Aboriginal Health and History: Power and Prejudice in Remote Australia. E. Hunter. New York: Cambridge University Press, 1993. xvi + 318 pp., índice, biblio., figuras e tabelas.
ISBN 0.521.41629.9 (capa dura)
ISBN 0.521. 44760.7 (brochura) US$59.95
A obra em apreço, de autoria de Ernest Hunter, médico psiquiatra australiano, constitui uma das mais importantes contribuições recentes à epidemiologia das populações nativas da Oceania.
Trata-se de um estudo de caso que enfoca a população aborígena da região de Kimberley, ao noroeste da Austrália. O objetivo da investigação é analisar o impacto sobre as condições de vida e de saúde aborígena, das mudanças socioculturais, econômicas e ambientais advindas do contato com os Europeus. Hunter está particularmente interessado em epidemiologia e saúde mental, enfocando o alcoolismo, mudanças de comportamento, assassinatos e suicídio na população aborígena.
Ernst Hunter realiza cuidadoso inquérito epidemiológico, complementado pela análise de dados secundários (principalmente causas de óbito) disponíveis nos serviços locais de saúde. Simultaneamente, o autor conduz investigação de orientação antropológica constituída por entrevistas em profundidade. Chama a atenção o cuidado com o método, sempre apresentado de forma crítica. Questões de ordem ética advindas da investigação de campo são também discutidas ao longo do texto.
Até a chegada dos europeus no final do século XIX, a região de Kimberley constituiu território sagrado dos povos aborígenas por mais de 40 mil anos. Após este contato, suas terras foram violentamente invadidas por fazendeiros, garimpeiros e outros intrusos, o que levou a dizimação da população nativa e ursupação de seus territórios. O autor demonstra sem deixar dúvidas como que a marginalização e alienação dos povos aborigenas, expulsos de suas terras e forçados a viver na periferia de uma sociedade que não os aceitam, leva a um quadro de pobreza e violência generalizada.
Chama a atenção a semelhança do quadro descrito por Hunter com aquele observado nas regiões mais pobres do mundo "subdesenvolvido", o que torna ainda mais gritante os resultados deste estudo por expôr as enormes distâncias que separam o "main stream" da sociedade australiana de seus aborígenas. Elevadas taxas de mortalidade materna e infantil, altas prevalências de infecções respiratórias, desnutrição infantil, doenças cardiovasculares, diabetes mellitus, alcoolismo e acidentes somam-se às precárias condições de vida, habitação e desemprego, produzindo um quadro marcado por violência, alcoolismo e elevadas taxas de suicídio entre jovens.
Ao final do livro, no entanto, o autor assume um tom otimista no que se refere ao futuro da população aborígena da Austrália em geral, e de Kimberley em particular. Para Hunter, os acenos recentes por parte do governo federal, através da promulgação de legislação específica, visando regularizar a situção das terras aborígenas, são um indicativo de que, no futuro próximo, mudanças positivas poderão ocorrer para reverter o cenário tão vivido de pobreza e exclusão descrito pelo autor. Além disso, o amadurecimento e expansão dos movimentos étnicos na Austrália dão voz às lideranças aborígenas, fato inusitado na história do país.
A leitura deste livro é altamente recomendada não somente pelas discussões metodológicas e teóricas mas, principalmente, pela análise meticulosa de uma realidade que, em sua essência, aplica-se também à realidade com a qual se deparam as populações indígenas no Brasil.
Carlos E. A. Coimbra Jr.
Departamento de Endemias Samuel Pessoa
Escola Nacional de Saúde Pública