Resumo
O envelhecimento constitui um fenômeno demográfico e uma questão econômica, social, política, cultural e ética. O objetivo deste ensaio é refletir sobre o envelhecimento e o sentido da velhice no sistema capitalista, sob o paradoxo que contrapõe lucro e necessidades humanas. A investigação efetuada sinaliza que sobre a pessoa idosa, com perdas de capacidades e incapacidades, recaem altos índices de negligências públicas e privadas. Isso exige a implementação de políticas específicas para a velhice, devido ao aumento tendencial de uma categoria de idosos/as, os dependentes. Em geral, as políticas têm atuado no sentido de reforçar os dados colhidos numa pesquisa realizada em 2019, em 6 estados brasileiros e no Distrito Federal, junto a uma população de 446.101 idosos/as, na qual se constataram descasos e maus tratos, mesmo com os avanços na legislação brasileira em vigor. Tais fatos endossam a percepção de imagens desvalorizadoras da velhice e do fato de ser velho/a, fazendo-se urgente uma ética global sob a perspectiva do cuidado que resgate valores democráticos essenciais a uma velhice com sentido.
Palavras-chave:
Envelhecimento; Pessoa idosa; Comprometimento funcional; Dependência; Proteção social
Introdução
Este ensaio parte da perspectiva histórica do envelhecer na Antiguidade para dar ênfase aos tempos áureos do Welfare State e à crise estrutural capitalista contemporânea que contrapõe o lucro à satisfação de necessidades humanas.
O sentido do envelhecer, na perspectiva filosófica antiga, não foi único para os povos e civilizações. Na China, o filósofo e historiador Lao-Tsy11 Lao-Tzy. Tao-te King: o livro do sentido da vida. São Paulo: Pensamento; 1999. concebe a velhice como o momento supremo da vida, enquanto Confúcio22 Confúcio. Vida e doutrina: os analectos. São Paulo: Pensamento; 1999. afirma que uma das mais sublimes formas de amor está no cuidado dos filhos para com os pais durante a velhice. Na Grécia, a velhice era tratada com desprezo e pavor, sobretudo pela perda da força, dos prazeres e dos sentidos, ao contrário do culto ao corpo jovial e saudável33 Beauvoir S. A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1990.. Aristóteles tratava a velhice como algo deprimente, como condição de pessoa indigna, diminuída e que por isso deveria ser afastada do poder33 Beauvoir S. A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1990.. No entanto, Sócrates, na obra A República, escrita por Platão44 Platão. A República. Brasília: Editora da UnB; 1985. (Livro 7), defende a ideia de que o envelhecimento não constitui um peso para a sociedade. Nos diálogos socráticos de Platão, os filhos têm obrigação de zelar pelos pais, uma vez que a velhice depende tanto do caráter da pessoa quanto das condições de cuidado saudável que se pode ter durante a vida. Ao aprofundar o pensamento de Platão, Cícero55 Cícero MT. Saber envelhecer - seguido de A amizade. Porto Alegre: L± 1999. - tecendo duras críticas ao preconceito, desrespeito e rejeição sobre a pessoa idosa, na obra Senectute - defende a ideia de que a velhice não pode ser vista apenas no âmbito individual, mas também no que significa nas relações sociais e de poder.
Na contemporaneidade, o tema do envelhecimento assume uma das mais destacadas presenças nas preocupações intelectuais e políticas das sociedades capitalistas, não só por constituir um fenômeno demográfico, mas também por ser uma questão econômica, social, política, cultural e ética que põe em xeque a qualidade de seu compromisso com os direitos humanos. Isso porque se, de um lado, o envelhecimento humano e populacional representa um avanço espetacular da medicina e da saúde pública, aliado a uma nova cultura de respeito às diferenças, assegurada por direitos e políticas públicas, por outro lado, esse avanço é encarado como um estorvo ao crescimento econômico. Em vista disso, o tema do envelhecimento, no sistema capitalista recente, encerra um paradoxo cujas lógicas contrapostas, - do lucro e das necessidades humanas - inerentes ao sistema, precisam ser problematizadas.
Para se ter uma ideia da relevância e complexidade do processo de envelhecimento, sob a égide do capital, vale lembrar Esping-Andersen e Palier66 Esping-Andersen G, Palier B. Los tres grandes retos del Estado del bienestar. Barcelona: Ariel; 2010., quando o analisam na fase mais recente do capitalismo. Ao longo do século passado, dizem os autores, as sociedades capitalistas não pararam de envelhecer. Contudo, desde a segunda metade do século XX, o envelhecimento vem apresentando várias características que, em grande parte, são fruto da racionalidade burguesa forjada em meio a acontecimentos socioeconômicos importantes, desde o término da Segunda Guerra Mundial que produziu prosperidade econômica; pleno emprego masculino; universalização de diretos sociais; e fortalecimento do poder dos sindicatos e dos movimentos identitários, entre outros. Para tanto, contribuíram:
o fim do monopólio nuclear norte americano; o auge dos partidos comunistas em alguns países da Europa Ocidental; a formidável recuperação da economia soviética; o triunfo da revolução socialista da China; a heroica luta dos vietnamitas resistindo ao colonialismo francês; a ocupação japonesa e depois a intervenção estadunidense; o triunfo da revolução cubana e o auge dos processos de descolonização na África e na Ásia77 Boron A. Socialismo siglo XXI: ¿hay vida después del neoliberalismo? Buenos Aires: Ediciones Luxemburg; 2014..
A primeira característica do movimento mundial da longevidade diz respeito à aceleração da mudança demográfica, cuja origem pode se resumir na seguinte equação: “poucos bebês, vidas longas”66 Esping-Andersen G, Palier B. Los tres grandes retos del Estado del bienestar. Barcelona: Ariel; 2010.. Isso quer dizer que, em havendo, como houve, diminuição da taxa de fecundidade, ocorrerá aumento da proporção de pessoas idosas no conjunto da população; e, em havendo o processo de longevidade, alimentado por fatores coadjuvantes, os/as idosos/as viverão mais. Disso decorre que o envelhecimento caminha pari passu com a diminuição da população que, ao mesmo tempo, representa um descenso da demanda agregada e da produtividade econômica, indo contra a lógica e a ética capitalista.
De fato, esta tendência tem sido posta em marcha acelerada em quase todo o mundo, dizem Esping-Andersen e Palier66 Esping-Andersen G, Palier B. Los tres grandes retos del Estado del bienestar. Barcelona: Ariel; 2010.. Países do sul da Europa, cuja taxa de fecundidade se estabilizou abaixo de 1,3 filhos por mulher, terão a sua população reduzida a três quartos até o final do século. Dentre esses países, a Itália ficará reduzida a 12 (doze) milhões de habitantes. A França, que conseguiu manter a fecundidade em 2 (dois) filhos, constitui a mais alta taxa da Europa e, por isso, só terá 15% da sua população reduzida ao final do século. Na Europa como um todo, a taxa de fecundidade que parece ter se estabilizado em 1,5 certamente não estará livre de prognósticos pessimistas sobre a sua economia66 Esping-Andersen G, Palier B. Los tres grandes retos del Estado del bienestar. Barcelona: Ariel; 2010.. Para isso, motivos não faltam. A população idosa na Europa tem crescido continuamente. Na França, por exemplo, o aumento foi de três milhões, entre 1950 e 1990, prevendo-se, para os próximos quarenta anos, aumento em cinco milhões. Por seu turno, o Plano de Ação Internacional para o Envelhecimento da Organização das Nações Unidas - ONU88 Organização das Nações Unidas (ONU). Plano de Ação Internacional para o Envelhecimento. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; 2002. informa que, em âmbito mundial, a proporção de pessoas com 60 anos e mais de idade deverá atingir, em 2050, a casa dos dois bilhões.
A segunda característica tem a ver, particularmente, com o aumento da esperança de vida que advém, principalmente, da melhoria das condições de saúde da população idosa. Graças a essas condições, este segmento populacional vem ganhando, desde os anos 1960, dez anos a mais de vida, permitindo-lhe a possibilidade de viver, pelo menos, até os 80 anos (no caso dos homens) e 85 anos (no caso das mulheres). É o que confirma o referido Plano da ONU88 Organização das Nações Unidas (ONU). Plano de Ação Internacional para o Envelhecimento. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; 2002., quando indica que, até 2050, o número de pessoas idosas com 80 anos e mais deverá quadriplicar, com uma particularidade: nos países em desenvolvimento88 Organização das Nações Unidas (ONU). Plano de Ação Internacional para o Envelhecimento. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; 2002. o montante de pessoas mais velhas aumentará mais de cinco vezes, nos próximos 50 anos. Uma transformação demográfica dessa magnitude, em especial nos países em desenvolvimento, terá consequências para cada um dos aspectos da vida individual, comunitária, nacional e internacional. Note-se que o envelhecimento também se faz valer nos chamados segundo e terceiro mundos.
No Brasil, considerado país de terceiro mundo, estudos populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)99 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Projeções da população: revisão - 2018. Rio de Janeiro: IBGE; 2018., indicam que existem, atualmente, cerca de 30,2 milhões de pessoas idosas. A esperança de vida ao nascer é, em média, 75,4 anos para os homens e 78,2 para as mulheres, sendo que a faixa etária que mais cresce é a de 80 anos e mais1010 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Projeção da população do Brasil e Unidades da Federação por sexo e idade para o período 2000-2030. Rio de Janeiro: IBGE; 2017., confirmando a tendência mundial geral.
Correntemente, 86,4% da população idosa no Brasil é ativa, prescindindo de cuidados pessoais sistemáticos. No entanto, os 13,6% restantes apresentam algum tipo de dependência, em decorrência de doenças como Alzheimer e outros tipos de demências, além de modalidades de dependências de natureza motora, visual, auditiva, dentre outras. Conforme a Organização Mundial de Saúde - OMS, o termo “demência” engloba várias enfermidades progressivas que afetam a memória, outras capacidades cognitivas e de comportamento, e interferem, consideravelmente, na capacidade do indivíduo para realizar tarefas cotidianas.
Para vários analistas, a superioridade numérica da população idosa provoca uma ameaça iminente identificada como “choque de gerações”, por implicar a possibilidade de dominância dos interesses das pessoas idosas nas decisões públicas que dependem do voto dos cidadãos. Por constituírem a maioria do eleitorado, os votantes não jovens terão, não só maior chance de participar de atividades políticas como contarem com lobbies majoritários em defesa de suas causas, gerando, em contrapartida, desfalques em investimentos dedicados a crianças, jovens e famílias. Ou seja, é possível que se estabeleça o que, na teoria dos jogos, se denomina jogo de soma zero, contrário ao princípio da partilha equitativa. É com base nesse tipo de raciocínio que pleitos por reformas nos sistemas de aposentadorias e pensões têm proliferado, principalmente sob a égide do ideário neoliberal/neoconservador que, desde meados dos anos 1970, advoga a privatização das políticas sociais públicas. Observe-se que, em meio à crise estrutural do capital, agora associada à crise sanitária decorrente da pandemia do COVID-19, há quem reivindique práticas darwinistas sociais que sacrifiquem a vida dos idosos e das idosas no altar da economia de mercado.
Por fim, a terceira característica do momento atual coincide com o processo histórico de ascensão de conquistas democráticas no campo da cidadania social, iniciada no imediato segundo pós-guerra e vigente até meados dos anos 1970. Trata-se da fase histórica que ficou conhecida como os 30 anos gloriosos do Estado Social e das políticas públicas conquistadas pela sociedade, garantidas por lei e balizadas por uma ética de pendor solidário. Foi nesse período que, no tocante às pessoas idosas, a aposentadoria como direito se tornou uma segurança social legitimada, posto que, antes, raros trabalhadores a usufruíam como proteção contra a pobreza. Em escala mundial, vários países, inclusive o Brasil, conheceram momentos de reconhecimento dos direitos individuais (civis e políticos) e sociais, da pessoa idosa, tais como: respeito à integridade física, psíquica e moral protegida pelo Estado e pela sociedade, incluindo-se, aí, a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, de valores, de ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais; e, ainda, a satisfação de necessidades sociais, em atenção aos direitos à vida e à saúde, além de autonomia de ação e de crítica, imprescindíveis à participação social dos cidadãos1111 Brasil. Presidência da República. Lei n. 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Diário Oficial da União 2003; 3 out.,1212 Pereira-Pereira PA. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos sociais. São Paulo: Cortez, 2000.. Entretanto, no curso dos últimos 40 anos, estas conquistas democráticas vêm sendo demolidas. Como os gastos sociais com as pessoas idosas vêm aumentando, especialmente os relacionados aos segmentos dependentes, a tendência é retirar do Estado o protagonismo da proteção e socializar os custos com a família e o mercado, inaugurando-se o denominado pluralismo de bem-estar. A ética da solidariedade vai dando vez à moral privatista (mercantil e não mercantil) e a tradicional reserva de cuidadores familiares, capitaneada pelas mulheres, se escasseia.
É sobre este pano de fundo que a reflexão a seguir, sobre envelhecimento e o sentido da velhice no sistema capitalista, se desenvolve.
Envelhecimento e velhice na sociabilidade capitalista contemporânea
O processo de envelhecimento e da velhice, no atual estágio de desenvolvimento capitalista, caracterizado por uma crise estrutural e sistêmica interminável, não deve ser analisado apenas pelo prisma biológico; isto é, alheio ao contexto econômico, político e social e, portanto, desarticulado do mundo do trabalho e das condições materiais e imateriais de produção e reprodução1313 Abigalil A. Desafios do envelhecimento ativo face à reestruturação e ao desfinanciamento da seguridade social no Brasil [dissertação]. Brasília: Universidade de Brasília; 2019.. Isso porque, neste estágio histórico, o que mais tem movido o capital como relação é o esforço incessante por recriar condições favoráveis à sua valorização, com vista à retomada das elevadas taxas de lucros, corroídas pela grande recessão iniciada em fins dos anos 1970. Contudo, essa saída da crise propiciou o triunfo das forças globais desregulamentadoras da economia e dos pactos sociais interclassistas, constituídos no segundo pós-guerra, e, por consequência, potenciou o domínio do capital financeiro sobre o industrial produtivo. Não à toa, na crise capitalista ainda em curso e agudizada em 2008 com a quebra de importantes fundos de investimentos aplicados na especulação de ativos imobiliários, a partir dos Estados Unidos, a oligarquia capitalista abriu uma guerra camuflada contra os trabalhadores, sob o manto da austeridade econômica - ou do austericídio no dizer de Navarro1414 Navarro V. Ataque a la democracia y al bienestar: critica al pensamiento económico dominante. Barcelona: Anagrama; 2012.. Portanto, é bastante pertinente a afirmação de que:
a velhice deve ser analisada no interior do sistema capitalista e da estrutura de classes [porque]: [...] a ideologia da velhice é fundamental à reprodução das relações capitalistas na medida em que a produção das relações capitalistas implica reprodução de ideias, valores, princípios e doutrinas [que compõem] o conjunto de representações sobre a etapa final da vida humana1515 Minayo MCS, Mendonça JMB, Meneghel SN, Gutierrez DMD, Silva RM, Souza GS. Estudo situacional dos idosos dependentes que residem com suas famílias visando subsidiar uma política de atenção e de apoio aos cuidadores. Rio de Janeiro: Fundação Osvaldo Cruz; 2019..
Efetivamente, é da natureza do modo de produção capitalista gerar desigualdades, que castigam, severamente, cidadãos de todos os ciclos de vida, principalmente os pertencentes à classe trabalhadora; ou dos que não pertencem ao seleto grupo de super ricos, considerado a oligarquia da crise, que se beneficiou, absurdamente, da formidável concentração de renda decorrente da desigualdade social da atualidade. Na classe trabalhadora, um número significativo de pessoas idosas sofrem, além da pobreza, discriminação e violência, pois elas são vistas como um peso para a sociedade, para as famílias e para o Estado. Os governantes e os Organismos Internacionais, a exemplo do Fundo Monetário Internacional (FMI), concebem, estimulam ou praticam mecanismos de contrarreformas do sistema de Seguridade Social, baseados em argumentos, sem sustentação empírica, que culpabilizam as pessoas idosas pelos gastos considerados improdutivos do setor público, em especial com políticas que integram a seguridade social: saúde, previdência e assistência social. Essas áreas são as mais demandadas pelas pessoas idosas.
A falta de Rede de Proteção e Defesa de Direitos leva as pessoas idosas a enfrentarem sérios problemas em sua vida cotidiana. E os mais sobrecarregados com essa situação são os familiares. A família é a fonte privada voluntária de serviços sociais informais, em particular, dos idosos dependentes. No entanto, essa instituição também sofreu decisivas mudanças na sua estrutura e configuração. A figura da mulher cuidadora ou principal reprodutora da força de trabalho no âmbito do lar, que vivia à margem do mercado de trabalho, é raridade; quando existe, é à custa de ingentes sacrifícios e amadorismos no trato da pessoa idosa.
Nas famílias pesquisadas num estudo feito no Distrito Federal/Brasil1616 Minayo MCS, coordenador. O sentido das idades da vida: interrogar a solidão e a dependência. Lisboa: CESDET; 2004., a maioria das que abrigavam idosos em situação de dependência não tinham condições de pagar um cuidador formal. Apenas 20% possuíam empregada doméstica que auxiliavam os cuidadores familiares. No Brasil, o cuidado formal é um serviço caro que poucas famílias têm condições financeiras de bancar.
Contradições entre propostas de cuidados e reprodução de preconceitos
A existência social dos velhos nunca foi pacífica, nem bem tratada. Seria um erro, ter uma nostalgia de um passado abstrato e idílico. É preciso ter claro que os maus-tratos e as vicissitudes da velhice, além dos conflitos que encerram, são antigos e conhecidos, seja na esfera do senso comum, da literatura e, mais recentemente, das investigações científicas. Em 1970, quando Simone de Beauvoir publicou o seu livro A velhice, nele a autora dizia que havia “duas categorias de velhos: uma extremamente vasta e outra reduzida a uma pequena minoria que a oposição entre exploradores e explorados cria”33 Beauvoir S. A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1990. - ressaltando que nenhum estudo deveria omitir essa clivagem. A França tinha, então, 12% de sua população com 65 anos e mais de idade. Mas, até hoje as discriminações no mundo são em torno dessa clivagem, inclusive no Brasil que está, na atualidade, com mais de 30,5 milhões de pessoas com 60 anos e mais de idade. E “os mitos e clichês postos em circulação pelo pensamento burguês se aplicam em mostrar o velho como um outro”, prossegue Beauvoir33 Beauvoir S. A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1990.. Se os velhos manifestam os mesmos desejos, os mesmos sentimentos, as mesmas reivindicações que os jovens, eles escandalizam: neles, o amor, o ciúme parece odiosos ou ridículos, a sexualidade repugnante, a violência irrisória33 Beauvoir S. A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1990..
Se o velho for rico, as imagens melhoram, uma vez que prevalece o poder do sujeito; mas são poucos os que têm essa prerrogativa. “Por sua virtude ou sua abjeção, os velhos situam-se fora da humanidade”33 Beauvoir S. A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1990.. Caso emblemático foi o de Christine Lagard, presidente do Fundo Monetário Internacional (FMI), de julho de 2011 a novembro de 2019, que, em um de seus discursos, afirmou que os velhos devem apressar suas mortes porque constituem um gasto muito grande para o Estado. Essa fala, proferida há poucos anos, por uma idosa de alta renda, antecipou o que é voz corrente nos discursos malthusianos pronunciados diante do dilema de quem salvar da pandemia do novo COVID-19: os jovens ou velhos? E isso, sem dúvida, tem a ver com a cultura utilitarista, própria de um capitalismo que, na sua ampliação destrutiva, se reencontrou com a sua face mais primitiva.
Sendo a pessoa idosa considerada um peso que tende a aumentar no orçamento público, disputado tanto pelo trabalho como pelo capital, não restam dúvidas de que é sobre ela que recairão os mais altos índices de negligências públicas e privadas. A esse respeito, dados recentes disponíveis são eloquentes.
Na Espanha, nas últimas décadas, notam-se preocupações e avanços relacionados à melhoria das políticas de orientação e ajudas sociais às pessoas com dependência - com base na Lei 39/2006 de Promoção da Autonomia Pessoal e Atenção às Pessoas em Situação de Dependência, conhecida como Lei de Dependência - LAPAD1717 Espanha. Lei nº 39/2006 de Promoção da Autonomia Pessoal e atenção as Pessoas Idosas em Situação de Dependência-LAPAD. 2006.; à erradicação da desigualdade de gênero e maus-tratos com diferentes protocolos e iniciativas parlamentares; à existência de uma rede de saúde especializada em Geriatria e Gerontologia e de formação de especialistas; ou ainda ao apoio da sociedade a Organizações não governamentais, como Caritas Espanha ou Alzheimer Catalunya Fundación. Entretanto, em que pesem essas preocupações, o empobrecimento dos velhos não tem sido estancado e continua aumentando no rastro da ausência de recursos materiais e financeiros. Além disso, a Lei de Dependência impõe múltiplas barreiras burocráticas para se materializar.
No Brasil, pesquisa realizada em 2019, em seis estados da Federação e no Distrito Federal1515 Minayo MCS, Mendonça JMB, Meneghel SN, Gutierrez DMD, Silva RM, Souza GS. Estudo situacional dos idosos dependentes que residem com suas famílias visando subsidiar uma política de atenção e de apoio aos cuidadores. Rio de Janeiro: Fundação Osvaldo Cruz; 2019., junto a uma população de 446.101 pessoas idosas constatou descasos na forma de tratá-las, apesar do avanço na legislação brasileira em vigor. Apenas uma minoria está recebendo atendimento na área de saúde. A maioria não conta com um suporte de cuidados efetivos do poder público. Dos pesquisados, 80% contam com cuidadores familiares, sobrecarregados, adoecidos e com dificuldades de acesso a medicamentos para os idosos e para si próprios. Observou-se que não existem serviços disponíveis, como Centros Dia; Instituições de Longa Permanência para pessoas idosas, que atendam à real demanda; e nem atenção domiciliar ou ajuda financeira para as famílias dos idosos em situação de dependência1717 Espanha. Lei nº 39/2006 de Promoção da Autonomia Pessoal e atenção as Pessoas Idosas em Situação de Dependência-LAPAD. 2006..
Tais constatações endossam a percepção dos pesquisadores de que os idosos não fazem parte das preocupações do Estado brasileiro, mesmo quando, no papel, suas políticas e documentos digam o contrário. Na prática, as ações públicas reforçam a cristalização das imagens que desvalorizam a velhice e do fato de ser velho1818 Organização dos Estados Americanos (OEA). Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos. Washington: OEA; 2015..
Desafios que vão das leis às normas e às práticas
No mundo contemporâneo, entre a ideia do pluralismo na oferta do bem-estar social que abona a privatização da provisão de serviços e a solidariedade informal intrafamiliar é importante reafirmar a liderança do Estado na formulação de políticas e práticas em defesa dos direitos. Mesmo porque a velhice protegida tornou-se um direito humano fundamental e essencial conquistado e reconhecido nas normativas internacionais que comprometem governos nacionais, principalmente os signatários de acordos supranacionais, como é o caso do Brasil.
A ONU recomenda, por exemplo, por meio da Resolução 41/911919 Organização das Nações Unidas (ONU). Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República. Princípios das Nações Unidas para as Pessoas Idosas adotados pela Resolução 46/91 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 16 de dezembro de 1991. [acessado 2020 Maio 12]. Disponível em: http://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/princ-pessoasidosas.pdf
http://gddc.ministeriopublico.pt/sites/d... alguns princípios que devem orientar o cuidado no trato das pessoas idosas”: independência, participação, assistência, autorrealização e dignidade. De acordo com a terceira dessas recomendações, a pessoa idosa deve se beneficiar da assistência e proteção da família e da comunidade, em conformidade com os valores culturais da sociedade; mas precisa também ter acesso à assistência da saúde para manter ou adquirir bem-estar físico, mental e emocional, prevenindo-se da incidência de doenças. No entanto, orientações como as citadas e outras, de cuja construção o Brasil participou e assinou o documento final1919 Organização das Nações Unidas (ONU). Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República. Princípios das Nações Unidas para as Pessoas Idosas adotados pela Resolução 46/91 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 16 de dezembro de 1991. [acessado 2020 Maio 12]. Disponível em: http://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/princ-pessoasidosas.pdf
http://gddc.ministeriopublico.pt/sites/d... , não têm sido colocadas em prática, o que certamente impede que as pessoas idosas brasileiras - particularmente as dependentes - tenham uma qualidade de vida melhor1313 Abigalil A. Desafios do envelhecimento ativo face à reestruturação e ao desfinanciamento da seguridade social no Brasil [dissertação]. Brasília: Universidade de Brasília; 2019.. Em que pese o fato de a velhice protegida ser um processo que cruza com o envelhecimento personalizado, os direitos da pessoa idosa evoluem no sentido da pluralidade e da diversidade mas também para a homogeneização e a estandardização, beneficiando todos2222 Rosanvallon P. La sociedad de los iguales. Barcelona: RBA Libros; 2012..
Nesse contexto, ressaltam-se desafios de várias ordens que convocam a compreensão de que a dependência e os cuidados de longa duração extrapolam a esfera familiar1818 Organização dos Estados Americanos (OEA). Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos. Washington: OEA; 2015.,1919 Organização das Nações Unidas (ONU). Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República. Princípios das Nações Unidas para as Pessoas Idosas adotados pela Resolução 46/91 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 16 de dezembro de 1991. [acessado 2020 Maio 12]. Disponível em: http://gddc.ministeriopublico.pt/sites/default/files/princ-pessoasidosas.pdf
http://gddc.ministeriopublico.pt/sites/d... e exigem comprometimento público.
As enfermidades que acarretam a dependência das pessoas idosas provocam alterações de comportamento com o avançar da doença. Logo, é necessário que familiares e cuidadores sejam orientados para entenderem as mutações que ocorrem tanto no aspecto físico como no cognitivo da pessoa idosa.
O ambiente de vivência da pessoa idosa com seus familiares influencia o bem-estar de todos. Quando as relações domésticas são tensas, agravadas pela precariedade nas condições de segurança social e emocional, a atenção e os cuidados das pessoas mais velhas dificilmente são satisfatórios e saudáveis. Nesse ambiente, as mulheres que tradicionalmente ficavam no lar e arcavam com a responsabilidade dos cuidados dos filhos, maridos, pais ou sogros estão cada vez mais labutando num mercado de trabalho desfavorável para garantir o sustento da família que, na maioria das vezes, chefiam.
Nessas famílias, possíveis ajudas e cuidados costumam ser precários pelo despreparo e improvisação. Como já dito, embora no Brasil a tarefa de cuidador esteja inserida na Classificação Brasileira de Ocupação, ela ainda não é profissionalmente reconhecida e costuma custar muito mais cara do que as famílias trabalhadoras podem pagar. Isso afeta também a classe média assalariada, obrigada a arcar com as despesas que, no mínimo desfalcam suas economias.
Os familiares que acabam, por falta de alternativa, a optar por cuidar de seu idoso dependente, não só rebaixam seu padrão de vida como adiam planos de aperfeiçoamento profissional, perdem oportunidades de trabalho e estudos e se tornam reclusos por muito tempo. No Brasil, eles não têm a quem recorrer. Tudo isso denuncia a falta de uma rede de serviços estruturada que, em ação conjunta com a família e a sociedade, possam proporcionar aos idosos novas opções de vida, como recomenda a OMS2020 Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório mundial de envelhecimento e saúde. 2015. [acessado 2020 Maio 13]. Disponível em: http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/ 2015/10/OMS-ENVELHECIMENTO-2015-port.pdf
http://sbgg.org.br/wp-content/uploads/ 2... :
a idade avançada frequentemente envolve mudanças significativas além das perdas biológicas. Essas mudanças incluem alterações nos papéis e posições sociais, bem como na necessidade de lidar com perdas de relações próximas. Em resposta, os adultos mais velhos tendem a selecionar metas e atividades em menor número, porém mais significativas, otimizar suas capacidades existentes, por meio de práticas e novas tecnologias, bem como compensar as perdas de algumas habilidades encontrando outras maneiras de realizar tarefas.
Um importante agravante à situação aqui tratada e captada pela mencionada pesquisa, no DF, Brasil, são as contrarreformas operadas na área da previdência social, que apenaram, significativamente, assalariados ativos, aposentados e pensionistas. Várias pessoas idosas pesquisadas ressentem-se do rebaixamento do valor monetário de suas aposentarias e pensões por causa do aumento das alíquotas da contribuição previdenciária e lamentam terem de depender dos filhos para cobrir suas despesas. Algumas outras (65% da população idosa), ainda ativas têm voltado ao mercado de trabalho, ainda que de forma precária, para se sustentarem. Essa prática vem sendo adotada, geralmente, em troca de um salário mínimo mensal, com o qual os velhos contribuem, principalmente, para o sustento de filhos e netos.
À guisa de conclusão
O sentido do envelhecer para a pessoa idosa dependente é, nos dias de hoje, como se pode inferir do exposto neste texto, múltiplo e não linear. Por isso, ele contempla, simultaneamente, grandezas e misérias comuns da história da humanidade, típicas das contradições fundamentais da sociabilidade contemporânea, que se acirra com o avanço da nova direita - amálgama do neoliberalismo com o neoconservadorismo - e pelo obscurantismo, este último, em especial no Brasil.
O paradoxo que serviu de fio condutor à construção deste ensaio contém uma disjuntiva que contrapõe, dialeticamente, a lógica da rentabilidade econômica privada à lógica das necessidades humanas ou sociais, constituindo um denominador comum a todas as formações sociais capitalistas, ricas ou pobres. Assim, embora existam entre essas formações sociais diferenças quantitativas, dignas de atenção, qualitativamente todas elas possuem algo que lhes é característico: a coexistência da abundância e da carência, como uma contradição estrutural, que só será resolvida por completo com a mudança do próprio sistema que a contém1212 Pereira-Pereira PA. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos sociais. São Paulo: Cortez, 2000..
Isso explica por que, mesmo na época dos trinta anos gloriosos do Welfare State, ou Estado de Bem-Estar Social (1945-1975), os países mais ricos do mundo possuíam pobres e os países mais pobres do mundo possuíam ricos. Diante dessa realidade, a maior façanha das forças defensoras da precedência da satisfação das necessidades humanas sobre a satisfação das necessidades de lucro do capital consistiu na conquista de direitos sociais no rastro de tenazes e prolongadas lutas por direitos trabalhistas e previdenciários, desde o século XIX, que abarcaram as pessoas idosas. Segundo Pierson2121 Pierson C. Beyond the Welfare State? Cambridge: Polity Press; 1991., no século XIX, quatro países europeus (Alemanha, 1889; Dinamarca, 1891; França, 1895; Itália, 1898), além da Nova Zelândia (1898), passaram a legislar sobre pensões, integrando o time da primeira geração legisladora do bem-estar, da qual também fizeram parte, na primeira década do século XX: Bélgica, em 1900; Irlanda e Reino Unido, em 1908; e Austrália, em 1909. Entretanto, as subvenções às famílias compuseram a segunda geração de legislação do bem-estar; no século XIX, nenhum país tratou desse assunto e somente durante a Segunda Guerra Mundial ele mereceu melhor atenção, com exceção dos Estados Unidos, que, em 1935, legislaram sobre as pessoas idosas.
Contemporaneamente, com a débâcle dos direitos sociais, duramente conquistados, de par com as políticas sociais públicas criadas para concretizá-los, o paradoxo se explicita com uma crueza inimaginável, após ter dado a impressão de que as suas contradições estavam sob o controle dos progressos científicos e civilizacionais que a humanidade alcançou e deles se beneficiou. Em relação ao envelhecimento, a contribuição da ciência e da tecnologia de ponta para que as pessoas vivessem mais e com saúde, parecia ter por ética o respeito à necessidade humana mais vital, que é a preservação da vida, a partir da conjunção da saúde física e mental.
Contudo, assim como, no capitalismo, a extensão das oportunidades de igualdade e de liberdade não são democráticas, a vida e a morte também não o são. E não o são porque, contraditoriamente, à medida em que essas possibilidades se potencializaram em aperfeiçoamentos e sofisticações, elas se concentram em parcelas minoritárias da população. Não por acaso, vivencia-se um aumento espetacular das desigualdades sociais que, seguramente, se configuram como o mais ingente problema do mundo atual.
Nos últimos 30 anos, houve um crescimento extraordinário desse descalabro não só na periferia do capitalismo, mas também nos países da Europa, nos Estados Unidos e praticamente em todo o globo. Esse fato permite dizer que, de acordo com Rosanvallon2222 Rosanvallon P. La sociedad de los iguales. Barcelona: RBA Libros; 2012., existe uma “mundialização das desigualdades”, a qual apresenta o seguinte perfil: em cada país, as desigualdades, principalmente as de renda, aumentaram. Isso revela que, ao mesmo tempo em que os países apresentavam melhores índices de crescimento econômico (como é o caso dos integrantes do Brics - Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), as desigualdades internas cresciam e se multiplicavam. A Europa é o caso mais emblemático dessa tendência, porque o aumento da desigualdade em seu seio ocorreu após um século de sua redução, especialmente entre a Primeira Guerra Mundial e a primeira crise do petróleo, nos anos 1970. E o mesmo aconteceu nos Estados Unidos.
Por isso, pode-se dizer que se o século XX foi o século da redução das desigualdades na Europa, graças, em grande parte, à ação do Welfare State e dos direitos sociais, o século XXI tem sido o do aumento e da multiplicação das desigualdades e das afrontas aos direitos humanos. Afrontas que se expressam no acirramento dos preconceitos de classe; nos ódios raciais, religiosos, ideológicos; nas intolerâncias a opções sexuais; no recrudescimento de nacionalismos, machismos, separatismos, xenofobias, moralismos e criminalização da pobreza2323 Lindgren-Alves JA. Os direitos humanos na pós-modernidade. São Paulo: Perspectiva; 2005.. Em vista disso, houve, na opinião de Rosanvallon, uma degradação da democracia como forma de sociedade, embora como regime político ela ainda seja apregoada2222 Rosanvallon P. La sociedad de los iguales. Barcelona: RBA Libros; 2012..
Tal realidade tem aumentado não só o hiato entre pobreza e riqueza, ou a extraordinária concentração da riqueza mundial em poucas mãos - o crescimento principal está sendo canalizado para o 1% mais rico da população mundial, que passou a deter quase 50% da riqueza no planeta; mas, também tem produzido o divórcio entre democracia política e democracia social. Consequentemente, tem havido o rompimento dos laços entre os componentes de uma mesma coletividade de cidadãos, fazendo prevalecer a concepção de que as sociedades modernas são meros agregados de indivíduos, tal como anunciava a ex-Primeira Ministra inglesa Margareth Thatcher, nos anos 1980: na Grã Bretanha, dizia ela, não existe sociedade, mas Fulano, Beltrano e Sicrano.
E como cada indivíduo vem sendo induzido a ter sucesso, a ser reconhecido pelos seus próprios méritos e parecer original, os laços de identidade societária, as trajetórias e as situações comuns que poderiam uni-lo organicamente aos demais, se esgarçam. Da mesma forma, esvaem-se os valores democráticos de colaboração e de solidariedade, que seriam essenciais para uma velhice com sentido, instaurando-se, assim, a perspectiva do cuidado. Como defende Boff2424 Boff L. Saber cuidar: ética do humano - compaixão pela Terra. Petrópolis: Vozes; 1999., é mais do que urgente e necessário que se recupere o papel da ética em todas as instâncias da vida: uma ética do cuidado, em substituição ao modelo totalitário, simétrico, linear e homogeneizante, seja na construção do conhecimento, da relação com a mãe terra, seja nas relações de poder estabelecidas. É indispensável que “o cuidado aflore em todos os âmbitos, que penetre na atmosfera humana e que prevaleça em todas as relações! O cuidado salvará a vida, fará justiça ao empobrecido e resgatará a Terra como pátria e mátria de todos”2424 Boff L. Saber cuidar: ética do humano - compaixão pela Terra. Petrópolis: Vozes; 1999..
O cuidado, segundo Boff 24,25, mais do que atitude humana é a priori ontológica ao ser humano, antes mesmo de sua ação. O cuidado implica o modo de ser e de existir. O cuidado é um processo relacional de corresponsabilidade e envolvimento afetivo para com o outro. Nesse sentido, “mais que uma técnica, o cuidado é uma arte, um paradigma novo de relacionamento para com a natureza, para com a Terra e para com os outros seres humanos”2525 Boff L. Cuidado necessário: na vida, na saúde, na educação, na ecologia, na ética e na espiritualidade. Petrópolis: Vozes, 2012.. Logo, o cuidado é um modo de ser e existir com, no e para a vida em todas as suas dimensões e espécies. Desse modo, “o cuidado das pessoas, das sociedades e da natureza será a atitude mais adequada e imprescindível para a nova fase da história da humanidade e da própria Terra”2525 Boff L. Cuidado necessário: na vida, na saúde, na educação, na ecologia, na ética e na espiritualidade. Petrópolis: Vozes, 2012.. A isso Boff chama de novo ethos mundial ou ética global, tão urgente e necessário para a vida e, portanto, para o processo de envelhecer saudável.
Referências
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Datas de Publicação
- Publicação nesta coleção
25 Jan 2021 - Data do Fascículo
Jan 2021
Histórico
- Recebido
02 Jun 2020 - Aceito
26 Ago 2020 - Publicado
28 Ago 2020