salutogênese-Camponês a Camponês: uma metodologia para promoção da saúde de populações expostas a agrotóxicos. Saúde debate. 2018 [acesso em 2022 mar 14]; 42(esp4):261-74. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/bBvpcNhb5bf9mpKgcvGxYcK/abstract/?lang=pt.
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) que tanto aprofundaram o processo de autorreconhecimento dos camponeses e camponesas envolvidas como promoveram os passos iniciais do processo de organização camponesa em Lavras –, evidenciou a necessidade de um aprofundamento teórico e de uma ampliação do alcance da transformação social promovida por meio da estrutura metodológica que estava em desenvolvimento.

Dessa forma, foi incorporado à estrutura metodológica o Método Analético. Assim, utilizando-se os métodos práticos disponibilizados pela CaC3535 Sosa MA, Jaime AMR, Lozano DRA, et al. Revolução agroecológica: o movimento de camponês a camponês da ANAP em Cuba. São Paulo: Expressão Popular; 2013. para desenvolver uma promoção da saúde salutogênica com populações camponesas submetidas ao modelo de produção ‘moderno’/colonizador do agronegócio, o potencial de descolonialidade do modo de vida e economia camponesa pôde ser desenvolvido, escutado, discutido, sistematizado, analisado (por meio de categorias salutogênicas) e devolvido por intermédio de métodos/instrumentos que operacionalizaram: o entendimento do contexto de subjugação do modo de produção dos camponeses pela lógica colonial da Revolução Verde e, também, o entendimento das possibilidades, viabilidades e benefícios gerais (incluindo os sanitários) da agroecologia (sentido de compreensão); a identificação dos recursos agroecológicos e demais experiências positivas existentes em suas propriedades e comunidades e a crença de que eles estão disponíveis para a realização da transição de um modelo de produção colonial para um modelo emancipatório (sentido de manejo); e a motivação em querer utilizar e compartilhar seus próprios conhecimentos e práticas e em se organizar para a mudança e melhoria do contexto de vida, economia, produção e saúde de sua família e sua comunidade (sentido de significação)3232 Antonovsky A. Unraveling the mystery of health: how people manage stress and stay well. San Francisco: Jossey-Bass; 1987..

Pesquisa-Ação-Participativa

Um trabalho de pesquisa científica que pretenda desenvolver um processo coletivo de promoção da saúde salutogênica e analisar a efetividade desse desenvolvimento por meio da escuta da palavra e do protagonismo dos próprios camponeses não pode ter um desenho de estudo fundamentado em uma prática científica que se impõe como ‘superior’.

Baseando-se, então, na insuficiência de desenhos metodológicos positivistas para o desenvolvimento de uma ciência socialmente compromissada, útil e efetivamente participativa, Orlando Fals-Borda3939 Fals-Borda O. Investigación Participativa. Montevideo: Instituto del Hombre; 1986. [acesso em 2022 mar 14]. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/406639730/Fals-Borda-y-Rodrigues-Brandao--Investigacion-Participativa.
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,4040 Fals-Borda O. Conocimiento y poder popular: lecciones con campesinos de Nicaragua, Mexico y Colombia. Bogota: Siglo Veintiuno; 1985.
apresenta as bases científicas da Pesquisa-Ação-Participativa. Desenvolvida a partir das experiências adquiridas por meio da realização de pesquisas científicas que buscavam a construção coletiva de melhorias sociais (e sua sistematização) com e a serviço de comunidades exploradas e subalternizadas (em especial, comunidades camponesas de países como Colômbia, México e Nicarágua), a Pesquisa-Ação-Participativa se fundamenta em elementos que apresentam intrínseca relação conceitual e operativa com o Método Analético, a CaC e a Salutogênese.

Nesse sentido, o primeiro elemento apresentado por Fals-Borda3939 Fals-Borda O. Investigación Participativa. Montevideo: Instituto del Hombre; 1986. [acesso em 2022 mar 14]. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/406639730/Fals-Borda-y-Rodrigues-Brandao--Investigacion-Participativa.
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é o rompimento da relação dominante sujeito-objeto. Nas ‘ciências clássicas’, a relação sujeito-objeto estrutura-se na desigualdade entre o pesquisador (com seu conhecimento científico metódico, superior em sua formação acadêmica e com capacidade de entender e interpretar a realidade e de definir ações a partir das informações extraídas do contexto em estudo) e as comunidades estudadas (seres incapazes de compreender, de fato, sua realidade e de agir para melhorar seu contexto de vida a partir de seus próprios recursos, definições e vontades). Assim, o rompimento dessa relação vertical viabiliza o ‘saber situar-se para aceder à palavra do outro’ do Método Analético2929 Dussel ED. Método para uma filosofia da libertação. São Paulo: Edições Loyola; 1986.. Essa viabilização prática se dá porque a Pesquisa-Ação-Participativa apenas poderá ser desenvolvida e chamada como tal caso a metodologia e os métodos de atuação propostos permitam ao pesquisador se posicionar e agir horizontalmente (sem dominações ou geração de dependências) em relação à população com quem trabalha.

Já o elemento de reconhecimento e valorização da ciência popular como válida e rica em conhecimentos, técnicas e definições, sem estar em desigualdade de importância no processo social estabelecido, quando da associação desta com a ciência acadêmica descolonizada (e sem desconsiderar os momentos em que cada uma realiza seu ‘papel de destaque’ neste processo)3939 Fals-Borda O. Investigación Participativa. Montevideo: Instituto del Hombre; 1986. [acesso em 2022 mar 14]. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/406639730/Fals-Borda-y-Rodrigues-Brandao--Investigacion-Participativa.
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, permite ao pesquisador exercer a sua função na medida da necessidade que esse processo coletivo e horizontal exige, sem sobreposições epistemológicas. Além disso, e mais importante para a efetividade de processos de libertação-autonomia em relação a dominações externas, esse elemento permite à sabedoria popular ocupar o seu devido espaço como racionalidade científica. Indicando, portanto, que esse nivelamento de racionalidades favorece a ação conjunta de ambos os sujeitos nesses processos, Fals-Borda3939 Fals-Borda O. Investigación Participativa. Montevideo: Instituto del Hombre; 1986. [acesso em 2022 mar 14]. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/406639730/Fals-Borda-y-Rodrigues-Brandao--Investigacion-Participativa.
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afirma que “no podemos aceptar, desde el punto de vista de la ciencia misma, que la ciencia popular no tenga su propia racionalidad, porque lo demuestra todos los días en la experiencia”.

É nesse sentido, então, que o pesquisador exerce seu papel acadêmico horizontal ao acessar e apreender uma metodologia social genuinamente camponesa (como a CaC), adaptá-la inicialmente para as condições de um contexto específico de dominação pelo agronegócio e colocá-la à disposição da práxis camponesa. O autorreconhecimento de suas sabedorias e práticas e de sua capacidade de organização para utilização e compartilhamento dos seus recursos permite aos camponeses, por meio da apropriação e valorização de sua própria ciência, tanto criar as condições para a superação de seu contexto de injustiça quanto construir coletivamente sua ampla autonomia (inclusive em relação ao próprio pesquisador, ao desenrolar da Metodologia CaC e a seu processo organizativo).

Com relação a esse papel do pesquisador (como elemento externo, porém em atuação horizontal com a comunidade) de captar (escutar, observar e perceber) e sistematizar as informações disponibilizadas durante processos como os citados anteriormente, a Pesquisa-Ação-Participativa lança mão do princípio da redundância3939 Fals-Borda O. Investigación Participativa. Montevideo: Instituto del Hombre; 1986. [acesso em 2022 mar 14]. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/406639730/Fals-Borda-y-Rodrigues-Brandao--Investigacion-Participativa.
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. Segundo esse princípio, o pesquisador deve desempenhar continuamente sua responsabilidade de devolução e debate dos conhecimentos (resultados e conclusões) que pôde gerar por meio de análises das informações captadas, até se tornar, no tempo mais curto possível, redundante ao processo coletivo. Ou seja,

no debe ser ni necesario ni indispensable en el proceso, por la sencilla razón de que lo ha retomado la propia gente, con sus propios cuadros o intelectuales orgánicos3939 Fals-Borda O. Investigación Participativa. Montevideo: Instituto del Hombre; 1986. [acesso em 2022 mar 14]. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/406639730/Fals-Borda-y-Rodrigues-Brandao--Investigacion-Participativa.
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(26)
.

Nesse sentido, um desenho de estudo baseado na Pesquisa-Ação-Participativa permite, de certo modo, corrigir a verticalidade do pesquisador que se utiliza do paradigma salutogênico de promoção da saúde como este é, maiormente, concebido e aplicado. Ao invés da aplicação de questionários2222 Eriksson M, Lindström B. A salutogenic interpretation of the Ottawa Chartrer. Health Promotion International. 2008; 23(2):190-99.,4141 Eriksson M, Lindström B. Antonovsky’s sense of coherence scale and its relation with quality of life: a systematic review. J Epidemiol. Community Health. 2007; (61):938-44.,4242 Eriksson M, Lindström B. Antonovsky’s sense of coherence scale and its relation with health: a systematic review. J Epidemiol. Community Health. 2006; (60):376-81. para a identificação das capacidades de compreensão, manejo e significação, com a posterior apresentação de um score sobre a autopercepção da saúde individual e de suas possíveis implicações pessoais e em uma comunidade3232 Antonovsky A. Unraveling the mystery of health: how people manage stress and stay well. San Francisco: Jossey-Bass; 1987., essas capacidades (na presente experiência, captadas por meio de instrumentos da CaC) podem ser utilizadas, a partir das relações e posicionamentos horizontais sujeito-sujeito e ciência técnica--ciência popular, como categorias para analisar as falas geradas em um processo de mudança social. As análises (a serem apresentadas em publicação futura) por meio dessas categorias e suas subcategorias emergentes, indicadoras de autonomia em processos que promovem a saúde, permitem, assim, a devolução de informações e conhecimentos sistematizados que podem gerar uma crescente autopercepção de características pessoais e coletivas positivas (recursos) – visibilizadas e disponibilizadas por meio de processos sociais participativos – e, consequentemente, o controle sobre os determinantes (e suas determinações) de saúde e o protagonismo no gerenciamento das melhorias das condições de vida nessas comunidades. Ao mesmo tempo, a visão salutogênica desses processos pode evitar que a pesquisa-ação estabeleça sua centralidade, como alguns autores têm enfatizado4343 Dionne H. A Pesquisa-Ação-Participativa para o desenvolvimento local. Brasília, DF: Liber Livro; 2007.,4444 Thiollent M. Metodologia da Pesquisa-Ação-Participativa. São Paulo: Cortez; 2011.,4545 Tripp D. Pesquisa-Ação-Participativa: uma introdução metodológica. Educação e Pesquisa. 2005; 31(3):443-66., na identificação e solução dos ‘problemas’ que afetam uma localidade. Assim, contando com a teoria da Salutogênese, a estrutura da pesquisa-ação prioriza estratégias metodológicas que caracterizam e permitem a autoconstrução comunitária das possibilidades, modos e estruturas de tomada autônoma de decisão a partir de seus recursos positivos.

A experiência metodológica camponesa em Lavras-MG: um novo horizonte

Identificados os referenciais teórico-prático--epistemológicos que se propõem radicais em termos de transformação social, de protagonismo da classe trabalhadora (camponesa) e de resolutividade e utilidade popular da ciência-técnica, apresentamos a estruturação metodológica que identificamos como Pesquisa-Ação-Participativa Analética de promoção da saúde de populações camponesas, desenvolvida por meio da Metodologia CaC e analisada sob a perspectiva e categorias da Salutogênese. Essa experiência metodológica foi construída e documentada na pesquisa de doutorado1111 Abreu PHB. Construção de um processo social participativo de Promoção da Saúde para a superação do modelo do agronegócio: a experiência camponesa a partir da Salutogênese e da Agroecologia em Lavras – MG. [tese]. [Campinas]: Universidade Estadual de Campinas; 2018. 412 p., sendo os resultados obtidos, analisados e discutidos a partir dessa metodologia, e disponibilizados em publicação futura.

Essa experiência de Pesquisa-Ação-Participativa foi executada por meio de atividades práticas baseadas em instrumentos da CaC, tendo estas atividades criado as condições de possibilidade para a revelação da palavra (falas com conteúdo referente aos entendimentos de contexto; conhecimentos gerais; técnicas agroecológicas; opiniões; críticas; decisões; motivações etc.) de camponeses e camponesas de comunidade rurais do município de Lavras-MG. O pesquisador, de modo horizontal e participativo, pôde, por meio das mesmas atividades, realizar a captação, a escuta e a interpretação de recursos e aspectos salutogênicos presentes nessas falas. Esses recursos e aspectos positivos do sujeito camponês e suas comunidades, uma vez analisados (sob as categorias salutogênicas dos sentidos de compreensão, manejo e significação), possibilitaram a indicação do desenvolvimento, ao longo desse processo social, da construção coletiva e da apropriação, por esses atores, de possibilidades, modos e estruturas de tomada autônoma de decisão em relação aos seus determinantes de saúde (em especial, os relacionados com o modo de vida, produção, economia e organização camponesa).

Assim, todo o trabalho de campo foi concebido como o momento analético (dividido em duas fases: momento analético inicial e intermediário de transição para o momento dialético) de um processo contínuo de descolonialidade em relação ao modo capitalista de exploração dos camponeses e camponesas lavrenses, buscando criar as condições subjetivas e as práticas para a construção coletiva da organização camponesa no município e, consequentemente, o meio social para o desenvolvimento continuado, progressivo e autônomo da transição agroecológica. Dessa forma, a organização e a CaC se tornaram o tecido e o instrumento social que têm permitido o desenrolar camponês-de-fato (protagonismo e interesses) do momento dialético de superação da dominação do agronegócio capitalista pela agroecologia camponesa (momento posterior ao recorte apresentado neste ensaio e na própria tese1111 Abreu PHB. Construção de um processo social participativo de Promoção da Saúde para a superação do modelo do agronegócio: a experiência camponesa a partir da Salutogênese e da Agroecologia em Lavras – MG. [tese]. [Campinas]: Universidade Estadual de Campinas; 2018. 412 p.).

Para dar sustentação e operacionalização a tais proposições, intenções e desenvolvimento prático, a metodologia desenvolvida foi composta por fases e atividades (subdivididas em modos operacionais) com objetivos e conformações definidos, como apresentado no quadro 2.

Quadro 2
Fases de trabalho, atividades de campo e modos operacionais que compuseram a estrutura metodológica do estudo. Lavras, 2017

A partir dessa composição, segue, no quadro 3, a esquematização da estrutura metodológica desenvolvida em Lavras-MG, apresentando as duas fases que conformaram os trabalhos; as atividades de campo (desenvolvidas por meio de instrumentos e métodos da CaC); além dos dois modos operacionais (planejamento, organização e realização) das atividades de campo: os Encontros de Promoção da Saúde (EPS) e os Momentos de Potencialização das Capacidades de Compreensão, Manejo e Significação (MPSOC).

Quadro 3
Estruturação metodológica da Pesquisa-Ação-Participativa Analética de promoção da saúde de população camponesa, desenvolvida por meio de métodos da Metodologia Camponês a Camponês e analisada sob a perspectiva e categorias da Salutogênese. Lavras, 2017

A estrutura metodológica apresentada, que aprofundou, ampliou e atualizou a metodologia ‘Salutogênese-Camponês a Camponês’, anteriormente publicada1010 Abreu PHB, Alonzo HGA. Salutogênese-Camponês a Camponês: uma metodologia para promoção da saúde de populações expostas a agrotóxicos. Saúde debate. 2018 [acesso em 2022 mar 14]; 42(esp4):261-74. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/bBvpcNhb5bf9mpKgcvGxYcK/abstract/?lang=pt.
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, permitiu desenvolver os passos iniciais e fundamentais de um processo social de emancipação camponesa ante o modelo capitalista de agricultura em Lavras-MG. Tal abordagem, fundamentada teórica, prática e epistemologicamente nos conceitos da agroecologia, da Salutogênese, da filosofia da libertação, da Metodologia social CaC e da Pesquisa-Ação-Participativa, permitiu a operacionalização de um processo social (gradual e contínuo) que apresentou (e segue apresentando) resultados que envolvem: a compreensão dos camponeses sobre seu contexto de dominação e exploração pela racionalidade e atuação do agronegócio capitalista; a autoconstrução e a (re)apropriação, por esses sujeitos, de possibilidades, modos e estruturas familiares/comunitárias de tomada autônoma de decisões; e os passos iniciais da organização camponesa em Lavras-MG.

Considerações finais

Na lógica da colonialidade do poder capitalista3131 Quijano A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino--americanas. Buenos Aires: CLACSO; 2005., a atuação histórica e permanente de controle e submissão do modo de vida e economia familiar camponesa se justifica devido à resistência desse ator social que, ao mesmo tempo, é proprietário e trabalhador da terra2020 Chayanov AV. Teoria dos sistemas econômicos não capitalistas. In: Carvalho HM, organizador. Chayanov e o campesinato. São Paulo: Expressão Popular; 2014. p. 89-137.. No entanto, mesmo com grande potência e violência econômica, ideológica e política corporativas/estatais, a Revolução Verde e seus processos antecedentes-estruturais não chegaram, apesar dos profundos e gerais impactos causados, a apagar e desarticular por completo os modos de produção de alimentos, conhecimentos, sociabilidade e cultura dos camponeses do Brasil. Essa afirmação pode ser evidenciada pelos 24% de terras ainda sob propriedade e uso pela agricultura camponesa (o que corresponde a 84,4% das propriedades rurais); pelos 40% da produção geral de alimentos do País que vêm do trabalho e das terras familiares (totalizando 70% dos alimentos consumidos pela população brasileira); e pelos 74% da mão de obra do campo empregados nas propriedades camponesas, composta em sua maior parte pela própria família4646 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Agropecuário 2006. Rio de Janeiro: IBGE; 2009. [acesso em 2017 abr 6]. Disponível em: http://www.mma.gov.br/estruturas/sds_dads_agroextra/_arquivos/familia_censoagro2006_65.pdf.
http://www.mma.gov.br/estruturas/sds_dad...
.

Essa resistência camponesa apontou o caminho para a elaboração de uma estrutura metodológica participativa de promoção da saúde em Lavras-MG, que permitiu desenvolver os passos iniciais e fundamentais de um processo social de emancipação camponesa diante do modelo capitalista de agricultura. Esta experiência, juntamente ao marco referencial deste trabalho, permite-nos afirmar que os conceitos e modos de operação da Revolução Verde e do agronegócio (verticalizantes, totalizantes, invasivos, subalternizantes, descredibilizadores, externamente dominantes etc.) são diametralmente opostos aos conceitos da promoção da saúde, que está fundamentada na construção participativa da autonomia, do entendimento, da apropriação e do controle sobre o contexto e os determinantes/determinações de saúde individuais e comunitários2222 Eriksson M, Lindström B. A salutogenic interpretation of the Ottawa Chartrer. Health Promotion International. 2008; 23(2):190-99.,2323 Navolar TS, Rigon AS, Philippi JMS. Diálogo entre agroecologia e promoção da saúde. Rev. bras. Promoção Saúde. 2010; 23(1):69-79.,4747 Buss PM. Uma introdução ao conceito de Promoção da Saúde. In: Czeresnia D, Freitas CM, organizadores. Promoção da Saúde: conceitos, reflexões e tendências. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2009. p. 19-42.. Nesse mesmo sentido, desde a perspectiva da saúde coletiva/saúde ambiental e em coerência com autores como Porto4848 Porto MFS. Emancipatory promotion of health: contributions from Brazil in the context of the Global South. Health Prom. Int. 2019; (34):56-64., podemos apontar que, por estruturar tal processo de emancipação e por ter como centralidade teórico-prática a busca metódica pelo protagonismo, pelo saber, pela cultura e pela autonomia camponesa, a metodologia aqui apresentada pode, também, ser considerada como uma proposta de promoção emancipatória da saúde4848 Porto MFS. Emancipatory promotion of health: contributions from Brazil in the context of the Global South. Health Prom. Int. 2019; (34):56-64..

Dessa forma, toda e qualquer pesquisa e ação pública que vise a uma promoção, de fato, emancipatória da saúde de camponeses e/ou territórios camponeses impactados pelo modelo do agronegócio deve estruturar-se em metodologias que permitam o desenvolvimento e/ou o resgate participativo da cultura e prática agroecológica camponesa. Assim, criando-se as possibilidades para que os camponeses visualizem, identifiquem e se apropriem processualmente dos recursos agroecológicos existentes em suas propriedades e comunidades, a agroecologia – mesmo em momentos iniciais e intermediários ainda pré-transição entre um modelo de produção tóxico (biológica, cultural, econômica e socialmente) e um modelo de produção saudável – passa a ser a base, o meio e o constructo prático e motivacional para a promoção da saúde camponesa.

Em conclusão, afirmamos que a agroecologia é o modelo de produção que permite a (re)construção efetiva da autonomia do modo de vida e economia camponesa e o (re)posicionamento do sujeito camponês nas relações e disputas de poder, que influenciam tanto os fatores determinantes de sua saúde quanto as possiblidades de autoconstrução de um contexto mais justo, favorável e promissor. Ademais, para seu desenvolvimento desde a perspectiva e ação da área da promoção da saúde e do campo da saúde coletiva, bases teóricas, metodológicas e epistemológicas radicalmente horizontais, participativas e emancipatórias (como o Método Analético, a Salutogênese, a Metodologia CaC e a Pesquisa-Ação-Participativa) devem ser priorizadas e entrelaçadas.

  • Suporte financeiro: não houve

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    30 Set 2020
  • Aceito
    05 Ago 2021
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
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