EDITORIAL EDITORIAL

 

No ano de 1982, iniciamos em Pelotas, Rio Grande do Sul, um estudo de saúde perinatal que incluiu todos os nascimentos ocorridos no ano. Esta pesquisa acabou se transformando em um estudo de coorte que continua ativo até hoje, quando nossos recém-nascidos completam 14 anos de idade. Várias visitas a esta população e outra sendo programada para este ano resultaram em uma extensa produção que incluiu mais de 30 artigos e um livro publicado em português e espanhol. Este livro - A Epidemiologia da Desigualdade - teve o intuito de descrever e analisar as diferenças nos indicadores de saúde conforme a inserção social da família. Após duas edições e tendo o mesmo sido adotado em numerosos cursos na área de saúde coletiva no Brasil e em outros países, podemos dizer que fomos bem sucedidos.

Filosofando um pouco sobre este estudo longitudinal, constatamos que, enquanto as crianças da coorte cresciam, o mesmo acontecia com nosso grupo. Às duas pessoas que iniciaram a investigação agregaram-se, aos poucos, diversos profissionais de diferentes formações, que terminaram por criar o Centro de Pesquisas Epidemiológicas do Departamento de Medicina Social da Universidade Federal de Pelotas, que hoje possui um Curso de Mestrado em Epidemiologia e é um Centro Colaborador da OMS em Nutrição Materno-Infantil.

Pensando nas marcadas transformações sociais e políticas que ocorriam no Brasil durante a década de 80, tínhamos muita vontade de realizar um novo estudo que pudesse ser comparado com o de 1982, avaliando a evolução dos indicadores de saúde e das diferenças sociais. Esta pesquisa estava planejada para 1992, mas um atraso na obtenção do financiamento fez com que somente fosse iniciada em 1993. O intenso trabalho de campo envolvido no acompanhamento de uma nova coorte de recém-nascidos manteve-nos em franca atividade nestes últimos três anos.

Além das coortes de nascimentos de 1946, 1958 e 1970, estudadas na Inglaterra, não temos conhecimento de dois estudos longitudinais de base populacional, realizados no mesmo local em diferentes períodos de tempo. O esforço que dispendemos para a realização desta pesquisa foi imenso e temos muita satisfação em trazer a público os primeiros resultados desta segunda coorte.

Devemos muito aos amigos dos Cadernos de Saúde Pública, pela honra do convite para publicar um número especial com nosso estudo. A aceitação do mesmo forçou-nos a trabalhar intensamente para organizar nossos dados na forma de artigos. Não teríamos avançado com esta rapidez sem o incentivo do editor chefe, Professor Carlos E. A. Coimbra Jr.

Decidimos organizar os artigos mantendo o formato dos capítulos do livro Epidemiologia da Desigualdade. Embora o estudo de 1993 seja bem mais sofisticado metodologicamente do que o de 1982, utilizamos neste suplemento temático as informações dos dois estudos que pudessem ser comparáveis. Esperamos que esta leitura possa colaborar para a compreensão da evolução da saúde materno-infantil em nosso país, assim como para a formulação de medidas concretas que eliminem os importantes diferenciais sociais que ainda persistem.

 

Fernando C. Barros e Cesar G. Victora
Departamento de Medicina Social e Mestrado em Epidemiologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul

 

 

In 1982 we began a perinatal health survey in Pelotas, in the State of Rio Grande do Sul, covering all births occurring that year. This perinatal survey turned into a cohort study that is still going today, with our original neonates now 14 years old. Several visits to this population (the last of which in 1995, with another planned for this year) resulted in the production of extensive knowledge, including more than 30 articles in the scientific literature and a book published in Portuguese and Spanish. The book, entitled The Epidemiology of Inequality, aimed to describe and analyze differences in health indicators based on the family's social status. The book is in its second edition, with 5,000 copies sold, and has been adopted by public health teaching curricula in Brazil and various other countries, and we feel rewarded by its impact.

Reflecting philosophically for a moment on this longitudinal study, we find that while the children from the cohort were growing, the same was happening with our research group. The two individuals who began the survey were joined one by one by professionals from various backgrounds who ended up founding the Center for Epidemiological Research under the Department of Social Medicine at the Federal University of Pelotas, which now has a Master's Programa in Epidemiology and is a WHO Collaborative Center in Maternal and Child Nutrition.

In light of the social and political changes occurring in Brazil during the 1980s, we were excited about the possibility of performing a new study that could be compared with the original one from 1982, assessing trends in health indicators and social differences. This survey was planned for 1992, but due to a delay in funding we were unable to begin it until 1993. Over the last three years we have been heavily involved in the field work of following a new cohort of neonates.

Except for the birth cohorts of 1946, 1958, and 1970 in England, we have no knowledge of two population-based longitudinal studies done in the same place over different periods of time. We have devoted tremendous effort to this study and are very pleased to be sharing the initial results from this second cohort.

We are grateful to our friends from Cadernos de Saúde Pública/Reports in Public Health for the invitation to publish a special issue with our study, thereby providing us with the special incentive to organize our data in article form. We would not have moved forward this quickly without such encouragement from the Editor-in-Chief, Professor Carlos E. A. Coimbra Jr.

We opted to organize the articles under the same format employed in our book The Epidemiology of Inequality. Although the 1993 study is far more sophisticated than that of 1982 in terms of methodology, for the purposes of this special issue we have chosen the data that can be compared for the two years. We hope that reading it will add to the understanding of maternal and child health in Brazil, thereby contributing to the development of concrete measures to eliminate the persistent social differences in our country.

 

Fernando C. Barros and Cesar G. Victora
Departamento de Medicina Social e Mestrado em Epidemiologia, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br