Proposta metodológica para avaliação da insegurança alimentar sob a ótica de suas múltiplas dimensões

Natália Louise de Araújo Cabral Nila Patrícia Freire Pequeno Angelo Giuseppe Roncalli Dirce Maria Lobo Marchioni Severina Carla Vieira Cunha Lima Clélia de Oliveira Lyra Sobre os autores

Resumo

O objetivo deste artigo é desenvolver uma proposta metodológica para avaliar a insegurança alimentar e nutricional (INSAN) em adultos e idosos. A proposta metodológica Vigi-INSAN foi elaborada com dados do Brazuca Natal, um estudo transversal com 411 residentes de Natal-RN. O modelo preditivo foi desenvolvido por regressão múltipla de Poisson, analisando-se as variáveis sociodemográficas, de saúde e nutrição, e a insegurança alimentar (IA). A prevalência de IA foi 42,1% (37,4%-46,9%), sendo maior em mulheres (47,5%), adultos (48,2%) e pessoas de cor/raça preta (52,7%). O Vigi-INSAN foi composto por: presença de <18 anos no domicílio (A) (RPaj=1,3; 1,1-1,6), renda familiar (B) (em quintis) (Q1: RPaj=5,4; 2,5-11,7; Q2: RPaj=4,8; 2,2-10,5; Q3: RPaj=3,8; 1,8-8,5; Q4 RPaj=2,2; 1,0-5,1), tratamento inadequado da água de beber (C) (RPaj=1,3; 1,1-1,5), presença de DCNT (D) (RPaj=1,3; 1,1-1,7), não comer frutas no café da manhã (E) (RPaj=1,7; 1,3-2,5), realizar refeições no sofá da sala ou na cama (F) (RPaj=1,3; 1,1-1,6) e pular pelo menos o almoço ou o jantar (G) (RPaj=1,4; 1,2-1,7). Foi adotado o ponto de corte 2,3 (Kappa=0,47; Sensibilidade=0,82; Especificidade=0,67; VPP=0,64; VPN=0,83).

Palavras-chave:
Saúde Coletiva; Segurança Alimentar e Nutricional; Vigilância Alimentar e Nutricional; Questionário

Introdução

Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) é a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, baseada em práticas alimentares promotoras de saúde, e sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis11 Brasil. Lei no 11.346, de 15 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional - SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências. Diário Oficial da União; 2006.. A não efetivação deste direito em qualquer uma de suas dimensões caracteriza a situação de insegurança alimentar e nutricional (INSAN).

Disponibilidade, acesso, utilização biológica e estabilidade são as quatro dimensões da SAN e incluem a produção, acesso físico e financeiro aos alimentos, adequado aproveitamento biológico, mediante o valor nutricional, disponibilidade de saneamento básico e água potável, de forma regular ao longo do tempo22 Chitiga-Mabugu M, Nhemachena C, Karuaihe S, Motala S, Tsoanamatsie N, Mashile L. A research and Policy Unit in collaboration with the Human Sciences Research Council Economic Performance and Development. South Africa: HSRC; 2013..

A evolução da insegurança alimentar (IA) no Brasil é preocupante. Dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares, em 2018, mostraram aumento de 63% da prevalência de IA comparado a 2013, quando 22,6% dos domicílios estavam nessa condição. As regiões Norte (57,0%) e Nordeste (50,3%) apresentaram as situações mais graves do país. O Rio Grande do Norte apresentou a terceira maior prevalência no Nordeste (54,7%), atrás apenas dos estados de Alagoas e Bahia33 Intituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares 2017-2018: análise da segurança alimentar no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2020..

Os retrocessos na questão alimentar e nutricional do Brasil foram acelerados entre 2018 e 2020, período no qual cresceram as vulnerabilidades sociais e foi observado um aumento de 27,6% na ocorrência de IA grave. Atrelada ao contexto de crises nos campos político, social e econômico, a tendência de crescimento da IA foi agravada pela pandemia pelo novo coronavírus e potencializou as iniquidades já observadas no país44 Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN). Insegurança alimentar e Covid-19 no Brasil - VIGISAN - Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil. Brasília: Rede PENSSAN; 2021;,55 Galindo E, Teixeira MA, Araújo M, Motta R, Pessoa M, Mendes L, Rennó L. Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Brasil. Food for Justice Working Paper 4 [Internet]. Berlim; 2021 [acessado 2020 maio 18]. Disponível em: https://www.lai.fu-berlin.de/food-for-justice
https://www.lai.fu-berlin.de/food-for-ju...
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A IA associa-se a desfechos negativos em saúde, como a má nutrição, doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) e baixa percepção de qualidade de vida66 Brown AGM, Esposito LE, Fisher RA, Nicastro HL, Tabor DC, Walker JR. Food insecurity and obesity: Research gaps, opportunities, and challenges. Transl Behav Med 2019; 9(5):980-987.,77 Russell JC, Flood VM, Yeatman H, Wang JJ, Mitchell P. Food insecurity and poor diet quality are associated with reduced quality of life in older adults. Nutr Diet 2016; 73(1):50-58.. É, portanto, um problema estrutural cujos determinantes devem ser monitorados88 Santos TG, Silveira JAC, Longo-Silva G, Ramires EKNM, Menezes RCE. Tendência e fatores associados à insegurança alimentar no Brasil: Pesquisa nacional por amostra de domicílios 2004, 2009 e 2013. Cad Saude Publica 2018; 34(4):1-17.. A Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) é o principal instrumento nacional de mensuração, baseado em uma escala psicométrica da percepção da IA no domicílio99 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação. Escala Brasileira de Insegurança Alimentar - EBIA: análise psicométrica de uma dimensão da Segurança Alimentar e Nutricional. Estudo Técnico. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; 2014..

Apesar de amplamente empregadas em estudos epidemiológicos, os resultados obtidos por escalas subjetivas podem ser afetados pela autopercepção da IA, o que pode representar uma limitação da interpretação dos dados, principalmente em contextos de instabilidade socioeconômica1010 Gregório MJ, Graça P, Nogueira J, Gomes S, Santos CA, Boavida J. Proposta Metodológica para a Avaliação da Insegurança Alimentar em Portugal. Rev Nutricias 2014; 21:4-11.. Além disso, por abranger apenas o aceso ao alimento99 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação. Escala Brasileira de Insegurança Alimentar - EBIA: análise psicométrica de uma dimensão da Segurança Alimentar e Nutricional. Estudo Técnico. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome; 2014. e o componente alimentar da SAN1111 Morais DC, Dutra LV, Franceschini SCC, Priore SE. Insegurança alimentar e indicadores antropométricos, dietéticos e sociais em estudos brasileiros: Uma revisão sistemática. Cien Saude Coletiva 2014; 19(5):1475-1488., faz-se necessário utilizar indicadores complementares, incluindo o componente nutricional, especialmente diante de um perfil alimentar, nutricional e epidemiológico brasileiro marcado pelas altas prevalências de sobrepeso, obesidade e das morbidades crônicas associadas1212 Malta DC, Bernal RTI, Souza MDFM, Szwarcwald CL, Lima MG, Barros MBDA. Social inequalities in the prevalence of self-reported chronic non-communicable diseases in Brazil: National health survey 2013. Int J Equity Health 2016; 15(1):1-11.,1313 Malta DC, Andrade SC, Claro RM, Bernal RTI, Monteiro CA. Evolução anual da prevalência de excesso de peso e obesidade em adultos nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal entre 2006 e 2012. Rev Bras Epidemiol 2014; 17(Supl. 1):267-276..

Ademais, a disseminação no consumo de alimentos ultraprocessados e de práticas alimentares que o favorecem, causa impacto socioeconômico, ambiental e nos sistemas alimentares1414 Monteiro CA, Cannon G, Moubarac JC, Levy RB, Louzada MLC, Jaime PC. The un Decade of Nutrition, the NOVA food classification and the trouble with ultra-processing. Public Health Nutr 2018; 21(1):5-17. e deve considerar as fortes desigualdades sociais do país e suas relações com a INSAN. Com isso, o monitoramento INSAN é primordial na vigilância alimentar e nutricional (VAN), no âmbito do Sistema Único de Saúde, por meio da avaliação de indicadores que possibilitem aos gestores públicos a construção de políticas públicas alinhadas às necessidades da população1515 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Atenção à Saúde. Marco de referência da vigilância alimentar e nutricional. Brasília: MS; 2015..

Frente às múltiplas facetas da INSAN, torna-se necessária utilização de indicadores complementares, que contemplem as dimensões de disponibilidade, acesso, utilização e estabilidade1616 Morais DC, Lopes SO, Priore SE. Evaluation indicators of food and nutritional insecurity and associated factors: Systematic review. Cien Saude Coletiva 2020; 25(7):2687-2700.. Assim, o presente estudo tem como objetivo desenvolver uma proposta metodológica para avaliar a insegurança alimentar e nutricional em adultos e idosos.

Métodos

O desenvolvimento da proposta metodológica para rastreamento da insegurança alimentar e nutricional, Vigi-INSAN, ocorreu a partir dos dados obtidos com a realização do estudo “Insegurança alimentar, condições de saúde e de nutrição em população adulta e idosa de uma capital do Nordeste do Brasil: Estudo Brazuca Natal”. Esse é um estudo observacional, de delineamento transversal, integrante do inquérito multicêntrico de base populacional BRAZUCA (Brazilian Usual Consumption Assessment).

População do estudo

O Brazuca Natal utilizou o plano de amostragem probabilística por conglomerados em múltiplos estágios (setores censitários e domicílios). O tamanho e alocação dos elementos amostrais foram definidos com base nos principais desfechos estudados. O efeito de delineamento (deff) foi de 1,5 e 15% de taxa de não-resposta e domicílios fechados foram acrescidos. Os valores amostrais para cada estrato (adultos e idosos, homens e mulheres) foram determinados para estimar uma prevalência de 50%, com erro de 8% e nível de confiança de 95%.

Setores censitários foram selecionados por probabilidade proporcional ao número de domicílios existente e ordenados por região e renda, para garantir distribuição espacial mais adequada à condição socioeconômica. As unidades secundárias foram selecionadas por amostragem aleatória simples. A quantidade de domicílios foi definida com base no tamanho mínimo de amostra, na densidade de elementos de cada grupo demográfico por domicílio, calculados a partir dos dados do Censo 2010. A taxa de correção foi de 0,9 para compensar as perdas de domicílios fechados, vagos e recusas. Com isso, foram sorteados 71 setores censitários, resultando em uma amostra estimada de 1.032 pessoas (258 por estrato).

Devido à emergência em saúde pública pela pandemia pelo novo coronavírus, as coletas de dados foram interrompidas. Este artigo apresenta um recorte com dados coletados antes da pandemia. Pessoas de ambos os sexos, com condições físicas e cognitivas para responder os questionários e participar da avaliação antropométrica, foram avaliadas no período de junho de 2019 a março de 2020, totalizando 411 entrevistados.

Dos 71 setores censitários previstos, 27 foram pesquisados (38%). Para verificar a equivalência entra a amostra coletada e estimada, procederam-se os testes de análise das perdas dos setores censitários, comparando variáveis socioeconômicas e demográficas dos setores pesquisados e os não pesquisados, para identificar possível viés amostral. Testaram-se as variáveis “número de domicílios particulares permanentes”, “número de residentes dos domicílios particulares permanentes”, “média de moradores”, “rendimento nominal médio” e “razão de sexo”, por teste t e análise de valores omissos, considerando p<0,05. A análise mostrou que as perdas foram aleatórias (p=0,135, teste MCAR de Little).

O estudo foi submetido e aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa do HUOL/UFRN, CAAE nº 96294718.4.2001.5292, parecer nº 3.531.721, conforme as diretrizes regulamentadas do Conselho Nacional de Saúde, com relação à pesquisa envolvendo seres humanos (Resolução 466/2012). As pessoas elegíveis foram devidamente informadas quanto aos objetivos, riscos e benefícios e participaram aqueles que concordaram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Coleta de dados

Dados socioeconômicos, demográficos, de nutrição e saúde foram obtidos por questionário eletrônico reproduzido no aplicativo Epicollect5 (https://five.epicollect.net/). As entrevistas foram conduzidas nos domicílios ou em unidades básicas de saúde por pesquisadores treinados. Todas as etapas da pesquisa foram orientadas por manuais de coleta de dados e procedimentos operacionais padrão para a avaliação antropométrica elaborados pela equipe do estudo, com instruções para padronização na aplicação dos questionários, procedimentos relativos ao exame físico e coleta das medidas.

As medidas antropométricas (peso, altura) foram realizadas conforme técnicas preconizadas pela OMS1717 World Health Organization (WHO). Physical Status: The use and Interpretation of Anthropometry. Report of a WHO Expert Committee. World Health Organ Tech Rep Ser 1995; 854:1-452.. O peso corporal foi medido em balança eletrônica (capacidade de 150 kg e precisão de 50 g). A estatura foi medida com estadiômetro portátil (precisão de 1,0 mm). O Índice de Massa Corporal (IMC) (kg/m²) foi classificado conforme proposição da OMS1717 World Health Organization (WHO). Physical Status: The use and Interpretation of Anthropometry. Report of a WHO Expert Committee. World Health Organ Tech Rep Ser 1995; 854:1-452. para adultos e Lipschitz1818 Lipschitz D. Screening for nutritional status in the elderly. Prim Care 1994; 21:55-67. para idosos.

O consumo alimentar foi avaliado pela escala de adesão a práticas alimentares saudáveis, proposta por Gabe e Jaime1919 Gabe KT, Jaime PC. Development and testing of a scale to evaluate diet according to the recommendations of the Dietary Guidelines for the Brazilian Population. Public Health Nutr 2019; 22(5):785-796., a partir do Guia Alimentar para a População Brasileira. Optou-se por utilizar essa escala, pois as diretrizes do Guia Alimentar Brasileiro2020 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Guia Alimentar para a População Brasileira. Brasília: MS; 2014. considera a multidimensionalidade da alimentação, em seus aspectos ambiental, cultural, socioeconômico e comportamental2121 Monteiro CA, Cannon G, Moubarac JC, Martins APB, Martins CA, Garzillo J, Canella DS, Baraldi LG, Barciotte M, Louzada ML, Levy RB, Claro RM, Jaime PC. Dietary guidelines to nourish humanity and the planet in the twenty-first century. A blueprint from Brazil. Public Health Nutr 2015; 18(13):2311-2322., que convergem conceitualmente com a SAN. A classificação da adesão foi feita por adaptação da classificação original, sendo baixa (<32 pontos), moderada (32 a 41 pontos) e alta (>41 pontos)2222 Gabe KT, Jaime PC. Práticas alimentares segundo o Guia alimentar para a população brasileira: fatores associados entre brasileiros adultos, 2018. Epidemiol Serv saude Rev SUS Bras 2020; 29(1):e2019045.. Os itens da escala foram avaliados individualmente para verificar a associação de diferentes práticas com a IA.

As condições de saúde foram analisadas pela presença de DCNT autorreferidas (hipertensão, diabetes, artrite, acidente vascular cerebral, depressão, câncer, doenças cardiovasculares, doenças pulmonares crônicas, doença renal crônica).

Organização da base teórica e seleção dos itens

A seleção dos itens para compor o Vigi-INSAN considerou a plausabilidade teórica entre as variáveis estudadas e o desfecho de IA, com base nas dimensões de acesso, estabilidade e utilização biológica. Essa proposição é inovadora à medida que dispõe em um único instrumento variáveis que, em geral, têm sua relação com a IA analisada isoladamente.

A avaliação da situação de IA foi feita com aplicação da EBIA, instrumento tradicionalmente utilizado em estudos epidemiológicos nacionais. Para fins de análise, a IA foi agrupada em segurança alimentar (SA) e insegurança alimentar (insegurança leve, moderada e grave).

As variáveis sociodemográficas sexo, idade (20-59 anos, 60 anos e mais), cor/raça autorreferida (branca, parda e outros, preta) e situação conjugal (casado/união estável, solteiro/separado/divorciado, viúvo) foram analisadas para caracterização da população.

As variáveis socioeconômicas e de saúde foram selecionadas de acordo com as dimensões da SAN:

  1. (a) acesso: renda familiar em quintis (Q1= até R$ 1.091,80; Q2= R$ 1.091,81 a R$ 2.000; Q3= R$ 2.000,01 a 3.000; Q4= R$ 3.000,01 a R$ 6.000; Q5= acima de R$ 6.000), número de moradores no domicílio (<3, 4-5, ≥6), presença de menores de 18 anos no domicílio;

  2. (b) estabilidade: situação de trabalho (empregado, desempregado, aposentado ou pensionista), anos de estudo (não alfabetizado, 1 a 4 anos, 5 a 9 anos, 10 a 11 anos, 12 anos e mais).

  3. (c) utilização biológica: acesso ao saneamento básico (adequado, inadequado), frequência do abastecimento de água (diariamente, pelo menos uma vez por semana, menos que uma vez por semana) e tratamento da água de beber (com tratamento, sem tratamento); estado nutricional antropométrico - IMC (inadequado: baixo peso + excesso de peso, adequado: eutrofia); presença de DCNT (nenhuma ou alguma DCNT) e consumo alimentar (itens da escala de adesão ao guia alimentar).

Desenvolvimento do modelo estatístico para mensuração da INSAN

Os dados foram analisados no programa IBM® SPSS® Statistics versão 23. Inicialmente, análise bivariada foi feita para verificar a associação com a IA e estimativa das razões de prevalência brutas (RP), com seus respectivos intervalos de confiança (IC95%). As variáveis com significância de até 0,20 na análise bivariada foram selecionadas para a segunda etapa.

A definição da proposta metodológica considerou os requisitos para um rastreamento simples, rápido, econômico, com uma escala confiável, possível de ser aplicada por um avaliador generalista e de fácil resposta para o entrevistado. Para tal, foram recategorizadas as variáveis situação de trabalho (desempregado/sem ocupação ou empregado e/ou aposentado pensionista), frequência do fornecimento de água (inadequado - não diariamente ou adequado - diariamente) e os itens da escala de adesão ao guia alimentar (nunca/raramente ou quase sempre/sempre).

Na segunda etapa, foi realizada a regressão múltipla de Poisson para definir o modelo estatístico com melhor predição da IA e compor o Vigi-INSAN. Optou-se pela Regressão de Poisson em detrimento da Regressão Logística por ser mais adequada para estudos transversais, com desfechos de alta prevalência2323 Aluísio JD, Barros VNH. Alternatives for logistic regression in cross-sectional studies: an empirical comparison of models that directly estimate the prevalence ratio. BMC Med Res Methodol 2003; 37(1):1-13.. Foram incluídas as variáveis selecionadas na primeira etapa, excluindo-se a cada rodada aquelas p> 0,10. Permaneceram no modelo final, as variáveis com p<0,05. Os pressupostos foram analisados pelo Omnibus Test (p<0,05) e pelo valor de p do “deviance” (p>0,05), para verificar a significância e ajuste do modelo, respectivamente. A eficiência do modelo foi analisada por meio da curva ROC.

Na terceira etapa, a pontuação dos itens foi atribuída utilizando os valores aproximados ao coeficiente da equação de regressão (β) de cada variável do modelo. O ponto de corte para classificação da INSAN foi determinado pela curva ROC.

Resultados

A IA esteve presente em 42,1% (37,4%-46,9%) dos entrevistados (26% leve, 9,2% moderada e 6,8% grave), sendo significativamente maior em mulheres (47,5%; IC95% 41,2-53,8), adultos (48,2%; IC95% 41,7-54,8) e pessoas de cor/raça preta ou parda (48,4; IC95% 42,4-54,6).

As variáveis socioeconômicas, de saúde e nutrição estão apresentadas na tabela 1, de acordo com sua relação com as dimensões da SAN, segundo a análise bruta. Na dimensão do acesso, pessoas de domicílios com menores de 18 anos apresentaram maior prevalência de IA (57,3%), o que representou um aumento de 80% na probabilidade de ter esse desfecho. A situação de IA aumentou proporcionalmente com o número de moradores no domicílio e foi 2,1 vezes maior nos domicílios com 6 ou mais moradores em detrimento daqueles com até 3 pessoas (75,0% versus 35,7%).

Tabela 1
Características socioeconômicas, de saúde e nutrição dos entrevistados pelo estudo Brazuca Natal-RN, 2019-2020, por dimensão da segurança alimentar e nutricional.

Em relação à dimensão da estabilidade, houve associação significativa entre não ter emprego, aposentadoria ou pensão e a ocorrência da IA (56,1%) (RP=1,5; 1,1-1,9), sendo menor entre os aposentados/pensionistas (34,0%), seguido daqueles com emprego fixo (38,6%). A prevalência de IA variou significativamente (p<0,001) conforme os anos de estudo. As maiores prevalências foram observadas entre os não alfabetizados (64,3%; RP=3,3) e com 1 a 4 anos de estudo (51,7%; RP=2,7).

Em relação à utilização biológica, maiores prevalências foram identificadas nos residentes de domicílios com saneamento básico inadequado (48,4%), representando 1,4 vez mais probabilidade de ter IA. O fornecimento de água inadequado, ou seja, não diário, aumentou em 50% a probabilidade de IA. Nestes, a prevalência encontrada foi de 59,0%. A prevalência de IA entre as pessoas que não consomem água tratada (mineral, filtrada ou fervida) foi de 79,5% (RP=2,1; 1,7-2,6).

Quanto às variáveis do estado nutricional e consumo alimentar, observou-se que não houve associação significativa entre baixo peso e excesso de peso com a IA, porém destaca-se o alto percentual de indivíduos com inadequação do estado nutricional antropométrico, sendo 70% dos entrevistados com excesso de peso e 4,7% com baixo peso.

A análise de adesão revelou associação inversa entre a IA e a pontuação da escala, em que aqueles com baixa adesão às recomendações do Guia Alimentar apresentam 1,8 vez mais probabilidade de ter IA, em relação à alta pontuação (58,2% versus 32,5%). A mudança de adesão baixa (RP=1,8; 1,3-2,4) para moderada (RP=1,5; 1,1-1,9) representa uma redução de 30% da probabilidade de ter INSAN (Tabela 1).

Em relação às variáveis de consumo alimentar, procedeu-se com análise bivariada entre cada pergunta da escala de adesão e o desfecho de IA. A Figura 1 apresenta as variáveis com associação significativa (p<0,05), incluídas como marcadores de consumo alimentar na análise múltipla.

Figura 1
Prevalência de insegurança alimentar conforme os itens da escala de adesão ao Guia Alimentar para a População Brasileira, entre os entrevistados do estudo Brazuca Natal-RN, 2019-2020.

Ter o hábito de pular pelo menos o almoço ou jantar (63,2%), de fazer refeições no sofá da sala (57,9%), de beliscar nos intervalos das refeições (56,9%), de beber sucos industrializados (56,5%), de aproveitar o horário das refeições para resolver outras coisas (56,3%) foram os marcadores para os quais encontraram-se as maiores prevalências de IA. Sobre os hábitos saudáveis, respostas “nunca” ou “raramente” para as variáveis fazer refeições com calma (54,2%), comer frutas no café da manhã (52,5%), consumir fruta nos lanches (49,3%), dar preferência a vegetais a vegetais orgânicos (45,0%), variar feijão por ervilha, lentilha ou grão de bico (43,4%), participar do preparo dos alimentos (34,4%), fazer refeições sentado à mesa (34,1%) e comprar alimentos em feiras livres (32,8%) estiveram significativamente associados à IA. Além destas, os itens referentes ao hábito de levar alimento quando sai caso sinta fome (p=0,10) e uso de farinha integral (p=0,12) foram testadas na Regressão múltipla de Poisson.

A Tabela 2 apresenta as prevalências brutas e ajustadas das variáveis elencadas para compor a proposta metodológica de rastreamento da INSAN. A análise ajustada mostrou que, na dimensão do acesso, a presença de menores de 18 anos no domicílio (RPaj=1,3; 1,1-1,6) e renda familiar (Q1: RPaj=5,4; 2,5-11,7; Q2: RPaj=4,8; 2,2-10,5; Q3: RPaj=3,8; 1,8-8,5; Q4: RPaj=2,2; 1,0-5,1) permaneceram significativos no modelo proposto. Nenhuma variável da dimensão da estabilidade permaneceu significativa na análise múltipla.

Tabela 2
Razões de prevalência brutas e ajustadas dos indicadores da proposta metodológica multidimensional de rastreamento da insegurança alimentar e nutricional.

Sobre a dimensão da utilização biológica, das variáveis ambientais, apenas o inadequado tratamento da água de beber permaneceu no modelo final (RP=1,3; 1,1-1,5). A presença de DCNT elevou a probabilidade de ocorrência da IA em 30% e ganhou significância estatística na análise múltipla (RP=1,3; 1,1-1,7).

Já em relação aos marcadores de consumo alimentar, as variáveis correspondentes ao hábito de comer frutas no café da manhã, de realizar as refeições no sofá da sala ou na cama e de pular pelo menos o almoço foram as selecionadas para compor a proposta metodológica. A probabilidade de ter IA foi 1,7 vezes maior naqueles que raramente ou nunca consumiam frutas no café da manhã (RPaj=1,7; 1,3-2,5). Entre os que muitas vezes ou sempre realizam as refeições no sofá da sala ou na cama, a probabilidade de ter IA foi 30% maior que aqueles que nunca ou raramente têm essas práticas (RP=1,3; 1,1-1,6). Já em relação ao hábito de pular pelo menos o almoço ou o jantar, a RP foi 1,4 (1,2-1,7).

Segundo a análise dos pressupostos, houve significância estatística no teste Omnibus (p<0,001) e não significativo para deviance (p=0,54), o que indica adequação do ajuste do modelo. A curva ROC mostrou uma área sob a curva igual a 0,83 (IC95% 0,79-0,87), ou seja, 83% de precisão na predição da INSAN (Figura 2).

Figura 2
Curva ROC do modelo preditivo da insegurança alimentar e nutricional.

A pontuação de cada item da proposta metodológica foi atribuída com valores aproximados aos coeficientes da equação da regressão de Poisson (Quadro 1). O ponto de corte foi definido a partir da curva ROC, sendo considerada INSAN a pontuação igual ou maior que 2,3. O valor do coeficiente Kappa foi 0,47, o que é considerada moderada concordância, segundo a classificação de Landis e Koch2424 Landis JR, Koch GG. The Measurement of Observer Agreement for Categorical Data. Biometrics 1977; 33(1):159.. Quanto aos critérios de precisão diagnóstica, foram obtidos os seguintes resultados: Sensibilidade =0,82; Especificidade =0,67; Valor Preditivo Positivo (VPP) =0,64 e Valor Preditivo Negativo (VPN) =0,83.

Quadro 1
Proposta metodológica multidimensional para rastreamento da insegurança alimentar e nutricional - Vigi-INSAN.

Discussão

No presente artigo, analisaram-se os fatores associados à INSAN em adultos e idosos domiciliados, para produzir uma proposta metodológica para sua avaliação. A magnitude da IA neste estudo foi superior à média 35,1% do Brasil (área urbana), inclusive ao desagregar por intensidade de IA, e, semelhante ao encontrado para a região Nordeste (49,7%), segundo dados da POF33 Intituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares 2017-2018: análise da segurança alimentar no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2020.. Entretanto, este recorte mostra menor prevalência que a identificada para o estado do Rio Grande do Norte (54,7%), que apresentou aumento de 22% nos últimos 5 anos33 Intituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares 2017-2018: análise da segurança alimentar no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2020.,2525 Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Segurança Alimentar: 2004/2013: Brasil, grandes regiões e unidades da federação. Rio de Janeiro: IBGE; 2014..

A proposta apresentada neste artigo mostra a análise por dimensões da SAN. A presença de menores de 18 anos no domicílio, a maior densidade domiciliar e a renda principal inferior a um salário-mínimo aumentaram a probabilidade da ocorrência de IA, por comprometer o acesso financeiro à alimentação. Essas condições implicam em menor renda per capita e maiores gastos com alimentação e outras necessidades essenciais, principalmente da criança e do adolescente e em famílias mais numerosas88 Santos TG, Silveira JAC, Longo-Silva G, Ramires EKNM, Menezes RCE. Tendência e fatores associados à insegurança alimentar no Brasil: Pesquisa nacional por amostra de domicílios 2004, 2009 e 2013. Cad Saude Publica 2018; 34(4):1-17.,2626 Marin-Leon L, Francisco PMSB, Segall-Corrêa AM, Panigassi G. Bens de consumo e insegurança alimentar: Diferenças de gênero, cor de pele autorreferida e condição socioeconomic. Rev Bras Epidemiol 2011; 14(3):398-410.

27 Ferreira HS, Souza MEDCA, Moura FA, Horta BL. Prevalência e fatores associados à Insegurança Alimentar e Nutricional em famílias dos municípios do norte de Alagoas, Brasil, 2010. Cien Saude Colet 2014; 19(5):1533-1542.

28 Panigassi G, Segall-Corrêa AM, Marin-León L, Pérez-Escamilla R, Sampaio MDFA, Maranha LK. Insegurança alimentar como indicador de iniqüidade: Análise de inquérito populacional. Cad Saude Publica 2008; 24(10):2376-2384.

29 Maas NM, Mendoza-Sassi RA, Meucci RD, Cesar JA. Food insecurity in rural families in the extreme South of Brazil. Cien Saude Colet 2020; 25(7):2605-2614.

30 Sperandio N, Priore SE. Prevalência de insegurança alimentar domiciliar e fatores associados em famílias com pré-escolares, beneficiárias do Programa Bolsa Família em Viçosa, Minas Gerais, Brasil. Epidemiol Serv Saude 2015; 24(4):739-748.
-3131 Souza BFNJ, Marin-Leon L, Camargo DFM, Segall-Corrêa AM. Demographic and socioeconomic conditions associated with food insecurity in households in Campinas, SP, Brazil. Rev Nutr 2016; 29(6):845-857..

Na análise bivariada das variáveis da dimensão da estabilidade, a já esperada associação inversa entre anos de estudo e IA foi identificada. Bezerra et al.3232 Bezerra TA, Olinda RA, Pedraza DF. Food insecurity in Brazil in accordance with different socio-demographic scenarios. Cien Saude Colet 2017; 22(2):637-652. corroboraram a associação entre escolaridade e presença de emprego à situação de IA no Brasil. A baixa escolaridade é uma barreira para inserção no mercado de trabalho formal, e, consequentemente, ao acesso a empregos com remuneração satisfatória3030 Sperandio N, Priore SE. Prevalência de insegurança alimentar domiciliar e fatores associados em famílias com pré-escolares, beneficiárias do Programa Bolsa Família em Viçosa, Minas Gerais, Brasil. Epidemiol Serv Saude 2015; 24(4):739-748..

Este estudo preocupou-se em apresentar o componente nutricional além do alimentar, ao avaliar indicadores da utilização biológica. A tríade água, saneamento básico e higiene é considerada primordial para o alcance da SAN, devido aos impactos em saúde decorrentes da contaminação dos alimentos pela ausência de condições adequadas de higiene e saneamento, e, água segura para o consumo3333 WASH Advocates. Global Food Security: The Critical Role of Water, Sanitation, and Hygiene (WASH). Washington, D.C.: WASH and Food Security; 2013..

Apesar da redução média de 47,3% (2004-2013), a probabilidade de IA nos domicílios com saneamento inadequado tem persistido nos últimos anos no Brasil88 Santos TG, Silveira JAC, Longo-Silva G, Ramires EKNM, Menezes RCE. Tendência e fatores associados à insegurança alimentar no Brasil: Pesquisa nacional por amostra de domicílios 2004, 2009 e 2013. Cad Saude Publica 2018; 34(4):1-17.. Diversos estudos ratificam as relações entre o manejo do saneamento básico e utilização de água tratada para consumo e a INSAN1111 Morais DC, Dutra LV, Franceschini SCC, Priore SE. Insegurança alimentar e indicadores antropométricos, dietéticos e sociais em estudos brasileiros: Uma revisão sistemática. Cien Saude Coletiva 2014; 19(5):1475-1488.,3434 Figueroa-Pedraza D, Alves-Bezerra T, Dantas AC, Cerqueira R, Fonsêca JS. (In)Segurança alimentar de famílias residentes em um município do interior da Paraíba, brasil Food (in)security of families living in a city of Paraíba, Brazil. Rev Salud Pública 2017; 19(5):649-656.,3535 Pedraza DF, Gama JSFA. Segurança alimentar e nutricional de famílias com crianças menores de cinco anos do município de Campina Grande, Paraíba. Rev Bras Epidemiol 2015; 18(4):906-917..

De forma análoga à INSAN, a insegurança hídrica repercute negativamente na qualidade de vida da população, inclusive pela experiência de ansiedade diante da incerteza do fornecimento de água e comprometimento do orçamento doméstico para provê-la3636 Stoler J, Pearson AL, Staddon C, Wutich A, Mack E, Brewis A, Rosinger AY; Household Water Insecurity Experiences (HWISE) Research Coordination Network. Cash water expenditures are associated with household water insecurity, food insecurity, and perceived stress in study sites across 20 low- and middle-income countries. Sci Total Environ 2020; 716:135881.,3737 Workman CL, Ureksoy H. Water insecurity in a syndemic context: Understanding the psycho-emotional stress of water insecurity in Lesotho, Africa. Soc Sci Med 2017; 179:52-60.. O acesso à água de qualidade é um direito humano fundamental3838 Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA). O acesso e os usos da água no contexto da soberania e da Segurança Alimentar e Nutricional. Brasília: CONSEA; 2008., essencial à efetivação do DHAA e da SAN em suas múltiplas dimensões, no entanto, não é avaliado pela EBIA.

Indicadores de consumo alimentar são usados para abranger o componente nutricional e são proxy da INSAN quando não atendem às recomendações nutricionais para determinados grupos alimentares e/ou nutrientes1616 Morais DC, Lopes SO, Priore SE. Evaluation indicators of food and nutritional insecurity and associated factors: Systematic review. Cien Saude Coletiva 2020; 25(7):2687-2700.,3939 Kepple AW, Segall-Corrêa AM. Conceituando e medindo segurança alimentar e nutricional. Cien Saude Colet 2011; 16(1):187-199.. Com notório destaque, o guia alimentar brasileiro é o principal documento norteador das práticas alimentares adequadas e saudáveis, sob princípios que convergem com o conceito de SAN2121 Monteiro CA, Cannon G, Moubarac JC, Martins APB, Martins CA, Garzillo J, Canella DS, Baraldi LG, Barciotte M, Louzada ML, Levy RB, Claro RM, Jaime PC. Dietary guidelines to nourish humanity and the planet in the twenty-first century. A blueprint from Brazil. Public Health Nutr 2015; 18(13):2311-2322.,2222 Gabe KT, Jaime PC. Práticas alimentares segundo o Guia alimentar para a população brasileira: fatores associados entre brasileiros adultos, 2018. Epidemiol Serv saude Rev SUS Bras 2020; 29(1):e2019045.. Por isso, optou-se por utilizar os indicadores propostos na escala de adesão ao guia alimentar, por traduzir o entendimento da SAN em suas múltiplas dimensões. Neste estudo, a adequação às recomendações do guia alimentar apresentou associação inversa com a IA, caracterizando a insegurança nutricional pelo possível comprometimento da adoção de práticas alimentares saudáveis entre aqueles em situação de IA.

A análise item a item evidenciou altos percentuais de respostas divergentes às recomendações do guia quanto à escolha dos alimentos e modos de comer relacionados com práticas compatíveis com a preferência por alimentos in natura e minimamente processados em detrimento dos ultraprocessados1919 Gabe KT, Jaime PC. Development and testing of a scale to evaluate diet according to the recommendations of the Dietary Guidelines for the Brazilian Population. Public Health Nutr 2019; 22(5):785-796.. Nesse aspecto, destacam-se o hábito de realizar refeições no sofá da sala ou na cama, hábito de pular pelo menos o almoço ou o jantar, incluídos na proposta metodológica.

Tais práticas chamam atenção sobre como ocorre o consumo de alimentos e refeições, especialmente quanto às características do ambiente, da regularidade e atenção destinadas à alimentação1919 Gabe KT, Jaime PC. Development and testing of a scale to evaluate diet according to the recommendations of the Dietary Guidelines for the Brazilian Population. Public Health Nutr 2019; 22(5):785-796.,2020 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Guia Alimentar para a População Brasileira. Brasília: MS; 2014.. Fazer refeições em locais inapropriados, como sofá ou cama, pode estimular o consumo excessivo de porções e alimentos ultraprocessados, principalmente em ambientes com celulares ou aparelhos de TV, que interferem na interação com o alimento e concentração ao alimentar-se2020 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Guia Alimentar para a População Brasileira. Brasília: MS; 2014..

Vale ressaltar que alimentos ultraprocessados apresentam alta densidade energética, gorduras não saudáveis, açúcares refinados, sódio e pobres em fibras dietéticas, proteínas e micronutrientes. Por seu perfil nutricional inadequado, o consumo excessivo desses alimentos está relacionado à epidemia de obesidade no Brasil e às DCNT1414 Monteiro CA, Cannon G, Moubarac JC, Levy RB, Louzada MLC, Jaime PC. The un Decade of Nutrition, the NOVA food classification and the trouble with ultra-processing. Public Health Nutr 2018; 21(1):5-17.,4040 Canella DS, Levy RB, Martins APB, Claro RM, Moubarac JC, Baraldi LG, Cannon G, Monteiro CA.. Ultra-processed food products and obesity in Brazilian households (2008-2009). PLoS One 2014; 9(3):e92752.,4141 Louzada MLC, Baraldi LG, Steele EM, Martins APB, Canella DS, Moubarac JC, Levy RB, Cannon G, Afshin A, Imamura F, Mozaffarian D, Monteiro CA. Consumption of ultra-processed foods and obesity in Brazilian adolescents and adults. Prev Med 2015; 81:9-15.. Portanto, a maior participação de alimentos ultraprocessados na dieta do brasileiro representa forte ameaça à efetivação da SAN.

Apesar de realizar refeições no sofá ou na cama não ser uma prática recomendada, o ambiente domiciliar pode não ser adequado ao ato de comer. Em residências pequenas, é comum que a mesa da cozinha esteja na sala, próxima à televisão, ou ainda, que essa seja utilizada para compensar a falta de companhia4242 Menegassi B. Eat regularly and carefully, in appropriate environments and in company": A brief analysis of this recommendation of the Brazilian Food Guide. Appetite 2020; 149:104619.. Assim, essa prática traduz aspectos quantitativos e qualitativos da alimentação, e pode estar associado a condições precárias e falta de recursos2020 Brasil. Ministério da Saúde (MS). Guia Alimentar para a População Brasileira. Brasília: MS; 2014.,4343 Scagliusi FB, Pereira PR, Unsain RF, Sato PM. Eating at the table, on the couch and in bed: An exploration of different locus of commensality in the discourses of Brazilian working mothers. Appetite 2016; 103:80-86..

Pular refeições está relacionado à regularidade da alimentação. Reduzir o tamanho das porções ou pular refeições é um dos principais marcadores da IA que se reflete no componente nutricional, devido à escassez de alimentos4444 Rasmusson G, Lydecker JA, Coffino JA, White MA, Grilo CM. Household food insecurity is associated with binge-eating disorder and obesity. Int J Eat Disord 2019; 52(1):28-35.. Apesar disso, é necessário extrapolar o entendimento da IA para além das carências nutricionais e fome, especialmente diante da alta prevalência de excesso de peso encontrada no território brasileiro.

De forma similar, a divergência de respostas entre itens da organização doméstica e planejamento e as proposições do guia, podem indicar dificuldades no preparo e consumo de alimentos em casa. Neste estudo, não ter o hábito de comer fruta no café da manhã esteve associado à IA e foi elencado para compor o modelo estatístico. Panigassi et al.4545 Panigassi G, Segall-Corrêa AM, Marin-León L, Pérez-Escamilla R, Maranha LK, Sampaio MDFA. Insegurança alimentar intrafamiliar e perfil de consumo de alimentos. Rev Nutr 2008; 21(Supl.):135-144. identificaram que domicílios com algum grau de IA tinham dieta mais monótona, composta por alimentos densamente energéticos e que afetava o seu consumo de alimentos in natura, como frutas e vegetais. Em outro estudo, o consumo de alimentos in natura e minimamente processados foi reduzido nesses domicílios, sem alterar, contudo, a ingestão de ultraprocessados4646 Araújo ML, Mendonça RD, Lopes Filho JD, Lopes ACS. Association between food insecurity and food intake. Nutrition 2018; 54:54-59.. Dados da última POF (2017-2018) destacam a menor aquisição de frutas, hortaliças, aves, carnes e ovos conforme a IA se agrava e maior aquisição de cereais, leguminosas e farináceos33 Intituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de orçamentos familiares 2017-2018: análise da segurança alimentar no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2020., alimentos de maior valor energético e menos perecíveis que os in natura.

A alimentação nutricionalmente inadequada aumenta o risco para DCNT e obesidade1414 Monteiro CA, Cannon G, Moubarac JC, Levy RB, Louzada MLC, Jaime PC. The un Decade of Nutrition, the NOVA food classification and the trouble with ultra-processing. Public Health Nutr 2018; 21(1):5-17.. Estudos têm mostrado associações entre a INSAN e a presença de múltiplas condições crônicas, especialmente em idosos. Essas relações são bidirecionais, de forma que a INSAN pode contribuir para o seu desenvolvimento ou agravamento, ou estas impactarem o orçamento doméstico, pelos custos com tratamento medicamentoso da doença, criando um loop IA-doença crônica-IA4747 Fernandes SG, Rodrigues AM, Nunes C, Santos O, Gregório MJ, Sousa RD, Dias S, Canhão H. Food insecurity in older adults: Results from the epidemiology of chronic diseases cohort study 3. Front Med (Lausanne) 2018; 5:203.,4848 Jih J, Stijacic-Cenzer I, Seligman HK, Boscardin WJ, Nguyen TT, Ritchie CS. Chronic disease burden predicts food insecurity among older adults. Public Health Nutr 2018; 21(9):1737-1742..

Frente a sua complexidade conceitual, medir a INSAN é desafiador pela necessidade de utilizar inúmeros indicadores. Nesse sentido, a presente proposta é inovadora, pois engloba variáveis com elevada sensibilidade para identificar a INSAN. A alta convergência entre o Vigi-INSAN e a EBIA (padrão-ouro) aponta para a viabilidade de utilizá-lo como ferramenta de rastreamento. A elevada sensibilidade corrobora sua aplicabilidade na correta identificação daqueles em situação de INSAN. A especificidade de 0,67 mostra de maneira satisfatória os que de fato não estão em situação de IA. O alto VPN indica que entre aqueles com triagem negativa pelo Vigi-INSAN, 83% estavam em situação de SAN, excluindo-os adequadamente. O VPP de 64% aponta a proporção daqueles que realmente encontram-se em situação de INSAN. Poblacion et al.4949 Poblacion A, Segall-Corrêa AM, Cook J, Taddei JAAC. Validity of a 2-item screening tool to identify families at risk for food insecurity in Brazil. Cad Saude Publica 2021; 37(6):e00132320. também propuseram um instrumento de triagem para identificação da IA a partir de modelo estatístico semelhante ao exposto neste trabalho.

Por incluir itens referentes à dimensão da utilização biológica (componente nutricional), o Vigi-INSAN é uma proposta metodológica que pode ser complementar ao componente alimentar e a dimensão do acesso medidos pela EBIA, além de uma alternativa em situações em que a sua aplicação não seja viável. É preciso dar um passo adiante na utilização de indicadores que ofereçam elementos complementares ao acesso à alimentação e valorizem a dimensão nutricional, especialmente diante de um cenário de transições alimentar, nutricional e epidemiológica, e, em particular no atual momento de crise econômica agravada pela pandemia do novo coronavírus.

A principal limitação deste trabalho é o desenho de estudo transversal que não permite a inferência causal entre as variáveis estudadas e o desfecho de IA. Outra limitação é que variáveis relevantes podem não ter sido incorporadas ao modelo múltiplo por limitação amostral, uma vez que não foi possível continuar as coletas de dados devido à pandemia.

Apesar disso, destaca-se a valiosa contribuição deste trabalho por propor uma metodologia que abrange os componentes alimentar e nutricional. O Vigi-INSAN pode ser uma importante ferramenta de VAN para rastreamento da INSAN por profissionais da atenção básica à saúde e para subsidiar a gestão no planejamento e desenvolvimento de políticas e ações intersetoriais de efetivação da SAN.

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  • Financiamento

    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001, e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - Edital Universal processo número 431053/2016-2.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Jul 2022

Histórico

  • Recebido
    05 Jun 2021
  • Aceito
    05 Jan 2022
  • Publicado
    07 Jan 2022
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revscol@fiocruz.br