A Longevidade que presenciamos hoje em nível global - e certamente no Brasil - é uma revolução. Já vivemos trinta ou mais anos que nossos avós. As implicações desse processo vão além da dimensão individual e atingem os setores legais, de saúde, educação, cultura, trabalho, serviços assistenciais e seguridade social. A longevidade também tem efeito retroativo, com impactos em todas as fases da vida: não são trinta anos a mais de velhice e sim trinta ou mais anos de vida.
Minha primeira impressão sobre um país envelhecido foi na Inglaterra onde fui cursar Mestrado em Saúde Publica em 1975. A partir de então, percebi que o Brasil também envelheceria rapidamente, mas num contexto de pobreza, diferente dos países desenvolvidos que primeiro se enriqueceram para depois envelhecerem. Dei-me conta, anos mais tarde, de que o envelhecimento brasileiro acontecia de forma extraordinariamente comprimida: nossa expectativa de vida hoje ultrapassa a da Inglaterra dos anos 1970 e a taxa de fecundidade ficou no limiar da reposição em poucos anos.
Meus 20 anos de experiência acadêmica em Londres e Oxford somaram-se ao período em que dirigi o Departamento de Envelhecimento e Saúde da OMS e ajudaram-me a formular o Marco Político do Envelhecimento Ativo, assim definido pela OMS: o processo de otimizar as oportunidades para Saúde, Educação Continuada, Participação e Segurança (Proteção) de modo a aumentar a qualidade de vida à medida em que envelhecemos. Quem envelhece com saúde e conhecimentos pode participar plenamente da sociedade. Na falta dessas condições, é indispensável prover proteção e segurança para que o idoso não se sinta abandonado. Por isso, uma política que atenda à Revolução da Longevidade deve promover os quatro capitais essenciais para o bem envelhecer: atenção à saúde; acesso a conhecimentos; condições financeiras, pelo menos renda mínima; e suporte e cuidado da família, amigos e pessoas próximas.
A Revolução da Longevidade requer adotar uma perspectiva de curso de vida. O jovem de hoje será o idoso de amanhã. Para entendermos um idoso, olhemos para trás, para o modo como levou a vida e se tornou quem é hoje. Por isso, é indispensável considerar os determinantes do envelhecimento ativo: de acesso a serviços sociais e de saúde; comportamentais (estilos de vida); pessoais (genéticos, hereditários e de personalidade); ambientais; sociais e econômicos. Esses aspectos são interdependentes, segundo cada cultura e perspectiva de gênero.
No Brasil de hoje se envelhece melhor do que há 40 anos. Primeiro, porque na Constituição de 1988 a saúde passou a ser um direito de todos e também dos idosos. É preciso melhorar os serviços, mas, não se morre mais a míngua ou à espera do gesto de uma pessoa caridosa. Segundo, pela política de renda mínima. Mesmo sendo distribuído apenas um salário mínimo, para muitas famílias, o idoso deixou de ser um fardo.
Mas há muito a ser feito: o copo está meio vazio. O Estatuto do Idoso, depois de 10 anos, continua com muitos dispositivos a serem implementados. Falta, uma "Cultura do Cuidado". Vou personalizar o que digo, falando de minha mãe que aos 96 anos já preveniu o que podia ser prevenido, já está tratando o que é tratável. Mas, com Alzheimer, ela precisa essencialmente de ser cuidada e o é. Mas, milhões de idosos chegaram ou chegarão à longevidade sem saber quem vai cuidá-los, num contexto em que a família está cada vez mais fragmentada.
Finalmente, o Brasil é um país melhor hoje para os idosos também porque há mais conhecimento. Há quarenta anos, o envelhecimento estava praticamente restrito a prática médica. Nas últimas décadas o interesse por este domínio do saber aumentou vertiginosamente, como mostra a produção cientifica atestada nos bem elaborados artigos desta Revista.
Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
Ago 2014