O estudante em campo: uma experiência de formação em saúde da criança na Amazônia brasileira

The student in the field: an experience in child health training in the Brazilian Amazon

Maria Lúcia Chaves Lima Roseneide dos Santos Tavares Melina Navegantes Alves Paulo de Tarso Ribeiro de Oliveira Luiz Marques Campelo Karol Veiga Cabral Nelson José de Souza NettoSobre os autores

RESUMO

O artigo teve como objetivo relatar a experiência de imersão em campo de prática de estudante do Curso de Psicologia da Universidade Federal do Pará, enquanto participante do Projeto Multicampi Saúde: Atenção à Saúde da Criança, durante a realização do atendimento à criança-guia, à família e à comunidade de acordo com atividades que tiveram por finalidade a capacitação de estudantes e profissionais do serviço, diretamente na Unidade Básica de Saúde (UBS) e território adjacente. Delineou-se a trajetória percorrida pela estudante realizada no município de Cametá, Pará, durante o mês de junho de 2019, relatando a experiência em seis atividades principais: acompanhamento do uso da Caderneta da Criança com os profissionais da UBS; construção do Plano Terapêutico Singular para a criança/família-guia; mapeamento da rede de saúde mental do município; ações de educação em saúde; grupos de escuta; e capacitações para os profissionais da UBS. Os resultados mostram que a experiência de imersão no território, vivenciando o atendimento, foi enriquecedora nas dimensões do ensino, serviço e gestão. A imersão no campo de prática demonstrou ser potente espaço de formação dos futuros profissionais, utilizando-se do modelo de formação em serviço.

PALAVRAS-CHAVES
Atenção Primária à Saúde; Capacitação em serviço; Saúde da criança

ABSTRACT

The article aimed to report the immersion experience in the practice field of a Psychology student from Federal University of Pará, while participant in Projeto Multicampi Saúde: Atenção à Saúde da Criança, during the care provided to the guide-child, the family, and the community according to activities that had the purpose of training students and professionals of the service, directly in the Basic Health Unit (UBS) and adjacent territory. The trajectory traveled by the student was outlined, carried out in the municipality of Cametá, Pará, during June 2019, reporting the experience in six main activities: monitoring the Child’s Handbook use with the Unit’s professionals; construction of the Singular Therapeutic Plan for the guide child/family; mapping of the municipality’s mental health network; health education actions; listening groups; and training for the UBS professionals. The results show that the immersion experience in the territory, experiencing health care, was enriching in dimensions of teaching, service, and management. Immersion in the field of practice proved to be a powerful training space for future professionals, using the in-service training model.

KEYWORDS
Primary Health Care; Inservice training; Child health

Introdução

Qualificar a formação de estudantes da área da saúde e de profissionais da Atenção Básica (AB), de acordo com a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC), foi o intuito do Projeto Saúde da Criança Paraense na Atenção Básica: Articulação entre ensino, pesquisa, serviço e gestão, mais conhecido como ‘Projeto Multicampi Saúde da Criança’ foi uma experiência da Universidade Federal do Pará (UFPA).

O Multicampi Saúde da Criança foi um projeto realizado pela Pró-Reitoria de Extensão da UFPA, contou com a participação de 628 estudantes de 10 cursos de graduação dessa universidade (medicina, enfermagem, fisioterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia, farmácia, nutrição, biomedicina, psicologia e serviço social) distribuídos em 6 municípios do estado do Pará (Belém, Abaetetuba, Bragança, Cametá, Castanhal e Soure), região da Amazônia brasileira. Em parceria com o Ministério da Saúde (MS), a Secretaria de Estado da Saúde do Pará (Sespa), as Secretarias Municipais de Saúde dos municípios envolvidos e com o Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do Estado do Pará (Cosems/PA), os estudantes foram imersos no campo, in loco, no desenvolvimento das ações da PNAISC, ao encontro de saberes multiprofissionais com os saberes locais, dinamizando a implementação de boas práticas e ações de atenção e educação em saúde, promovendo encontros intersetoriais e interseccionais entre a saúde e as demais políticas públicas.

A metodologia de pesquisa-intervenção adotada no Multicampi Saúde da Criança permitiu a utilização da estratégia da educação permanente com a integração do ensino-serviço-gestão, corroborando os princípios centrais da UFPA de integração com a sociedade, a reestruturação do modelo de ensino, o desenvolvimento amazônico e a modernização da gestão. Utilizando a Caderneta da Criança como instrumento de partida, que se apresenta como um instrumento de vigilância à saúde da criança, permitindo às equipes e às famílias o acompanhamento da saúde das crianças, bem como o desenvolvimento de políticas públicas, os estudantes foram imersos no campo de práticas da AB nos municípios selecionados.

Em estudo de revisão integrativa, ao examinarem publicações entre 2000 e 2011 no campo da AB, foi constatado que a maioria dos dados sobre as crianças não era registrada pelas equipes de saúde nas cadernetas, sendo estas pouco utilizadas para orientar pais, responsáveis e familiares das crianças. O maior percentual de desinformação nas cadernetas está relacionado com a primeira semana de saúde integral, índice de Apgar, uso do ferro profilático, dados sobre parto e gravidez, desenvolvimento neuropsicomotor e internações e hospitalizações. As autoras apontam que o não preenchimento desses dados revela que as orientações contidas na caderneta não têm sido utilizadas para orientar pais e responsáveis11 Gaiva MAM, Silva FB. Caderneta da saúde da criança: revisão integrativa. Rev enferm UFPE online. 2014 [acesso em 2021 jan 15]; 8(3):742-9. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/view/9733/98.
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Em estudo de revisão de literatura abrangendo o período de 2000 a 2013 sobre a AB em saúde, os autores concluíram que os serviços de saúde no País são heterogêneos e necessitam de mudanças estruturais e de processo de trabalho, a fim de melhor planejar ações e cuidados na AB como forma de garantir acesso de qualidade à saúde das crianças. Os mesmos autores perceberam que a introdução da Estratégia Saúde da Família (ESF), com presença dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) atuando em território, configurou-se como principal estratégia para vigilância da saúde infantil, com destaque para adoção de instrumentos de monitoramento do desenvolvimento infantil, ações de incentivo ao aleitamento materno único até 6 meses e posterior ingestão de alimentos orientados por padrões nutricionais adequados à faixa etária das crianças, bem como à imunização e à atenção a doenças prevalentes na infância, sendo todos os temas presentes na Caderneta da Criança. Nesse sentido, a adoção no território nacional da ESF foi fator preponderante para a diminuição da mortalidade no País, pois enfocou ação de atenção e educação em saúde rede de serviços que à época estava em expansão22 Damasceno SS, Nóbrega VM, Coutinho SED, et al. Saúde da criança no Brasil: orientação da rede básica à Atenção Primária à Saúde. Ciênc. Saúde Colet. 2016 [acesso em 2020 abr 12]; 21(9):2961-2973. Disponível em https://www.scielo.br/j/csc/a/9y97dqhzbFyhcvvYprvrbVx/?format=pdf&lang=pt.
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Em estudo compreendendo o período de 2008 a 2015, sobre a importância do Sistema de Único de Saúde (SUS) e da ESF, foi observada uma tendência decrescente das doenças e mortalidades sensíveis à AB, contudo, os mesmos autores apontam que ainda se faz necessário superar o modelo de queixa, conduta presente no modelo biologicista da consulta individualizada, presente nos serviços. As práticas ainda são muito marcadas pelo modelo biomédico hegemônico, tendendo ao fortalecimento do modelo tradicional da AB33 Carneiro VB, Oliveira PT, Carneiro SR, et al. Evidence of the effect of primary care expansion on hospitalizations: Panel analysis of 143 municipalities in the Brazilian Amazon. PLoS One. 2021 [acesso em 2021 nov 15]; 16:1-16. Disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33831030.
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. Os profissionais tendem a se apresentar como os detentores do conhecimento e a tratarem o familiar/usuário como mero receptor. Esse tipo de atendimento ficou conhecido na literatura como cuidado desigual. Além disso, os autores destacam a importância da escuta e do acolhimento para a produção de um verdadeiro cuidado22 Damasceno SS, Nóbrega VM, Coutinho SED, et al. Saúde da criança no Brasil: orientação da rede básica à Atenção Primária à Saúde. Ciênc. Saúde Colet. 2016 [acesso em 2020 abr 12]; 21(9):2961-2973. Disponível em https://www.scielo.br/j/csc/a/9y97dqhzbFyhcvvYprvrbVx/?format=pdf&lang=pt.
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É importante pontuar que a cobertura da AB no Pará está entre as menores da região Norte, 58,03%, enquanto o Tocantins alcança patamares acima da média nacional, 91,29%. Em relação às internações sensíveis à AB, o Pará apresenta maior percentual, de 41,07%, enquanto no Amapá os dados apresentados são de 21,43%. Quanto à mortalidade infantil, o estado do Pará apresenta taxa de 15,40 óbitos/ mil nascidos vivos, enquanto o ideal preconizado pela Organização Mundial da Saúde é uma taxa abaixo de 10 óbitos/mil nascidos vivos. Ademais, ao analisar a mortalidade infantil por município, percebe-se enorme variação e assimetria de municípios como Cachoeira do Arari e Ourém, respectivamente, com taxas de mortalidade infantil de 3,03 e 3,33, até Soure e Trairão com 36,65 e 45,25. Com a maioria dos municípios com taxa acima do preconizado, a capital, Belém, apresenta a mortalidade infantil de 13,5544 Pará. Governo do Estado do Pará, Secretaria de Saúde Pública. Plano Estadual de Saúde 2016/2019. Belém: Secretaria de Saúde Pública; 2015. [acesso em 2021 set 2]. Disponível em: https://www.conass.org.br/pdf/planos-estaduais-de-saude/PA_Plano-esta-dual-saude-2016-2019.pdf.
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. Assim, desenvolver ações que possam incidir sobre esse cenário parece melhorar as condições de vida da população.

O investimento na AB como primeira porta preferencial de acesso da população nos permite, além do desenvolvimento de ações de assistência em saúde, trabalhar a prevenção e a promoção em saúde, como forma de evitar o adoecimento e os agravos em saúde55 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atenção Básica. Brasília, DF: MS; 2012. [acesso em 2022 maio 1]. Disponível em: http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/pnab.pdf.
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. Fortalecer as redes instaladas e capilarizadas nos territórios parece ser medida absolutamente prudente para reverter o cenário da saúde no Pará. Outrossim, investir fortemente na atenção à criança é dar condições de desenvolvimento de um adulto mais saudável e consciente.

Nesse contexto, este artigo tem como objetivo relatar a experiência de imersão em campo de prática de uma estudante do Curso de Psicologia da UFPA, enquanto participante do projeto, durante a realização do atendimento à criança-guia, família e comunidade no município de Cametá, Pará, Brasil, um dos atendidos pelo projeto, em atividades que tiveram por finalidade a capacitação de estudantes e profissionais do serviço, diretamente na Unidade Básica de Saúde (UBS) e no território adjacente.

Material e métodos

Este artigo consiste em um relato de experiência da participação de uma estudante do Curso de Psicologia da UFPA, no Projeto Multicampi Saúde: Atenção à Saúde da Criança dessa universidade. Nesse contexto, buscou-se delinear a trajetória percorrida pela estudante durante a imersão em campo de prática, realizada no município de Cametá, no Pará, durante todo o mês de junho de 2019.

O município de Cametá é margeado pelo grande Rio Tocantins, em uma faixa de cerca de 3 km de extensão. O último censo (2010) registrou população estimada de 134.100 habitantes66 Cametá (PA). Prefeitura. Sobre o município. Cametá: Prefeitura Municipal; 2022. [acesso em 2022 maio 1]. Disponível em: https://prefeituradecameta.pa.gov.br/o-municipio/sobre-o-municipio/.
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Cametá é formado geograficamente por ilhas e áreas de terra firme, que atingem 2.487 km². Seu território possui rios e baías (20,3%), campos naturais (36,4%), várzeas e ilhas (26,2%) e terra firme (17,1%). O extrativismo vegetal, a agricultura familiar e a pesca artesanal movem a economia da região, tendo complementação de outras rendas (auxílios governamentais, setor informal e criações de animais de pequeno porte). A renda média mensal das famílias gira em torno de 2,2 salários mínimos. Dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, de 2010, indicaram que o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) era considerado baixo (0,577). O município possui apenas 48,6% de domicílios com esgotamento sanitário adequado77 Cametá (PA). Prefeitura. Secretaria Municipal de Saúde. Plano Municipal de Saúde 2018-2021. Cametá: Prefeitura Municipal; 2021. [acesso em 2022 maio 3]. Disponível em: https://digisusgmp.saude.gov.br/storage/finalizar_plano/d573d252b25d9a9f5f4d8c-cb4b781381.pdf.
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A capacidade física instalada da saúde do município compõe-se de 37 estabelecimentos de saúde no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, sendo 32 públicos (31 municipais e 1 estadual), 5 privados e 1 filantrópico. Desses estabelecimentos, 24 são UBS, das quais 5 foram atendidas pelo projeto77 Cametá (PA). Prefeitura. Secretaria Municipal de Saúde. Plano Municipal de Saúde 2018-2021. Cametá: Prefeitura Municipal; 2021. [acesso em 2022 maio 3]. Disponível em: https://digisusgmp.saude.gov.br/storage/finalizar_plano/d573d252b25d9a9f5f4d8c-cb4b781381.pdf.
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,88 Postos de Saúde.com.br. Postos de Saúde da cidade de Cametá. S.l.: s.n.; s.d. [acesso em 2022 maio 2]. Disponível em: https://postosdesaude.com.br/pa/cameta.
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Após participar do edital de seleção pública e capacitação em curso introdutório sobre a PNAISC, a estudante compôs um grupo de dez estudantes de sete cursos (enfermagem, farmácia, fisioterapia, nutrição, odontologia psicologia e terapia ocupacional), dividido em duplas alocadas nas cinco UBS participantes do projeto no município de Cametá. A dupla composta pelas estudantes de psicologia e terapia ocupacional foi alocada na UBS de Nova Cametá localizada na zona periférica do município.

A composição da equipe da UBS e ESF de Nova Cametá, continha integração com o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf ), composto por fisioterapeuta, educador físico, pedagoga, assistente social e nutricionista; duas psicólogas, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo. Na unidade atuavam diretamente enfermeira (coordenadora), dentista, médica, assistente administrativa, oito ACS, dois agentes de combate a endemias, três técnicas de enfermagem e dois auxiliares de serviços gerais e segurança.

As atividades das estudantes foram registradas no Diário de Campo. Essas atividades eram propostas e orientadas pela equipe de preceptores, supervisores e tutores do projeto. Tais atividades foram relatadas como experiências vivenciadas.

Esse artigo relata a experiência em seis atividades principais do estudante, sendo apresentadas com as seguintes temáticas: 1-Acompanhamento do uso da Caderneta da Criança com os profissionais da Unidade; 2- Construção de um Plano Terapêutico Singular (PTS) para a criança/família-guia; 3- Mapeamento da rede de saúde mental do município; 4- Ações de educação em saúde; 5- Grupos de escuta; e 6- Capacitações para os profissionais da UBS. Em cada temática, são relatadas as ações, a metodologia utilizada e os principais resultados obtidos, de acordo com a participação dos atores do processo.

O relato de experiência foi baseado nas ações desenvolvidas no âmbito projeto. Por esse motivo, o presente estudo não foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, entretanto, o relato atentou para questões éticas; desse modo, não há informações que identifiquem quaisquer atores participantes das atividades descritas.

Acompanhamento do uso da Caderneta da Criança com os profssionais da Unidade

A ‘Caderneta da Criança: Passaporte da Cidadania’, conhecida popularmente como Caderneta, apresenta-se como um documento potencialmente importante para registro de todas as informações sobre o atendimento à criança nos serviços de saúde, de educação e de assistência social, para o acompanhamento desde o momento do seu nascimento até os 9 anos de idade. O registro das informações na Caderneta compete aos profissionais de saúde envolvidos nas ações da PNAISC que compartilham esses dados com a família e facilitam a integração das ações sociais. A Caderneta traz orientações sobre os cuidados com a criança e com o ambiente para que cresça e se desenvolva de forma saudável. Também contém informações sobre os direitos e deveres das crianças e dos pais, aleitamento materno, alimentação complementar saudável, vacinas, saúde bucal, marcos do crescimento e desenvolvimento, consumo; além disso, informa sobre o acesso aos equipamentos e programas sociais e de educação99 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção Primária à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas, Coordenação de Saúde da Criança e Aleitamento Materno. Caderneta da Criança Menino: Passaporte da Cidadania. 2. ed. Brasília, DF: MS/ CGDI; 2020. [acesso em 2021 set 2]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cader-neta_crianca_menino_2ed.pdf.
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O uso da Caderneta da Criança foi uma das principais investigações realizadas dentro da UBS, com observações e questionamentos que resultaram na constatação de uma série de dificuldades de manejo do instrumento. O primeiro problema percebido foi o elevado número de criança sem a Caderneta, uma vez que o município estava sem exemplares. A Secretaria Municipal de Saúde disponibilizou somente cópia do Cartão da Criança, o que demostrava precariedade do serviço.

O manejo da Caderneta entre as famílias também se configurou problemático, não havendo devido cuidado com o documento: muitos eram encontrados rasgados ou mal dobrados. Esse descuido demostrava falta de diálogo do serviço-comunidade sobre a importância da Caderneta como documento e instrumento para o acompanhamento da saúde da criança.

Estudo mostrou que o papel da família é zelar pela Caderneta e levá-la a todos os atendimentos de saúde. No entanto, embora orientações sejam oferecidas por profissionais de saúde pesquisados, ficou evidenciado que, por vezes, a família pouco utiliza o instrumento. A Caderneta, como instrumento para a vigilância e promoção da saúde infantil, deve ser utilizada e valorizada pelos familiares da criança1010 Fabiane BS, Maria AMG, Débora FM. Use of the child health record by families: perceptions of professionals. Texto Contexto Enferm. 2015 [acesso em 2022 maio 2]; 24(2):407-414. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tce/a/BBh4xMN9ZkVdbYCQ8YYPnkx/?lang=en.
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Quanto ao manejo da Caderneta pela equipe, a partir de diálogos realizados com alguns profissionais e reuniões, foi perceptível o preenchimento inadequado, principalmente na seção de vigilância do desenvolvimento da criança. Não havia profissional encarregado para esse preenchimento.

Todos os profissionais de saúde têm participação e responsabilidade pelo preenchimento correto da Caderneta. Para a família, como destacado por Fabiane et al.1010 Fabiane BS, Maria AMG, Débora FM. Use of the child health record by families: perceptions of professionals. Texto Contexto Enferm. 2015 [acesso em 2022 maio 2]; 24(2):407-414. Disponível em: https://www.scielo.br/j/tce/a/BBh4xMN9ZkVdbYCQ8YYPnkx/?lang=en.
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, o instrumento também é importante, cabendo aos profissionais fortalecer o uso deste como fonte de comunicação, educação, prevenção e promoção da saúde das crianças.

Construção de um Plano Terapêutico Singular para a criança/família-guia

O segundo foco de atuação foi na escolha da criança-guia, termo utilizado para caracterizar a criança escolhida pela estudante, em comum acordo com a equipe de profissionais, para ser acompanhada durante a imersão em campo, de acordo com o plano de ação traçado, considerando as demandas dos núcleos profissionais aos quais os estudantes pertenciam. Além do atendimento à criança-guia, também eram atendidas família e comunidade, caracterizado pela visita à residência delas.

A escolha do caso veio a partir da demanda de diversos profissionais da UBS para o acompanhamento não apenas de uma criança, mas sim de uma família com sete crianças, ou seja, a criança-guia se transformou em família-guia. Diversos profissionais auxiliaram na construção do PTS para essa família, especialmente a assistente social e a nutricionista do Nasf.

Durante a estadia de um mês, foi possível realizar quatro visitas domiciliares e duas consultas na UBS com a família-guia. Dentre os pontos principais dessas intervenções, vale destacar a constante resistência da família à assistência prestada pela equipe. Infelizmente, não foi possível investigar detalhadamente e compreender os motivos da resistência, que se configuravam na falta de interesse pela assistência prestada pela equipe de saúde, exemplificada no não comparecimento às consultas previamente agendadas ou no comparecimento apenas mediante a solicitação feita pela ACS responsável, assim como situações de visitas domiciliares (previamente avisadas) sem nenhum dos pais em casa e com crianças na residência. Porém, a partir do trabalho em conjunto, foi possível realizar anamnese das sete crianças e início de encaminhamento para os profissionais de saúde de acordo com a demanda de cada caso.

Observou-se que um mês se mostrou pouco efetivo para a realização de trabalho conclusivo com a família. Finalizado o estágio, a equipe local recebeu o relatório das principais demandas, bem como dos aspectos sanitários julgados necessários para atendimentos, tanto pelos profissionais da UBS quanto pelas equipes seguintes do projeto a atuar na UBS em questão.

Mapeamento da rede de saúde mental do município

O mapeamento da rede psicossocial do município foi realizado por meio de visitas técnicas por parte da equipe de estudantes em diversos serviços de saúde, como Secretaria Municipal de Saúde, diversas UBS, Hospital Regional, Centro de Inclusão Educacional; e Centro de Atenção Psicossocial II, único do município. Nas visitas, percebeu-se que todos os estabelecimentos apresentavam sobrecarga de demanda em saúde mental. Como resultado principal do mapeamento, observou-se precariedade na comunicação entre as instituições do município. As demandas continuamente eram encaminhadas e reencaminhadas sem, contudo, ocorrer um diálogo entre os serviços visando à delimitação de funções institucionais. Além disso, vale destacar carência de profissionais em saúde mental do município, como psicólogos, terapeutas ocupacionais e psiquiatras, com destaque aos dois únicos terapeutas ocupacionais que se dividiam entre AB, hospital regional e rede psicossocial.

Ações de educação em saúde

Como parte dos objetivos propostos nos planos de trabalho era fortalecer o vínculo serviço-comunidade, foram realizadas palestras e rodas de conversas como proposta de educação em saúde. As atividades de educações em saúde foram feitas na sala de espera da UBS com os usuários que aguardavam o atendimento. O público envolvia crianças, adultos e idosos. Os temas discutidos foram relacionados com o Julho Vermelho (hepatites virais), participação e conhecimento sobre a rede e saúde na UBS, autocuidado, chás terapêuticos, gravidez, parto, aleitamento, desenvolvimento infantil e agravos. A partir do trabalho realizado, foi possível perceber a importância da educação em saúde para a população, bem como devido levantamento de informações acerca da comunidade atendida. Identificou-se a necessidade de constância no trabalho possibilitando melhor difundir questões relacionadas com a prevenção como forma eficaz de promoção de saúde.

A AB tem na ESF o primeiro acesso preferencial, coordenando o cuidado, ordenando a Rede de Atenção à Saúde e construindo vínculos na perspectiva de gerar autonomia nos indivíduos e comunidade. Para tanto, a educação em saúde é componente vital, já estabelecido como parte do processo de trabalho das equipes da AB1111 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria de Consolidação nº 2, de 28 de setembro de 2017. Consolidação das normas sobre as políticas nacionais de saúde do Sistema Único de Saúde. Diário Oficial da União. 28 Set 2017. [acesso em 2022 maio 3]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prc0002_03_10_2017.html.
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. Mesmo tendo sofrido mudanças ao longo do tempo, influenciada pelos contextos histórico e político1212 Fittipaldi ALM, O’Dwer G, Henriques P. Educação em saúde na atenção primária: as abordagens e estratégias contempladas nas políticas públicas de saúde. Interface (Botucatu). 2021 [acesso em 2022 maio 2]; 25:1-16. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/icse/2021.v25/e200806/.
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, a educação em saúde incorporou discussão sobre a influência dos determinantes sociais da saúde, assim como os fundamentos da educação popular, propondo soluções, por meio da problematização, para transformação da realidade com a interação de saberes científico e popular1313 Tatiana CR, Maria FSF, Luís PSS, et al. Educação em saúde: aspectos históricos no Brasil. J Health Sci Inst. 2013. [acesso em 2022 maio 3]; 31(2):219-23. Disponível em: http://repositorio.unip.br/wp-content/uploads/2020/12/V31_n2_2013_p219a223.pdf.
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A educação em saúde é

instrumento de construção dialógica do conhecimento, bem como de estímulo à autonomia à participação popular e ao protagonismo dos sujeitos no seu próprio cuidado1212 Fittipaldi ALM, O’Dwer G, Henriques P. Educação em saúde na atenção primária: as abordagens e estratégias contempladas nas políticas públicas de saúde. Interface (Botucatu). 2021 [acesso em 2022 maio 2]; 25:1-16. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/icse/2021.v25/e200806/.
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(2).

Nesse sentido, e considerando a importância do debate, estudo que discute a educação em saúde na AB, ao expor as abordagens e as estratégias contempladas nas Políticas Nacionais de saúde (de Atenção Básica – PNAB; de Promoção da Saúde – PNPS; da Alimentação e Nutrição – PNAN; e de Saúde Bucal – PNSB), além de analisar o enfoque preventivo voltado para a concepção biológica da educação em saúde – que tem suas contribuições, entretanto, não é suficiente para combater as causas sociais de agravos e doenças –, propõe outro enfoque: o da Educação Popular em Saúde, ao analisar também a Política Nacional de Educação Popular em Saúde do SUS (PNEPS-SUS). Tal enfoque, baseado na pedagogia de Paulo Freire, caracteriza-se pelo propósito comum, entre profissionais e pesquisadores, de considerar a relação dialógica constante “como caminho para uma educação que possibilite o estímulo à autonomia e à construção compartilhada do conhecimento, para assim transformar a realidade”1212 Fittipaldi ALM, O’Dwer G, Henriques P. Educação em saúde na atenção primária: as abordagens e estratégias contempladas nas políticas públicas de saúde. Interface (Botucatu). 2021 [acesso em 2022 maio 2]; 25:1-16. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/icse/2021.v25/e200806/.
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(6). As mesmas autoras destacam que os sujeitos participam como os verdadeiros protagonistas no enfrentamento das causas e condições sociais da saúde, considerando o debate como uma convergência de conhecimentos, pautado no respeito aos saberes diversos, expandindo aprendizado crítico e colaborando para processo de autonomia e liberdade dos sujeitos.

Grupos de escuta

Outra demanda da equipe de estudantes na experiência em campo foi a criação de grupo de escuta com gestantes e mães. Para o primeiro encontro, as ACS convidaram famílias de suas regiões para participar do grupo. Foram realizados três encontros grupais semanais, trabalhando os seguintes temas: hepatites virais e doenças infectocontagiosas; autocuidado; mitos e verdades sobre a gravidez; parto, aleitamento e desenvolvimento infantil. Os encontros objetivaram identificar com o grupo meios de incorporar o autocuidado na rotina, promover o fortalecimento de vínculos entre os membros da comunidade e aproximar a população dos serviços da rede de saúde, além de fortalecer a discussão dos temas demandados pelos usuários.

Durante os encontros, as dinâmicas de grupo introduziam os assuntos e incentivavam a participação das pessoas, produzindo propostas ativas de atuação social. As dinâmicas se caracterizaram como instrumentos de intervenção alternativos para os profissionais e metodologia ativa para os usuários.

Os atendimentos grupais permitem interação entre participantes de forma dinâmica e reflexiva, oportunizando vínculo entre atores do processo, além de incentivar o desenvolvimento de capacidades individuais e grupais, promover proveito dos recursos disponíveis e valorização da saúde.

Nesse sentido, o foco foi a criação de vínculos com a comunidade que integrava o território da UBS, através de rodas de conversa buscando o diálogo Unidade-mães. Nos encontros seguintes com o grupo de mães, o objetivo foi estabelecer dinâmicas visando orientação e promoção em saúde. Foi possível elucidar dúvidas e orientar acerca de cada temática de maneira dinâmica, fazendo com que o grupo efetivamente dialogasse, o que foi de grande valia. Com a progressão do diálogo no grupo o resultado foi, além da formação de vínculo, a apreensão e a compreensão de como as integrantes entendiam sua saúde e como procuravam mantê-la, enquanto assumiam o novo papel da maternidade.

Na AB as tecnologias leves estão ganhando mais espaço estabelecendo sua importância ao viabilizar articulação e construção das relações interpessoais nos diversos cenários, ao produzirem o cuidado de forma plena, para atender as necessidades de saúde da população. As tecnologias leves, exemplificadas pelas relações, são caracterizadas pelo acolhimento como estratégia da integralidade do cuidado; pela ação de escutar, que é exercida pela prática sensível e estratégica para o protagonismo das pessoas; também pelo vínculo representado na formação de laços entre os atores sociais envolvidos nas relações; e ainda pelo empoderamento dos participantes do processo saúde e doença, dentre outros exemplos1414 Joyce WRS, Fabrícia CVS, Paloma KHB, et al. Tecnologias leves na atenção básica: discurso dos enfermeiros. Rev Saúde Ciênc. 2020 [acesso em 2022 maio 3]; 9(3):18-28. Disponível em: https://rsc.revistas.ufcg.edu.br/index.php/rsc/article/view/460/414.
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O objetivo dessa ferramenta viva é valorizar o usuário como participante ativo do processo relacional, a partir do momento em que o profissional o reconhece como plenamente capacitado para intervir nas suas próprias ações, deixando de ser visto somente como um ser passivo e sem ter como expressar suas percepções1515 Jones SBO, Cleuma SSS, Rudval SS. Tecnologias leves como práticas de enfermagem na atenção básica. Rev. Saúde Com. 2016 [acesso em 2022 maio 3]; 12(2):613-621. Disponível em: https://periodicos2.uesb.br/index.php/rsc/article/view/425/344.
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Pela experiência dos grupos de escuta, produzida e vivenciada pelos estudantes, tornou-se possível afirmar que usar tecnologias leves, como metodologias alternativas são forma de promoção de saúde, principalmente no cenário da AB. Entretanto, há muito que caminhar na busca de novas estratégias de cuidado em saúde, para além dos modelos clássicos médico-hegemônico de consultas individuais, que por vezes, se configuram como únicas e frequentes ainda em inúmeros serviços de saúde.

Capacitações para os profssionais da UBS

Os estudantes participantes das vivências de campo no âmbito do Multicampi Saúde atuaram sob orientação dos tutores da UFPA, em capacitações complementares à formação dos profissionais da UBS, em temas específicos de livre demanda, de acordo com as particularidades do território.

Capacitar profissionais do serviço, foi um dos inúmeros desafios do Multicampi Saúde da Criança, contribuindo de modo ímpar com as instituições. A esse respeito muito se tem discutido, considerando que as ações de educação em serviço acontecem de modo pontual, com a intenção de atender às lacunas da atuação técnica dos profissionais, reunindo esforços na vinculação entre a formação e o processo ensino-aprendizagem nas situações de trabalho. É importante destacar que tais processos educativos necessitam ser conduzidos por diretrizes políticas, princípios e concepções teóricas relacionados com as políticas de saúde; e considerar ainda que estes se deparam com difíceis desafios na prática, ante as mudanças no mundo do trabalho, particularmente nos cenários nos quais são desenvolvidos por diversos atores1616 Lorena F, Júlia SAB, Carolina DDE, et al. Educação Permanente em Saúde na atenção primária: uma revisão integrativa da literatura. Saúde debate. 2019 [acesso em 2022 maio 4]; 43(120):223-239. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/3wP8JDq48kSXrFMZqGt8rNQ/?format=pdf&lang=pt.
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As experiências diárias mostram a necessidade contínua de educação nos próprios ambientes de atendimento; e devem ser movidos pela compreensão e superação de limitações. É importante sempre mentalizar que esse movimento deve ser ininterrupto e dinâmico, envolvendo o binômio ensino-serviço em espaços coletivos de aprendizagem, em que o objeto de transformação é o próprio processo de trabalho1616 Lorena F, Júlia SAB, Carolina DDE, et al. Educação Permanente em Saúde na atenção primária: uma revisão integrativa da literatura. Saúde debate. 2019 [acesso em 2022 maio 4]; 43(120):223-239. Disponível em: https://www.scielo.br/j/sdeb/a/3wP8JDq48kSXrFMZqGt8rNQ/?format=pdf&lang=pt.
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Integrar ensino-serviço, característica peculiar do Multicampi Saúde da Criança, configurou-se em estratégia de capacitação profissional estimulada por todos os participantes desse processo, produzindo construção coletiva do conhecimento.

Com essa finalidade, as capacitações foram agendadas semanalmente, em dia destinado ao funcionamento interno, com quatro encontros mensais, debatendo temas como: vigilância do desenvolvimento neuropsicomotor; estudos de caso pertinentes à realidade da UBS, apresentação das funções dos profissionais da UBS e do Nasf, preenchimento adequado da Caderneta da Criança e violência.

Os objetivos principais das ações foram complementação da formação dos profissionais, fortalecimento do trabalho em equipe, capacitação para identificar situações de risco ao desenvolvimento infantil, habilitação para o uso correto da Caderneta e estímulo à solução de problemas de saúde da comunidade.

O interesse da equipe nos assuntos e nas metodologias aplicadas foi perceptível. A educação permanente das equipes deve envolver desde o favorecimento da aquisição de novas habilidades, conhecimento e cooperação, até o preparo para lidar com novas situações-problema específicas da região, que surgem no ambiente de trabalho com a construção de estratégias alternativas para o enfrentamento.

Nesse sentido, a atualização profissional, mediante matriciamentos e capacitações durante as reuniões semanais de equipe, foi fundamental para a discussão de casos e integração da equipe, mediante diálogos interdisciplinares, bem como para ampliar a visão dos profissionais para além de um campo fechado de atuação e promover a capacidade de criação de novos meios para atuar nas demandas dos usuários e lutar pelas transformações contínuas do sistema de saúde.

Considerações finais

A experiência do projeto Multicampi Saúde: Atenção à Saúde da Criança foi enriquecedora nas dimensões do ensino, do serviço e da gestão. Ao incorporar o estudante em uma prática profissional bem estabelecida, foi possível a realização de intercâmbio com o SUS e com os futuros profissionais. Além disso, estudantes buscaram diversas formas de contribuir, vivenciando a interlocução entre ensino-serviço e sugerindo novidades provenientes de seus aprendizados teóricos, caracterizando, desse modo, a troca de saberes ao possibilitar uma imersão no SUS, conhecendo seu funcionamento e desafios.

A imersão no campo de prática demonstrou ser potente espaço de formação dos futuros profissionais, utilizando-se do modelo de formação em serviço. Mesmo estudantes dos cursos que garantem na matriz curricular as atividades práticas, como enfermagem e medicina, entre outros, avaliaram como muito proveitosa a imersão proporcionada no projeto.

Os estudantes demonstraram satisfação em realizar tarefas propostas apesar da agenda exaustiva que enfrentam cotidianamente. Relataram que o convívio diário, no modelo de imersão, permite importante troca entre atores de diferentes áreas, ampliando seus conhecimentos sobre a área da saúde e aprendendo a desenvolver relação multi/interprofissional.

Os profissionais das UBS também avaliaram positivamente o projeto, elogiando a capacidade técnica dos estudantes, a seriedade com que encaram as tarefas, o empenho e a disponibilidade com que as realizam.

Capacitar profissionais do serviço foi um dos objetivos do projeto, contribuindo de modo ímpar para as instituições, demonstrado por eles que, além da troca estabelecida com os professores que imergiram no campo disponibilizando percursos formativos demandados pelo território, a troca com os estudantes foi de muito aprendizado, além de trazer novas energias para os espaços das instituições, gerando estímulo para enfrentar os desafios postos na pesada agenda da AB nos municípios, enfrentando as múltiplas vulnerabilidades das comunidades que acessam os serviços dada a conjuntura atual.

A avaliação do Multicampi Saúde da Criança foi muito positiva por todos os envolvidos mesmo que alguns desafios ainda tenham que ser superados. Como pontos positivos, destacamos uma função social da mais alta relevância da UFPA que é a proximidade com a comunidade, com a gestão das prefeituras paraenses envolvidas, com os cidadãos, permitindo aos estudantes que conheçam outros territórios e suas especificidades de saúde. O grande desafio tem sido conciliar as agendas acadêmicas do processo educacional de cada curso com a agenda de imersão nos municípios.

O encontro de saberes que se produziu entre a universidade, por meio dos dez cursos envolvidos de diferentes áreas, e os saberes locais, dos profissionais de saúde, de gestores e comunidade mostrou-se absolutamente imprescindível para a UFPA repensar sua forma de produção de ensino e pesquisa. A utilização da ferramenta Multicampi Saúde da Criança é um importante analisador para guiar a trajetória acadêmica, tendo como fim a formatação de cursos que efetivamente preparem estudantes para atender às demandas de saúde da população.

  • Suporte financeiro: não houve

Referências

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    Dez 2022

Histórico

  • Recebido
    05 Maio 2022
  • Aceito
    13 Set 2022
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
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