RESUMO
Este artigo analisa os modos como distintas configurações da relação entre Estado e movimentos sociais produziram diferentes políticas públicas de saúde da mulher desde a virada do século XXI. Nas últimas quatro décadas, diversos setores da sociedade têm trabalhado na elaboração e ampliação de direitos de cidadania. Entre esses coletivos, destacam-se os movimentos feministas, que aliaram as lutas pelo direito à saúde e pela democracia, construindo práticas que afirmam a articulação com o Estado, a fim de incidir na formulação de políticas públicas baseadas em direitos humanos. Partindo de pesquisa documental de perspectiva antropológica, analisam-se os documentos e os contextos de promulgação das principais políticas públicas nacionais de saúde da mulher desde 2000. Argumenta-se que uma interlocução sistemática entre movimentos sociais e representantes do governo, por meio da participação popular na formulação de políticas públicas, pode resultar em propostas mais alinhadas às demandas coletivas no campo da saúde da mulher, ainda que tais conquistas mostrem-se sujeitas ao jogo partidário e ao conservadorismo. Essa abordagem visibiliza um processo de construção mútua entre o gênero e o Estado, que possibilita, simultaneamente, incidir no cenário político-institucional, redefinir agendas político-sociais e operar uma vigilância crítica das práticas governamentais.
PALAVRAS-CHAVES
Política de saúde; Saúde da mulher; Ativismo social; Identidade de gênero; Direitos sexuais e reprodutivos
Introdução
Este artigo discute sobre diferentes configurações da relação entre Estado e movimentos sociais e seus efeitos na produção de políticas na área de saúde da mulher a partir dos anos 2000, no Brasil. Nosso argumento é de que uma interlocução sistemática entre movimentos sociais e representantes do governo, por meio de participação popular, na elaboração de políticas públicas pode produzir propostas mais alinhadas às demandas coletivas na área da saúde da mulher, ainda que tais conquistas se mostrem vulneráveis ao jogo partidário e ao conservadorismo. Essa perspectiva ressalta as articulações entre movimentos sociais e Estado, processo que permite, a um só tempo, certa incidência sobre o cenário político-institucional, reposicionamentos de pautas político-sociais e capacidade de vigilância e crítica das práticas governamentais.
Incidir no Estado refere-se a um processo de advocacy baseado em direitos, no qual a sociedade civil interage com o Estado para reivindicar cidadania e direitos humanos11 Franke K. Dating the State: the moral hazards of winning gay rights. Colum Hum Rts L Rev [Internet]. 2012 [acesso em 2024 set 29];44:1-46. Disponível em: https://scholarship.law.columbia.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=3110&context=faculty_scholarship
https://scholarship.law.columbia.edu/cgi... ,22 Pitanguy J. Advocacy e direitos humanos. In: Barsted LL, Pitanguy J, organizadoras. O Progresso das Mulheres no Brasil 2003-2010. Rio de Janeiro: CEPIA; 2011. p. 20-57.. No campo dos direitos das mulheres, trata-se de uma estratégia de enfrentamento de relações de opressão e subalternização que se realizam entre a convergência e a divergência de posições, estratégias e valores33 Ávila MB, Corrêa S. O movimento de saúde e direitos reprodutivos no Brasil: revisitando percursos. In: Galvão L, Díaz J, organizadores. Saúde sexual e reprodutiva no Brasil: dilemas e desafios. São Paulo: Hucitec; 1999. p. 70-103.,44 Schumaher S. Os movimentos feministas ontem e hoje no Brasil: desafios da sua institucionalização. In: Matos M, Alvarez S, organizadoras. Quem são as mulheres das políticas para as mulheres no Brasil: o feminismo estatal participativo. Porto Alegre: Zouk; 2018. p. 21-56..
A saúde da mulher como uma questão de direitos humanos teve como marco internacional as Conferências da Organização das Nações Unidas (ONU) de Cairo e de Beijing, nos anos de 199055 Bandeira L, Almeida T. A transversalidade de gênero nas políticas públicas. Rev CEAM [Internet]. 2013 [acesso em 2024 set 25];2(1):35-46. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/revistadoceam/article/view/10075
https://periodicos.unb.br/index.php/revi... . No Brasil, ainda na década de 1980, antes da proposição de um sistema de saúde público e universal, surgem experiências nacionais e regionais de políticas públicas de saúde da mulher ancoradas no conceito de integralidade, cujo objetivo era contemplar necessidades de saúde das mulheres para além da gestação, enfrentando o caráter predominantemente materno-infantilista da saúde pública brasileira66 Ministério da Saúde (BR). Assistência Integral à Saúde da Mulher: bases de ação programática. Brasília, DF; 1984.,77 Costa AM, Bahia L, Conte D. A saúde da mulher e o SUS: laços e diversidades no processo de formulação, implementação e avaliação das políticas de saúde para mulheres no Brasil. Saúde debate [Internet]. 2007 [acesso em 2024 set 29];31(75-77):13-24. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/4063/406345310003.pdf
https://www.redalyc.org/pdf/4063/4063453... .
Construída na interface entre a saúde pública e o ativismo social, a integralidade na atenção à saúde da mulher traz a marca de movimentos sociais feministas que buscaram incidir no Estado, com interesse na ampliação de direitos88 Araújo M, Simonetti M. Saúde das Mulheres: questões que o debate sobre políticas públicas ainda tem que enfrentar. Rev Observatório Brasil Igualdade de Gênero. 2014;4(5):118-29.,99 Centro Brasileiro de Estudos de Saúde [Internet]. Rio de Janeiro: Cebes; Ó2024. Costa AM. Saúde integral da mulher: quo vadis 30 anos depois?; 2013 março 7 [acesso em 2024 jan 25]. Disponível em: http://cebes.org.br/2013/03/saude-integral-da-mulher-quo-vadis-30-anos-depois/
http://cebes.org.br/2013/03/saude-integr... . É essa perspectiva que orienta o Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM)66 Ministério da Saúde (BR). Assistência Integral à Saúde da Mulher: bases de ação programática. Brasília, DF; 1984., de 1983, e, posteriormente, a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PNAISM)1010 Ministério da Saúde (BR). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: princípios e diretrizes. Brasília, DF: MS; 2004., de 2004. Formulada em parceria do governo federal com a sociedade civil, a PNAISM é lançada na primeira gestão de um governo de esquerda desde a redemocratização do país. Anos depois, o advento de uma política direcionada à assistência à gestação e ao parto, a Rede Cegonha (RC)1111 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 1.459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS - a Rede Cegonha. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 25 jun 2011; Seção 1., mostraria que se mantém viva a disputa entre integralidade e materno-infantilismo na arena da saúde da mulher. Promulgada em 2011, sob outra gestão de esquerda, a RC demonstra que as relações da gestão federal com o ativismo social de mulheres e de feministas se deram de maneira distinta em comparação àquelas que foram vistas na PNAISM.
Ainda que as políticas mencionadas contenham diferentes estatutos jurídicos, elas constituem as principais iniciativas federais com relação à saúde da mulher desde 20001212 Carvalho LDP. Da esterilização ao Zika: interseccionalidade e transnacionalismo nas políticas de saúde para as mulheres [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2017. 212 p.,1313 Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea). Atenção Integral à Saúde da Mulher ficou fragilizada. Jornal Fêmea [Internet]. 2011 [acesso em 2024 set 20]. Disponível em: https://www.cfemea.org.br/images/stories/colecaofemea/jornalfemea172.pdf.
https://www.cfemea.org.br/images/stories... . Ao conjugarem em seus processos de elaboração diferentes modalidades de articulação entre agentes de governo, movimentos sociais e interesses partidários, a PNAISM e a RC evidenciam como as propostas de ações em saúde da mulher se alteraram no Brasil em período recente.
A análise de tal dinâmica pode ser especialmente frutífera para compreender a relação entre ativismo social e Estado no âmbito da saúde da mulher, sob governos considerados aliados dos movimentos sociais no Brasil. O debate sobre ganhos e perdas na interação com o Estado tem sido levantado por diversos segmentos dos movimentos sociais no Brasil, com destaque para os movimentos negros, feministas e de dissidências sexuais44 Schumaher S. Os movimentos feministas ontem e hoje no Brasil: desafios da sua institucionalização. In: Matos M, Alvarez S, organizadoras. Quem são as mulheres das políticas para as mulheres no Brasil: o feminismo estatal participativo. Porto Alegre: Zouk; 2018. p. 21-56.,1414 Aguião S. Fazer-se no “Estado”: uma etnografia sobre o processo de constituição dos “LGBT” como sujeitos de direitos no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Eduerj; 2018.,1515 Werneck J. Racismo institucional e saúde da população negra. Saúde soc. 2016;25(3):535-49. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-129020162610
https://doi.org/10.1590/S0104-1290201626... . Nesse cenário, as diferentes formas de conceber a relação entre os partidos políticos e o Estado aparecem como dilemas históricos. Considerar ativistas e o Estado – incluindo os governos – como agentes interessados em negociar o reconhecimento de sujeitos de direitos pode contribuir para compreender impasses e limitações no ciclo das políticas públicas.
Frequentemente compreendidas como respostas do Estado a pleitos da sociedade civil, as políticas públicas podem assumir caráter instrumental e tecnicista, colocando em prejuízo uma abordagem histórica que contemplaria os elementos políticos e sociais que as compõem1414 Aguião S. Fazer-se no “Estado”: uma etnografia sobre o processo de constituição dos “LGBT” como sujeitos de direitos no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Eduerj; 2018.. Em tal enquadramento, as políticas são vistas como atos administrativos que apenas representam os elementos dos quais falam1616 Souza Lima AC, Castro JPM. Notas para uma abordagem antropológica da(s) política(s) pública(s). Anthropológicas [Internet]. 2015 [acesso em 2024 set 2];26(2):17-54. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaanthropologicas/article/view/23968
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Em uma perspectiva antropológica, as políticas públicas atuam como pedras angulares no processo contínuo de fazer-se do Estado, no qual a arte de governar e as atividades administrativas não se opõem1616 Souza Lima AC, Castro JPM. Notas para uma abordagem antropológica da(s) política(s) pública(s). Anthropológicas [Internet]. 2015 [acesso em 2024 set 2];26(2):17-54. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaanthropologicas/article/view/23968
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revi... . Inseridas no feixe de relações que compõe o Estado, as políticas envolvem múltiplos agentes, agências e práticas, extrapolando o território estrito do organismo estatal. Ao forjar sujeitos e formas de assujeitamento, as políticas também participam da produção de saberes, subjetividades e relações1717 Foucault M. Segurança, território e população. São Paulo: Martins Fontes; 2008..
O fazer-se do Estado implica sustentar práticas necessariamente hierarquizantes e segregadoras, ainda que distribuídas de modo irregular pelo tecido social1616 Souza Lima AC, Castro JPM. Notas para uma abordagem antropológica da(s) política(s) pública(s). Anthropológicas [Internet]. 2015 [acesso em 2024 set 2];26(2):17-54. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaanthropologicas/article/view/23968
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revi... . Entre as diversas formas de segmentação, está a produção contínua da diferença sexual. De acordo com Paul Preciado1818 Preciado P. Testo Junkie. São Paulo: n-1; 2018., o sexo e o gênero são vistos como tecnologias complexas por meio das quais o corpo é tomado enquanto um artefato, tendo seus órgãos, funções e relações artificialmente estabelecidos como dados de natureza. Funcionando como um regime político através da inscrição e reinscrição de códigos binários, a diferença sexual é também formulada e recitada nas ferramentas governamentais, inclusive por meio de documentos.
Os processos de enquadramento que qualificam e definem os sujeitos e a população também se projetam sobre o Estado, numa construção mútua, contínua e processual1919 Vianna A, Lowenkron L. O duplo fazer do gênero e do Estado: interconexões, materialidades e linguagens. Cad Pagu. 2017;51:1-61. DOI: https://doi.org/10.1590/18094449201700510001
https://doi.org/10.1590/1809444920170051... . Ao considerar a capacidade de fabricar sujeitos e subjetividades que gênero e Estado exercitam em associação, vê-se que as políticas públicas de saúde da mulher inserem-se nesse campo de modo especial por conjugarem formalmente os dois termos.
Se, atualmente, gênero, sexo e sexualidade não se situam às margens das disputas de poder, mas, sim, no seu próprio núcleo2020 Corrêa S, Parker R. Prologue. In: Corrêa S, Parker R, organizadores. SexPolitics: Trends and Tensions in the 21st Century – Critical Issues. Rio de Janeiro: ABIA; 2018. p. 4-7., investigar políticas públicas voltadas para mulheres pode permitir compreender um dos processos por meio dos quais no Estado se produz e delimita quem são as mulheres que podem ser contempladas pela cidadania.
Dessa forma, o objetivo do artigo é analisar de forma comparativa a relação entre movimentos sociais e o Estado no processo de elaboração das duas principais políticas públicas nacionais de saúde da mulher desde o início dos anos 2000 no Brasil – PNAISM e RC1010 Ministério da Saúde (BR). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: princípios e diretrizes. Brasília, DF: MS; 2004.,1111 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 1.459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS - a Rede Cegonha. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 25 jun 2011; Seção 1.,2121 Ministério da Saúde (BR). Política nacional de atenção integral à saúde da mulher: plano de ação 2004-2007. Brasília, DF: MS; 2004.,2222 Ministério da Saúde (BR). Manual prático para implementação da Rede Cegonha. Brasília, DF: MS; 2011.. A partir de uma perspectiva antropológica sobre documentos, estudaram-se o corpus material e o contexto de cada normativa para, em seguida, discutir os resultados à luz de marcos teóricos do feminismo e da antropologia do Estado.
Material e métodos
Para a pesquisa da qual deriva este artigo, um conjunto extenso de documentos oficiais do governo foi examinado (n=64), bem como documentos de movimentos sociais e a produção acadêmica de pessoas diretamente envolvidas com as normativas estudadas. Para cumprir os objetivos deste artigo, privilegiou-se a análise etnográfica dos documentos inaugurais da PNAISM1010 Ministério da Saúde (BR). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: princípios e diretrizes. Brasília, DF: MS; 2004. e da RC1111 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 1.459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS - a Rede Cegonha. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 25 jun 2011; Seção 1.. A seguir, somaram-se outros documentos oficiais do governo vinculados às políticas, para iluminar aspectos relativos ao seu processo de elaboração e promulgação2121 Ministério da Saúde (BR). Política nacional de atenção integral à saúde da mulher: plano de ação 2004-2007. Brasília, DF: MS; 2004.,2222 Ministério da Saúde (BR). Manual prático para implementação da Rede Cegonha. Brasília, DF: MS; 2011.,2323 Ministério da Saúde (BR). Simpósio Internacional de Redes de Atenção Integral à Saúde da Mulher e da Criança/Rede Cegonha. Brasília, DF: MS; 2015.. Todos os documentos encontram-se disponíveis em plataformas oficiais do Ministério da Saúde (MS), de acesso público e universal.
O trabalho de viés antropológico com e a partir de documentos implica atentar para o conteúdo e a forma, bem como para o contexto no qual se inserem e para o conjunto de elementos que agenciam e relacionam2424 Vianna A. Etnografando documentos: uma antropóloga em meio a processos judiciais. In: Castilho SRR, Souza Lima AC, Teixeira CC, organizadores. Antropologia das práticas de poder: reflexões etnográficas entre burocratas, elites e corporações. Rio de Janeiro: Contra Capa; 2014. p. 43-70.. Com efeito, a sua caraterística de ser algo que deve permanecer e durar atravessa todo o seu processo de elaboração. Campo também de disputas intensas, cujos efeitos ultrapassam os órgãos estatais, os documentos inscrevem-se no circuito político internacional e no regime de gestão dos corpos e da vida2525 Lowenkron L, Ferreira L. Anthropological perspectives on documents. Ethnographic dialogues on the trail of police papers. Vibrant. 2014;11(2):76-112. DOI: https://doi.org/10.1590/S1809-43412014000200003
https://doi.org/10.1590/S1809-4341201400... .
O estudo comparativo das políticas organizou-se em dois eixos complementares entre si: o estudo do documento e o estudo da conjuntura. No primeiro eixo, foram analisados o conteúdo e o formato dos documentos oficiais de promulgação das políticas, cujo objetivo consistiu em apreender como a política produz seu discurso, quais prioridades estabelece e que articulações promove. No estudo da conjuntura, investigaram-se as condições sociais, históricas e políticas em torno das políticas.
O documento inaugural da PNAISM1010 Ministério da Saúde (BR). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: princípios e diretrizes. Brasília, DF: MS; 2004. é composto por 82 páginas e assinado pela equipe da Área Técnica de Saúde da Mulher e do MS. Seu conteúdo expõe: conceitos e princípios adotados pela PNAISM; síntese histórica das políticas nacionais de saúde da mulher; análise sociodemográfica e diagnóstico situacional de saúde. Entre os objetivos, destaca-se a melhoria das condições de vida das mulheres por meio de ações voltadas para: atenção clínico-ginecológica; redução da mortalidade por câncer; atenção às mulheres em situação de violência; fortalecimento da participação popular; e atenção à saúde mental.
Estabelecida por meio de uma portaria que contém 9 páginas, a RC leva a assinatura do ministro da saúde, sem incluir outros atores como corresponsáveis, conferindo-lhe um aspecto mais centralizado. A portaria apresenta princípios, diretrizes e objetivos da política, priorizando a promoção da atenção a parto e nascimento e a meta de redução de mortalidade materna e infantil, sobretudo neonatal.
Mais do que dois territórios de contornos bem delimitados, falamos de planos que se co-engendram e derivam entre si, possibilitando uma mirada acerca dos fluxos de circulação de forças nas disputas abertas e ininterruptas em torno do sexo e do gênero no âmbito do Estado.
Resultados
Análise de documentos sobre políticas e respectivos processos
O processo de elaboração de políticas voltadas às mulheres na área da saúde no Brasil tem se dado em intersecção com diversos atores não governamentais, entre os quais, os movimentos sociais de mulheres e de feministas. Entretanto, a articulação dos movimentos sociais com o Estado mostrou-se irregular e instável, com períodos de maior proximidade e outros de distanciamento e centralização das decisões no governo2626 Cruz E. As estratégias de mobilização do movimento feminista para a aprovação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, de 2004 [dissertação]. Brasília, DF: Universidade de Brasília; 2015. 178 p.,2727 Gonzalez D. Quando feminismos e Estado se encontram(?): Brasil e Chile no “ciclo progressista” [tese]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 2019. 191 p.. A seguir, apresentam-se elementos singulares do percurso de formulação de cada uma das normativas que indicam como se desenvolveu a incidência no Estado e quais efeitos foram produzidos com relação às proposições políticas.
PNAISM e participação social ampliada
A PNAISM instituiu-se, em 2004, como a primeira normativa de saúde nacional voltada para mulheres, denominada ‘política’, e não ‘programa’. Ela incorpora questões sobre desigualdade de gênero e racismo, e abrange especificidades no sujeito alvo de suas ações ao incluir subgrupos de mulheres (negras, indígenas, idosas, rurais etc.). O documento inaugural1010 Ministério da Saúde (BR). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: princípios e diretrizes. Brasília, DF: MS; 2004. anuncia a perspectiva de gênero, a integralidade e a saúde como direito de cidadania, incluindo a participação de movimentos sociais em sua elaboração como uma expressão de seu caráter democrático. A afirmação da cidadania plena da mulher, para além da função como genitora ou mãe, soma-se à abordagem da relação entre adoecimento e desigualdades sociais, visando a garantir direitos humanos às mulheres.
A elaboração da PNAISM deu-se por encontros regulares entre representantes do MS, de órgãos mistos, como Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres (CNDM) e Comissão Intersetorial de Saúde da Mulher (Cismu), e de movimentos sociais de mulheres e feministas. A normativa1010 Ministério da Saúde (BR). Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: princípios e diretrizes. Brasília, DF: MS; 2004. menciona os seguintes coletivos da sociedade civil organizada entre os parceiros: Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos; Articulação de Mulheres Brasileiras; Articulação Nacional das Mulheres Trabalhadoras Rurais; e Rede Nacional pela Humanização do Parto e Nascimento.
Com relação à equipe do MS, um grupo considerável de ativistas feministas esteve presente na equipe de Luís Inácio Lula da Silva desde a corrida presidencial, em 2002, assessorando na elaboração de propostas e material de campanha2626 Cruz E. As estratégias de mobilização do movimento feminista para a aprovação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, de 2004 [dissertação]. Brasília, DF: Universidade de Brasília; 2015. 178 p.. Na formação dos quadros ministeriais, incluindo os da saúde, muitas ativistas de movimentos feministas e de mulheres foram incorporadas, principalmente, nos chamados segundos e terceiros escalões do governo do Partido dos Trabalhadores (PT) no poder executivo. Esse período é reconhecido como um marco de fortalecimento dos espaços participativos do governo federal, sendo considerada uma fase profícua para a articulação entre Estado e movimentos sociais, inclusive no âmbito das políticas para mulheres2828 Abers R, Tatagiba L. Institutional activism: mobilizing for women’s health from inside the brazilian bureaucracy. In: Rossi F, Bülow M, organizadores. Social movement dynamics. Nova Iorque: Routledge; 2015. p. 73-101..
Sobre impactos da desigualdade social na condição de saúde dos grupos de mulheres, o documento cita referências ligadas a movimentos sociais e a encontros da sociedade civil, visibilizando a articulação com atores para além da circunscrição do poder executivo. As intensas redes de discurso e influência apontam que os movimentos sociais faziam mais do que informar o governo, pois forneciam, também, legitimidade e oportunidade para a implementação de ações2626 Cruz E. As estratégias de mobilização do movimento feminista para a aprovação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, de 2004 [dissertação]. Brasília, DF: Universidade de Brasília; 2015. 178 p..
Esse processo demonstra a existência de uma tripla entrada da sociedade civil organizada referente à administração pública e à formulação da PNAISM, pois houve composição entre: a frente de tensionamento do governo em prol das pautas defendidas (advocacy), a participação popular institucionalizada e a ocupação direta de cargos na estrutura do Estado por pessoas ligadas às pautas ativistas. Essa dinâmica transformou as relações historicamente forjadas entre os distintos espaços de poder no âmbito da política institucional. Um de seus efeitos foi a diversificação dos atores formalmente envolvidos na construção de políticas públicas, com a emergência de diferentes grupos sociais como sujeitos de direito88 Araújo M, Simonetti M. Saúde das Mulheres: questões que o debate sobre políticas públicas ainda tem que enfrentar. Rev Observatório Brasil Igualdade de Gênero. 2014;4(5):118-29..
Ao reunir-se com integrantes dos movimentos negro, indígena, de trabalhadores sem-teto, de lésbicas, entre outros, a equipe do MS expande seu campo de visão para além do movimento sanitarista e feminista que já o habitava – dada a trajetória das mulheres que compunham a equipe. A participação de setores fora do eixo classe média-branca-urbanizada nos espaços deliberativos de políticas da saúde forçou a entrada na agenda de outras formas de opressão e discriminação, provocando a revisão de conceitos e prioridades, tanto nos grupos ativistas quanto nos setores governamentais1212 Carvalho LDP. Da esterilização ao Zika: interseccionalidade e transnacionalismo nas políticas de saúde para as mulheres [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2017. 212 p..
O caráter participativo da PNAISM é evidenciado não só nos textos oficiais do governo, mas, também, em documentos oriundos de organizações da sociedade civil e ativistas. Neles, a PNAISM é descrita como uma política ampliada de saúde da mulher, produto da interação entre representantes do governo e movimentos sociais diversos2929 Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea). Planejamento com perspectiva de gênero. Jornal Fêmea [Internet]. 2004 jan [acesso em 2023 jul 10]. Disponível em: https://www.cfemea.org.br/images/stories/colecaofemea/jornalfemea132.pdf
https://www.cfemea.org.br/images/stories... ,3030 Oliveira F. Ministério da Saúde adoça a boca do Vaticano. Viomundo [Internet]. 2011 abr 15 [acesso em 2023 jul 10]. Disponível em: https://www.viomundo.com.br/entrevistas/fatima-oliveira-ms-adoca-a-bo-ca-do-vaticano-ao-retomar-conceito-de-saude-ma-terno-infantil.html
https://www.viomundo.com.br/entrevistas/... .
Rede Cegonha e a focalização nas ações
Os reveses nas pautas e nos documentos relacionados à saúde da mulher se fizeram sentir em menos de uma década. Em 2011, é promulgada a RC, cuja proposta consiste em implementar uma rede de cuidados voltada à mulher e à criança, a fim de promover mudanças no modelo de assistência ofertado às mulheres durante gestação e parto, sob a ótica da atenção humanizada1111 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 1.459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS - a Rede Cegonha. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 25 jun 2011; Seção 1.,2222 Ministério da Saúde (BR). Manual prático para implementação da Rede Cegonha. Brasília, DF: MS; 2011..
Entre os marcos reconhecidos pela portaria1111 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 1.459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS - a Rede Cegonha. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 25 jun 2011; Seção 1., constam os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), nomeadamente, os referentes à redução da mortalidade materna e neonatal. Entre os princípios da política, são citados o enfoque de gênero e a diversidade étnica e racial, porém, tais perspectivas não são desenvolvidas ou relacionadas com as ações propostas. Não há menção à PNAISM ou à integralidade na atenção à saúde da mulher. A participação popular no processo de formulação da RC está ausente do documento, que, tampouco, elenca alguma diretriz reservando assento para os movimentos sociais em espaços deliberativos da política.
Em publicação posterior à portaria2222 Ministério da Saúde (BR). Manual prático para implementação da Rede Cegonha. Brasília, DF: MS; 2011., a RC situa a participação da população no conjunto de parcerias com as quais o MS conta para apoiá-lo em sua implementação, ou seja, em apenas uma das dimensões do ciclo das políticas públicas, descartando a entrada da sociedade civil nas etapas de formulação e avaliação. Entre os parceiros, são elencados, no âmbito da sociedade civil, a Rede pela Humanização do Parto e Nascimento (Rehuna) e os movimentos de mulheres.
A Rehuna é a única organização da sociedade civil citada no conjunto de documentos que integra a RC1111 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 1.459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS - a Rede Cegonha. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 25 jun 2011; Seção 1.,2222 Ministério da Saúde (BR). Manual prático para implementação da Rede Cegonha. Brasília, DF: MS; 2011.. O alinhamento entre a agenda da Rehuna e a RC não é mera casualidade, afinal, a formulação da política contou com envolvimento direto de integrantes da organização que já ocupavam cargos dentro do MS, incluindo a própria coordenadora da Área Técnica de Saúde da Mulher e da RC3131 Castro MS. A integralidade como aposta: etnografia de uma política pública no Ministério da Saúde [tese]. Brasília, DF: Universidade de Brasília; 2012. 343 p.. A presença de ativistas em órgãos de governo compunha uma das principais estratégias de ação da Rehuna, a fim de conquistar aliados na gestão pública federal e obter sucesso no avanço de suas pautas2828 Abers R, Tatagiba L. Institutional activism: mobilizing for women’s health from inside the brazilian bureaucracy. In: Rossi F, Bülow M, organizadores. Social movement dynamics. Nova Iorque: Routledge; 2015. p. 73-101..
Em 2011, na composição da equipe da primeira gestão de Dilma Rousseff (sucessora de Lula e também membro do PT), ativistas sociais assumiram postos nos ministérios, com destaque para aquelas associadas ao movimento pela humanização do parto no MS. O foco no parto e na saúde da criança foi definido ainda durante a corrida eleitoral2323 Ministério da Saúde (BR). Simpósio Internacional de Redes de Atenção Integral à Saúde da Mulher e da Criança/Rede Cegonha. Brasília, DF: MS; 2015.. A polêmica gerada em torno do aborto e da união homoafetiva levou o PT a firmar alianças conservadoras, a fim de angariar apoio para a eleição. Dessa forma, a defesa de pautas mais reconhecidamente feministas foi preterida, e, junto com isso, também se observou um afastamento dos movimentos sociais feministas na construção da campanha e do programa de governo3232 Werneck J. O governo Dilma está chocando o ovo da serpente. Viomundo [Internet]. 2012 fev 9 [acesso em 2023 jul 10]. Disponível em: https://www.viomundo.com.br/denuncias/jurema-werneck-o-governo-dil-ma-esta-chocando-o-ovo-da-serpente.html
https://www.viomundo.com.br/denuncias/ju... .
Com relação à distribuição de recursos orçamentários, a sobreposição das políticas torna-se ainda mais evidente, uma vez que as verbas destinadas à PNAISM foram drasticamente reduzidas após a promulgação da RC1212 Carvalho LDP. Da esterilização ao Zika: interseccionalidade e transnacionalismo nas políticas de saúde para as mulheres [tese]. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2017. 212 p.,1313 Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea). Atenção Integral à Saúde da Mulher ficou fragilizada. Jornal Fêmea [Internet]. 2011 [acesso em 2024 set 20]. Disponível em: https://www.cfemea.org.br/images/stories/colecaofemea/jornalfemea172.pdf.
https://www.cfemea.org.br/images/stories... . A persistência de altas taxas de mortalidade materna, mesmo após as duas gestões de Lula, pode ter contribuído para justificar o foco na atenção à gravidez e ao parto3333 Vilela E. Coordenadora do Ministério da Saúde fala sobre o Rede Cegonha [DVD]. Brasília, DF: TV Brasil; 2011.. Ao mesmo tempo, também ofereceu uma maneira de evitar a polêmica em torno do aborto, permitindo sustentar as alianças partidárias.
Ao analisar os temas priorizados em normativas de saúde da mulher pelo MS em 20111111 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 1.459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS - a Rede Cegonha. Diário Oficial da União, Brasília, DF. 25 jun 2011; Seção 1.,2222 Ministério da Saúde (BR). Manual prático para implementação da Rede Cegonha. Brasília, DF: MS; 2011., vemos que uma das bandeiras de luta – humanização do parto e do nascimento – ganhou mais força do que outras – integralidade e equidade de gênero, por exemplo. Com isso, uma significativa bagagem conceitual e instrumental na área da saúde da mulher foi negligenciada, obscurecendo a dimensão dos direitos sexuais e reprodutivos.
Para além da ocupação direta de cargos, não houve investimento governamental para a participação popular na formulação da RC. Tampouco instâncias oficiais, como o CNDM, foram envolvidas, o que desencadeou questionamentos de ativistas feministas, incluindo aquelas que se viam como apoiadoras da presidenta Dilma3030 Oliveira F. Ministério da Saúde adoça a boca do Vaticano. Viomundo [Internet]. 2011 abr 15 [acesso em 2023 jul 10]. Disponível em: https://www.viomundo.com.br/entrevistas/fatima-oliveira-ms-adoca-a-bo-ca-do-vaticano-ao-retomar-conceito-de-saude-ma-terno-infantil.html
https://www.viomundo.com.br/entrevistas/... ,3434 Castilhos C. Senhora presidenta, ouça as mulheres. Viomundo [Internet]. 2011 abr 2 [acesso em 2024 jul 25]. Disponível em: https://www.viomundo.com.br/politica/clair-castilhos-senhora-presidenta-ouca-as-mulheres.html
https://www.viomundo.com.br/politica/cla... . As críticas argumentavam que a ausência de interlocução com a sociedade civil produziu um encurtamento de visão na portaria, desprezando pautas cruciais para a saúde das mulheres brasileiras, como o racismo e a desigualdade de gênero3535 Negrão T. Compromissos assumidos pelo Ministério da Saúde com a Rede Feminista de Saúde não são cumpridos. Viomundo [Internet]. 2011 jul 7 [acesso em 2024 jul 25]. Disponível em: https://www.viomundo.com.br/entrevistas/telia-negrao-portaria-da-rede-cegonha-deixa-a-desejar.html
https://www.viomundo.com.br/entrevistas/... . Nessas falas, o ministro da saúde e sua equipe foram acusados de estarem se colocando na posição de porta-vozes da sociedade de modo ilegítimo3232 Werneck J. O governo Dilma está chocando o ovo da serpente. Viomundo [Internet]. 2012 fev 9 [acesso em 2023 jul 10]. Disponível em: https://www.viomundo.com.br/denuncias/jurema-werneck-o-governo-dil-ma-esta-chocando-o-ovo-da-serpente.html
https://www.viomundo.com.br/denuncias/ju... .
Ao expor as flagrantes lacunas na RC, o debate gerado no circuito feminista fez mais do que somente enunciar os temas negligenciados: ele denunciou o caráter centralizador e excludente adotado pelo MS no processo de elaboração da RC. Vista como responsável por conferir à política um aspecto verticalizado, a coordenação da política esteve alheia à diversidade de movimentos sociais de mulheres, conferindo-lhe um caráter empobrecido de potência democrática. Além disso, abdica flagrantemente da concepção de integralidade em saúde e reifica a mulher a partir da dimensão biológica da reprodução.
Discussão
Coprodução das políticas públicas e do Estado
Ao discutir o efeito estrutural do Estado, Silvia Aguião1414 Aguião S. Fazer-se no “Estado”: uma etnografia sobre o processo de constituição dos “LGBT” como sujeitos de direitos no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Eduerj; 2018. ressalta a importância de estudar as práticas que sistematicamente fazem com que o Estado, como uma estrutura, pareça existir. Considerando que as políticas públicas ocupam lugar central entre as práticas que forjam o Estado, ao mesmo tempo que também contribuem para a formação da própria população, interessa pensá-las como um ponto de convergência no qual mulher, Estado, saúde e movimento social se coproduzem. Assim, é necessário compreender essas categorias não como pontos isolados, mas como linhas que se entretecem, fazendo com que uma seja imanente à outra.
O envolvimento de grupos da sociedade civil na elaboração de políticas públicas de saúde não se inaugurou nos anos 2000 na área de saúde da mulher. A intensificação da participação popular em governos na América Latina ocorreu a partir dos anos de 1980, em um momento no qual muitos países reescreveriam suas constituições e passariam a incorporar temas relacionados às mulheres nos planos de governo2727 Gonzalez D. Quando feminismos e Estado se encontram(?): Brasil e Chile no “ciclo progressista” [tese]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 2019. 191 p.,3636 Curiel O. La Nación Heterosexual. Bogotá, DC.: Brecha Lésbica; 2013.,3737 Diniz CSG, Cabral CS. Reproductive health and rights, and public policies in Brazil: revisiting challenges during covid-19 pandemics. Glob Public Health. 2022;17(11):3175-88. DOI: https://doi.org/10.1080/17441692.2021.1995463
https://doi.org/10.1080/17441692.2021.19... . No caso do Brasil, esse período coincide com a transição do regime autoritário da ditadura civil-militar para o regime democrático de presidencialismo, sendo marcado por intensa mobilização da sociedade em prol de maior participação popular nas diferentes esferas do governo, e com vigorosa presença do ativismo feminista33 Ávila MB, Corrêa S. O movimento de saúde e direitos reprodutivos no Brasil: revisitando percursos. In: Galvão L, Díaz J, organizadores. Saúde sexual e reprodutiva no Brasil: dilemas e desafios. São Paulo: Hucitec; 1999. p. 70-103.,3838 Silveira PS, Paim JS, Adrião KG. Os movimentos feministas e o processo da Reforma Sanitária no Brasil: 1975 a 1988. Saúde debate. 2019;43(esp8):276-291. DOI: https://www.doi.org/10.1590/0103-11042019S820
https://www.doi.org/10.1590/0103-1104201... .
Na década de 1990, diversos países latino-americanos, ainda que sob governos das mais variadas matizes do espectro político, não só estavam promovendo participação social como também criando órgãos estatais destinados às questões relacionadas às mulheres e incluindo alguns termos feministas em sua agenda3636 Curiel O. La Nación Heterosexual. Bogotá, DC.: Brecha Lésbica; 2013.,3939 Galindo M. No se pude descolonizar sin despatriarcalizar. La Paz: Mujeres Creando; 2013.. A trajetória brasileira ganha relevo nesse panorama devido às experiências vividas ainda antes dos anos de 1990, com a formulação e implementação do PAISM, em 1984, e a criação do CNDM, em 1985. O PAISM foi pioneiro no cenário global ao desenhar um programa de saúde para mulheres sob a diretriz da integralidade77 Costa AM, Bahia L, Conte D. A saúde da mulher e o SUS: laços e diversidades no processo de formulação, implementação e avaliação das políticas de saúde para mulheres no Brasil. Saúde debate [Internet]. 2007 [acesso em 2024 set 29];31(75-77):13-24. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/4063/406345310003.pdf
https://www.redalyc.org/pdf/4063/4063453... . O CNDM, por sua vez, inaugurou a entrada oficial de ativistas feministas na esfera federal do governo, cuja função híbrida articulava simultaneamente movimentos sociais e representantes do governo4040 Alvarez S. Falas do Estado ou o estado das falas sobre as mulheres nas administrações democrático-populares. In: Godinho T, Silveira M, organizadores. Políticas públicas e igualdade de gênero. São Paulo: CEM; 2004. p. 103-12..
Após a redemocratização, as feministas acumularam reflexões, experiências e críticas sobre a ‘maquinaria estatal’ relacionada às mulheres4040 Alvarez S. Falas do Estado ou o estado das falas sobre as mulheres nas administrações democrático-populares. In: Godinho T, Silveira M, organizadores. Políticas públicas e igualdade de gênero. São Paulo: CEM; 2004. p. 103-12.. Uma das constatações dizia respeito ao frágil poder deliberativo, executivo e orçamentário de órgãos governamentais destinados a tratar de questões das mulheres. Outra apontava para o papel chave que a posição ocupada por esses órgãos no organograma governamental imprimia na relevância e na sobrevida das ações promovidas4040 Alvarez S. Falas do Estado ou o estado das falas sobre as mulheres nas administrações democrático-populares. In: Godinho T, Silveira M, organizadores. Políticas públicas e igualdade de gênero. São Paulo: CEM; 2004. p. 103-12..
Além da presença marcante de ativistas nas gestões federais estudadas, observou-se a diferença de visões e objetivos entre os grupos de ativistas que ocuparam cargos no governo. Considerando as pautas que atingiram alguma hegemonia no MS, é possível identificar divergência entre as prioridades elencadas e o método utilizado para elaborar propostas entre a equipe que compôs a primeira gestão de Lula, à época da PNAISM, e aquela que integrou a primeira gestão de Dilma, à época da RC. A participação popular, incluindo o assento em processos deliberativos, sobressai como um elemento dissonante.
Tais divergências indicam que não há consenso tanto entre ativistas que se ocupam do Estado quanto na dimensão dos temas vinculados às mulheres e aos feminismos dentro dos partidos políticos. Mais do que um campo bem estabelecido dentro dos partidos, o feminismo no Estado aparece como um efeito de alianças políticas construídas ao longo das campanhas eleitorais e dos governos33 Ávila MB, Corrêa S. O movimento de saúde e direitos reprodutivos no Brasil: revisitando percursos. In: Galvão L, Díaz J, organizadores. Saúde sexual e reprodutiva no Brasil: dilemas e desafios. São Paulo: Hucitec; 1999. p. 70-103.. Mesmo em governos considerados parceiros, as feministas “precisam trabalhar na contra-corrente das práticas e das falas do Estado em que participam”4040 Alvarez S. Falas do Estado ou o estado das falas sobre as mulheres nas administrações democrático-populares. In: Godinho T, Silveira M, organizadores. Políticas públicas e igualdade de gênero. São Paulo: CEM; 2004. p. 103-12.(108).
Avanços e recuos da agenda feminista no Estado
O direcionamento de esforços a fim de tecer articulações com o Estado tornou-se alvo de polêmicas dentro dos movimentos sociais desde os anos de 198033 Ávila MB, Corrêa S. O movimento de saúde e direitos reprodutivos no Brasil: revisitando percursos. In: Galvão L, Díaz J, organizadores. Saúde sexual e reprodutiva no Brasil: dilemas e desafios. São Paulo: Hucitec; 1999. p. 70-103.,44 Schumaher S. Os movimentos feministas ontem e hoje no Brasil: desafios da sua institucionalização. In: Matos M, Alvarez S, organizadoras. Quem são as mulheres das políticas para as mulheres no Brasil: o feminismo estatal participativo. Porto Alegre: Zouk; 2018. p. 21-56.,2727 Gonzalez D. Quando feminismos e Estado se encontram(?): Brasil e Chile no “ciclo progressista” [tese]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 2019. 191 p.,4040 Alvarez S. Falas do Estado ou o estado das falas sobre as mulheres nas administrações democrático-populares. In: Godinho T, Silveira M, organizadores. Políticas públicas e igualdade de gênero. São Paulo: CEM; 2004. p. 103-12.. O “longo e turbulento percurso”33 Ávila MB, Corrêa S. O movimento de saúde e direitos reprodutivos no Brasil: revisitando percursos. In: Galvão L, Díaz J, organizadores. Saúde sexual e reprodutiva no Brasil: dilemas e desafios. São Paulo: Hucitec; 1999. p. 70-103.(71) de institucionalização da agenda feminista causava preocupação nas ativistas, uma vez que poderia acarretar descaracterização das pautas, por meio de sua tradução e incorporação seletiva. Por um lado, o aumento da capacidade de influenciar o cenário político-institucional era comemorado, pois acenava com a possibilidade de ampliar a permeabilidade do Estado à pauta feminista. Já, por outro lado, havia receio de que os movimentos fossem contaminados por uma atuação tecnocrática, gerando distanciamento das bases populares e dificuldade em exercer uma oposição mais frontal e radical ao governo, ao Estado e ao capitalismo44 Schumaher S. Os movimentos feministas ontem e hoje no Brasil: desafios da sua institucionalização. In: Matos M, Alvarez S, organizadoras. Quem são as mulheres das políticas para as mulheres no Brasil: o feminismo estatal participativo. Porto Alegre: Zouk; 2018. p. 21-56..
Levar para o campo dos direitos e das políticas públicas questões referentes às condições de vida das mulheres tem a intenção de favorecer a transformação desse cenário44 Schumaher S. Os movimentos feministas ontem e hoje no Brasil: desafios da sua institucionalização. In: Matos M, Alvarez S, organizadoras. Quem são as mulheres das políticas para as mulheres no Brasil: o feminismo estatal participativo. Porto Alegre: Zouk; 2018. p. 21-56.,3838 Silveira PS, Paim JS, Adrião KG. Os movimentos feministas e o processo da Reforma Sanitária no Brasil: 1975 a 1988. Saúde debate. 2019;43(esp8):276-291. DOI: https://www.doi.org/10.1590/0103-11042019S820
https://www.doi.org/10.1590/0103-1104201... , principalmente em um contexto no qual a pobreza e a violência ameaçam sistematicamente a própria vida, como é o caso do Brasil. Assim, a procura da proteção estatal atenderia à própria possibilidade de se manter viva, fazendo com que a parceria com o Estado em nome da ampliação de direitos e da cidadania transforme-se em algo “que não podemos não desejar”4141 Spivak G. Outside in the teaching machine. Nova Iorque: Routledge; 1993.(279).
Aproximar-se do Estado requer dos movimentos sociais aprender a gramática estatal em um esforço de traduzir as questões sensíveis de sua agenda para a linguagem de documentos e leis1414 Aguião S. Fazer-se no “Estado”: uma etnografia sobre o processo de constituição dos “LGBT” como sujeitos de direitos no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Eduerj; 2018.. A produção de conhecimento acadêmico e científico, assim como a circulação de docentes e pesquisadoras por espaços ligados a movimentos sociais e ao governo, compõe o processo de incidir no Estado na experiência brasileira em direitos reprodutivos e sexuais4242 Rosa H. Políticas do feminino: saúde, sexo, gênero. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2023..
O relevante fluxo de movimentos sociais buscando interagir com o Estado desde o final da década de 1980 foi, em parte, incentivado pela incorporação seletiva de termos do vocabulário feminista por agências internacionais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, a Fundação Rockfeller e a ONU4040 Alvarez S. Falas do Estado ou o estado das falas sobre as mulheres nas administrações democrático-populares. In: Godinho T, Silveira M, organizadores. Políticas públicas e igualdade de gênero. São Paulo: CEM; 2004. p. 103-12.. Esses organismos adotaram um discurso no qual a igualdade de gênero tinha centralidade na sua plataforma de ação junto aos países, sobretudo os considerados periféricos3939 Galindo M. No se pude descolonizar sin despatriarcalizar. La Paz: Mujeres Creando; 2013..
A adoção da ‘agenda da igualdade de gênero’ ou da ‘perspectiva de gênero’ pelas agências internacionais, que impactaria movimentos sociais e governos, efetivou-se, sobretudo, a partir da definição de metas voltadas para as mulheres4343 Farah M. Políticas públicas e gênero. In: Godinho T, Silveira M, organizadores. Políticas públicas e igualdade de gênero. São Paulo: PMSP; 2004. p. 127-42.. Diante disso, pode-se identificar o reforço de paradigmas nos quais o corpo passível de medicalização, regulação e controle é o feminino4444 Rosa H, Cabral CS. Uma cidadania da fertilidade – as políticas de saúde da mulher como tecnologias de produção do sexo e do gênero. Saúde Soc. 2023;32(2):1-13. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-12902023220534pt
https://doi.org/10.1590/S0104-1290202322... . O fato de que a perspectiva de gênero informe e subsidie políticas comprometidas com o que faz um corpo ser designado como feminino – nomeadamente, a capacidade reprodutiva –, em vez de políticas voltadas para habitação, imigração, empregos, agricultura, mobilidade, meio ambiente, é algo a ser urgentemente ponderado. A que complexo conjunto de problemas a evocação de gênero no âmbito do Estado responde?
No período que compreende a PNAISM, de 2003 a 2005, vê-se que o esforço para a transversalização de gênero entre as pastas ministeriais foi mais bem sucedido nas áreas de saúde e educação, do que em outras como economia, segurança pública, relações exteriores e casa civil. Indo além, ao considerar a transversalização de gênero no governo federal brasileiro, a partir dos anos 2000, pode-se pensar em duas camadas de composição: na primeira, a saúde se sobressai como o campo que se mostrou mais permeável às demandas feministas; e, na segunda, dentro das políticas públicas de saúde, algumas das pautas dos movimentos sociais mais palatáveis aos projetos de governo foram mais bem sucedidas na conquista de espaço3737 Diniz CSG, Cabral CS. Reproductive health and rights, and public policies in Brazil: revisiting challenges during covid-19 pandemics. Glob Public Health. 2022;17(11):3175-88. DOI: https://doi.org/10.1080/17441692.2021.1995463
https://doi.org/10.1080/17441692.2021.19... . O engajamento de movimentos feministas com o Estado conseguiu, na saúde, uma articulação singular com as tecnologias de governo de modo a inscrever, mesmo que de modo instável, suas marcas na política pública.
Na RC, a priorização da assistência a gestação e parto, em consonância com os ODM, valeu-se do arcabouço de movimentos sociais, como a Rehuna4444 Rosa H, Cabral CS. Uma cidadania da fertilidade – as políticas de saúde da mulher como tecnologias de produção do sexo e do gênero. Saúde Soc. 2023;32(2):1-13. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-12902023220534pt
https://doi.org/10.1590/S0104-1290202322... . O uso da linguagem dos direitos a fim de promover o materno-infantilismo e sufocar temas como sexualidade e aborto mostrou-se um recurso importante para firmar apoios partidários3131 Castro MS. A integralidade como aposta: etnografia de uma política pública no Ministério da Saúde [tese]. Brasília, DF: Universidade de Brasília; 2012. 343 p.. Tais alianças conservadoras forçaram um recuo na diretriz da integralidade e na agenda feminista para a saúde da mulher, demonstrando a frágil institucionalidade de políticas como a PNAISM e também as disputas em torno do papel da mulher na sociedade.
Os reveses pela ampliação de políticas públicas baseadas em direitos humanos apenas aumentaram nos anos recentes4545 Brandão E, Cabral CS. Sexual and reproductive rights under attack: the advance of political and moral conservatism in Brazil. Sex Reprod Health Matters. 2019;27(2):76-86. DOI: https://doi.org/10.1080/26410397.2019.1669338
https://doi.org/10.1080/26410397.2019.16... . A perda de direitos para as mulheres no Brasil é alarmante e, considerando que estamos no início de uma nova gestão federal, interessa observar por onde transitarão o debate e as propostas para a saúde da mulher e qual articulação se costurará com os movimentos sociais feministas.
Considerações finais
A análise mostrou que o Estado é habitado por forças não conciliadas entre si que sofrem inflexões ao longo do tempo, de acordo com as distintas conjunturas. Entre os aspectos mais relevantes das políticas analisadas, destacou-se a relação entre Estado e movimentos sociais de mulheres e feministas. A forma final dos documentos de cada normativa revela a influência da incidência do ativismo social na formulação de políticas, tanto no que se refere à concepção de sujeito quanto à de política pública de assistência à saúde. Na PNAISM, política alinhada à perspectiva dos direitos sexuais e reprodutivos, a diversidade de movimentos sociais imprimiu marcas referentes à ampliação dos direitos das mulheres na saúde e à democratização do processo de elaboração de políticas públicas. Na RC, a parceria limitada a um único representante do movimento social gerou empobrecimento do escopo de ações e também do sujeito alvo.
A visibilização de tensões internas aos diferentes movimentos feministas e de mulheres problematiza a universalização da mulher e, consequentemente, de suas condições de vida e necessidades de saúde. O fortalecimento de uma diversificação da agenda à época da PNAISM expandiu a figura de sujeito político ao visibilizar mulheres negras, indígenas, lésbicas, do campo, com deficiência e em situação de privação de liberdade. Nota-se a contribuição fundamental do movimento de mulheres negras para que os feminismos se tornassem mais sensíveis às diferenças e levassem tais demandas aos espaços participativos4646 Carneiro S. Mulheres em movimento. Estud Av. 2003;17(49):117-33. DOI: https://doi.org/10.1590/S0103-40142003000300008
https://doi.org/10.1590/S0103-4014200300... .
A ocupação de cargos nos ministérios por ativistas pelos direitos das mulheres trouxe implicações tanto para os movimentos sociais quanto para o próprio Estado. Para as ativistas, significou estar em negociação permanente da agenda, buscando parcerias entre os gestores, ao passo que para o Estado resultou em assumir um conjunto de proposições, conceitos e prerrogativas no seu quadro de referências.
Identificou-se que a parceria com o Estado praticada pelos movimentos sociais de mulheres e feministas sofreu impactos relevantes dos processos eleitorais (2010 e 2014) para a presidência da República e também em face dos distintos acordos partidários2727 Gonzalez D. Quando feminismos e Estado se encontram(?): Brasil e Chile no “ciclo progressista” [tese]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas; 2019. 191 p.,3131 Castro MS. A integralidade como aposta: etnografia de uma política pública no Ministério da Saúde [tese]. Brasília, DF: Universidade de Brasília; 2012. 343 p.. Ao submergir uma política (PNAISM) e seu respectivo conjunto de paradigmas, em benefício de promover uma outra (RC), o jogo de interesses político-partidário serviu-se de elementos do vocabulário dos movimentos sociais na luta por direitos a fim de concretizar alianças conservadoras. Esse aspecto torna-se especialmente relevante diante do cenário de profundo recrudescimento nos direitos das mulheres experimentado no Brasil nos últimos anos.
Por fim, a análise das políticas aponta para a sucessiva constituição do gênero e do Estado, inclusive no que se refere às disputas por sentido e por poder no domínio público. Nesse cenário, a diferença sexual opera no centro do processo de produção de segregação, ordenamento e hierarquização de corpos, práticas e modos de vida. Portanto, trata-se de considerar o papel estratégico que o sexo e o gênero desempenham na conformação de tecnologias de governo e das dinâmicas estatais.
Suporte financeiro:
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (Capes) – Código de financiamento 001; Processo nº 2023/13347-0, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp); Processo nº 308568/2022-2, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
Agradecimentos
Nossos mais sinceros agradecimentos a Ana Maria Costa e a Elisabeth Meloni Vieira, pela leitura atenta e cuidadosa deste manuscrito e pelos comentários generosos.
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