FÓRUM FORUM
Fórum: o que é saúde urbana?
Projeta-se que, em 2030, dois terços da população mundial viverão em grandes centros urbanos. A população brasileira, na década de 90, apresentou a menor taxa de crescimento dos últimos 40 anos, associada à crescente urbanização: em 1991, 75,6% da população morava em zonas urbanas em comparação com 81,2% em 2000. E o que é saúde urbana? Claramente, trata-se de conceito (e objeto) em construção. Podemos citar como referencial teórico-operacional a urbanização acentuada da população, associada a importantes iniqüidades intra-urbanas. A ocorrência dos eventos relacionados à saúde estaria associada a atributos dos indivíduos aninhados no "lugar urbano", assim como a propriedades do agregado desses indivíduos (composição). A saúde urbana incorpora uma outra dimensão: o papel do ambiente físico e social do "lugar" (o contexto) em moldar a saúde das pessoas. O entendimento de que nem todos os determinantes de eventos relacionados à saúde podem ser reduzidos a atributos restritos ao nível hierárquico de complexidade individual é motivo de recente debate no campo da epidemiologia. Uma nova visão e compreensão das complexidades metodológicas, inferências relacionadas aos estudos e variáveis mensuradas em nível hierárquico de grupo, agregado e contexto têm despertado interesse crescente e reflexões sobre os possíveis efeitos, para a saúde dos indivíduos e das populações, de construtos e variáveis mensuradas no nível de complexidade contextual, como iniqüidade em renda, capital social e características da "vizinhança". Neste Fórum, Monte-Mór discute a evolução histórica das cidades de acordo com Henri Lefèbvre: da cidade política à cidade medieval e, finalmente, desta à cidade industrial dos dias atuais, além do duplo processo sofrido, caracterizado pela implosão sobre si mesma e pela explosão. Essa urbanização extensiva avança para além das fronteiras do urbano, ocupando todo o espaço social. Poderia essa ocupação ser determinante para a reemergência, em áreas urbanas do País, de doenças tradicionalmente entendidas como "rurais", como a leishmaniose visceral humana? Vlahov et al. discutem os conceitos "efeitos adversos do urbano sobre a saúde", "a expansão e o esgarçar do tecido urbano" e "efeitos positivos do urbano para a saúde". Propõem, ainda, três questões que exigirão enorme esforço, criatividade e um novo pensar para serem respondidas; é razoável dizer que respostas somente serão possíveis dentro de uma perspectiva trans e interdisciplinar. Finalmente, Caiaffa et al. utilizam metodologia ecológica para mensurar a variação geográfica intra-urbana de eventos diversos relacionados à saúde, como a asma, dengue, gravidez de adolescentes, homicídios e a leishmaniose visceral humana no contexto do Município de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Esperamos que, em instituições acadêmicas e serviços de saúde, os textos estimulem o debate e contribuam para a incorporação do tema saúde urbana ao campo da saúde coletiva.
Fernando Augusto Proietti; Waleska Teixeira Caiaffa
Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil