Territórios Sustentáveis e Saudáveis

Hermano Albuquerque de Castro Guilherme Franco Netto Andréa Araujo de Vasconcellos Maria Inês Corrêa Cárcamo Francco Antonio Neri de Souza e Lima Bruna Drumond Silveira Adriana Miranda de Castro Edmundo Gallo Ricardo Moratelli Luís Carlos Soares Madeira Domingues Sobre os autores

ESTE NúMERO ESPECIAL DA REVISTA ‘SAúDE EM DEBATE’, intitulado ‘Territórios Sustentáveis e Sau dáveis’, celebra os cinco anos do Programa Institucional de Territórios Sustentáveis e Saudáveis (Pitss), que compõe a Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS) e a Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030 (EFA 2030) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Por meio desta edição, pretendemos dar visibilidade a experiências que buscaram promover saúde e sustentabilidade nos territórios, trazendo alternativas de ações emancipatórias e de construção de futuros.

A VPAAPS, mediante debates em suas câmaras técnicas, seminários, participação em congressos, indução de produção e disseminação de conhecimento, vem progressivamente se desafiando sobre a necessidade de ação da saúde pública e da saúde coletiva nos territórios vulnerabilizados. Em seus congressos internos, instância máxima de planejamento, a Fiocruz consagrou ‘saúde, ambiente e sustentabilidade’ como um de seus eixos estruturantes, passando a verificar a necessidade de instituir uma iniciativa que articule saberes e práticas sobre a determinação socioambiental da vida e da saúde no contexto da integralidade aspiracional da Agenda 2030, que vise assegurar qualidade de vida, saúde e sustentabilidade nos territórios11 Fundação Oswaldo Cruz. Programa Institucional de Territórios Sustentáveis e Saudáveis (PITSS): termo de referência conceitual e metodológico e proposta de governança [Internet]. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2019 [acesso em 2024 maio 30]. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/documento/tr-pitss-programa-institucional-de-territorios-sustentaveis-e-saudaveis
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Nesse contexto, e a partir de um intenso debate, o Pitss foi instituído em 2019, por meio da Portaria da Presidência da Fiocruz nº 5.555, quando foram elaborados pressupostos e um modelo de marco lógico-institucional que buscam referenciar a ação da instituição. Desde então, dentre as principais iniciativas do Pitss, destacam-se as articulações entre as unidades e os escritórios da Fiocruz, a formação do Grupo de Trabalho consultivo técnico-científico com representantes dessas unidades e desses escritórios (GT Pitss), o mapeamento de experiências de Territórios Sustentáveis e Saudáveis (TSS) no âmbito da instituição e a organização de um edital em parceria com o Programa Fiocruz de Fomento à Inovação (Inova Fiocruz). O edital, lançado em 2020, teve como objetivo apoiar estratégias territorializadas de convívio com a covid-19, estruturantes na superação das situações de vulnerabilidade socioambientais de populações periféricas urbanas e do campo, da floresta e das águas, para serem referências para aplicação em contextos pós-pandemia. Esse edital recebeu 60 projetos, sendo 13 deles aprovados, contemplando pesquisas de 11 unidades da Fiocruz.

Este número especial apresenta algumas das contribuições desses projetos, que podem ser vistos nos seguintes artigos selecionados após avaliação por pares: ‘Da Lagoa do Boi Morto à Barragem da Toldinha: a água como elemento central para a construção de territórios sustentáveis e saudáveis no Médio Jequitinhonha’, ‘De repente, tudo fechou: rede de cuidado à População em Situação de Rua na pandemia de covid-19’, ‘Agroecologia e soberania alimentar: lutas por justiça e alimentação saudável em territórios periféricos urbanos’, ‘Reflexos da pandemia de covid-19 na venda de alimentos em feiras livres no Maciço de Baturité-CE’, ‘Vulnerabilidades socioambientais na pesca artesanal: desafios e conquistas para Territórios Saudáveis e Sustentáveis em Pernambuco’, ‘Atuação de uma secretaria municipal de saúde diante do desastre-crime do petróleo em Pernambuco’ e ‘O Povo Cuidando do Povo: Agentes Populares na promoção de territórios mais sustentáveis e saudáveis’.

Ao todo, reunimos nesta edição 27 trabalhos publicados, entre eles, artigos originais, ensaios, artigos de opinião e relatos de experiências. Eles apresentam experiências exitosas no campo de TSS, como a realização de cursos e processos formativos envolvendo as comunidades, o desenvolvimento de tecnologias sociais e de novas formas de governança, o estabelecimento de parcerias e articulações com gestores locais e o desenvolvimento de novas metodologias e estratégias de comunicação. Ancorados nas bases teórico-conceituais dos TSS, demonstraram a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) para melhoria de vida nos territórios, bem como apontaram a necessidade de apoio e fortalecimento da rede de cuidado e da integração com outros setores.

O conjunto de trabalhos desta edição traz resultados de pesquisas realizadas em diferentes Unidades da Federação (UF) - Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Mato Grosso, Minas Gerais, Pernambuco e Rio de Janeiro - e em países da América Latina (além do Brasil, do Chile e da Colômbia). A distribuição regional e a diversidade de experiências permitem enriquecer o compartilhamento de experiências territorializadas e a apresentação de novas perspectivas teóricas e metodológicas em trabalhos que denunciam conflitos socioambientais decorrentes de diferentes contextos, como o agronegócio, o derramamento de petróleo e a implantação de parques eólicos, além de experiências de enfrentamento da crise sistêmica climática e alimentar, intensificada durante a pandemia da covid-19. Ao mesmo tempo, apresentam soluções para essas questões, baseadas em epistemologias, cosmologias e práticas emancipatórias.

Trabalham, também, com diferentes populações, como aquelas em situação de rua, quilombolas, pescadores, agricultores, agentes comunitários de saúde, estudantes indígenas, profissionais de saúde mental e militantes de diferentes movimentos sociais. Uma característica em comum entre muitos desses trabalhos é a participação dessas populações em diferentes etapas dos estudos, e em boa parte delas como protagonistas, evidenciando um vínculo mais direto entre as necessidades territoriais e as pesquisas emancipatórias.

A Fiocruz desempenha um papel crucial na promoção da saúde e na pesquisa científica no Brasil. Como instituição que mobiliza a ciência para a vida, seu desafio é manter o diálogo permanente com os diversos territórios e as populações que compõem nosso país, como as populações periféricas urbanas e os povos originários e tradicionais. Foi nesse contexto que se iniciou a implementação do Pitss na VPAAPS/Fiocruz. Prosseguir com o Programa exigirá da instituição, de seus pesquisadores, pesquisadoras, trabalhadores e trabalhadoras esforços para a realização de pesquisas e ações que busquem contribuir para o fortalecimento do SUS, sobretudo em territórios vulnerabilizados.

Alguns desafios enfrentados são institucionais, como o financiamento limitado, que dificulta o investimento em programas de longo prazo, e a necessidade de integração intersetorial e das diferentes políticas de vigilância, atenção e promoção da saúde que contribuam para a construção de TSS na perspectiva socioambiental. Outros desafios estão relacionados com o contexto territorial, como mudanças nas prioridades políticas, que podem afetar a continuidade e a consistência dos programas de saúde e sustentabilidade, assim como processos de governança territorial democrática essenciais para o desenvolvimento de processos transformadores. Trabalhar em territórios historicamente vulnerabilizados exige a colaboração de diversos atores na gestão das questões políticas locais e territoriais, requerendo um trabalho conjunto e uma coordenação eficaz para garantir que as iniciativas sejam bem-sucedidas e atendam às necessidades das comunidades. As desigualdades socioeconômicas são outro fator significativo que impacta a vida das populações, e superá-las é essencial para o sucesso de qualquer programa em TSS.

A Fiocruz enfrenta, portanto, o desafio de superar diferentes barreiras ao implementar programas que visam à promoção da saúde e da sustentabilidade socioambiental, exigindo parcerias estratégicas, inovação, capacitação de recursos humanos e adaptação a contextos locais específicos. Esses esforços certamente exigirão reflexão política, muito trabalho nos territórios e desenvolvimento de soluções baseadas na ciência e no saber tradicional e popular, como demonstram muitas das pesquisas publicadas neste número especial.

Assim, esperamos propiciar um proveitoso debate sobre experiências, questões teórico-metodológicas e políticas públicas direcionadas à promoção de saúde e sustentabilidade para transformação emancipatória de territórios.

Desejamos uma boa leitura!

Referência

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Set 2024
  • Data do Fascículo
    Ago 2024
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde RJ - Brazil
E-mail: revista@saudeemdebate.org.br