RESUMO
Objetivou-se descrever a condição de saúde bucal de idosos institucionalizados, com enfoque no edentulismo, na necessidade de prótese e na Autopercepção de Saúde Bucal (ASB), e explorar a associação com fatores individuais. Um estudo transversal foi realizado em Ponta Grossa, município do Sul do Brasil, com amostra de conveniência de idosos residentes em três Instituições de Longa Permanência para Idosos. Por meio de questionário estruturado, foram coletados dados sobre características demográficas, de saúde geral e bucal e acesso a serviços de saúde. No exame bucal, avaliou-se o Índice de dentes permanentes Cariados, Perdidos e Obturados (CPO-D), número de dentes presentes, uso e necessidade de prótese dentária e presença de lesões bucais. Foram avaliados 130 idosos, a maioria com mais de 80 anos (62,20%). O CPO-D médio foi de 30,62 (desvio-padrão 2,85), 62,31% dos idosos eram edêntulos, 41,54% usavam e 79,23% necessitavam de prótese dentária. As lesões bucais foram identificadas em 35,42% dos avaliados, e 64,86% dos idosos classificaram a ASB como boa. Conclui-se que a saúde bucal dos participantes foi considerada ruim, do ponto de vista clínico, levando em consideração a alta prevalência de edentulismo e a necessidade do uso de prótese dentária.
PALAVRAS-CHAVES
Idoso; Saúde bucal; Saúde do idoso institucionalizado; Boca edêntula; Prótese dentária
ABSTRACT
The aim was to describe the oral health status of institutionalized older people, focusing on edentulism, need for dentures, and Self-Perception of Oral Health (SPOH), and to explore the association with individual factors. A cross-sectional study was carried out in Ponta Grossa, in the South of Brazil, with a convenience sample of older people living in three Long Stay Institutions for the Elderly. Using a structured questionnaire, data on demographic, general, and oral health characteristics and access to health services were collected. In the oral examination, the Index of Decayed, Missing and Filled permanent Teeth (DMFT), number of teeth present, use and need for dental prosthesis, and presence of oral lesions were evaluated. 130 older people were evaluated, most of them over 80 years old (62.20%). The mean DMFT was 30.62 (± 2.85), 62.31% of attendees were edentulous, 41.54% used, and 79.23% needed dental prosthesis. Oral lesions were identified in 35.42% of those evaluated and 64.86% of the participants classified their SPOH as good. It is concluded that the oral health of the participants was considered poor, from a clinical point of view, taking into account the high prevalence of edentulism and the need to use dental prosthesis.
Keywords:
Aged; Oral health; Health of institutionalized elderly; Mouth, edentulous; Dental prosthesis
Introdução
A proporção de idosos na população geral tem aumentado a cada ano, e o número de pessoas com 60 anos ou mais vai mais que dobrar no mundo até 2050, passando dos atuais 900 milhões para cerca de 2 bilhões11 World Health Organization. World report on ageing and health. 2015. [acesso em 2022 set 28]. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/186463.
https://apps.who.int/iris/handle/10665/1... . Esse processo de transição demográfica mundial caminha em paralelo com o desenrolar da transição epidemiológica, mudando o perfil de doenças agudas para doenças crônicas22 Calazans JA, Queiroz BL. The adult mortality profile by cause of death in 10 Latin American countries (2000–2016). Rev. Panam. Salud Publica. 2020; (44):1-9.,33 Tinós AMFG, Sales-Peres SHC, Rodrigues LCR. Acesso da População Idosa aos Serviços de Saúde Bucal: Uma Revisão. RFO (Passo Fundo). 2013; 18(3):351-360.. Com o aumento da expectativa de vida e com a mudança no panorama das doenças, torna-se maior a necessidade de produzir conhecimento sobre a condição de saúde da população idosa e do processo de envelhecimento.
O cuidado com a saúde bucal do idoso tem relação com a melhora das funções estomatognáticas, nutrição, relações interpessoais e autoestima, qualidade de vida e percepção de saúde44 Bianco A, Mazzea S, Fortunato L, et al. Oral health status and the impact on oral health-related quality of life among the institutionalized elderly population: A cross-sectional study in an area of southern italy. Int J Environ Res Public Health. 2021; (18):1-12., entre outros fatores que estão diretamente ligados à quantidade e à qualidade de dentes presentes na cavidade oral. A falta de dentes naturais ou artificiais pode ocasionar dificuldade de mastigação, causar dor e insatisfação, bem como resultar em impactos psicológicos negativos, fatores relacionados com a fragilidade em idosos55 Vieira BLC, Morais LP, Vargas-Ferreira F, et al. Use and need of removable dental prostheses in an institutionalized Brazilian elderly population: a cross-sectional study. Braz Oral Res. 2021; (35):e134..
Idosos residentes em Instituições de Longa Permanência para Idosos (Ilpi) podem ser caracterizados no contexto de vulnerabilidade66 Pessoa DMV, Pérez G, Marí-Dell’Olmo M, et al. Comparative Study of the Oral Health Profile of Institutionalized Elderly Persons in Brazil and Barcelona, Spain. Rev. bras. geriatr. gerontol. 2016; 19(5):723-732.,77 Cunha SÉ, Franco EJ, Gomes LO, et al. Avaliação da higiene bucal de idosos institucionalizados: reflexões para o delineamento de intervenções de educação em saúde. Rev Kairos. 2021; (24):93-112. e são considerados pela Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI)88 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528 de 18 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Diário Oficial da União. 18 Out 2006. como indivíduos mais fragilizados e com maiores riscos a determinados agravos à saúde66 Pessoa DMV, Pérez G, Marí-Dell’Olmo M, et al. Comparative Study of the Oral Health Profile of Institutionalized Elderly Persons in Brazil and Barcelona, Spain. Rev. bras. geriatr. gerontol. 2016; 19(5):723-732.. Os idosos institucionalizados podem apresentar a condição de saúde bucal precária77 Cunha SÉ, Franco EJ, Gomes LO, et al. Avaliação da higiene bucal de idosos institucionalizados: reflexões para o delineamento de intervenções de educação em saúde. Rev Kairos. 2021; (24):93-112.,99 Farias IPS, Sousa SA, Almeida LFD, et al. Does non-institutionalized elders have a better oral health status compared to institutionalized ones? A systematic review and meta-analysis. Ciênc. saúde coletiva. 2020; 25(6):2177-2192.,1010 Ferreira CO, Antunes JLF, Andrade FB. Fatores associados a utilização dos serviços odontológicos por idosos brasileiros. Rev Saude Publica. 2013; 47(supl3):90-9 7.,1111 Wong FMF, Ng YTY, Keung Leung W. Oral health and its associated factors among older institutionalized residents—a systematic review. Int J Environ Res Public Health. 2019; 16(21):4132, o que afeta diretamente a qualidade de vida dessa parcela da população66 Pessoa DMV, Pérez G, Marí-Dell’Olmo M, et al. Comparative Study of the Oral Health Profile of Institutionalized Elderly Persons in Brazil and Barcelona, Spain. Rev. bras. geriatr. gerontol. 2016; 19(5):723-732.. O edentulismo, desfecho comum entre os mais velhos, tem forte relação com o efeito crônico e cumulativo das doenças dentárias77 Cunha SÉ, Franco EJ, Gomes LO, et al. Avaliação da higiene bucal de idosos institucionalizados: reflexões para o delineamento de intervenções de educação em saúde. Rev Kairos. 2021; (24):93-112.,99 Farias IPS, Sousa SA, Almeida LFD, et al. Does non-institutionalized elders have a better oral health status compared to institutionalized ones? A systematic review and meta-analysis. Ciênc. saúde coletiva. 2020; 25(6):2177-2192., como a experiência de cárie e de doença periodontal, além de outros fatores relacionados com as questões de acesso e utilização de serviços de saúde.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) tinha como meta para o ano 2000 que houvesse pelo menos 50% dos indivíduos de 65-74 anos com 20 ou mais dentes na boca1212 Fédération Dentaire Internationale. Global goals for oral health in the year 2000. Int Dent J. 1982; 32(1):74-77., quantitativo considerado como definição de dentição funcional. Entretanto, 22 anos depois, a população continua edêntula e sofrendo com os impactos negativos da perda dentária1313 Kassebaum NJ, Bernabé E, Dahiya M, et al. Global Burden of Severe Tooth Loss: A Systematic Review and Meta-analysis. J Dent Res. 2014; 93(supl7):20S-28S.,1414 Peres MA, D Macpherson LM, Weyant RJ, et al. Oral health 1 Oral diseases: a global public health challenge. The Lancet. 2019; 394(10194):249-259.. Identificada na terceira idade, a perda dental trouxe como consequência o aumento pela demanda por serviços de saúde1515 Veiga Pessoa DM, Roncalli AG, Lima KC. Economic and sociodemographic inequalities in complete denture need among older Brazilian adults: A cross-sectional population-based study. BMC Oral Health. 2016; 17(5)., entre os quais, a necessidade de próteses dentárias para substituir os dentes perdidos1616 Maia LC, Costa SM, Martelli DRB, et al. Edentulismo total em idosos: envelhecimento ou desigualdade social? Rev Bioét. 2020; (28):173-181.. A reabilitação protética seria uma opção viável para reduzir os prejuízos da ausência dentária para mastigação, digestão, fonação e estética, além dos fatores psicológicos e sociais, como a qualidade de vida e a percepção de saúde44 Bianco A, Mazzea S, Fortunato L, et al. Oral health status and the impact on oral health-related quality of life among the institutionalized elderly population: A cross-sectional study in an area of southern italy. Int J Environ Res Public Health. 2021; (18):1-12.,55 Vieira BLC, Morais LP, Vargas-Ferreira F, et al. Use and need of removable dental prostheses in an institutionalized Brazilian elderly population: a cross-sectional study. Braz Oral Res. 2021; (35):e134..
O elevado custo para o tratamento, as dificuldades de uso e acesso aos serviços de saúde, a falta de suporte social e outros fatores podem colaborar para a manutenção do edentulismo e para o impacto negativo na qualidade de vida dos indivíduos99 Farias IPS, Sousa SA, Almeida LFD, et al. Does non-institutionalized elders have a better oral health status compared to institutionalized ones? A systematic review and meta-analysis. Ciênc. saúde coletiva. 2020; 25(6):2177-2192.. Vale ressaltar que a saúde do idoso deve ser garantida pelo Estado e ser considerada como prioridade nos mais diversos níveis de atenção88 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528 de 18 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Diário Oficial da União. 18 Out 2006.. Reconhecer os motivos que resultam na perda dentária, na necessidade de prótese e na autopercepção de saúde é passo importante para subsidiar discussões sobre as políticas de saúde atuais e propor estratégias para fornecer um melhor cuidado em saúde bucal para a população idosa institucionalizada. Dessa forma, o objetivo deste estudo foi descrever avaliar a condição de saúde bucal e explorar os fatores associados ao edentulismo, à necessidade de prótese e à Autopercepção de Saúde Bucal (ASB) entre idosos institucionalizados do município de Ponta Grossa, Paraná (PR).
Material e métodos
Para obter os dados de saúde dos idosos institucionalizados, um estudo transversal foi realizado por meio da aplicação de questionário e exame clínico bucal em idosos que residem em Ilpi do município de Ponta Grossa-PR. A coleta de dados do estudo ocorreu entre os meses de setembro e dezembro de 2019, sendo que havia quatro Ilpi de caráter não governamental no município em questão, segundo registro do Censo Suas de 2019, das quais três aceitaram participar do estudo. Cabe ressaltar que não existia registro de Ilpi governamentais no Censo Suas de 2019. Os representantes legais de cada Ilpi assinaram termo de concordância sobre a realização da pesquisa.
A amostra foi de conveniência, sendo incluídos todos os idosos que aceitaram participar, por meio de assinatura de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pelos participantes, no momento da entrevista. No caso dos idosos considerados analfabetos ou incapazes de assinar (dificuldade motora), mas com capacidade cognitiva para fornecer consentimento, a assinatura foi coletada no formato de carimbo da digital do dedo polegar ou outro. Não foram incluídos no estudo os idosos que não estavam aptos a serem submetidos ao exame bucal, como a impossibilidade de receber orientações básicas e casos de doentes terminais.
Para a elaboração do instrumento de coleta de dados, foi utilizado como referência o questionário aplicado pelo estudo Saúde, Bemestar e Envelhecimento (Sabe), desenvolvido pela Faculdade de São Paulo/Universidade de São Paulo.De modo geral, foram incluídas informações sobre demografia, saúde geral, acesso aos serviços de saúde e saúde geral. As características demográficas e de saúde geral obtidas de forma autorreferida foram: sexo; idade; raça/cor; tabagismo e percepção de saúde geral. Informações sobre hipertensão e diabetes foram obtidas por meio de ficha de registro da instituição. Cabe ressaltar que a ficha de registro não era prontuário médico, mas uma lista fornecida pelo responsável de cada instituição, contendo nome, data de nascimento, idade e uso de medicação para hipertensão e/ou diabetes mellitus.
A função cognitiva foi avaliada por meio do teste Miniexame do Estado Mental (Meem). O instrumento Meem apresenta pontuação de zero a 30 pontos, e os escores mais altos obtidos indicam melhor desempenho cognitivo. No presente estudo, optou-se por utilizar o valor da mediana como ponto de corte (20 pontos). Cabe ressaltar que, até o momento, não há consenso quanto aos pontos de corte para declínio cognitivo no Brasil, sendo que a escolaridade e a idade podem ser utilizadas como escores de ponto de corte1717 Melo DM, Barbosa AJG. O uso do Mini-Exame do Estado Mental em pesquisas com idosos no Brasil: Uma revisão sistemática. Ciênc. saúde coletiva. 2015; (20):3865-3876.. Para fins de análise, e para assegurar maior consistência nas respostas, as informações de caráter subjetivo relacionadas com acesso a serviços de saúde, saúde geral e bucal, necessidade de tratamento e problema de saúde foram analisadas apenas para os idosos com capacidade cognitiva igual ou superior a 20 pontos.
A aplicação do Meem foi realizada com um total de 75 idosos (57% da amostra total), pois, entre a população investigada, existiam pessoas acamadas e sem comunicação verbal, afônicas, não comunicativas, com deficiência auditiva, que não respondiam a comandos, com diagnóstico de Alzheimer, com dificuldade de comunicação e grau de dependência III (idosos com dependência que requeiram assistência em todas as atividades de autocuidado para a vida diária e ou com comprometimento cognitivo).
Em relação ao acesso a serviços de saúde, as informações obtidas foram: data da última consulta odontológica; motivo da consulta e local de atendimento. A necessidade de saúde bucal percebida foi aferida a partir das questões: percepção de problema de saúde bucal, indicação de necessidade de tratamento odontológico e ASB; para esta última, utilizou-se o Geriatric Oral Health Assessment Index (GOHAI).
O GOHAI é composto por 12 questões, com respostas em escala Likert de cinco pontos (sempre, frequentemente, algumas vezes, raramente ou nunca), sobre problemas bucais que afetam funções físicas e funcionais, aspectos psicológicos, dor e desconforto dos idosos. O GOHAI é medido em uma escala de 12 a 60 pontos, sendo que quanto maior a pontuação, melhor a ASB. Para este estudo, a variável foi categorizada em condição bucal ruim (<52 pontos) e boa (≥52 pontos), dicotomizada a partir da mediana (52 pontos).
Após aplicação do questionário, foi realizado o exame clínico por pesquisadoras treinadas e calibradas, sendo uma aluna de graduação e uma aluna de pós-graduação. Antes da coleta de dados nas Ilpi, foi realizado um estudo-piloto, durante dois meses, com adultos e idosos (13 participantes no total) atendidos nas clínicas odontológicas da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) para treinamento da metodologia tanto do questionário quando do exame clínico e calibração dos examinadores para coleta do CPO-D.
A técnica de calibração foi a mesma adotada pelo SB Brasil 20101818 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa Nacional de Saúde Bucal – resultados principais. Brasília, DF: MS; 2012., por meio de consenso e calculando os coeficientes de concordância entre cada examinador, tendo como limite mínimo aceitável o valor de 0,65 de coeficiente Kappa. Dessa forma, os seguintes coeficientes Kappa foram identificados: interexaminador CPO-D: 0,89 (IC 95% 0,853-0,942); intraexaminador 01 CPO-D: 0,904 (IC 95% 0,861-0,948); intraexaminador 02 CPO-D: 0,865 (IC 95% 0,810-0,920).
Para o exame clínico bucal dos idosos, foram utilizados ficha clínica e materiais descartáveis, como luvas, máscaras, gorro, afastadores de madeira e compressas de gaze. Para facilitar a visualização, foram empregados espelhos clínicos; e, quando necessário, uma higienização rápida da boca foi feita com gaze, para remoção de restos alimentares. O exame foi realizado em um cômodo, como sala de estar e espaço de convivência, com a iluminação artificial do espaço (lâmpadas acesas) ou em ambiente externo com a luz natural do dia (jardim e espaços externos de convivência). Os idosos acamados foram avaliados em seus leitos com iluminação artificial.
As seguintes condições bucais foram avaliadas durante o exame: número de dentes presentes; uso e necessidade de prótese dentária; tipo de uso e de necessidade de prótese dentária; presença de lesão de mucosa associada ao uso de prótese (estomatite protética); qualidade da prótese e índice de dentes permanentes cariados, perdidos e obturados considerando 32 dentes no total (CPO-D).
Partindo do pressuposto que o edentulismo é característica marcante entre as pessoas idosas, avaliar quais fatores estão associados a tal condição oral é importante para entender quais motivos podem colaborar para a perda dentária. Quando a ausência de dentes é identificada, a necessidade de prótese pode ser um dos desfechos presentes, motivo pelo qual os fatores associados também foram investigados. Sendo assim, os desfechos de interesse foram: edentulismo, necessidade de prótese e ASB.
Foram realizadas análises descritivas (frequência absoluta e relativa) de todas as variáveis do estudo. Para o CPO-D, avaliado de forma numérica contínua, foram calculados as médias e o desvio-padrão, tanto para a população geral como para a estratificação de dentados, bem como para a faixa etária preconizada pela OMS e utilizada no levantamento de saúde bucal nacional1818 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa Nacional de Saúde Bucal – resultados principais. Brasília, DF: MS; 2012.. Na sequência, foi realizada análise bivariada para buscar associações entre edentulismo e as características demográficas, de saúde geral e de saúde bucal. A necessidade de prótese também foi um desfecho de interesse, e foi realizada análise bivariada para avaliar os fatores associados.
Foi efetuada análise bivariada para identificar associações entre ASB e características acima mencionadas, sendo que, para esta análise, foram incluídos apenas os idosos que apresentaram classificação de função cognitiva como boa (resultado do Meem maior que a mediana da amostra, conforme detalhado anteriormente). Para todas as análises bivariadas, utilizou-se o teste Qui-quadrado ou teste Exato de Fisher para identificar as associações entre as variáveis categóricas.
Em todas as análises bivariadas de associação, para as variáveis de caráter subjetivo e/ ou autoavaliado (raça/cor, autopercepção de saúde geral, tabagismo, última consulta odontológica, motivo da consulta, local de atendimento, problema de saúde bucal atualmente, necessidade de tratamento odontológico, ASB), foram incluídos nas análises bivariadas apenas os idosos considerados com boa função cognitiva de acordo com o resultado do Meem.
Após teste de Shapiro Wilk para normalidade, as variáveis contínuas foram analisadas por estatística não paramétrica, por meio do coeficiente de correlação de Spearman. Identificaram-se, por meio da matriz de correlação, as associações entre o total de dentes presentes e do índice CPO-D, a função cognitiva (escore Meem) e a idade em anos. Para todos os testes acima mencionados, as associações foram consideradas significativas quando os valores de p foram menores ou iguais a 0,05 (nível de significância de 5%).
O estudo foi aprovado por meio do Comitê de Ética em Pesquisa da UEPG (CAAE: 13934619.6.0000.0105).
Resultados e discussão
Do total de idosos residentes nas Ilpi (n=176), 130 foram avaliados (73,86%). Não foi possível avaliar todos os idosos, pois alguns não aceitaram participar da pesquisa e outros não estavam nas instituições no momento em que as coletas foram realizadas, visto que haviam saído para consulta médica, visita familiar e outros compromissos. Quanto aos aspectos demográficos, a maior parte da amostra foi composta por mulheres (77,69%) e por idosos com 80 anos ou mais (62,20%). Segundo os dados fornecidos pelas instituições, obtidos por meio do acesso às fichas de registro dos moradores, quanto às características de saúde geral, identificou-se que 50% dos idosos eram hipertensos e que 30,19% tinham diabetes mellitus. Na tabela 1, observa-se a caracterização da amostra.
Características dos idosos residentes em Instituições de Longa Permanência para Idosos do município de Ponta Grossa (PR)
Os idosos foram avaliados em relação à capacidade cognitiva por meio do Meem (função cognitiva boa ou ruim). Foram coletados dados de 75 idosos (57,69% da amostra total), sendo que os escores variaram de 1 a 30, com média de 19,17 (desvio-padrão 6,19) e mediana de 20. Considerando a mediana como ponto de corte, nota-se que 33 (44%) deles foram classificados com menos de 20 pontos, e 42 (56%), com 20 pontos ou mais.
Entre os 42 idosos com função cognitiva boa e consequente capacidade para responder às perguntas subjetivas, 52,38% afirmaram ter uma percepção boa da saúde geral. Esses idosos responderam ao instrumento GOHAI, e o escore médio obtido foi de 50,05 (desvio-padrão 8,60) e mediana de 52. Quando o GOHAI foi categorizado, utilizando como ponto de corte a mediana, e deu origem à ASB, 64,86% dos idosos foram classificados com ASB boa. Quanto às características de saúde bucal, a maioria dos participantes (69,08%) afirmou não estar com problema de saúde bucal no momento da entrevista e não necessitar de tratamento odontológico (61,90%).
Quando questionados sobre o acesso a serviços de saúde, 60% informaram ter realizado a última consulta odontológica nos dois últimos anos, sendo que a maioria foi ao dentista para revisão, prevenção, rotina ou para realizar algum tratamento. A maior parte dos atendimentos (51,28%) aconteceu em unidades de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) ou na própria Ilpi.
Todos os 130 idosos foram avaliados quanto à presença de dentes; e, destes, 62,31% eram edêntulos totais. Verificou-se que 58,46% das pessoas não faziam uso de prótese. Independentemente do uso ou não de prótese, observou-se a necessidade de reabilitação protética, por meio da confecção de nova prótese para os que não faziam uso dela ou substituição de próteses com má qualidade. Dessa forma, 79,23% de todos os idosos avaliados necessitavam de algum tipo de prótese.
Em relação ao tipo de necessidade de prótese, foi possível identificar que a maioria dos idosos necessita de prótese total tanto superior (73%) quanto inferior (73%). A combinação de próteses fixas e/ou próteses parciais removíveis também foi relevante entre os idosos, ou seja, aqueles que ainda mantêm dentes na cavidade oral precisam de reabilitações mais complexas, não de apenas um elemento.
A qualidade da prótese foi avaliada conforme informado na tabela 1. A maioria dos idosos (64,58%) não apresentava lesão associada ao uso da prótese (estomatite protética). Contudo, algumas próteses não estavam adequadas quanto a: retenção (20,93%); estabilidade e reciprocidade (30,23%); fixação (23,26%); e estética (27,91%), sendo indicativas de troca/substituição.
O índice CPO-D para a amostra total foi de 30,62 (desvio-padrão 2,85); e para a amostra estratificada dos dentados, foi de 28,25 (desvio-padrão 3,64). Levando em consideração a padronização da faixa etária de 64-75 anos para estudos epidemiológicos com idosos, o CPO-D para tal grupo etário foi de 30,61 (desvio-padrão 2,85).
Quando os idosos foram classificados em dentados ou edêntulos totais (tabela 2), identificou-se que os grupos diferiram entre si em relação a: idade; presença de hipertensão; última visita odontológica; tipo de uso e de necessidade de prótese. Foi identificada uma prevalência maior de edentulismo entre idosos mais velhos (80 anos ou mais). Além disso, prevalência de hipertensão foi maior entre os edêntulos. Ademais, foram verificadas maiores proporções de dentados que foram ao dentista nos últimos 1 ou 2 anos.
Associação entre edentulismo e características demográficas, saúde geral e saúde bucal de idosos residentes em Instituições de Longa Permanência para Idosos do município de Ponta Grossa (PR)
Em relação aos fatores associados à necessidade de prótese (tabela 3), apenas o motivo da última consulta odontológica e o uso de prótese estiveram associados. A maioria dos idosos que necessitam de prótese (66,67%) procurou o dentista para tratamento de rotina, sem apresentar quadro de dor ou outra urgência. Em relação ao uso de prótese, a maioria dos idosos que necessitam de prótese nova ainda não faz uso (73,79%), mas cabe ressaltar que metade dos idosos que já usam prótese precisa de substituições.
Associação entre necessidade de prótese e características demográficas, saúde geral e saúde bucal de idosos com capacidade cognitiva, residentes em Instituições de Longa Permanência para Idosos do município de Ponta Grossa (PR)
Na tabela 4, observa-se que a ASB negativa foi associada à identificação de problema de saúde bucal atual (p<0,05). Para todas as demais características demográficas, saúde geral e saúde bucal, não houve diferenças estatisticamente significantes (p>0,05).
Associação entre autopercepção de saúde bucal e características demográficas, saúde geral e saúde bucal de idosos com capacidade cognitiva, residentes em Instituições de Longa Permanência para Idosos do município de Ponta Grossa (PR)
A tabela 5 apresenta as associações entre as variáveis contínuas: idade; capacidade cognitiva; ASB; e experiência de cárie, considerando a amostra total de idosos participantes. Percebe-se que quanto maior a idade, menor a capacidade cognitiva. Além disso, quanto maior a idade, menor o número total de dentes presentes e maior o total do índice CPO-D. Nota-se também uma correlação entre o número total de dentes, ou seja, quanto mais dentes, maior o número de dentes cariados e obturados e menor o total do índice CPO-D.
Matriz de correlação de Spearman. Associação entre as variáveis de condição de saúde bucal, idade e capacidade cognitiva entre idosos residentes em Instituições de Longa Permanência para Idosos do município de Ponta Grossa (PR)
A maioria dos idosos avaliados era edêntula, necessitava de prótese dentária e autopercebeu a saúde bucal adequada (boa). O edentulismo foi mais prevalente entre os idosos com 80 anos de idade ou mais e entre aqueles que foram ao dentista há três anos ou mais, sendo que quantos mais dentes presentes na cavidade oral, maior a quantidade de dentes cariados no índice CPO-D. A maior necessidade de prótese foi do tipo prótese total. Entre os idosos que autoperceberam a saúde bucal boa, a maioria relatou não estar com problema de saúde bucal atualmente.
A alta prevalência de edentulismo identificada no presente estudo, assim como em outros66 Pessoa DMV, Pérez G, Marí-Dell’Olmo M, et al. Comparative Study of the Oral Health Profile of Institutionalized Elderly Persons in Brazil and Barcelona, Spain. Rev. bras. geriatr. gerontol. 2016; 19(5):723-732.,1919 Silva RS, Fedosse E, Pascotini FS, et al. Condições de saúde de idosos institucionalizados: contribuições para ação interdisciplinar e promotora de saúde. Cad Bras Ter Ocup. 2019; (27):345-356.,2020 Beloti AM, Schwab BL, Bertipaglia T, et al. Avaliação das condições de saúde bucal de idosos institucionalizados em asilos públicos de Maringá-PR. Ciênc Cuid Saúde. 2011; (10):96-100.,2121 Montandon AAB, Pereira LAP, Pardi V, et al. Edentulism and associated variables among institutionalized elders. MOJ Gerontol. Geriatr. 2018; 3(5):356-361. já realizados com idosos no Brasil e em outros lugares do mundo, contraria a preconização da OMS de que apenas 5% dos idosos fossem desdentados em 2010 e as metas definidas tanto pela OMS quanto pela Federação Dentária Internacional (FDI) de que pelo menos 50% dos indivíduos entre 65 e 79 anos devem possuir, no mínimo, 20 dentes funcionais na cavidade bucal1212 Fédération Dentaire Internationale. Global goals for oral health in the year 2000. Int Dent J. 1982; 32(1):74-77..
Na matriz de correlação, foi possível identificar que, conforme a idade dos idosos aumentou, houve diminuição no número de dentes presentes; enquanto possuir mais dentes na boca esteve correlacionado com aumento de dentes cariados no índice CPO-D. Para os idosos dentados, o CPO-D médio do presente estudo foi semelhante ao encontrado por Francisco et al.2222 Francisco KMS, Silveira NT, Casotti CA, et al. Condições de saúde bucal de idosos institucionalizados. Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano. 2012; 9(3):405-416. em estudo realizado na Bahia (29,02), assim como nos resultados de Melo et al.2323 Melo LA, Sousa MM, Medeiros AKB, et al. Fatores associados à autopercepção negativa da saúde bucal em idosos institucionalizados. Ciênc. saúde coletiva. 2016; 21(11):3339-3346. (28,9) coletados em Natal, Rio Grande do Norte, e próximo ao apresentado pelo Projeto SB 20101818 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa Nacional de Saúde Bucal – resultados principais. Brasília, DF: MS; 2012. da região Sul (28,89). Na revisão sistemática sobre os níveis de saúde bucal, o impacto da saúde bucal na qualidade de vida e os fatores associados entre os idosos institucionalizados realizada por Wong et al.1111 Wong FMF, Ng YTY, Keung Leung W. Oral health and its associated factors among older institutionalized residents—a systematic review. Int J Environ Res Public Health. 2019; 16(21):4132, identificou-se que, entre os artigos incluídos na revisão e que avaliaram o CPO-D (n=13), a pontuação média de CPO-D variou de 11,30 (Índia) a 28,80 (Brasil).
Nota-se elevado CPO-D entre idosos institucionalizados, e a presença de dentes naturais na cavidade oral não garante boa saúde bucal, pois tais dentes precisam estar em oclusão e funcionamento, permitindo a mastigação, a fonação, a estética, entre outras funções1111 Wong FMF, Ng YTY, Keung Leung W. Oral health and its associated factors among older institutionalized residents—a systematic review. Int J Environ Res Public Health. 2019; 16(21):4132. Sendo assim, os dentes naturais presentes também são suscetíveis a problemas de saúde bucal, como doença periodontal e cárie dentária, causando dor, desconforto, problemas alimentares, malnutrição, dificuldades de fala, problemas estéticos, predisposição a várias doenças não transmissíveis, sofrimento psicossocial, impacto negativo na qualidade de vida, entre outros44 Bianco A, Mazzea S, Fortunato L, et al. Oral health status and the impact on oral health-related quality of life among the institutionalized elderly population: A cross-sectional study in an area of southern italy. Int J Environ Res Public Health. 2021; (18):1-12.,1111 Wong FMF, Ng YTY, Keung Leung W. Oral health and its associated factors among older institutionalized residents—a systematic review. Int J Environ Res Public Health. 2019; 16(21):4132.
Para suprir a falta de dentes, faz-se necessária a reabilitação protética. A utilização de próteses, seja total ou parcial, tende a melhorar as funções físicas, incluindo mastigar, falar, sorrir e se comunicar1111 Wong FMF, Ng YTY, Keung Leung W. Oral health and its associated factors among older institutionalized residents—a systematic review. Int J Environ Res Public Health. 2019; 16(21):4132. Entretanto, não basta apenas fazer uso da prótese, pois esta deve estar completamente adequada à cavidade oral, permitindo que todas as funções sejam realizadas sem impactar negativamente na qualidade de vida do idoso. No presente estudo, identificou-se que muitas próteses já em uso tinham a indicação de troca, assim como outros resultados apresentados na literatura77 Cunha SÉ, Franco EJ, Gomes LO, et al. Avaliação da higiene bucal de idosos institucionalizados: reflexões para o delineamento de intervenções de educação em saúde. Rev Kairos. 2021; (24):93-112.,2424 Piuvezam G, Lima KC. Self-perceived oral health status in institutionalized elderly in Brazil. Arch Gerontol Geriatr. 2012; (55):5-11.,2525 Iosif L, Preoteasa CT, Preoteasa E, et al. Oral health related quality of life and prosthetic status among institutionalized elderly from the bucharest area: A pilot study. Int J Environ Res Public Health. 2021; 18(12):6663., uma vez que apresentavam comprometimento dos fatores como retenção, estabilidade, fixação e estéticas.
A necessidade de prótese, seja de instalação de novas peças, seja da troca de próteses antigas, pode estar relacionada com a falta de acesso ou o uso de serviços odontológicos para realizar tratamento, manutenção preventiva, correções e ajustes. Porém, o acesso a serviços odontológicos não depende apenas da vontade do usuário, visto que as barreiras de acesso, como baixa escolaridade, baixa renda, e a escassa disponibilidade de serviços públicos e de saúde bucal estão presentes e dificultam a realização do tratamento1515 Veiga Pessoa DM, Roncalli AG, Lima KC. Economic and sociodemographic inequalities in complete denture need among older Brazilian adults: A cross-sectional population-based study. BMC Oral Health. 2016; 17(5)..
Tanto o edentulismo quanto o CPO-D elevado e a alta prevalência de necessidade de prótese podem ser explicados pela subutilização de tratamentos dentários pelos idosos institucionalizados, levando em consideração a fragilidade e a redução de mobilidade física, a ausência de recursos financeiros, a falta de assistência odontológica dentro das Ilpi, as doenças crônicas, os fatores psicológicos, a baixa quantidade de cuidadores nas Ilpi, a falta de higiene, o baixo nível de escolaridade, as barreias financeiras, entre outros fatores2121 Montandon AAB, Pereira LAP, Pardi V, et al. Edentulism and associated variables among institutionalized elders. MOJ Gerontol. Geriatr. 2018; 3(5):356-361.,2525 Iosif L, Preoteasa CT, Preoteasa E, et al. Oral health related quality of life and prosthetic status among institutionalized elderly from the bucharest area: A pilot study. Int J Environ Res Public Health. 2021; 18(12):6663..
Para diminuir a perda dentária e obter melhor índice de CPOD, com menos dentes cariados e melhor saúde bucal, a instalação de estratégias de higiene oral no âmbito das Ilpi pode ser um caminho bem-sucedido. Por exemplo, fornecer capacitação em saúde bucal para cuidadores dos idosos, avaliar individualmente a escovação de cada idoso para fazer orientação e adaptação de acordo com as limitações motoras, incentivar ações educativas de prevenção na Ilpi por meio atividades com acadêmicos de odontologia, estabelecer parcerias entre Ilpi e instituições de ensino em odontologia para fornecer tratamento aos idosos e incentivar a criação de agenda específica para idosos nos atendimentos odontológicos nas Unidades Básicas de Saúde.
Em relação à necessidade de prótese e levando em consideração que, segundo a PNPSI88 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528 de 18 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Diário Oficial da União. 18 Out 2006., devem ser estabelecidas ações de reabilitação, para recuperação da máxima autonomia funcional e da saúde, uma das opções para amenizar a alta prevalência seria garantir o acesso por meio do SUS, pois os Laboratórios Regionais de Prótese Dentária estão previstos na Política Nacional de Saúde Bucal e recebem repasse financeiro federal para fornecer reabilitação oral protética2626 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica, Coordenação Nacional de Saúde Bucal. Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal. Brasília, DF: MS; 2004..
Cabe ressaltar que o edentulismo, a perda dentária parcial e a consequente necessidade de reabilitação protética refletem a prática odontológica mutiladora a que os idosos foram submetidos no passado33 Tinós AMFG, Sales-Peres SHC, Rodrigues LCR. Acesso da População Idosa aos Serviços de Saúde Bucal: Uma Revisão. RFO (Passo Fundo). 2013; 18(3):351-360.,99 Farias IPS, Sousa SA, Almeida LFD, et al. Does non-institutionalized elders have a better oral health status compared to institutionalized ones? A systematic review and meta-analysis. Ciênc. saúde coletiva. 2020; 25(6):2177-2192.,1111 Wong FMF, Ng YTY, Keung Leung W. Oral health and its associated factors among older institutionalized residents—a systematic review. Int J Environ Res Public Health. 2019; 16(21):4132,2323 Melo LA, Sousa MM, Medeiros AKB, et al. Fatores associados à autopercepção negativa da saúde bucal em idosos institucionalizados. Ciênc. saúde coletiva. 2016; 21(11):3339-3346., fruto de uma assistência odontológica que não era centrada na prevenção e na manutenção dos dentes na cavidade oral. Esses achados corroboram a afirmação de que os idosos são oriundos de uma época em que edentulismo e saúde bucal ruim eram considerados naturais e parte do envelhecimento2424 Piuvezam G, Lima KC. Self-perceived oral health status in institutionalized elderly in Brazil. Arch Gerontol Geriatr. 2012; (55):5-11., sendo o edentulismo em pessoas de idade avançada um compilado de problemas bucais que se agregam com o passar dos anos.
Além disso, a capacidade de lidar com as informações sobre saúde ao longo do ciclo de vida também pode estar relacionada com os achados do estudo, sendo a literacia em saúde importante ferramenta para pensar em políticas públicas futuras que possam diminuir o espaço existente entre a condição clínica precária e a percepção de estar com saúde adequada quando, na verdade, existem patologias a serem tratadas.
A OMS define a literacia em saúde como o conjunto de competências cognitivas e sociais e a capacidade dos indivíduos para ganharem acesso a compreender e a usar informação de forma que promovam e mantenham boa saúde2727 Wolrd Health Organization. Health promotion glossary. Geneva: World Health Organization; 1998. [acesso em 2022 mar 25]. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/WHO-HPR-HEP-98.1.
https://www.who.int/publications/i/item/... . Dessa forma, o processo de literacia em saúde pode criar condições para que o idoso tenha capacidade de controlar fatores determinantes de saúde, como estilo de vida, condição socioeconômica, culturais e ambientais, objetivando melhorar a condição de saúde e a qualidade de vida. A baixa literacia em saúde está relacionada com pior estado de saúde2727 Wolrd Health Organization. Health promotion glossary. Geneva: World Health Organization; 1998. [acesso em 2022 mar 25]. Disponível em: https://www.who.int/publications/i/item/WHO-HPR-HEP-98.1.
https://www.who.int/publications/i/item/... . Portanto, a partir do momento em que houver aumento do acesso da pessoa idosa à informação de saúde, como entendimento dos efeitos deletérios da perda dentária, a importância da reabilitação protética e a manutenção dos dentes na cavidade oral com condições adequadas podem acarretar uma saúde bucal favorável.
A prevalência de uso e necessidade de prótese dentária no presente estudo foi de 41,54% e 79,23% respectivamente. A necessidade de prótese foi similar a outros estudos realizados com idosos institucionalizados e maior do que a necessidade entre idosos não institucionalizados no Brasil1818 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. SB Brasil 2010: Pesquisa Nacional de Saúde Bucal – resultados principais. Brasília, DF: MS; 2012.. No estudo realizado em Belo Horizonte-MG, os autores identificaram que 74,3% dos idosos institucionalizados necessitavam de prótese removível55 Vieira BLC, Morais LP, Vargas-Ferreira F, et al. Use and need of removable dental prostheses in an institutionalized Brazilian elderly population: a cross-sectional study. Braz Oral Res. 2021; (35):e134.. Medeiro et al.2828 Medeiros AKB, Barbosa FP, Piuvezam G, et al. Prevalence and factors associated with alterations of the temporomandibular joint in institutionalized elderly. Ciênc. saúde coletiva. 2019; 24(1):159-168. identificaram que 58,6% da amostra de idosos institucionalizados do estudo deles realizado com municípios das cinco regiões brasileiras eram desdentados e que mais da metade dos indivíduos necessitavam de prótese dentária.
Silva e Castellanos Fernandes2929 Silva SRC, Castellanos Fernandes RA. Autopercepção das condições de saúde bucal por idosos. Rev Saude Publica. 2001; 35(4):349-355. identificaram que 63% dos idosos institucionalizados avaliados usavam prótese dentária e que 61% necessitavam de prótese, resultado muito similar aos dados do estudo de Beloti et al.2020 Beloti AM, Schwab BL, Bertipaglia T, et al. Avaliação das condições de saúde bucal de idosos institucionalizados em asilos públicos de Maringá-PR. Ciênc Cuid Saúde. 2011; (10):96-100. realizado em Maringá-PR e de Melo et al.1717 Melo DM, Barbosa AJG. O uso do Mini-Exame do Estado Mental em pesquisas com idosos no Brasil: Uma revisão sistemática. Ciênc. saúde coletiva. 2015; (20):3865-3876., os quais encontraram necessidade de prótese em 73,2% e 66,9% dos idosos respectivamente. Resultados internacionais também são semelhantes aos achados brasileiros, apontando elevada necessidade de prótese entre idosos institucionalizados. No Líbano, Choufani et al.3030 Choufani A, Folliguet M, El-Osta N, et al. Oral health status and care of institutionalized elderly individuals in Lebanon. Indian J Dent Res. 2020; 31(4):507. identificaram que mais da metade da amostra era edêntula (55,6%) e que 42,6% dos idosos avaliados usavam algum tipo de prótese dentária.
Contudo, apenas ofertar prótese dentária não é a solução total para o edentulismo e a precariedade de saúde bucal entre idosos, pois esta é multifatorial e necessita de acompanhamento e atendimento individualizado, além do acesso a medidas de prevenção de agravos e promoção de saúde. Dessa forma, a junção da assistência mutiladora com a ausência de medidas coletivas de prevenção pode ter impactado negativamente na condição de saúde bucal da população idosa; e os resultados do presente estudo, assim como de outros já realizados com idosos institucionalizados, reiteram a eminente necessidade de melhores de políticas públicas para a pessoa idosa.
Após avaliar clinicamente os idosos e identificar resultados negativos de saúde bucal, foi necessário entender como a pessoa se autoavalia, levando em consideração que mensurar autopercepção pode predizer a necessidade de cuidado2323 Melo LA, Sousa MM, Medeiros AKB, et al. Fatores associados à autopercepção negativa da saúde bucal em idosos institucionalizados. Ciênc. saúde coletiva. 2016; 21(11):3339-3346.. A ASB pode fornecer um meio de compreensão e avaliação do comportamento e das necessidades individuais, uma vez que são medidas subjetivas e que permitem identificar o que o idoso consegue perceber do seu estado bucal e o quanto isso pode influenciar positivamente ou negativamente na qualidade de vida.
Dessa forma, mais de 60% dos idosos do presente estudo consideraram a saúde bucal boa, achado que não condiz com os achados clínicos do estudo, mas está de acordo com dados apresentados por Melo et al.2323 Melo LA, Sousa MM, Medeiros AKB, et al. Fatores associados à autopercepção negativa da saúde bucal em idosos institucionalizados. Ciênc. saúde coletiva. 2016; 21(11):3339-3346. e Piuzevam2424 Piuvezam G, Lima KC. Self-perceived oral health status in institutionalized elderly in Brazil. Arch Gerontol Geriatr. 2012; (55):5-11. que também identificaram maior prevalência de boa percepção de saúde bucal entre idosos brasileiros institucionalizados. Mesmo com as condições bucais ruins, ou seja, com ausência de dentes, CPO-D médio elevado e necessidade de próteses, os idosos se autoavaliaram positivamente. Esses achados corroboram a literatura existente77 Cunha SÉ, Franco EJ, Gomes LO, et al. Avaliação da higiene bucal de idosos institucionalizados: reflexões para o delineamento de intervenções de educação em saúde. Rev Kairos. 2021; (24):93-112.,2424 Piuvezam G, Lima KC. Self-perceived oral health status in institutionalized elderly in Brazil. Arch Gerontol Geriatr. 2012; (55):5-11.,2525 Iosif L, Preoteasa CT, Preoteasa E, et al. Oral health related quality of life and prosthetic status among institutionalized elderly from the bucharest area: A pilot study. Int J Environ Res Public Health. 2021; 18(12):6663. e podem ser explicados pelo fato de que muitas condições clínicas precária são assintomáticas e podem ser desconhecidas pelo idoso2323 Melo LA, Sousa MM, Medeiros AKB, et al. Fatores associados à autopercepção negativa da saúde bucal em idosos institucionalizados. Ciênc. saúde coletiva. 2016; 21(11):3339-3346..
Além disso, o fato de o idoso autoperceber a saúde bucal positiva pode resultar em baixa procura de atendimento odontológico e, consequentemente, em aumento da prevalência de necessidade de prótese e presença de outros problemas de saúde bucal, pois se a falta de dentes não incomoda o indivíduo e se a maioria das condições clínicas desfavoráveis são assintomáticas, então o idoso somente saberá da importância de uma reabilitação protética após avaliação clínica. Portanto, a autopercepção relatada pode não ser suficiente para predizer e identificar condições de saúde bucal2323 Melo LA, Sousa MM, Medeiros AKB, et al. Fatores associados à autopercepção negativa da saúde bucal em idosos institucionalizados. Ciênc. saúde coletiva. 2016; 21(11):3339-3346..
Cabe ressaltar que a PNSPI88 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528 de 18 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Diário Oficial da União. 18 Out 2006. considera idoso frágil ou em situação de fragilidade aquele que vive em Ilpi, sendo uma população com maior risco de problemas de saúde. Dessa forma, diante de outros problemas de saúde, a saúde bucal tonar-se irrelevante ou menos importante, resultando em ABS positiva mesmo com condições clínicas desfavoráveis.
Camarano e Kanso3131 Camarano AA, Kanso S. As instituições de longa permanência para idosos no Brasil. Rev Bras Estud Popul. 2010; 27(1):232-235. destacaram que as Ilpi podem deixar de fazer parte apenas dos cuidados de assistência social e requerer mais atenção por parte da assistência à saúde, levando em consideração o aumento da sobrevivência de pessoas com redução da capacidade física, cognitiva e mental. Com esse compilado de dados e tendo em conta a relevância da atuação do cirurgião-dentista para educação, prevenção e tratamento em saúde bucal3131 Camarano AA, Kanso S. As instituições de longa permanência para idosos no Brasil. Rev Bras Estud Popul. 2010; 27(1):232-235.,3232 Ortíz-Barrios LB, Granados-García V, Cruz-Hervert P, et al. The impact of poor oral health on the oral health-related quality of life (OHRQoL) in older adults: The oral health status through a latent class analysis. BMC Oral Health. 2019; 19(1):141., justifica-se a importância da ampliação ou da implementação do atendimento odontológico, mesmo que parcial, para a população idosa residente das Ilpi.
Entretanto, como identificado no presente estudo, a maioria dos idosos foi ao dentista nos últimos dois anos, mas isso não eliminou a alta prevalência de necessidade de prótese. Portanto, não basta apenas que os idosos tenham o atendimento odontológico, mas que tal atendimento garanta o tratamento necessário deles, para que a reabilitação possa ocorrer, impactando na qualidade de vida, na nutrição e em todas as outras funções relacionadas com a saúde bucal1111 Wong FMF, Ng YTY, Keung Leung W. Oral health and its associated factors among older institutionalized residents—a systematic review. Int J Environ Res Public Health. 2019; 16(21):4132.
Cabe destacar que o presente estudo apresenta limitações, pois, por ser tratar de uma amostra de idosos muitas vezes com outras morbidades, no decorrer da coleta de dados, houve falecimento ou ausência de alguns idosos (consulta médica, visita familiar, entre outros), impossibilitando a obtenção completa das informações para esses indivíduos, o que pode ter enviesado os resultados para algumas das variáveis abordadas.
Outro ponto importante a ser destacado é que o estudo em questão utilizou a função cognitiva como forma de garantir a confiabilidade das informações subjetivas – e, com isso, o número amostral também foi afetado por meio da exclusão de idosos. Dessa forma, não foi possível realizar análise multivariada para identificar fatores associados após ajustes e seleção de modelo teórico. Além disso, o exame clínico realizado com luz natural ou artificial pode impedir que todos os detalhes sejam captados, de forma que a ausência do sugador odontológico e da seringa tríplice pode impactar na avaliação dos tecidos dentários. Nesse caso, considera-se que esse viés foi passível de tentativa de controle pela calibração prévia dos examinadores.
Por outro lado, o estudo trouxe à tona a realidade da condição de saúde bucal dos idosos institucionalizados e, ainda, permitiu o tratamento odontológico, por meio de encaminhamento de idosos para atendimento na UEPG, além de orientações e educação em saúde bucal. Outro ponto importante a ser destacado é de que o levantamento de dados foi elaborado com base em um estudo de coorte de reconhecimento nacional (Sabe), possibilitando o uso de metodologia padronizada e consagrada na literatura científica.
Considerações finais
A avaliação de saúde bucal dos idosos institucionalizados apresentou aspectos negativos, com destaque para alta prevalência de edentulismo, necessidade de prótese dentária e média de CPO-D acima dos valores nacionais. Cabe reforçar e ampliar as políticas públicas voltadas à saúde bucal de idosos, com ênfase aos que se encontram institucionalizados, envolvendo a garantia de atendimento odontológico, bem como ações de promoção e prevenção.
- Suporte financeiro: não houve
- *Orcid (Open Researcher and Contributor ID).
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Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
30 Jun 2023 - Data do Fascículo
Apr-Jun 2023
Histórico
- Recebido
04 Out 2022 - Aceito
30 Jan 2023