O Conselho Nacional de Saúde na pandemia de Covid-19: análise dos atos normativos e não normativos entre 2020 e 2022

José Rafael Cutrim Costa Sandra Mara Campos Alves Maria Célia Delduque Maria do Socorro de Souza Sobre os autores

RESUMO

Este artigo apresenta os resultados de pesquisa normativa sobre o enfrentamento da pandemia de Covid-19, no Conselho Nacional de Saúde (CNS), entre os meses de fevereiro de 2020 e maio de 2022. Tratou-se de estudo documental, descritivo-analítico com abordagem qualitativa, utilizando-se de técnica de análise de conteúdo. Foram identificados 77 atos expedidos pelo colegiado do CNS, sendo 63 recomendações, 6 pareceres, 5 moções, 2 notas técnicas e 1 resolução, constatando-se que a maior parte dos documentos (59%) foi elaborada no primeiro ano da pandemia. A despeito da atuação do CNS no enfrentamento da Covid-19, destaca-se o uso de atos não vinculantes, concentrando-se a produção normativa do CNS em recomendações que têm caráter meramente orientadores.

PALAVRAS-CHAVE
Controle social formal; Conselhos de saúde; Covid-19

Introdução

A consolidação do controle social na área da saúde se deu a partir da promulgação da Constituição de 198811 Brasil. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988. e das Leis nº 8.080/199022 Brasil. Lei nº 8.080, 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União. 20 Set 1990. e nº 8.142/199033 Brasil. Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências. Diário Oficial da União. 31 Dez 1990., que o institucionalizaram como diretriz e princípio do Sistema Único de Saúde (SUS).

O Conselho Nacional de Saúde (CNS), órgão permanente e deliberativo do SUS, com representação de diversos atores sociais em sua composição44 Costa AM, Noronha JC. Controle Social na Saúde: construindo a Gestão Participativa. Saúde debate. 2003; 27(65):358-363., tem como atribuição legal atuar na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde, inclusive nos aspectos logísticos, econômicos e financeiros; e fiscalizar, acompanhar e monitorar as políticas públicas de saúde, levando as demandas da população à gestão da saúde.

O CNS foi criado pela Lei nº 378, de 13 de janeiro de 193755 Brasil. Lei nº 378, de 13 de janeiro de 1937. Dá nova organização ao Ministério da Educação e Saúde Pública. Diário Oficial da União. 15 Jan 1937., com a finalidade de assistir ao Ministro da Educação e da Saúde, nos temas de sua competência. Com a separação do Ministério da Saúde e da Educação Pública, o CNS foi regulamentado pelo Decreto nº 34.347, de 8 de abril de 195466 Brasil. Decreto nº 34.347, de 8 de abril de 1954. Aprova o Regimento do Conselho Nacional de Saúde. Diário Oficial da União. 9 Abr 1954., com competência meramente consultiva. Em 1970, com o Decreto nº 67.30077 Brasil. Decreto nº 67.300, de 30 de setembro de 1970. Dispõe sobre o Conselho Nacional de Saúde e dá outras providências. Diário Oficial da União. 1 Out 1970., passou a ter a competência para emitir pareceres não vinculantes sobre matérias de interesse da saúde.

Em 1987, quando começaram as primeiras manifestações para o crescimento do controle social no País, foi publicado, em 14 de janeiro, o Decreto nº 93.93388 Brasil. Decreto nº 93.933, de 14 de janeiro de 1987. Dispõe sobre a organização e atribuições do Conselho Nacional de Saúde, e dá outras providências. Diário Oficial da União. 15 Jan 1987., dispondo sobre a organização e as atribuições do CNS, com funções normativas vinculantes e de assessoria ao Ministro da Saúde.

No entanto, foi em 11 de julho de 2006, pelo Decreto nº 5.83999 Brasil. Decreto nº 5.839, de 11 de julho de 2006. Dispõe sobre a organização, as atribuições e o processo eleitoral do Conselho Nacional de Saúde - CNS e dá outras providências. Diário Oficial da União. 12 Jul 2006., que o Poder Executivo reconheceu o CNS com plena competência para emitir resoluções de caráter normativo.

A Resolução nº 407/20081010 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução nº 407, de 12 de setembro de 2008. Aprova o Regimento Interno do Conselho Nacional de Saúde. Diário Oficial da União. 11 Mar 2009., que aprovou o Regimento Interno do CNS, assim determina:

Art. 57A § 1º - O Parecer é um pronunciamento técnico-político público, fundamentado e circunstanciado que indica solução para determinado assunto, consulta ou processo administrativo ao qual o CNS é instado a se manifestar.

Art. 57A § 2º - A Nota Técnica é ato interno, produzido pela Secretaria-Executiva do CNS, possui caráter instrutivo e tem por finalidade o subsídio à Mesa Diretora e ao Pleno do CNS em matérias relativas a processos administrativos, judiciais e políticos que necessitem de maior aprofundamento para orientar os debates e deliberações do CNS.

Art. 58 - ‘A Resolução é ato geral, de caráter normativo’.

Art. 59 - A Recomendação é uma sugestão, advertência ou aviso a respeito do conteúdo ou forma de execução de políticas e estratégias setoriais ou sobre a conveniência ou oportunidade de se adotar determinada providência.

Art. 60 - A Moção é uma forma de manifestar aprovação, reconhecimento ou repúdio a respeito de determinado assunto ou fato. [original sem grifo].

Destaca-se, no entanto, que, entre os tipos normativos e técnico-políticos expedidos pelo CNS, a resolução é a única que possui forma vinculativa de seu conteúdo, são os atos normativos pelos quais o Conselho de Saúde se posiciona enquanto controle social1111 Acipreste MTL, Castro JL, Lima JCS, et al. Atuação do Conselho Nacional de Saúde frente à pandemia do Covid-19: uma análise documental. Rev. Ciênc. Plur. 2022 [acesso em 2022 out 8]; 8(3):1-19. Disponível em: https://doi.org/10.21680/2446-7286.2022v8n3ID28241.
https://doi.org/10.21680/2446-7286.2022v...
.

Conforme definição de Di Pietro1212 Di Pietro MSZ. Direito Administrativo. 35. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense; 2022., atos normativos constituem atos gerais que atingem todas as pessoas que se encontram na mesma situação. São praticados pela administração, abrangendo portarias, resoluções, decretos, regimentos, de efeitos gerais e abstratos. Inúmeros órgãos da administração recebem de suas leis instituidoras competência para regular os assuntos a elas afetos. Ademais, tais atos normativos, desde que expedidos com observância da Constituição e das leis, vinculam as autoridades administrativas.

A pandemia de Covid-19 causou uma profunda crise que mudou a dinâmica econômica, social, política e cultural do mundo em poucas semanas. Diante da crise, os governos responderam de diferentes maneiras, e essas diferenças expressaram opções de políticas públicas que geraram efeitos também diversos. Em alguns casos, as crises pioraram, em outros, foi possível mitigar seus efeitos e as múltiplas desigualdades que se aprofundaram1313 Vommaro PA. O mundo em tempos de pandemia: certezas, dilemas e perspectivas. Rev. Direito Práx. 2021 [acesso em 2022 dez 12]; 12(2):1095-1115. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/51001.
https://www.e-publicacoes.uerj.br/index....
. Nesse sentido, foi necessário organizar as ações em âmbito da gestão do sistema de saúde, implementar ações no âmbito da economia e da legislação, incluída a infralegal.

O CNS não se furta ao seu importante papel perante o cenário de emergências sanitárias, tanto que tem antecedentes históricos de atuar em situações de epidemias e de contribuir para o processo de formulação e execução de políticas de saúde, a exemplo do HIV/Aids (vírus da imunodeficiência humana/Síndrome da Imunodeficiência Humana) e Zika vírus (ZIKV).

Desde a publicação da Portaria nº 188/20201414 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 188 de 3 de fevereiro de 2020. Declara Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) em decorrência da Infecção Humana pelo novo Coronavírus (2019-nCoV). Diário Oficial da União. 4 Fev 2020. - normativa que declarou a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) em decorrência da Infecção Humana pelo novo Coronavírus - 2019-nCOV -, o CNS organizou o seu sítio na internet com sua produção normativa e não normativa sobre a pandemia. Tais dados estão agrupados no painel ‘Especial CNS no enfrentamento à Covid-19’ (http://conselho.saude.gov.br/especial-cns-no-enfrentamento-a-covid-19)1515 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). [Brasília, DF]: CNS; [data desconhecida] [acesso em 2023 set 4]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/especial-cns-no-enfrentamento-a-covid-19.
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, que aponta que o CNS emitiu importantes atos voltados ao enfrentamento da Covid-19.

Em razão do exposto é que foi traçado o objetivo de estudo documental empreendido no repositório de atos normativos e técnico-políticos do Conselho, no período desde a declaração da Espin até 2022, para conhecer e analisar os atos emanados do CNS sobre o enfrentamento da pandemia de Covid-19.

Metodologia

Tratou-se de estudo descritivo-analítico com abordagem qualitativa, com análise de conteúdo dos documentos normativos e técnico-políticos exarados pelo CNS.

A pesquisa foi estruturada a partir dos atos: resoluções, recomendações, moções, pareceres e notas técnicas. Os documentos, de acesso público, emanados no período de 3 de fevereiro de 2020 a 22 de maio de 2022, foram extraídos do endereço web: http://conselho.saude.gov.br/1616 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). [Brasília, DF]: CNS; [data desconhecida] [acesso em 2023 set 4]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/.
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, nas abas ‘Atos Normativos’ e ‘CNS contra Covid’, a partir do uso dos descritores: Covid-19; Pandemia Covid-19; e Sars-CoV-2. A pesquisa encontrou um total de 129 documentos.

Após a leitura flutuante1717 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011. dos atos, ou seja, dos documentos normativos e não normativos que foram submetidos à análise, foram selecionados aqueles que continham pelo menos um dos descritores no corpo do texto ou na ementa, descartando-se os que não atendiam aos critérios da pesquisa, restando 77 atos.

Os documentos foram organizados conforme o tipo, a fim de identificar a razão numérica de cada um dos atos estudados.

Com relação às recomendações, por reunirem o maior volume dos documentos, optou-se pela organização e categorização a partir de temas abordados, definidos a partir da leitura integral dos referidos atos, objetivando comparar toda a produção elaborada.

O acesso ao inteiro teor dos pareceres deu-se por meio dos documentos apensados às recomendações, haja vista não estarem disponibilizados isoladamente. As notas técnicas, estavam localizadas na aba ‘CNS contra Covid’, que reúne o painel ‘Especial CNS no enfrentamento à Covid-19’, a partir do subtópico ‘Notas Públicas’ do referido painel.

Resultados e discussão

Do total de atos expedidos pelo CNS no período investigado, a maior parte (59%) concentrou-se no primeiro ano da pandemia (tabela 1). O exercício de busca pelos atos encontrou alguma complexidade devido ao fato de o sítio do Conselho estar desatualizado nas datas da pesquisa.

Tabela 1
Atos expedidos pelo CNS no enfrentamento da pandemia de Covid-19 no período de 03/02/2020 a 22/05/2022

Considerando que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o estado de pandemia em 11 de março de 2020, e que se tratava de uma doença desconhecida, exigindo de todos medidas que se alteravam conforme se descobria a história natural da doença, o CNS mostrou-se, em certa medida, diligente, pois os atos deliberavam sobre conteúdos diversos, tais como a preservação da saúde e a segurança de trabalhadores da área da saúde e da população geral; a aprovação e a utilização de recursos extraordinários para o enfrentamento da pandemia; bem como recomendações à Coordenação Nacional tripartite para Combate à Covid-19 e Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19, no Senado Federal.

Acipreste et al.1111 Acipreste MTL, Castro JL, Lima JCS, et al. Atuação do Conselho Nacional de Saúde frente à pandemia do Covid-19: uma análise documental. Rev. Ciênc. Plur. 2022 [acesso em 2022 out 8]; 8(3):1-19. Disponível em: https://doi.org/10.21680/2446-7286.2022v8n3ID28241.
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entendem que, em um primeiro momento, o CNS pareceu priorizar a saúde e a segurança dos trabalhadores da saúde, incluindo residentes e estagiários, em detrimento da população geral. No entanto, consideram, o que se concorda, que a opção por ‘cuidar de quem cuida’ se justificou uma vez que esse foi o contingente mais exposto ao vírus então desconhecido. Em relação à priorização na vacinação, o CNS aduziu, na Recomendação nº 211818 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Recomendação nº 21, de 24 de agosto de 2021. Recomenda ações referentes à priorização de trabalhadores e trabalhadoras que estão em exposição diária à Covid-19 no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19. [acesso em 2023 jul 18]. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/recomendacoes-cns/recomendacoes-2021/1985-recomendacao-n-021-de-24-de-agosto-de-2021sa.
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, que trabalhadores fossem priorizados na vacinação sem, no entanto, destacar que fossem trabalhadores da saúde.

O ato normativo mais utilizado foi a recomendação (81%). Trata-se de ato expedido pelo colegiado ou ad referendum, pelo Presidente do CNS, que consiste em sugestão, advertência ou aviso a respeito do conteúdo ou forma de execução de políticas e estratégias setoriais, ou sobre a conveniência ou oportunidade de adotar determinada providência. Versa sobre temas ou assuntos específicos que não sejam habitualmente de responsabilidade direta do CNS, mas que são relevantes e necessários dirigidos a sujeitos institucionais ou à sociedade, de quem se espera ou se solicita determinada conduta ou providência1010 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução nº 407, de 12 de setembro de 2008. Aprova o Regimento Interno do Conselho Nacional de Saúde. Diário Oficial da União. 11 Mar 2009.. É, nesse sentido, ato menos complexo e que independe de homologação do Ministro da Saúde, destinando-se a orientar a gestão quanto à necessidade de seguir o posicionamento do órgão colegiado em relação à política de saúde.

Ao todo, o CNS expediu 63 recomendações, tratando de temáticas variadas (quadro 1).

Quadro 1
Síntese das Recomendações emitidas pelo CNS no período de 03/02/2020 a 22/05/2022, separada por temas

É notável que a maior concentração de recomendações ocorreu no primeiro ano da pandemia, sendo bastante escassa em 2022. Embora sem força vinculante, a recomendação é ato que se expede sem maiores burocracias e que pode ser feito ad referendum da reunião do coletivo do CNS. Em tempos de uma crise de Covid-19, justifica-se a adoção desse tipo de ato para informar o necessário para os tomadores de decisão, uma vez que se trata de ato que pode ser dirigido a vários destinatários de modo concomitante, sendo homologado pelo coletivo, na primeira reunião posterior à edição do ato.

Por isso, no período analisado, 97% das recomendações foram aprovadas ad referendum, excetuando-se a Recomendação nº 71, de 11 de dezembro de 20201919 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Recomendação nº 71, de 11 de dezembro de 2020. Recomenda medidas corretivas que promovam a execução orçamentária e financeira do Ministério da Saúde com a celeridade requerida pela emergência sanitária causada pela pandemia do Covid-19. [acesso em 2023 jul 18]. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/recomendacoes-cns/recomendacoes-2020/1545-recomendacao-n-070-de-18-de-novembro-de-2021.
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, aprovada pelo Plenário do CNS em sua 66ª Reunião Extraordinária; e a Recomendação nº 8, de 27 de abril de 20222020 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Recomendação nº 8, de 27 de abril de 2022. Recomenda a revogação da Portaria GM/MS nº 913/2022 e outras medidas correlatas. [acesso em 2023 jul 18]. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/recomendacoes-cns/recomendacoes-2022/2448-recomendacao-n-008-de-27-de-abril-de-2022.
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, aprovada pelo Plenário em sua 329ª Reunião Ordinária.

O ad referendum é ato praticado por alguém sem autoridade irrestrita para praticá-lo e para cuja validade se faz necessária a posterior ratificação da autoridade competente2121 Diniz MH. Dicionário Jurídico Universitário. São Paulo: Editora Saraiva; 2022..

Compreende-se que tal situação deve-se ao fato de que as reuniões ordinárias e extraordinárias deixaram de ser realizadas presencialmente, o que dificultou as discussões que envolvem as matérias das recomendações analisadas.

Pela Resolução nº 645/2020 do CNS2222 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução n° 645 de 30 de setembro de 2020. Converte a Instrução Normativa em Resolução e estabelece os procedimentos relativos ao funcionamento do CNS, através da realização remota de reuniões colegiadas, durante a pandemia provocada pelo Covid-19. [acesso em 2023 fev 6]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes-cns/resolucoes-2020/1395-resolucao-n-645-de-30-de-setembro-de-2020.
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, em seu art. 4º, é estabelecido que as reuniões do Conselho, no período da vigência da Espin, passam a ser remotas, o que facilitaria as aprovações prévias para as recomendações, o que não ocorreu.

Art. 4º As reuniões remotas do CNS, realizadas durante a vigência da Emergência em Saúde Pública e do estado de calamidade pública decorrente da COVID-19, respeitado o disposto no Regimento Interno do CNS, serão realizadas por meio de plataforma digital, de acesso remoto [...].

Desconhece-se a razão da não utilização das reuniões remotas em maior número, até para que os documentos fossem expedidos com a força da decisão do Pleno, mas não há impedimento de que o Presidente do CNS se utilize do instituto do ad referendum para a adoção de medidas que não podem esperar o regular cronograma de reunião - sejam presenciais ou remotas -, podendo fazê-lo de pronto, dando ciência ao coletivo na primeira oportunidade.

O gráfico 1, a seguir, apresenta o panorama dos destinatários das recomendações.

Gráfico 1
Relação de sujeitos institucionais e quantidade de vezes que figuraram como destinatários de Recomendações emitidas pelo CNS no período de 03/02/2020 a 22/05/2022

O Ministério da Saúde foi o principal destinatário, justamente por ser o órgão responsável pela direção do SUS no âmbito da União, mas o CNS não descuidou de recomendar às demais instituições direta ou indiretamente ligadas ao enfrentamento da pandemia, e até mesmo os órgãos do sistema de justiça.

Dentre as recomendações expedidas, destacam-se aquelas sobre ‘Ação pública especificamente de serviço de saúde’, com 29 documentos. Seu conteúdo abarcou diversas áreas, como promoção da vigilância em saúde, assistência farmacêutica e atenção primária, secundária e terciária à saúde, incluindo medidas para garantir a segurança nos serviços de saúde. O que foi proposto reflete o compromisso do CNS em enfrentar a emergência sanitária, com especial atenção às populações mais vulneráveis e impactadas pela pandemia.

Um exemplo é a recomendação nº 26/20202323 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Recomendação nº 26, de 22 de abril de 2020. Recomenda aos gestores do SUS, em seu âmbito de competência, que requisitem leitos privados, quando necessário, e procedam à sua regulação única a fim de garantir atendimento igualitário durante a pandemia. [acesso em 2023 jul 18]. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/recomendacoes-cns/recomendacoes-2020/1131-recomendacao-n-026-de-22-de-abril-de-2020.
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, que orientou os gestores do SUS a requisitarem leitos privados e promoverem sua regulação única, garantindo um atendimento igualitário. O CNS reconheceu a importância da coordenação nacional da alocação dos recursos assistenciais, inclusive leitos hospitalares de propriedade privada, para atender às prioridades sanitárias de cada caso. Essa medida foi uma resposta à insuficiência de leitos disponíveis no sistema de saúde, realidade já conhecida quando se observavam as filas de espera mesmo em situações de controle epidemiológico. A falta de leitos adequados tornou-se um fenômeno preocupante, como foi revelado pelos dados relacionados com a judicialização da saúde pública no Brasil2424 Ramos EMB. Argumentos dos atores processuais nas causas jurídicas sobre saúde no Estado da Bahia, Brasil. Cad. Ibero-amer. Dir. Sanit. 2017 [acesso em 2023 jul 18]; 6(1):127-138. Disponível em: https://www.cadernos.prodisa.fiocruz.br/index.php/cadernos/article/view/357/444.
https://www.cadernos.prodisa.fiocruz.br/...
.

Outra pauta abordada diz respeito às ações relativas aos cuidados à saúde dos grupos vulneráveis. A Recomendação nº 4/20212525 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Recomendação nº 4, de 30 de março de 2021. Recomenda ações relativas aos cuidados à saúde das populações vulnerabilizadas no contexto da pandemia da Covid-19. [acesso em 2023 jul 18]. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/recomendacoes-cns/recomendacoes-2021/1671-recomendacao-n-004-de-30-de-marco-de-2021.
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enfatizou a importância de ações antirracistas nos serviços de atenção à saúde e incentivou o cumprimento integral da Política Nacional de Atenção Básica. A coleta de dados sobre raça/cor também foi estimulada para reduzir desigualdades na saúde e proteger comunidades vulneráveis.

Tais documentos estão limitados por ausência de força normativa, que não obriga qualquer autoridade pública. Entende-se que o CNS tem força institucional de constranger autoridades, instituições e até particulares a atuarem na garantia da saúde de todos, até por sua historicidade e importância nacional. No entanto, quando a recomendação não tem força normativa, pode, por vezes, ser desconsiderada pelos destinatários, infelizmente.

Entre as recomendações, aquelas relacionadas com ‘Revogação, alteração, aprovação de normas ou suspensão de orientação do Ministério da Saúde’ representam 26% do total. Esses atos têm conteúdo específico relativo a ações governamentais na área da saúde, e seu alcance é direcionado à influência das políticas públicas e normativas para o enfrentamento da pandemia. Essa temática abrange diversas questões, como destinação de recursos financeiros para aquisição de materiais de prevenção à Covid-19, medidas emergenciais para a agricultura familiar e licença compulsória de patentes em casos de emergência nacional ou internacional, interesse público ou estado de calamidade pública.

Uma das ações do CNS, a Recomendação nº 16/20202626 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Recomendação nº 16, de 24 de março de 2020. Recomenda ao Ministério da Economia, aos Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e ao Presidente do Supremo Tribunal Federal a adoção de providências em razão da edição da Medida Provisória no 927/2020. [acesso em 2023 jul 18]. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/recomendacoes-cns/recomendacoes-2020/1078-recomendac-a-o-no-016-de-24-de-marc-o-de-2020.
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, sugeriu, em 24 de março, a revogação imediata da Medida Provisória (MP) nº 927/20202727 Brasil. Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020. Dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), e dá outras providências. Diário Oficial da União. 22 Mar 2020., que alterou as regras trabalhistas para enfrentar a pandemia. No entanto, essa recomendação não foi acatada, uma vez que a MP vigorou até julho daquele ano, perdendo a validade somente em razão do esgotamento do prazo de vigência de 60 dias previsto na Constituição Federal11 Brasil. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988..

As nove recomendações sobre ‘Vacinação enquanto estratégia de enfrentamento’ tiveram seu alcance maior, dirigindo-se a importantes autoridades e instituições, visando garantir acesso à vacinação e ampliar a proteção da população. As medidas propostas foram enviadas para a Presidência da República, o Ministério do Trabalho, o Ministério da Saúde, as Secretarias de Saúde, o Congresso Nacional, o Ministério Público Federal, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa e para outras entidades relevantes. As medidas propostas incluíram: a retirada de material desencorajador à vacinação; o cumprimento de compromissos internacionais; a ampliação do Plano Nacional de Vacinação para grupos prioritários; o fortalecimento da Atenção Primária à Saúde; a proteção de gestantes, puérperas, lactantes; e a priorização de trabalhadores expostos ao vírus. Essas recomendações buscaram conter o avanço da pandemia e promover uma resposta coordenada e efetiva no enfrentamento da crise sanitária.

Por fim, com pequeno número de documentos recomendatórios expedidos, estão os de conteúdo sobre ‘Observância a Parecer Técnico’ e ‘Orçamento e Finanças’. Tais recomendações têm como conteúdo o cumprimento de pareceres técnicos emanados pelo próprio CNS, bem como a orientação das ações no âmbito orçamentário e financeiro, com enfoque na execução das despesas e transferências de recursos para ações de enfrentamento da pandemia, alcançando um reduzido número de autoridades e instituições.

Uma recomendação em que se destaca a ‘Observância a Parecer Técnico’ foi expedida ao Ministério da Educação, ao Ministério da Saúde e aos Programas de Residência em Saúde, em função da declaração da crise sanitária vivenciada, orientando-os a observar o Parecer Técnico nº 106/20202828 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Parecer Técnico nº 106, de 26 de março de 2020. [acesso em 2023 jul 18]. Disponível em: https://conselho.saude.gov.br/recomendacoes-cns/recomendacoes-2020/1086-recomendacao-n-018-de-26-de-marco-de-2020.
https://conselho.saude.gov.br/recomendac...
, que dispunha sobre as orientações ao trabalho/atuação dos residentes em saúde e dos trabalhadores e trabalhadoras, no âmbito dos serviços de saúde, durante a pandemia. Na prática, a recomendação teve como consequência o reforço da importância dos pareceres técnicos emitidos pelo CNS, com o intuito de promover uma atuação mais adequada e segura dos profissionais de saúde em meio à emergência sanitária. Essa iniciativa visou garantir uma resposta eficiente e alinhada aos protocolos de saúde em um momento crítico para a saúde pública do País.

Já as recomendações sobre ‘Orçamento e Finanças’ tiveram maior impacto, destinando-se principalmente à Presidência da República e ao Congresso Nacional. Elas solicitavam medidas corretivas urgentes para agilizar a execução orçamentária e financeira do Ministério da Saúde, incluindo transferência de recursos para Fundos Estaduais e Municipais de Saúde e controle das despesas públicas relacionadas com a saúde. Além disso, abordaram a questão do subfinanciamento do SUS e a importância de cumprir as obrigações constitucionais de financiamento para garantir um atendimento eficiente à população durante a pandemia.

Com relação aos pareceres emitidos pelo CNS, estes representam 7% dos atos expedidos no período. Cuida-se de um pronunciamento técnico-político-público - ou seja, não normativo - fundamentado e circunstanciado que indica solução para determinado assunto, consulta ou processo administrativo ao qual o CNS é instado a se manifestar. Ele deve ser apreciado pelo Pleno do CNS e pode ser produzido por quaisquer das instâncias do colegiado - Mesa Diretora, Comissões Intersetoriais, Grupos de Trabalho e Câmaras Técnicas1010 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução nº 407, de 12 de setembro de 2008. Aprova o Regimento Interno do Conselho Nacional de Saúde. Diário Oficial da União. 11 Mar 2009..

Considerando que todos os pareceres estudados foram proferidos para embasar recomendações do CNS, esses foram organizados com a indicação da Comissão responsável pela produção do ato, o assunto abordado, bem como a recomendação a ele atrelada (quadro 2).

Quadro 2
Síntese dos Pareceres do CNS, autoria, assunto e indicação do ato relacionado no período de 03/02/2020 a 22/05/2022

Os pareceres precisam ser apreciados pelo Pleno do CNS, o que sugere que sua validade e relevância são avaliadas em um contexto mais amplo, envolvendo representantes de várias instâncias do colegiado. Essa abordagem colaborativa e a revisão pelo Pleno podem ajudar a garantir que os pareceres sejam bem fundamentados, equilibrados e representem uma visão mais abrangente das questões de saúde em pauta, levando em consideração diversos pontos de vista e especialidades.

Ao fornecer informações técnicas sólidas e embasadas, esses pareceres podem contribuir para a formulação de políticas e ações mais efetivas no campo da saúde pública. Contudo, por não possuir um caráter normativo, não vincula o gestor. Além disso, o que muito se viu na pandemia foi a criação de comitês de emergência para tratar de assuntos da Covid-19 e, de certa forma, uma secundarização dos conselhos. Assim, não se pode afirmar que houve algum impacto desses pareceres no enfrentamento da Covid-19.

A moção retrata 6% do total dos atos estudados. É uma forma de o Conselho manifestar aprovação, reconhecimento ou repúdio a respeito de determinado assunto ou fato1010 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução nº 407, de 12 de setembro de 2008. Aprova o Regimento Interno do Conselho Nacional de Saúde. Diário Oficial da União. 11 Mar 2009.. As moções emitidas pelo CNS estão descritas no quadro 3.

Quadro 3
Síntese das Moções emitidas pelo CNS no período de 03/02/2020 a 22/05/2022

Duas das moções emitidas estão relacionadas com projetos de lei que estavam em discussão no Congresso Nacional. Reconhece-se que uma moção de apoio à aprovação ou repúdio à aprovação de normativas em tramitação no Congresso Nacional tem força política do Conselho2929 Temoteo-da-Silva B, Lima IMSO. Análise política da atuação do Conselho Nacional de Saúde na construção da política de saúde no Brasil no período de 2014-2017. Interface (Botucatu). 2022 [acesso em 2023 jul 18]; (26):e210582. Disponível em: https://doi.org/10.1590/interface.210582.
https://doi.org/10.1590/interface.210582...
, embora não seja determinante para a aprovação ou rejeição da proposição no órgão legiferante federal.

A Moção de Apoio nº 1/20213030 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Moção de Apoio nº 1, de 2 de fevereiro de 2021. Manifesta apoio à população amazonense e aos trabalhadores e trabalhadoras da linha de frente de combate à Covid-19. [acesso em 2022 out 13]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/mocoes-cns/mocoes-2021/1585-mocao-de-apoio-n-001-de-02-de-fevereiro-de-2021.
http://conselho.saude.gov.br/mocoes-cns/...
teve como motivação as notícias e as reportagens sobre a situação a que a população amazonense esteve submetida em virtude da ausência de acesso a oxigênio e a condições adequadas de tratamento. As Moções nº 8/20213131 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Moção de Repúdio nº 8, de 11 de novembro de 2021. Manifesta repúdio às declarações do Presidente da República proferidas em live do dia 21 de outubro de 2021. [acesso em 2023 fev 13]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/mocoes-cns/mocoes-2021/2173-mocao-de-repudio-n-008-de-11-de-novembro-de-2021.
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e nº 10/20213232 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Moção de Repúdio nº 10, de 20 de dezembro de 2021. Manifesta repúdio às declarações do Presidente da República proferidas em live do dia 16 de dezembro de 2021. [acesso em 2022 out 13]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/mocoes-cns/mocoes-2021/2260-mocao-de-repudio-n-010-de-20-de-dezembro-de-2022.
http://conselho.saude.gov.br/mocoes-cns/...
tiveram como fato motivador pronunciamentos do Presidente da República. Essa última, com grande repercussão na mídia, haja vista as declarações em sentido contrário ao determinado pelas autoridades científicas em nível mundial, como também nas diretivas da OMS. Em vista da enorme repercussão negativa dos fatos, o CNS não poderia deixar de apresentar moção de repúdio.

Sobre as notas técnicas expedidas, estas refletem 2% dos atos do CNS e representam um ato interno, produzido pela Secretaria-Executiva, detêm caráter instrutivo e têm por objetivo o subsídio à Mesa Diretora e ao Pleno do CNS, em matérias relativas a processos administrativos, judiciais e políticos que necessitem de maior aprofundamento para orientar os debates e as deliberações do colegiado1010 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução nº 407, de 12 de setembro de 2008. Aprova o Regimento Interno do Conselho Nacional de Saúde. Diário Oficial da União. 11 Mar 2009..

As duas notas técnicas encontradas foram elaboradas no ano de 2021, e versaram sobre o plano de vacinação contra Covid-19 e sobre ações para o controle da pandemia, tais como: avanço imediato da vacinação completa; busca ativa de pessoas sem a vacinação completa; transparência e acesso às informações sobre o ritmo da aplicação das doses desagregadas por marcadores sociais; implementação de um plano nacional de vigilância e testagem da população; e implementação de um plano nacional de monitoramento da situação epidemiológica para identificação de grupos de risco para reduções prematuras na imunidade a infecções graves etc.

Por fim, a resolução representa a espécie menos utilizada pelo CNS (1%). Trata-se de ato geral, de caráter normativo, resultante de deliberações no Conselho, que deve, obrigatoriamente, ser homologada pelo Ministro de Estado da Saúde no prazo máximo de 30 dias, dando-lhe a respectiva publicidade oficial. Não sendo homologada nem enviada justificativa pelo gestor ao CNS com proposta de alteração ou rejeição, o Conselho pode buscar a validação da resolução, recorrendo à Justiça e/ou ao Ministério Público quando necessário3333 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução nº 453, de 10 de maio de 2012. Aprova as diretrizes para instituição, reformulação, reestruturação e funcionamento dos Conselhos de Saúde. [acesso em 2022 out 12]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2012/res0453_10_05_2012.html.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
.

No caso concreto, o CNS emitiu a Resolução nº 671, em 5 de abril de 20223434 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução nº 671, de 05 de abril de 2022. Dispõe sobre as diretrizes referentes à definição de prioridades para as ações e serviços públicos de saúde nos processos de planejamento da saúde para 2023. [acesso em 2022 out 12]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes-cns/2421-resolucao-n-671-de-05-de-abril-de-2022.
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, que dispôs sobre as diretrizes referentes à definição de prioridades para as ações e os serviços públicos de saúde nos processos de planejamento da saúde para 2023, definindo que a programação orçamentária e financeira do Ministério da Saúde deveria alocar recursos suficientes tanto para o enfrentamento da Covid-19 como para as demais ações e serviços de saúde. Entretanto, a referida resolução não foi homologada pelo Ministro da Saúde, possivelmente em função do exíguo tempo que a autoridade sanitária teria para repassar, à Presidência da República, as informações para a produção do competente Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias - PLDO, que, segundo a Constituição de 198811 Brasil. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988., tem prazo máximo de submissão ao Congresso Nacional até 15 de abril de cada ano.

Como a resolução foi publicada a cinco dias úteis do prazo constitucional, está justificada sua não homologação por intempestividade. Isso não significa a baixa efetividade de ato emanado pelo CNS nas ações de enfrentamento da Covid-19, tampouco significa desprestígio, até porque, no PLDO e mesmo na Lei Orçamentária Anual - LOA-2023, houve a previsão pretendida pelo Conselho quando da edição da Resolução nº 6713434 Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução nº 671, de 05 de abril de 2022. Dispõe sobre as diretrizes referentes à definição de prioridades para as ações e serviços públicos de saúde nos processos de planejamento da saúde para 2023. [acesso em 2022 out 12]. Disponível em: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes-cns/2421-resolucao-n-671-de-05-de-abril-de-2022.
http://conselho.saude.gov.br/resolucoes-...
.

Conclusões

Diversos atos foram emanados pelo CNS, enquanto lugar de deliberação permanente, no enfrentamento da pandemia de Covid-19, durante a vigência da Espin.

O sítio do CNS, em especial, as abas destinadas às informações de atos normativos e técnico-políticos, está desatualizado, reunindo arquivos dos anos de 2020 e parcialmente do ano de 2021. Ademais, a forma como estão organizadas as abas dificulta sobremaneira a interação com o usuário, que necessita empregar um tempo maior para a localização de atos como os que foram estudados (os pareceres associados às recomendações e as notas técnicas em aba sobre notas públicas).

O CNS concentrou sua atuação não normativa, no período mais crítico da pandemia, em atos que não vinculam o gestor público. Além disso, apesar de a única resolução ter sido aprovada apenas em 2022, esta não teve aplicabilidade prática ante sua intempestividade e a ausência de homologação pelo Ministro. O CNS, por sua importância nacional, deveria ter feito uso mais rotineiro desse expediente normativo, já que é o único com chancela vinculante, mas não o fez.

O CNS, no período entre 2020 e 2022, foi bastante profícuo na emissão de recomendações, que, embora seja ato não vinculante, pode ser enviado a qualquer órgão público, inclusive de forma concomitante. Quase a totalidade das recomendações expedidas no período deram-se ad referendum que, embora regimentalmente previsto, denotam dificuldade de reunião dos membros, o que não é desejável, especialmente pela possibilidade de reunião virtual por meio de aplicativos, devidamente previstos.

Deve-se levar em consideração o entendimento de que o controle social é um processo complexo, que tem inúmeros obstáculos à sua efetividade, mas que não pode perder de vista a primazia da consciência da saúde como um bem indivisível, o compromisso e a cooperação de todos os atores envolvidos, em especial, as autoridades de saúde, sugerindo-se que outros estudos sejam realizados, de forma a levantar e divulgar questões relativas ao funcionamento do CNS, buscando fortalecer a participação da comunidade no contexto da saúde, para que ela possa se firmar e se autossustentar no tempo.

  • Suporte financeiro: não houve

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2023

Histórico

  • Recebido
    28 Fev 2023
  • Aceito
    15 Ago 2023
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
E-mail: revista@saudeemdebate.org.br