Lesão autoprovocada em todos os ciclos da vida: perfil das vítimas em serviços de urgência e emergência de capitais do Brasil

Camila Alves Bahia Joviana Quintes Avanci Liana Wernersbach Pinto Maria Cecilia de Souza Minayo Sobre os autores

Resumo

Caracteriza-se o perfil das vítimas de lesão autoprovocada que procuraram atendimento em serviços de urgência e emergência nas capitais brasileiras, utilizando-se a base de dados do Viva Inquérito 2014. Foi realizada estatística descritiva das lesões autoprovocadas por sexo e análise por regressão logística. As características avaliadas foram: faixa etária, sexo, raça/cor de pele, escolaridade, zona de residência, características do evento, uso de álcool e evolução do atendimento. Os resultados mostram que quase 10% dos atendimentos por violências nos serviços de urgência e emergência pesquisados decorrem de lesões autoprovocadas, com destaque para casos que envolvem mulheres e adultos. Há diferenças entre gêneros, inclusive as relacionadas à escolha do método para cometer suicídio. Alguns fatores geralmente associados às tentativas de suicídio não puderam ser avaliados, porque as informações não estavam contidas no escopo do instrumento de coleta. Conclui-se que o serviço de emergência é muito importante para os estudos de suicídio porque constituem a porta de entrada dos casos que chegam aos serviços. No entanto, dado seu caráter pontual, as informações que emite são muito restritas. Assim, os pacientes necessitam de acompanhamento posterior para prevenção das reincidências.

Tentativa de suicídio; Inquérito; Violência; Serviços de emergência

Introdução

O suicídio é uma autoviolência definido como um ato intencional para acabar com a própria vida11. World Health Organization (WHO). World report on violence and health. Geneva: WHO; 2002.,22. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Geneva: WHO; 2014.. Comportamentos suicidas não fatais aparecem sob a forma de ideação suicida, quando há pensamentos que fomentam o desejo de dar fim à existência e se agrava quando acompanhados de um plano suicida sobre o método de autoaniquilamento. A tentativa de suicídio envolve condutas voltadas para se ferir em que há intenção de se matar, podendo resultar em ferimento ou morte. Se a tentativa de suicídio resulta em morte, passa a ser definida como suicídio. Já o comportamento suicida se refere a um tipo de conduta da pessoa que busca se ferir ou se matar. A lesão autoprovocada é a violência que a pessoa inflige a si mesmo, podendo ser subdividida em comportamento suicida e em autoagressão (engloba atos de automutilação, incluindo desde as formas mais leves, como arranhaduras, cortes e mordidas até as mais severas, como amputação de membros)11. World Health Organization (WHO). World report on violence and health. Geneva: WHO; 2002.. A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10) considera como autoprovocados, as lesões e os envenenamentos intencionalmente desferidos pela própria pessoa a si mesma e as tentativas de suicídio33. Organização Mundial Da Saúde (OMS). Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde. 10° Revisão. São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; 2009. Vol. I..

Em geral, as fronteiras entre autonegligência, lesão autoprovocada, ideação suicida, comportamento suicida e suicídio consumado são tênues, uma vez que, de um lado, uma tentativa pode ser interrompida e se fixar como ideia ou intenção, enquanto um pensamento pode eclodir com angústias e ansiedades avassaladoras e explodir em forma de ato contra a vida. De outro lado, nem todo o pensamento sobre a morte ou o desejo de morrer é evidência de algum risco22. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Geneva: WHO; 2014.,44. World Health Organization (WHO). The world health report 2003. Shaping the future. Geneva: WHO; 2003.,55. Minayo MC, Souza ER. Suicídio: violência autoinfligida. In: Brasil. Ministério da Saúde (MS). Impactos da violência na saúde dos brasileiros. Brasília: MS; 2005. p. 311-331.. Conforme estudos em todo o mundo, uma morte autoinfligida é pensada, preparada e antecedida por tentativas. Existem suicídios por impulso, mas são raros.

O suicídio fatal se encontra entre as dez principais causas de óbito no mundo atingindo principalmente jovens e jovens adultos, o que tem impacto social, econômico, familiar, comunitário e nas sociedades22. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Geneva: WHO; 2014.. Em 2012, foram registrados pelos 172 Estados membros da OMS, 804.000 mortes autoinfligidas, representando uma taxa anual de 11,4/100.000, sendo 15/100.000 de homens e 8,0/100.000 de mulheres66. DeLeo D, Bille-Brahe U, Kerkhof A, Schmidtke A. Suicidal Behavior: Theories and Research Findings. Gottingen: WHO Regional Office for Europe; 2004.. Contudo, nos mais ricos, o suicídio é responsável por 81% dos óbitos por causas violentas entre homens e mulheres, e nos em desenvolvimento ou subdesenvolvidos, por 44% das mortes masculinas e 70% das femininas. Apesar de terem taxas mais reduzidas, 75% das mortes autoinfligidas ocorrem nos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento que abrigam a maior parcela da população mundial77. Levi F, La Vecchia C, Lucchini F, Negri E, Saxena S, Maulik PK, Saraceno B.Trends in mortality from suicide, 1965-99. Acta Psychiatr Scand 2003; 108(5):341-349..

Os índices de suicídios consumados estão distribuídos desigualmente no mundo22. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Geneva: WHO; 2014.,88. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Saúde Brasil 2014: uma análise da situação de saúde e das causas externas. Brasília: MS; 2015.. O Brasil é o oitavo país em número de suicídios entre os Estados membros da OMS, com média de 24 suicídios/dia. Mas suas taxas são consideradas baixas: ocupa o 73º lugar (entre 4,8/100.000 e 5,5/100.000)99. Minayo MCS. Comportamento suicida e suicídio consumado na velhice. In: Minayo MCS, Figueiredo AEB, Silva RM, organizadores. Comportamento suicida de pessoas idosas. Fortaleza: Editorial UFC; 2016. p. 35-58,1010. Bittencourt SA, Camacho LAB, Leal MC. O Sistema de Informação Hospitalar e sua aplicação na saúde coletiva. Cad Saude Publica 2006; 22(1):19-30..

Sexo, idade, cultura e etnia têm implicações importantes na epidemiologia do suicídio. As taxas globais evidenciam vulnerabilidade para dois picos etários: a faixa de 15 a 35 anos e a de 75 anos ou mais. Os índices variam de 0,9/100.000 no grupo de 5 a 14 anos a 66,9/100.000 entre pessoas com mais de 7544. World Health Organization (WHO). The world health report 2003. Shaping the future. Geneva: WHO; 2003.. Nos países mais ricos, os homens se infligem a morte três vezes mais que as mulheres. Nos países em desenvolvimento essa proporção é menor: 1,5 homens para cada mulher. A exceção fica para a região oeste do Pacífico, onde existe quase uma equivalência (17,6% e 16,6% respectivamente), atingindo particularmente a população de 15 a 29 anos como primeira causa de morte em ambos os sexos. No Brasil essa diferença é de 3:0 a 4:1, conforme a faixa etária22. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Geneva: WHO; 2014.. Quanto à etnia, no caso brasileiro, é relevante o fenômeno entre os indígenas. Outra característica brasileira é a maior concentração das mortes autoinfligidas em municípios de baixo porte populacional1111. Minayo MC, Cavalcante FG. Suicide in elderly people: a literature review. Rev Saude Publica 2010; 44(4):750-757..

Os principais fatores de risco associados ao comportamento suicida são: problemas biológicos, médicos, ambientais, psiquiátricos, psicológicos, filosófico existenciais e por motivações sociais. Os fatores psiquiátricos e psicológicos mais comuns são: depressão, problemas relacionados ao estado de humor e afetivo bipolar; esquizofrenia; ansiedade e transtornos de personalidade; alcoolismo; desesperança e solidão e comorbidades. Intoxicação com estimulantes como cocaína, anfetaminas ou álcool constituem fatores predisponentes frequentes para o suicídio, e são agravantes quando o paciente se encontra deprimido. De todos esses elementos, o álcool é o mais significativo. Algumas pesquisas1212. Mann JJ, Apter A, Bertolote J, Beautrais A, Currier D, Haas A, Hegerl U, Lonnqvist J, Malone K, Marusic A, Mehlum L, Patton G, Phillips M, Rutz W, Rihmer Z, Schmidtke A, Shaffer D, Silverman M, Takahashi Y, Varnik A, Wasserman D, Yip P, Hendin H.Suicide prevention strategies: a systematic review. JAMA 2005; 294(16):2064-2074. mostram traços genéticos que predispõem pessoas de uma mesma família a comportamento autodestrutivo. Pesquisas sobre a base biológica do fenômeno revelam níveis alterados de metabólitos de serotonina no fluído neuroespinhal de pessoas que cometeram suicídio1212. Mann JJ, Apter A, Bertolote J, Beautrais A, Currier D, Haas A, Hegerl U, Lonnqvist J, Malone K, Marusic A, Mehlum L, Patton G, Phillips M, Rutz W, Rihmer Z, Schmidtke A, Shaffer D, Silverman M, Takahashi Y, Varnik A, Wasserman D, Yip P, Hendin H.Suicide prevention strategies: a systematic review. JAMA 2005; 294(16):2064-2074.. Mas, estudos da OMS22. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Geneva: WHO; 2014.,44. World Health Organization (WHO). The world health report 2003. Shaping the future. Geneva: WHO; 2003. consideram que o comportamento suicida pode ser um transtorno psiquiátrico herdado e o suicídio, uma resposta ao padecimento de doenças graves incapacitantes e dolorosas.

Dos fatores microssociais mais importantes estão perdas pessoais, violências, isolamento social, conflitos interpessoais, relacionamentos interrompidos ou perturbados, problemas legais e no ambiente de trabalho. Na infância e na adolescência pesam muito os abusos físicos e sexuais e problemas com a orientação sexual. Entre os jovens, são relevantes as dificuldades de relacionamento com pais, brigas com namorados e solidão. E entre idosos, Duberstein et al.1313. Duberstein PR, Conwell Y, Conner KR, Eberly S.Suicide et 50 years of age and older: perceived physical illness, Family discord and financial strain. Psychol Med 2004; 34(1)137-146. citam traços de personalidade hipocondríaca, fechada, tímida ou excessivamente independente. Do ponto de vista social mais amplo, em sua obra clássica, Durkheim1414. Durkheim E. O suicídio: estudo sociológico. Rio de Janeiro: Zahar; 1982. ressalta que os índices de suicídio são um sintoma da patologia social e da desintegração social. Mas, ressalta que esse fenômeno acontece em todas as sociedades, embora difira de país para país, de época para época e do ambiente urbano para o rural.

Como fatores ambientais ressaltam-se: (1) estressores da vida: conflitos interpessoais, separações, rejeições, perdas, problemas financeiros e no trabalho, e vergonha por algo socialmente reprovado; (2) facilidade de acesso a meios que possibilitem o enforcamento, o afogamento, a queda de altura, o uso de arma de fogo, abuso de medicamentos e venenos; (3) exposição a casos espetaculares, por efeito de vizinhança ou dos meios de comunicação. Ter tentado suicídio anteriormente, ter parentes ou conhecidos que o tentaram ou o cometeram são fortes preditores de comportamentos suicidas11. World Health Organization (WHO). World report on violence and health. Geneva: WHO; 2002.,99. Minayo MCS. Comportamento suicida e suicídio consumado na velhice. In: Minayo MCS, Figueiredo AEB, Silva RM, organizadores. Comportamento suicida de pessoas idosas. Fortaleza: Editorial UFC; 2016. p. 35-58,1515. Turhan E, Inandi T, Aslan M, Zeren C. Epidemiology of attempted suicide in Hatay, Turkey. Neurosciences 2011; 16(4):347-352.

16. Bertolote JM, Fleischmann A. Suicide and psychiatric diagnosis: a worldwide perspective. World Psych 2002; 1(3):181-185.

17. Ima J, Choib SH, Hongc D, Seoc HJ, Parkb S, Hongb JP.Proximal risk factors and suicide methods among suicide completers from national suicide mortality data 2004-2006 in Korea. Compr Psychiatry 2011; 52(3):231-237

18. Minayo MCS, Cavalvante FG.Tentativas de suicídio entre pessoas idosas: revisão da literatura (2002/2013). Cien Saude Colet 2015; 20(6):2423-2430.

19. Larkin GL, Beautrais AL.Emergency departments are underutilized sites for suicide prevention. Crisis 2010; 31(1):1-6.

20. Hoven CW, Mandell DJ, Bertolote JM.Prevention of mental ill-health and suicide: Public health perspectives. Eur Psychiatry 2010; 25(5):252-256.
-2121. DeLeo D, Evans R. International Suicide Rates and Prevention. Guttingen: Hogrefe & Huber; 2004..

Em geral, suicídios, tentativas e autoagressões são subnotificadas, mesmo em países com bons sistemas de informação. Segundo a OMS44. World Health Organization (WHO). The world health report 2003. Shaping the future. Geneva: WHO; 2003., existem evidências de que apenas 25% dos que tentam se matar, entram em contato com hospitais. Chegam aos serviços apenas os casos graves. E mesmo estes costumam ser tratados apenas de forma emergencial quanto às lesões que causam.

O Sistema de Informação Hospitalar brasileiro registrou que as tentativas foram responsáveis por 153.061 das internações de pessoas com idade de 10 anos ou mais no período de 1998 a 2014, o que coloca esse evento como uma das principais causas de hospitalização99. Minayo MCS. Comportamento suicida e suicídio consumado na velhice. In: Minayo MCS, Figueiredo AEB, Silva RM, organizadores. Comportamento suicida de pessoas idosas. Fortaleza: Editorial UFC; 2016. p. 35-58,2222. Martins Junior DF, Felzemburgh RM, Dias AB, Caribé AC, Bezerra-Filho S, Miranda-Scippa A.Suicide attempts in Brazil, 1998-2014: an ecological study. BMC Public Health 2016; 1:8.,2323. Botega NJ.Comportamento suicida: epidemiologia. Psicologia USP 2014; 25(3):231-236.. A situação é mais crítica quando se estima que de cada três tentativas, apenas uma recebeu atenção dos serviços de saúde2323. Botega NJ.Comportamento suicida: epidemiologia. Psicologia USP 2014; 25(3):231-236..

Os serviços de urgência e emergência são os primeiros locais onde as pessoas que tentaram suicídio recebem cuidados, por isso, são estratégicos para a prevenção secundária, a atenção a suas consequências e a redução de custos dos serviços de saúde. No entanto, é um espaço onde ocorrem escassas pesquisas. Desta forma, este artigo busca contribuir para ampliar o conhecimento do fenômeno nesses serviços, mapeando as ocorrências e os potenciais fatores de risco, tendo como espaço serviços de urgências e emergências de capitais brasileiras.

Método

Estudo transversal com base nos dados de atendimento a vítimas de lesões autoprovocadas registradas no Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes (VIVA), em seu componente inquérito. Este inquérito foi realizado no ano de 2014, no período de 30 dias consecutivos, entre os meses de setembro a novembro de 2014. Os turnos foram sorteados através de amostragem probabilística por conglomerado em único estágio estratificado pelo tipo de estabelecimento (emergência geral, unidades de pronto-atendimento, emergências especializadas), sendo o turno a unidade primária de amostragem.

Envolveu 86 serviços de urgência e emergência do Sistema Único de Saúde (SUS), localizados em 24 capitais e no Distrito Federal, onde o tamanho da amostra foi de, no mínimo, 2.000 atendimentos por causas externas, assumindo coeficiente de variação inferior a 30% e erro padrão menor que 3.

Eram elegíveis para a entrevista, todos os atendimentos por causas externas realizados no turno sorteado em cada estabelecimento, sendo excluídos os casos em que o paciente procurou a mesma unidade pelo mesmo motivo. Nos casos em que o indivíduo atendido era uma criança, as respostas eram dadas por seus responsáveis ou pela equipe de saúde que atendeu o caso. Os casos de lesão autoprovocada caracterizados neste estudo decorrem da ocorrência do respectivo agravo que originou o atendimento no serviço de urgência e emergência estudado.

Primeiramente, os casos de lesão autoprovocada foram analisados segundo sexo por variáveis sociodemográficas: faixa etária – criança (0 a 9 anos), adolescente (10 a 19 anos), adulto (20 a 59 anos) e idoso (60 anos e mais); raça/cor da pele autodeclarada; escolaridade em anos de estudo; dia da semana do atendimento; local da ocorrência; zona de residência; meio utilizado no evento; se a lesão autoprovocada foi tentativa de suicídio (em que o entrevistado ou o responsável declarou se a lesão teve intenção suicida); a intencionalidade do ato (autodeclaração se a lesão foi intencional ou acidental); ingestão de bebida alcoólica nas 6 horas anteriores ao evento; natureza da lesão; parte do corpo atingida; e a evolução do atendimento.

Para verificar as associações entre o desfecho de interesse (lesão autoprovocada) e as variáveis independentes, foi realizada análise bivariada por meio do teste qui-quadrado com correção de segunda ordem de Rao-Scott, a qual incorpora o plano amostral complexo, e com nível de significância de 5%.

A seguir foi realizada uma análise bivariada segundo os casos de lesão autoprovocada e os demais casos de violências atendidos nos serviços estudados por variáveis pertinentes à modelagem estatística: faixa etária, sexo, raça/cor, escolaridade em anos de estudo, zona de residência e ingestão de bebida alcóolica nas 6 horas anteriores ao evento. Com a finalidade de verificar associações utilizou-se o teste de Rao-Scott, com nível de significância de 5%. Após essa análise bivariada, as variáveis com um valor de p < 0,20 foram selecionadas para inclusão no modelo múltiplo. Na análise múltipla, foram considerados significativos os valores de p < 0,05 para os fatores associados às lesões autoprovocadas. Todas as análises foram realizadas no pacote estatístico Stata 14, com uso do comando svy, específico para a análise de planos amostrais complexos.

O projeto do VIVA Inquérito 2014 foi avaliado e aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) do Ministério da Saúde, e foi utilizada a concordância verbal das vítimas ou de seus responsáveis ou acompanhantes, quando menores de 18 anos ou quando se tratava de vítima inconsciente.

Resultados

No Viva-Inquérito de 2014 foram registrados 4.949 atendimentos relacionados à violência, sendo 477 (9,5%) decorrentes de lesões autoprovocadas, dos quais 18 (2,9%) envolveram crianças, 94 (18,8%) adolescentes, 348 (74,6%) adultos e 16 (3,7%) idosos.

Da Tabela 1 pode-se verificar que 62,4% das vítimas de lesão autoprovocada eram de cor de pele preta ou parda e 34,3% branca. Na comparação entre os sexos, observa-se que o percentual de brancos entre as mulheres é superior (39,8%) ao dos homens (29,4%), ao passo que entre os pretos/pardos os homens se destacam (67,8% contra 56,3% das mulheres) e entre os indígenas há uma sobreposição feminina (1,9% contra 0,2% dos homens). Constatou-se diferença estatisticamente significativa na distribuição da variável cor da pele segundo o sexo (p = 0,0497). Tal diferença também foi observada para a variável escolaridade (p = 0,027). Interessante perceber que as mulheres se sobrepõem aos homens tanto na mais baixa escolaridade (45,3% contra 37,9%) quanto na mais elevada (11,0% contra 3,2%). Independente do sexo, nota-se que um grande número de vítimas possuía de zero a quatro anos de estudo (41,2%).

Tabela 1
Perfil de vítimas de lesões autoprovocadas atendidas nos serviços de urgência e emergência participantes do VIVA Inquérito 2014, Brasil, N = 477.

Verifica-se que a faixa etária adulta e os dias da semana domingo (18,0%) e terça-feira (16,3%) foram os mais frequentes para atendimento às vítimas de lesões autoprovocadas. Contudo, a análise dos dados não mostra diferença significativa dessas variáveis segundo o sexo. Tanto para homens como para mulheres, o domicílio constituiu o local de ocorrência da maior parte das lesões (86,4%) e os indivíduos residiam majoritariamente na zona urbana (96,9%). No entanto, também não há associação estatística significativa por sexo (Tabela 1).

Quanto aos meios empregados, nota-se que 53,6% das lesões autoprovocadas decorreram por envenenamento (homens = 38,9% e mulheres = 69,4%) e 34,5% por uso de objeto perfurocortantes (homens = 42,6% e mulheres = 25,8%). Observa-se na Tabela 1 que há diferença significativa na distribuição desta variável segundo o sexo (p < 0,001). Chama a atenção o fato de que 9,4% dos homens empregaram o enforcamento para se automutilar, contra 0,7% das mulheres. Outra questão que se mostrou distinta entre os sexos foi quanto à intencionalidade do ato (p = 0,015): assumido como intencional para 80,0% das mulheres e 66,0% dos homens. Em 69,4% das mulheres e 48,5% dos homens (p = 0,002) houve a autodeclaração por parte do entrevistado (ou a declaração do responsável nos casos que envolviam crianças e adolescentes) do evento como tentativa de suicídio. Verifica-se que 30,0% dos indivíduos relataram ter consumido bebida alcoólica nas seis horas precedentes à tentativa, mas sem diferença estatística significativa.

Ainda em relação às características do evento, para ambos os sexos observa-se um predomínio de intoxicação/queimaduras/outras (45,0%) e corte/laceração (33,8%). Contudo, na comparação por sexo, nota-se que cortes/lacerações foram mais frequentes entre os homens (40,7%) e intoxicação/queimaduras/outras (54,5%) se destacaram entre as mulheres (p = 0,009). Com relação à parte do corpo atingida, no grupo feminino em 57,2% dos casos foram envolvidas lesões de múltiplos órgãos/regiões e em 27,6%, membros superiores e inferiores. Já entre os homens, destacam-se, nesta ordem, membros superiores e inferiores (44,4%), múltiplos órgãos/regiões (33,6%) e cabeça/pescoço (14,6%). Verificou-se diferença estatisticamente significativa entre os sexos para a distribuição dessa variável (p = 0,018). Por fim, constatou-se que a maioria dos casos evoluiu para alta após o atendimento (61,4%). Contudo, em 24,5% deles, a internação hospitalar se fez necessária e em 9,2% houve encaminhamento para outros serviços, indiferentemente do sexo dos pacientes.

Na Tabela 2 observa-se a distribuição da variável desfecho (ser vítima de violência autoprovocada) em comparação com os demais casos de violências atendidos nos serviços estudados, segundo variáveis pertinentes para a modelagem estatística. Observa-se diferença estatisticamente significativa para as variáveis faixa etária e sexo (p < 0,001). Na infância são mais frequentes os atendimentos decorrentes por outras formas de violência que não a lesão autoprovocada (11,8% contra 2,9%). Já na faixa etária adulta (20 a 59 anos) se destaca o atendimento por lesão autoprovocada nos serviços estudados (74,6% contra 67,4% dos casos decorrentes por outras formas de violências), apesar da elevada frequência em ambos agravos neste grupo (p < 0,001). Na comparação entre os sexos, a vulnerabilidade feminina se destaca nos atendimentos por lesão autoprovocada, ao passo que entre os homens as outras violências se evidenciam nos atendimentos de urgência e emergência (p < 0,001). Verifica-se predomínio dos indivíduos de cor da pele preta/parda para ambos os sexos, perfazendo mais de 60% dos casos atendidos. A escolaridade também mostra diferença significativa na análise bivariada (p = 0,042). Nota-se maior escolaridade (9 a 11 anos) das vítimas de lesões autoprovocadas (41,2%), em comparação com o grupo que foi atendido por outras violências (32,6%). A zona de residência e o consumo de álcool nas seis horas anteriores não se mostraram distintos entre as pessoas atendidas por lesão autoprovocada ou por outras violências.

Tabela 2
Análise bivariada entre o grupo de lesões autoprovocadas e outras violências atendidas em serviços de urgência e emergência. Brasil.

Após a análise bivariada, procedeu-se ao ajuste do modelo de regressão logística, no qual foram incluídas as variáveis sexo, faixa etária, cor da pele e escolaridade por apresentarem p-valor inferior a 0,2. No modelo final, permaneceram apenas as variáveis sexo e escolaridade. Assim, verificou-se maior chance de as mulheres serem atendidas por lesões autoprovocadas nos serviços de urgência e emergência, em comparação com o grupo assistido por outras formas de violência (IC95% = 1,6-2,6) (Tabela 3). Com relação à escolaridade, verifica-se mais chance para a ocorrência da lesão autoprovocada em todos os grupos estudados, se comparados àqueles de maior quantidade de anos de estudo (12 anos ou mais).

Tabela 3
Modelo explicativo para os atendimentos de lesões autoprovocadas em serviços de urgência e emergência.

Discussão

O ineditismo em abordar num mesmo estudo o perfil das vítimas por lesão autoprovocada em todos os ciclos da vida, com amostra de base populacional, e a sua comparação com as vítimas por outros tipos de violência a partir de informações de atendimento em serviços de urgência e emergência são os pontos altos deste trabalho. A utilização do Viva-Inquérito se mostra como potente fonte de dados sobre as lesões autoprovocadas não fatais, pois cobre uma lacuna de informações geralmente não registradas e tratadas. No caso das tentativas de suicídio isso é ainda mais importante porque apenas uma minoria de pessoas chega à internação hospitalar, onde há uma forma de registro já estabelecida.

Vale ressaltar que quase 10% dos atendimentos por violências nos serviços de urgência e emergência pesquisados decorrem de lesões autoprovocadas, com destaque para os casos que envolvem mulheres e adultos. O que corrobora os achados de Monteiro et al.2424. Monteiro RA, Bahia CA, Paiva EA, Bandeira de Sá NN, Minayo MCS. Hospitalizações relacionadas a lesões autoprovocadas intencionalmente-Brasil, 2002 a 2013. Cien Saude Colet 2015; 20(3):689-699. para as internações hospitalares decorrentes de lesões autoprovocadas intencionalmente, atendidas no Sistema Único Saúde. O pequeno número de atendimentos envolvendo crianças (0 a 9 anos) para as lesões autoprovocadas pode sugerir a raridade do evento, mas também o sub-registro desse agravo, já que casos de tentativas podem ser identificados como acidentes domésticos ou negligência tanto pelos profissionais de saúde quanto por responsáveis. Ademais, o conhecimento sobre suicídio em crianças ainda é muito incipiente face, de um lado, ao imaginário social de alegria associada a esse momento da vida, mas também ao tema bastante controverso da intencionalidade do ato que inclui responsabilidade. Entre os idosos, apesar de dados mundiais apontarem para taxas elevadas para as lesões autoprovocadas, neste estudo poucos foram os casos que chegaram aos serviços de urgência e emergência, seja porque eles são mais efetivos na consumação da morte autoprovocada1818. Minayo MCS, Cavalvante FG.Tentativas de suicídio entre pessoas idosas: revisão da literatura (2002/2013). Cien Saude Colet 2015; 20(6):2423-2430. ou porque os casos são tratados em casa ou nas instituições.

Os achados segundo o sexo da vítima vão ao encontro dos dados internacionais em várias partes do mundo relacionados ao fenômeno11. World Health Organization (WHO). World report on violence and health. Geneva: WHO; 2002.,55. Minayo MC, Souza ER. Suicídio: violência autoinfligida. In: Brasil. Ministério da Saúde (MS). Impactos da violência na saúde dos brasileiros. Brasília: MS; 2005. p. 311-331.,66. DeLeo D, Bille-Brahe U, Kerkhof A, Schmidtke A. Suicidal Behavior: Theories and Research Findings. Gottingen: WHO Regional Office for Europe; 2004.,99. Minayo MCS. Comportamento suicida e suicídio consumado na velhice. In: Minayo MCS, Figueiredo AEB, Silva RM, organizadores. Comportamento suicida de pessoas idosas. Fortaleza: Editorial UFC; 2016. p. 35-58,1818. Minayo MCS, Cavalvante FG.Tentativas de suicídio entre pessoas idosas: revisão da literatura (2002/2013). Cien Saude Colet 2015; 20(6):2423-2430.. Aliás, merece destaque a constatação de que a vulnerabilidade feminina se revela como questão chave do perfil de vítimas de lesão autoprovocada, inclusive na comparação com as de outras formas de violência. Sabe-se que as mulheres tendem mais às tentativas de suicídio, enquanto os homens têm mais êxito para acabar com a própria vida55. Minayo MC, Souza ER. Suicídio: violência autoinfligida. In: Brasil. Ministério da Saúde (MS). Impactos da violência na saúde dos brasileiros. Brasília: MS; 2005. p. 311-331.,66. DeLeo D, Bille-Brahe U, Kerkhof A, Schmidtke A. Suicidal Behavior: Theories and Research Findings. Gottingen: WHO Regional Office for Europe; 2004.,88. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Saúde Brasil 2014: uma análise da situação de saúde e das causas externas. Brasília: MS; 2015.,1818. Minayo MCS, Cavalvante FG.Tentativas de suicídio entre pessoas idosas: revisão da literatura (2002/2013). Cien Saude Colet 2015; 20(6):2423-2430.,2525. Botega NJ, Marín-León L, Oliveira HB, Barros MBA, Silva VF, Dalgalarrondo P.Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil. Cad Saude Publica 2009; 25(12):2632-2638.. A tendência de maior frequência de problemas de saúde mental entre mulheres colocam-nas em posição de maior risco ao comportamento suicida. Além disso, a sobreposição feminina ao suicídio dialoga mais com a preferência de gênero na escolha do método suicida do que com a intenção de morte em si2626. Lovisi GM, Santos SA, Legay L, Abelha L, Valencia E. Epidemiological analysis of suicide in Brazil from 1980 to 2006. Rev Bras Psiquiatr 2009; 31(Supl. 2):S86-S84.. Como constatado neste estudo, os homens tendem a optar por métodos mais letais para se matar, como objeto perfurocortante, enquanto as mulheres utilizam mais as várias formas de envenenamento2626. Lovisi GM, Santos SA, Legay L, Abelha L, Valencia E. Epidemiological analysis of suicide in Brazil from 1980 to 2006. Rev Bras Psiquiatr 2009; 31(Supl. 2):S86-S84.,2727. Vásquez-Rojas R, Quijano-Serrano M.Cuando el intento de suicidio es cosa de ninos. Rev Colombiana Psiquiat 2013; 43(S1):36-46.. A verificação da dificuldade masculina em identificar o episódio suicida como intencional, levanta a hipótese do não reconhecimento da fragilidade emocional, típica do machismo. Vale destacar a significativa sobreposição das mulheres indígenas atendidas por tentativas de autoeliminação em comparação aos homens indígenas. Embora seja um dos grupos mais vulneráveis ao suicídio no Brasil2828. Machado, DB, Santos DN.Suicídio no Brasil, de 2000 a 2012. J. bras. psiquiatr. 2015; 64(1):45-54., há ainda muito a ser desvelado sobre os fatores de risco vinculado sobretudo à visão de mundo, à cultura e à psicopatologia que induz ao suicídio nos povos indígenas.

É importante destacar o papel relevante, estratégico e preciso do atendimento nas urgências e emergências às vítimas de lesões autoprovocadas, uma vez que esses serviços: (1) constituem-se como porta de entrada para o cuidado em saúde e a opção de grande parte da população em busca por atendimento; (2) são oportunos na abordagem epidemiológica do fenômeno; (3) atendem a episódios de tentativas de suicídio, que são o mais forte preditor de suicídio consumado em crianças, adolescentes, adultos e idosos; e (4) são, muitas vezes, responsáveis pelo tratamento imediato ou para encaminhamento dos casos para outras instâncias do sistema de saúde2929. Ballard ED, Cwik M, Storr CL, Goldstein M, Eaton WW, Wilcox HC.Recent medical service utilization and health conditions associated with a history of suicide attempts. General Hospital Psychiatry 2014; 36(4):437-441.

Existe um potencial importante do serviço de urgência e emergência em detectar e cuidar de casos em estágios ainda primários do fenômeno e de impedir um dano ainda mais grave para a vítima. No entanto, quando os profissionais só dão atenção pontual aos casos, tratando sintomaticamente as lesões sem preocupação de entender as circunstâncias do evento, os atendimentos trazem pouca informação na identificação das vítimas, prejudicam o correto registro e não promovem uma possível prevenção de novos episódios11. World Health Organization (WHO). World report on violence and health. Geneva: WHO; 2002.,22. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Geneva: WHO; 2014.. Nesse sentido, estudos têm revelado que 19% das tentativas de suicídio tratadas em emergências reaparecem no mesmo tipo de serviço seis meses depois1919. Larkin GL, Beautrais AL.Emergency departments are underutilized sites for suicide prevention. Crisis 2010; 31(1):1-6.. E 39% consumam o ato até um ano depois do primeiro atendimento3030. Gairin I, House A, Owens D.Attendance at the accident and emergency department in the year before suicide: retrospective study. Br J Psychiatry 2003; 183:28-33,3131. Boudreaux ED, Miller I, Goldstein AB, Sullivan AF, Allen MH, Manton AP, Arias SA, Camargo Junior CA.The Emergency Department Safety Assessment and Follow-up Evaluation (ED-SAFE): Method and design considerations. Contemp Clin Trials 2013; 36(1):14-24.. Estudos3232. Boudreaux ED, Clark S, Camargo Junior CA.Mood disorder screening among adult emergency department patients: a multicenter study of prevalence, associations and interest in treatment. Gen Hosp Psychiatry 2008; 30(1):4-13.,3333. Claassen CA, Larkin GL.Occult suicidality in an emergency department population. Br J Psychiatry 2005; 186:352-353. também ressaltam que de 3% a 12% dos adultos sem demanda explícita de problemas de saúde mental que comparecem às emergências apresentam ideação suicida3232. Boudreaux ED, Clark S, Camargo Junior CA.Mood disorder screening among adult emergency department patients: a multicenter study of prevalence, associations and interest in treatment. Gen Hosp Psychiatry 2008; 30(1):4-13.. E de 8% a 12% das pessoas que chegam aos mesmos serviços motivados por outros problemas têm uma ideação suicida silenciada3333. Claassen CA, Larkin GL.Occult suicidality in an emergency department population. Br J Psychiatry 2005; 186:352-353.. Ainda, um número significativo de pessoas que acorrem aos atendimentos de emergência por problemas gastrointestinais e fortes dores de cabeça, segundo Ballard et al.2929. Ballard ED, Cwik M, Storr CL, Goldstein M, Eaton WW, Wilcox HC.Recent medical service utilization and health conditions associated with a history of suicide attempts. General Hospital Psychiatry 2014; 36(4):437-441, apresentam traumas e lesões autoprovocadas. Apesar dessa complexidade de situações humanas com as quais os profissionais de emergência trabalham e da reincidência como risco para o suicídio, a maioria das pessoas que eles atendem recebe alta após prescrição medicamentosa, com ou sem avaliação psicossocial.

Ballard et al.2929. Ballard ED, Cwik M, Storr CL, Goldstein M, Eaton WW, Wilcox HC.Recent medical service utilization and health conditions associated with a history of suicide attempts. General Hospital Psychiatry 2014; 36(4):437-441 recomendam que todos os pacientes que chegam nas emergências em situação que sugira associação com lesão autoprovocada sejam rastreados quanto ao risco de cometer suicídio. Uma intervenção breve, com o delineamento de um plano de segurança que coloque o paciente em contato com serviços de saúde mental é uma das ações mais benéficas e eficazes11. World Health Organization (WHO). World report on violence and health. Geneva: WHO; 2002.,3434. Fleischmann A, Bertolote JM, Wasserman D, De Leo D, Bolhari J, Botega NJ, De Silva D, Phillips M, Vijayakumar L, Värnik A, Schlebusch L, Thanh HT.Effectiveness of brief intervention and contact for suicide attempters: a randomized controlled trial in five countries. Bull World Health Organ 2008; 86(9):703-709.,3535. Qin P, Webb R, Kapur N, Sørensen HT.Hospitalization for physical illness and risk of subsequent suicide: a population study. J Intern Med 2013; 273(1):48-58.. É, portanto, imperativo que se redobrem esforços para encontrar formas mais eficazes e métodos para prevenir o suicídio em todas as faixas etárias que chegam aos serviços de emergência.

Dentre as limitações do estudo ressalta-se, do ponto de vista do fenômeno e do próprio serviço, a força do mito, do estigma, das conveniências familiares e sociais e das razões políticas que induzem à subnotificação e à má classificação do suicídio. Esses problemas culturais e institucionais dificultam a elucidação e a prevenção.

Há limitações que são do próprio trabalho. Uma delas é o viés de seleção, uma vez que provavelmente apenas uma parte dos casos de lesões autoprovocadas ocorridas no período tenha chegado aos serviços de urgência e emergência. Nas ocorrências mais leves as pessoas não procuram atendimento. Assim, é possível que os dados não sejam suficientemente representativos da situação do país. Outra limitação é que fatores relevantes associados às tentativas de suicídio descritos na literatura não puderam ser avaliados. É o caso da presença de transtornos mentais, de doenças terminais e degenerativas, de problemas sociais, ambientais, de motivações sociais e influência da mídia, já que tais informações não estão no escopo das fontes de dados utilizadas. Outra limitação também foi a impossibilidade de fazer comparações com outros estudos sobre o tema, realizados em serviços de urgência e emergência no Brasil, porque não se encontrou uma literatura específica sobre o assunto. Por fim, o Inquérito-Viva é um instrumento ainda jovem de captação sobre a violência no país, o que limita a investigação do fenômeno a um período restrito de tempo.

Finalizando, os autores consideram que, apesar de todas as limitações e lacunas do trabalho, este artigo abre portas para outros estudos que aprofundem o que aqui foi encontrado. E também, acreditam que ele contribui para se pensarem as melhores formas de atuar nas urgências e emergências, para que sejam serviços que contribuam para prevenção dos suicídios, de acordo com a mensagem da Organização Mundial de Saúde: Preventing suicide: a global imperative!22. World Health Organization (WHO). Preventing suicide: a global imperative. Geneva: WHO; 2014..

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2017

Histórico

  • Recebido
    10 Mar 2017
  • Revisado
    18 Abr 2017
  • Aceito
    25 Maio 2017
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