Direitos Humanos, Justiça e Saúde: gênero e sexualidade

Maria Helena Barros de Oliveira Angélica Baptista Silva Diádiney Helena de Almeida Élida Azevedo Hennington Marcos Besserman Vianna Vania Reis Girianelli Sobre os autores

ESTE NúMERO ESPECIAL DA REVISTA ‘SAÚDE EM DEBATE’, do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), tem como objeto de reflexão os ‘Direitos Humanos, Justiça e Saúde: gênero e sexualidade’, que dá o título para esta produção.

Percorrer o caminho dos direitos humanos significa, em um primeiro momento, entender a saúde enquanto um direito humano, compreendendo que “essa relação contém uma visão multidisciplinar em que a saúde é considerada um instrumento de transformação social e um obstáculo à opressão da população”11 Oliveira MHB, Teles N, Casara RRR. Direitos Humanos e Saúde: reflexões e possibilidades de intervenção. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021.(7). Ao privilegiar que a saúde da população não deve estar submetida a nenhuma forma de opressão, direcionamos nosso olhar para o recorte de gênero e sexualidade, que expressa as mais diversas formas de violência praticadas, em especial contra a população LGBTI+, que resultam em doenças e agravos à saúde.

A maioria dos textos que compõem esse número temático tem sua origem em um projeto de formação de profissionais da saúde, por meio do Mestrado Profissional de Direitos Humanos, Justiça e Saúde do Departamento de Direitos Humanos e Saúde (DIHS), da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Outrossim, textos de convidados da academia, de especialistas da área e artigos oriundos de chamada aberta também compõem esta edição especial.

A possibilidade de formar profissionais para o campo dos direitos humanos e saúde e a própria produção deste número temático se concretizou a partir da compreensão da importância do tema, pelas instituições envolvidas, e pela contribuição do deputado federal David Miranda, por meio de emenda parlamentar, a quem prestamos nossos agradecimentos e reconhecimento de sua atuação exemplar e vida íntegra no Parlamento, infelizmente interrompida precocemente. A contribuição do deputado também se deu pela sua presença carinhosa em vários momentos da formação dos alunos, incentivando e dialogando acerca de experiências vividas e da importância da defesa dos direitos humanos, da justiça e da saúde.

A interseção entre direitos humanos, gênero e sexualidade é cada vez mais reconhecida como uma área crucial de pesquisas em saúde pública e na formulação de políticas. Os textos que integram este número temático evidenciam como os resultados de saúde são profundamente influenciados pelos determinantes sociais da saúde, que devem incluir fatores como identidade de gênero, orientação sexual e as desigualdades sistêmicas que os indivíduos enfrentam, cotidianamente, como consequência de sua condição de vida. Esses determinantes não são isolados, mas interagem de maneiras complexas, muitas vezes exacerbando as vulnerabilidades das populações mais empobrecidas e marginalizadas. Indivíduos que se identificam como LGBTI+ frequentemente enfrentam múltiplas camadas de discriminação que impactam negativamente no acesso à saúde, na saúde mental e no bem-estar geral. Abordar essas interseções é essencial para a criação de políticas de saúde inclusivas que promovam genuinamente a equidade e a justiça.

O conceito de interseccionalidade, a partir das contribuições do feminismo negro22 Crenshaw K. A interseccionalidade na discriminação de raça e gênero. In: Unifem. Cruzamento: raça e gênero. Brasília, DF: Unifem, 2004. p. 7-16.,33 Collins PH. Pensamento feminista negro: conhecimento, consciência e a política do empoderamento. São Paulo: Boitempo Editorial; 2019., oferece uma poderosa lente de análise para compreender como diferentes formas de opressão se cruzam e moldam as experiências com consequências na vida dos indivíduos.

Quando aplicado ao contexto das políticas públicas44 Carvalho HR, Marques MCS. O feminismo decolonial e a interseccionalidade nas políticas públicas LGBTI+ no Brasil (1998-2021). Rev Praia Vermelha. 2023;33(2):301-303., a interseccionalidade fornece uma estrutura relevante para entender como identidades sobrepostas - como raça, classe, gênero e sexualidade - podem agravar as barreiras enfrentadas por certos grupos no acesso aos cuidados de saúde. Ela desafia os formuladores de políticas a irem além de uma abordagem única e considerarem como intersecções específicas podem levar a necessidades e disparidades de saúde singulares. No contexto da diversidade sexual e de gênero, reconhecer a interseccionalidade é vital para garantir que as políticas de saúde sejam não apenas inclusivas em princípio, mas também eficazes na prática.

Para promover os direitos humanos no campo da saúde, é imperativo identificar e abordar os desafios únicos enfrentados por grupos em situações de vulnerabilidade, especialmente aqueles na intersecção de múltiplos marcadores e identidades marginalizadas. Afirmar os direitos humanos nesse contexto significa desenvolver políticas que estejam sintonizadas com as necessidades específicas desses grupos, garantindo que tenham acesso equitativo a todo o espectro de serviços de saúde. Essa abordagem exige um compromisso com a interseccionalidade como um princípio orientador na saúde pública, reconhecendo que somente ao abordar a complexa interação de fatores que moldam a vulnerabilidade podemos alcançar uma verdadeira equidade em saúde para todos.

Referências

  • 1
    Oliveira MHB, Teles N, Casara RRR. Direitos Humanos e Saúde: reflexões e possibilidades de intervenção. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2021.
  • 2
    Crenshaw K. A interseccionalidade na discriminação de raça e gênero. In: Unifem. Cruzamento: raça e gênero. Brasília, DF: Unifem, 2004. p. 7-16.
  • 3
    Collins PH. Pensamento feminista negro: conhecimento, consciência e a política do empoderamento. São Paulo: Boitempo Editorial; 2019.
  • 4
    Carvalho HR, Marques MCS. O feminismo decolonial e a interseccionalidade nas políticas públicas LGBTI+ no Brasil (1998-2021). Rev Praia Vermelha. 2023;33(2):301-303.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Out 2024
  • Data do Fascículo
    2023
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
E-mail: revista@saudeemdebate.org.br