ARTIGO ARTICLE

 

Consentindo ambigüidades: uma análise documental dos termos de consentimento informado, utilizados em clínicas de reprodução humana assistida

 

Consenting to ambiguities: a documental analysis of informed consent forms used in assisted human reproduction clinics

 

 

Vera Mincoff Menegon

Núcleo de Estudos e de Pesquisas sobre Práticas Discursivas e Produção de Sentidos, Pós-graduação em Psicologia Social, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Elegendo a reprodução humana assistida como estudo de caso, este artigo apresenta resultados de pesquisa realizada com termos de consentimento informado, que articulou a compreensão do uso de linguagens sociais ­ com ênfase na linguagem dos riscos ­ e suas implicações nas relações entre profissionais e clientes. A pesquisa qualitativa, na perspectiva da Psicologia Social, apoiou-se na abordagem teórica sobre práticas discursivas, compreendendo a linguagem dos riscos como uma linguagem que permite falar da aspiração de controle futuro dos riscos. Analisaram-se os textos de 27 formulários, cedidos por oito clínicas brasileiras. Além de entender especificidades lingüísticas, buscou-se responder à pergunta: o que está sendo consentido? Os resultados mostraram a ambigüidade desse documento, que pressupõe o uso da metáfora correr ou não correr riscos: ele pode ser democrático, burocrático ou mesmo autoritário; a comunicação de riscos e benefícios subsidia tanto o processo de tomada de decisão como dilui as responsabilidades pela rede relacional.

Consentimento Informado; Técnicas Reprodutivas Assistidas; Linguística


ABSTRACT

With the field of assisted human reproduction as a case study, this article presents the results of a study on informed consent forms, linking the understanding of the use of social languages ­ especially the language of risk ­ and its implications on the relationship between health professionals and clients. Informed by a social psychology perspective and aligned with the qualitative tradition in research, the study was oriented by a theoretical approach to discursive practice, whereby the language of risk is understood as a way of speaking of future control of risks. The analysis centered on the text of 27 informed consent forms provided by eight Brazilian clinics. Besides understanding the linguistic specificities, the analysis attempted to answer the question, "What is being consented to?" The results showed the ambiguity of a document which presupposes the use of the metaphor of taking versus not taking risks. That is, the document may be used in a democratic, bureaucratic, or even authoritarian way, while the communication of risks and benefits subsidizes both the decision-making and the dilution of responsibility throughout the relational network.

Informed Consent; Assisted Reproductive Techniques; Linguistics


 

 

Introdução

O termo de consentimento é um documento recomendado por declarações internacionais, códigos de ética e resoluções e leis específicas, para ser utilizado na prática cotidiana em saúde e na realização de pesquisas envolvendo seres humanos. É, portanto, indicado para as situações em que se empregam tecnologias avançadas, como é o caso da reprodução humana assistida.

A terminologia para expressar a prática do consentimento, que inclui sua forma processual e documental, apresenta variações. Na literatura, principalmente a internacional, a expressão mais familiar para referir, de maneira genérica, a essa prática é Consentimento Informado, em sua versão na língua inglesa Informed Consent. Na legislação brasileira, desde 1996, adota-se a terminologia Consentimento Livre e Esclarecido (CLE), conforme a Resolução do CNS n. 196/96 1, que dispõe sobre ética em pesquisa com seres humanos. Já na Resolução do CFM n. 1.358/92 2, que estabelece normas éticas para a prática clínica de reprodução humana assistida, a terminologia empregada ainda é Consentimento Informado.

Considerando o campo eleito como estudo de caso e as nomeações utilizadas no material analisado, neste artigo, utiliza-se consentimento informado como expressão genérica dessa prática e documento ou termo de consentimento informado, para os textos formulados pelas clínicas de reprodução assistida, destinados a pessoas que buscam seus serviços.

A literatura consultada sobre o consentimento informado aponta que existem diferentes compreensões sobre essa prática. Por um lado, é significada como um processo que humaniza as relações, tanto por significar respeito pela autonomia de pacientes como por se constituir em proteção aos profissionais, emergindo, assim, como uma estratégia de gestão das relações e das técnicas empregadas. Por outro lado, é compreendida também como uma prática ambígua e problemática, cujas dificuldades parecem aumentar com a complexidade do aparato biomédico empregado, principalmente ante a assinatura de um documento.

Foi considerando tanto a complexidade biomédica como a psicossocial que se escolheu a reprodução assistida como estudo de caso. Elegeu-se, então, a versão documental do consentimento informado como foco de análise, buscando entender as linguagens sociais utilizadas, com atenção especial à linguagem dos riscos e suas implicações para a relação entre profissionais e clientes dessa tecnologia.

Neste artigo, para dar uma visão dos temas que se entrelaçam no estudo, discutem-se aspectos históricos e contextuais do consentimento informado, da linguagem dos riscos e da reprodução assistida. Na seqüência, apresenta-se o núcleo da pesquisa, incluindo delineamento teórico-metodológico, discussão e comentários finais.

 

Sobre a prática do consentimento informado

Apesar de traços mais antigos, a prática do consentimento informado é relativamente recente na rotina dos serviços de saúde. Suas trajetórias mostram o entrelaçamento entre os campos biomédico, jurídico-legal e filosófico, apresentando em sua matriz, conforme conceito de Hacking 3, reflexões éticas sobre direitos e deveres de pacientes e profissionais, alimentadas por situações-chave, tais como: processos por erro médico; o julgamento e Código de Nüremberg (e mais tarde a Declaração de Helsinque) e os avanços da biotecnologia moderna, com a concomitante formação do campo bioético 4.

É comum citar o Código de Nüremberg, formulado no final de 1946 e que utiliza a nomeação consentimento voluntário do paciente humano 5, como marco do consentimento informado. Esse código, entretanto, vincula-se mais à obtenção de consentimento para pesquisa do que para rotina assistencial, cuja trajetória remete aos processos legais impetrados contra médicos, ocorridos nos Estados Unidos, a partir da passagem para o século XX. Nessa ocasião institui-se a necessidade de comunicar possíveis riscos antes da intervenção; na década de 1950 é nomeado de consentimento informado, em sua versão na língua inglesa, informed consent 6.

Todavia, a prática do consentimento, envolvendo a assinatura de documento, adquiriu visibilidade na década de setenta com a aceleração e a complexidade da biotecnologia moderna, que levou ao maior controle de pesquisas com seres humanos e do emprego de novas tecnologias 7. Nessa década "tudo explodiu: problemas relacionados com aborto, definição e determinação da morte, eutanásia e prolongamento da vida, o uso de técnicas de controle do comportamento, intervenção genética e tecnologias reprodutivas" 6 (p. 92).

Dessa maneira, além dos códigos de ética e resoluções para procedimentos de rotina e de pesquisa, passou-se a promulgar leis visando ao controle da utilização de tecnologias, seja por estas suscitarem controvérsias culturais e religiosas, seja pelo temor de riscos e de incertezas associados às inovações científicas 8. A reprodução assistida, como se discute mais adiante, é uma dessas tecnologias sob regulamentação em vários países.

O diálogo entre os campos legal e filosófico e suas controvérsias, serve de referendum à prática do consentimento informado na saúde 7,9,10. A abordagem Legal garante ao paciente o direito de consentir ou recusar, mas o foco está localizado no médico que tem um dever a cumprir e se arrisca ser responsabilizado ao falhar; já a Filosofia Moral privilegia o paciente que "tem direito à escolha autônoma" 6 (p. 4).

Entrelaçando noções de cidadania e direitos do consumidor, as práticas discursivas sobre o consentimento informado, na literatura, falam da tensão entre riscos e benefícios, direitos e deveres, autonomia e beneficência, liberdade e responsabilidade, controle e confiança, alimentando diferentes posições.

Alguns autores reconhecem problemas, mas acreditam na melhoria do processo, pressupondo um indivíduo racional e autônomo que, bem informado, toma decisões válidas 7,10,11. Outros ressaltam particularidades e dificuldades de algumas situações como, por exemplo, a reprodução assistida em que estão implicados dois ou mais pacientes 12; outros autores, ainda, criticam o padrão individual de consentimento informado para situações que remetem à esfera coletiva, como no uso de informações genéticas armazenadas em bases de dados 13. Por último, questiona-se a eficácia do consentimento informado para mediar relações pluralizadas, em uma biomedicina cada vez mais complexa (centros cirúrgicos, UTI, diagnósticos avançados etc.) e distante da tradicional díade médico-paciente 14.

 

Sobre a comunicação dos riscos

Dentre as informações, incluídas em documentos destinados a obter o consentimento de clientes na área da saúde, destaca-se aqui a comunicação de riscos, benefícios e alternativas ao tratamento 1,7,15,16. Os riscos comunicados baseiam-se em cálculos probabilísticos fornecidos por abordagens técnico-científicas, que se limitam ao cálculo de riscos (danos) físicos 7,17. A racionalidade da comunicação, por sua vez, alinha-se à abordagem da Economia sobre riscos, cujo equilíbrio entre riscos e benefícios é dado pelo denominador comum satisfação pessoal 17.

Correr riscos é uma das metáforas mais fortes que emergiu na área da saúde para enfrentar riscos 18. O estilo de vida é a face famosa dessa estratégia de autocontrole e prevenção de riscos, sendo a educação continuada um de seus pilares. Nessa vida aprendiz privilegia-se aspectos como incentivo ao consumo, busca incessante de melhoria, monitoramento da saúde e o gerenciamento, sem fim, de possíveis riscos. Nessa ótica, sob a supervisão de especialistas, a pessoa deve exercer o poder de escolha e de decisão, ficando responsável pelo controle dos riscos 19.

Essa lógica de escolha não se restringe às situações limite, pois uma cultura permeada pela linguagem dos riscos pressupõe que sempre se decida se é válido correr este ou aquele risco 20. Assim, a decisão de ter um filho implica correr riscos, independente dos graus desses riscos. Na reprodução assistida, a força inscrita nessa metáfora adquire maior potência diante das incertezas e das dificuldades.

Na perspectiva científica, falar de risco pressupõe conhecer danos e probabilidade de ocorrência. Os danos, entretanto, podem ser conhecidos, mas não sua probabilidade. Por outro lado, mesmo conhecendo a probabilidade, o controle será sempre na medida do possível 21. Essa arena abre-se à polissemia de sentidos, pois até conceitos formais de risco dependem de cálculos abstratos, baseados na presumível identidade entre o possível e o provável. Definir risco é tarefa que passa por valores sociais 21,22, daí a relevância do gerenciamento no emprego de tecnologias de ponta.

 

Sobre a reprodução humana assistida: benefícios e riscos

Considerando o potencial de transformação da vida, a biotecnologia moderna foi classificada como a terceira tecnologia estratégica do pós-guerra ­ em primeiro vem a energia nuclear e em segundo a tecnologia de informação 8. Inter-relacionadas à biotecnologia moderna, as técnicas para reprodução assistida redefiniram as formas e os limites da concepção humana e relações de parentesco, conforme mostram estudos realizados na Antropologia 23 e na Filosofia 24.

O marco dessa transformação é Louise Brown, o primeiro bebê fruto de fertilização em laboratório, que nasceu na Inglaterra em 1978 ­ Ana Paula, o primeiro bebê brasileiro por fertilização in-vitro, nasceu em 1984 11. Oliveira & Borges Jr. 11 (p. 12) relatam que nos anos oitenta, com mais de cem nascimentos, "a fertilização in-vitrodeixou de ser um assombro para a sociedade, que começou a se preocupar com os conflitos inerentes às novas técnicas, verificando-se a necessidade mundial de regulamentação das práticas". No Reino Unido, por exemplo, essa regulamentação tem força de lei e consta do Código de Prática 15; no Brasil, conforme menção anterior, a Resolução CFM n. 1.358/92 2 estabelece apenas normas éticas para a prática clínica desse campo, sem força de lei.

Visando a uma legislação para esse campo, há dois Projetos de lei (PL 3.638/93, atual PLC 00054/02, e PLS 00090/99, atual PL 01184/03) em tramitação no Congresso Nacional ­ o primeiro é uma réplica da Resolução CFM n. 1.358/ 92 25. As práticas desse campo, todavia, estão sob o Código de Ética Médica, conforme Resolução CFM n. 1.246/88 5; sob a Lei Federal n. 8.974/95, que versa sobre "o uso das técnicas de engenharia genética e de organismos geneticamente modificados" 26 (p. 118) e, no campo da pesquisa, sob a Resolução do CNS n. 196/96, já referida anteriormente.

No Brasil, contando com 117 clínicas, distribuídas por 18 estados 27, a reprodução assistida continua palco de debates, conforme aponta o título do artigo Quem Tem Medo das (Bio) Tecnologias de Reprodução Assistida? 28, texto este que compõe o Simpósio: Aspectos Éticos da Reprodução Assistida, publicado na revista Bioética do Conselho Federal de Medicina brasileiro.

É relevante compreender que a importância desse campo não se resume à oferta de novas técnicas, pois seu potencial de transformação depende, também, de novas demandas, que surgem tanto pela busca de ter um bebê como pela qualidade desse bebê. Na demanda por um bebê, enquadram-se as infertilidades de homens e mulheres (a procura mais tradicional), pessoas que se submetem à quimioterapia, mulheres na menopausa (precoce ou não), casais do mesmo sexo e pessoas sozinhas. Na demanda pela qualidade o que está em jogo não é apenas ter um bebê. Pertencem a esse grupo portadoras(es) de doenças genéticas, casais que querem selecionar o sexo de seus bebês ­ apesar da controvérsia 24 ­ e, mais recentemente, portadores do vírus HIV ou da AIDS que podem recorrer a essas técnicas.

Além da complexidade do tratamento, a viabilização dessas demandas depende de legislações, de padrões éticos das clínicas e dos clientes, e de fatores econômicos, pois os serviços públicos são poucos e os planos de saúde não cobrem o tratamento 4.

 

Aspectos teórico-metodológicos

Inserido na tradição qualitativa de pesquisa, na perspectiva da Psicologia Social, o estudo realizado 4 apoiou-se na abordagem teórico-metodológica sobre práticas discursivas e produção de sentidos 29, em sua articulação com estudos sobre a linguagem dos riscos 30,31.

Tradicionalmente utilizada no mundo econômico das trocas e das apólices de seguros, nos esportes radicais e no campo médico, a linguagem dos riscos exibe repertórios prototípicos como cálculo, probabilidade e possibilidade, associados a outros vocábulos como índices, taxas e porcentagens de sucesso, de chance, de danos, de perigos, de falhas, de insucesso etc. Na perspectiva adotada, a linguagem dos riscos é compreendida como uma linguagem social que permite falar da aspiração de governo e controle futuro de riscos, num jogo entre eventos passados e projeções futuras, agregando repertórios e sentidos produzidos em esferas sociais específicas.

Como apoio conceitual e contextual consultou-se literatura sobre as duas temáticas, consentimento informado e reprodução assistida, incluindo entrevistas com representantes de sociedades médicas no campo reprodutivo, a participação em congressos dessa área e conversas com pesquisadores e profissionais 4.

O foco da análise, entretanto, foram os textos dos documentos usados para obter o consentimento de pacientes que utilizam técnicas de reprodução assistida. Privilegiando as práticas discursivas de quem oferece o tratamento, analisaram-se as linguagens utilizadas nos textos. Não se trata de análise comparativa entre as clínicas ou entre os diferentes tipos de documentos. O material analisado constou de vinte e sete formulários, sem identificação e sem assinaturas, cedidos por oito clínicas, localizadas no Município de São Paulo, resguardando-se o anonimato, conforme acordo prévio.

A análise orientou-se por três objetivos complementares: compreender especificidades dos textos para consentimento informado, responder à pergunta o que está sendo consentido?, e nessa resposta, articular a análise do uso da linguagem dos riscos.

Apresentando os termos de consentimento informado

A reprodução assistida no Brasil é um campo em organização. Cada clínica é responsável pela formulação do texto de seus documentos e os formulários seguem parâmetros gerais, sem modelos oficiais ou obrigatoriedade de uso 4.

Conforme exemplos da Tabela 1, organizou-se o material em dois grupos: (1) Técnicas Principais, destinadas à fertilização propriamente dita; (2) Técnicas Auxiliares, que agregam documentos de consentimento para: (a) doação e recepção de material genético e biológico, (b) criopreservação (congelamento e descongelamento) e (c) testes de prevenção.

Metodologia de análise

Delineada ao longo da pesquisa, a metodologia de análise observou duas etapas. Na primeira, de cunho descritivo, analisaram-se aspectos lingüísticos dos textos e seu uso como prática discursiva e, visando a segunda etapa, produziram-se quadros de visualização dos textos e quadros associativos com repertórios da linguagem dos riscos.

Nos quadros de visualização (Tabela 2), mantendo a seqüência original, distribuiu-se cada texto seguindo duas classificações: afirmações categóricas (que expressam compromisso, controle e certezas) e afirmações abertas (que falam de resultados, possibilidades, probabilidades, dúvidas e incertezas). Essa classificação considerou aspectos estruturais da linguagem, utilizando o conceito de modalidades textuais 32 e sua inter-relação com a linguagem dos riscos, no jogo entre o possível e o provável 31, inserindo-se nas afirmações não-categóricas ou abertas.

Com base nesse conjunto de dados, na segunda etapa buscou-se responder à pergunta o que está sendo consentido?, elegendo-se quatro maneiras de consentir, que se mostraram centrais para compreender especificidades dos termos de consentimento na reprodução assistida e o que se consente ao assinar esse documento, a saber: (1) consentindo os serviços de uma determinada clínica; (2) consentindo regulamentações e normas éticas; (3) consentindo um conjunto de técnicas; (4) consentindo possíveis resultados ­ enfocando o uso da linguagem dos riscos.

 

Discussão: consentindo ambigüidades

Que documentos são esses?

O conjunto dos textos analisados caracteriza-se pela hibridização de linguagens sociais, destacando-se: (1) a biomédica para comunicar aspectos técnicos, exibindo repertórios já típicos da reprodução assistida como pré-embrião excedente, doação de material genético, doação e recepção de pré-embriões, ovodoação, doação temporária de útero, ficando com os mais emblemáticos; (2) a linguagem dos riscos, com função pragmática na comunicação de possíveis riscos e benefícios; (3) a linguagem dos direitos, num entrelaçamento das áreas jurídico-legal e filosófica (moral, ética e bioética), que transitam entre direitos e deveres.

Essa diversidade organiza-se como gênero de fala 33 do tipo contratual (contrato, requerimento, declaração, autorização), aproximando-se do que Fairclough 32 nomeia de "gênero de governo", que remete a noções de gestão e auditoria, com efeitos na órbita do Direito. Inicialmente endereçado aos clientes, ao ser assinado, teoricamente é reendereçado a quem possa interessar: que inclui quem assina, órgãos auditores (internos ou externos à clínica) e tribunais, em caso de processos legais.

O consentimento documental funciona como forma de gestão da relação entre profissionais e pacientes, entre a clínica e seus profissionais e outros órgãos oficiais. Independente da assinatura de documento, informar remete à tradição de governar por meio da educação em saúde ­ que viabiliza a autogestão 18. Essa é uma das ambigüidades do consentimento informado. Por um lado, ao se disponibilizar informação, democratizam-se as relações entre profissionais e clientes. Por outro, em nome da garantia de direitos e de deveres, impõe-se uma prática discursiva contratual que restringe o diálogo.

Uma relação face a face pode garantir o respeito pela autonomia de decisão independente de assinaturas. Depreende-se, então, que a importância do documento está na esfera legal: dependendo da formulação, pode servir mais como proteção ao profissional e à clínica do que ao cliente. Todavia, pode também servir como garantia de reconhecimento da paternidade da criança gerada.

O que está sendo consentido?

Em princípio consente-se a mediação de terceiros nos processos reprodutivos, que se materializam numa rede de profissionais da saúde, clientes, doadores de material genético ou biológico, tecnologia desenvolvida para essa finalidade (técnicas, laboratórios, instrumentos, clínicas, hospitais etc.) e regulamentações de órgãos oficiais. A decisão de participar de um programa para reprodução assistida prende-se, portanto, a um campo relacional de materialidades: falas, textos escritos, imagens, emoções, corpos, equipamentos, leis, arquitetura, enfim, tudo o que viabiliza e ordena o campo da reprodução assistida, utilizando aqui a noção de redes sociais de Law 34.

Nessa perspectiva, ao consentir submeter-se aos serviços de uma clínica aceitam-se suas estruturas físicas (consultórios, laboratórios, hospitais, UTI, equipamentos etc.) e humanas (pessoas da equipe e sua capacitação profissional). Considerar esses aspectos é compreender os limites da prática do consentimento informado, que não deve substituir serviços deficientes 14, uma vez que a falta de ética começa no exercício profissional sem qualificação e não apenas em não informar sobre a desqualificação.

As normas éticas e regulamentações vigentes também estão nessa rede e são aceitas na assinatura do documento. A análise das referências, feitas nos termos de consentimento, sobre a Resolução do CFM n. 1.358/92 mostra que as normas são negociadas, indicando que a autonomia de decisão prende-se tanto a regras e normas pré-estabelecidas como a variações interpretativas. O destino dos chamados pré-embriões excedentes é um exemplo: alguns documentos afirmam que os pré-embriões têm dois destinos: ser "criopreservados ou doados", "não podendo ser descartados ou destruídos". Outros, baseando-se em documentos complementares à Resolução, incluem em seu destino a pesquisa e o descarte após três anos.

No consentimento que se dá ao conjunto de técnicas, uma intervenção pode precisar de termos de consentimento complementares como para criopreservação e uso de material genético de terceiros. A análise dos documentos mostrou que a descrição das técnicas e procedimentos é sempre problemática, seja em texto compacto, seja em texto mais extenso. Algumas clínicas formulam textos intermediários, buscando superar o problema da informação com folhetos, reuniões e aconselhamento. Em última instância, depende-se do compromisso ético de cada clínica e do grau de agenciamento da clientela. Não se nega, entretanto, que o termo de consentimento informado pode desencadear a necessidade de esclarecimentos.

Finalmente, ao assinar esse documento, consente-se a projeção de possíveis resultados da intervenção. Ao falar do possível e do provável, a linguagem social dos riscos assume papel nuclear. Conforme discussão anterior, na racionalidade que rege a prática do consentimento informado, o indicador satisfação pessoal faz parte da relação risco-benefício.

O maior benefício da reprodução assistida é ter um bebê. Nos textos, esse benefício é comunicado com repertórios como probabilidades de sucesso, possibilidades de obter uma gravidez, taxas de sucesso etc. Assim, o termo de consentimento de uma clínica informa que a taxa de sucesso está "ao redor de 35% de se obter uma gestação e de 28% para uma gestação a termo"; outro anuncia que as taxas variam de "15 a 52%". O risco de não-engravidar, entretanto, não é comunicado em porcentagens, mas em expressões como "não há garantia", a clínica tem "obrigação de meios e não de resultados", "gestação pode não ocorrer" e "não se responsabiliza pelo êxito" 4.

A comunicação de riscos refere-se a insucessos, falhas, acidentes e danos. Alguns reportam às causas da não-fertilização, dentre elas: "óvulos e ou espermatozóides de baixa qualidade", "insucesso no processo de estimulação ovariana"; outros a danos físicos para a mulher como "reações aos anestésicos durante a captura dos oócitos", "síndrome de hiperestímulo ovariano patológico grave" etc.; outros, ainda, referem-se à gravidez propriamente dita, afetando a mulher, o feto ou o bebê, como é o caso da gravidez múltipla que, em alguns textos de consentimento, é classificada como um risco inerente 4.

A comunicação da gravidez múltipla como risco inerente à reprodução assistida mostra uma outra face da ambigüidade presente nos textos. Primeiro, o repertório risco inerente naturaliza um risco que é fabricado 35, pois resulta do número de embriões transferidos para o útero da mulher. Segundo, por ser risco um termo polissêmico, a gravidez múltipla pode não ter o sentido de risco (como dano) para quem deseja uma gravidez. Como afirma Spink 18 (p. 170): "risco é a possibilidade de perda de algo que tem valor para nós".

O profissional cumpre o seu dever ao informar que esse tipo de gravidez é de alto risco. Entretanto, mesmo que a mulher a compreenda como risco, teoricamente, salvo autorização judicial, o profissional não pode oferecer a técnica de redução embrionária para minimizar esse risco fabricado ­ a Resolução do CFM n. 1.358/92 autoriza a transferência de quatro embriões, mas proíbe a "redução embrionária". Compreendida como mal necessário 36, essa técnica levanta controvérsias culturais e religiosas ao ser associada ao aborto. Contrapõe-se, então, o dever de seguir as normas, o dever de minimizar os riscos e o direito da mulher de decidir correr ou não o risco da gravidez múltipla.

Informar sobre a possibilidade de riscos desconhecidos é também uma forma de gestão, e, ao mesmo tempo, reforça a ambigüidade da linguagem dos riscos. Dentre os documentos pesquisados, encontrou-se a informação que diz: "não obstante, como em todo processo tecnológico novo como é a fertilização assistida, existem riscos ainda não identificados" 4. Essa informação alerta para a imponderabilidade ou mesmo ignorância de possíveis riscos.

Em resumo, na racionalidade do consentimento informado, a comunicação de riscos e de benefícios favoreceria a tomada de decisões esclarecidas e conscientes. Na reprodução assistida, quem se submete ao tratamento não tem controle sobre os riscos comunicados, estes dependem mais dos profissionais. A metáfora em pauta, portanto, é correr ou não os riscos comunicados. Exceto riscos associados ao estilo de vida, que se postula devam ser evitados, correr riscos na área materno-infantil significa vencer obstáculos e adversidades. Em geral a mulher não é incentivada a correr riscos no campo da aventura, mas para fins de maternidade é culturalmente aceito e até incentivado 20. Nessa perspectiva, levar adiante uma gravidez de risco (como a gravidez múltipla) ou vencer as adversidades presentes nas tentativas de engravidar por meio da reprodução assistida, pode ter o sentido de ato heróico.

A comunicação de riscos e benefícios, além de subsidiar a tomada de decisão apresenta uma outra função: a distribuição de responsabilidades. Na lógica do consentimento informado, o profissional tem o dever de comunicar possíveis riscos, benefícios e tratamentos alternativos. Ao cumprir esse dever as responsabilidades são redistribuídas e diluídas pela rede social de relações, em diferentes níveis.

Ao se afirmar que as causas responsáveis pelos insucessos e falhas são os óvulos de baixa qualidade, o esperma ausente, o pré-embrião anormal ou falhas da técnica, a responsabilidade vai para o material genético, máquinas, técnicas etc., distanciando-se de conceitos clássicos como responsabilidade civil, legal ou moral.

A classificação de riscos como inerentes à tecnologia é uma outra forma de distribuição de responsabilidade. No caso da gestação múltipla, em alguns documentos classificada como risco inerente à reprodução assistida, as responsabilidades diluem-se na rede de relações: a própria técnica; as normas que permitem a transferência de quatro embriões e proíbem a redução embrionária; os profissionais que fazem a transferência e os(as) clientes que aceitam correr os riscos comunicados.

A análise dos documentos de consentimento informado mostrou também que a relação de responsabilidade dos profissionais, quanto aos resultados, é de não-responsabilidade, contando com respaldo legal, pois o que se estabelece entre profissional e paciente é uma relação contratual de meio e não de resultados 11.

Em síntese, sem entrar no mérito de como a comunicação é feita, ao comunicar possíveis riscos, o profissional e a clínica cumprem seu dever. Por outro lado, a relação contratual selada pela assinatura do termo de consentimento informado promove a passagem de responsabilidades. Quem consente, teoricamente, assume a responsabilidade de correr os riscos comunicados.

 

Comentários finais

O processo de obtenção de um consentimento que seja Livre e Esclarecido, imprimindo aqui a força dessa nomeação, mostra-se uma prática vulnerável. Pode estar a serviço de relações democráticas, mas também a usos burocráticos e até autoritários. A formulação de documentos híbridos carrega ambigüidades presentes tanto na linguagem como nos endereçamentos e finalidades a que se prestam.

A linguagem dos direitos carrega a ambigüidade instituída no diálogo filosófico-legal, entrelaçando e contrapondo noções como direitos e deveres, que são interpretadas por ordens legais, éticas, morais e sociais. A linguagem dos riscos também apresenta ambigüidades, uma vez que sua racionalidade move-se entre objetividade e subjetividade, cuja comunicação de riscos e benefícios fala do possível e do provável, do calculável e do imponderável.

Na reprodução assistida essas ambigüidades ficam evidentes. Os riscos físicos e psicossociais podem ser da ordem do não-calculável ou do desconhecido e as responsabilidades ficam diluídas pelas redes de relações: órgãos que regulamentam (com efeitos na órbita do Direito); relação médico-paciente, que é múltipla e não binária, representada pela equipe (várias especialidades) e por diferentes usuários (mulher e homem, que podem também ser doadores e receptores de material genético).

Essa rede indica por que os documentos de consentimento informado privilegiam a ordem legal, evidenciada no gênero contratual e nos conteúdos. Mesmo que o Brasil não tenha tradição de processos legais, fundamentados na falta ou deficiência de comunicação dos riscos 9, a ênfase legal mostra a cautela das clínicas diante de conseqüências futuras, com destaque para possíveis processos contra profissionais e para a necessidade de garantir a paternidade, principalmente quando há doação ou recepção de material genético.

Uma tecnologia com o potencial de transformação da humanidade não pode prescindir de regulamentações. O termo de consentimento informado faz parte desse esforço de gestão, mostrando-se como estratégia necessária, mas não suficiente. A obtenção da assinatura em um documento como prova da isenção de responsabilidade da clínica, mesmo que legítima, não contribui para o fortalecimento de relações de confiança entre profissionais e clientes.

A reprodução assistida trouxe benefícios, mas também enigmas e riscos fabricados. Um exemplo são as controvérsias sobre a técnica ICSI (injeção de espermatozóide no citoplasma do óvulo) em que especialistas alertam para riscos agora conhecidos, dentre eles a transmissão de infertilidade 37.

A discussão de incertezas que envolvem futuras gerações não pertence à esfera individual e nem à lógica de mercado. A responsabilidade é das pessoas que desenvolvem novas técnicas, das que aplicam essas técnicas e das pessoas que buscam esses serviços. Mas é, também, responsabilidade de órgãos fiscalizadores e legislativos, de comitês de ética e de bioética, de universidades que desenvolvem pesquisas (técnicas ou psicossociais) e de organizações não-governamentais. Enfim, o debate diz respeito ao conjunto de cidadãos e cidadãs, que garantem o consentimento coletivo para diferentes práticas e relações sociais, conferindo legitimidade a um Consentimento Livre e Esclarecido no âmbito individual.

 

Agradecimentos

Este trabalho é parte da Tese de Doutorado em Psicologia Social, apresentada à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em 2003, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Agradecimentos especiais às clínicas de reprodução humana assistida que cederem os documentos de consentimento informado para a pesquisa.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Vera Mincoff Menegon
Al. Girassóis 302, R-6 Alphaville
Santana de Parnaúba, SP
06500-000, Brasil
mincoff@uol.com.br

Recebido em 12/Nov/2003
Versão final reapresentada em 12/Fev/2004
Aprovado em 01/Mar/2004

Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@ensp.fiocruz.br