RESENHAS BOOK REVIEWS
Tiago Pessoa Tabosa e Silva; Israel de Lucena Martins Ferreira
Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, Brasil. drtiagopessoa@yahoo.com.br
CRITÉRIOS PARA ANÁLISE DE INVESTIMENTOS EM SAÚDE. Diretoria de Investimentos e Projetos Estratégicos, Secretaria Executiva, Ministério da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde; 2005. 56 pp.
ISBN: 85-334-0811-0
No Brasil, assim como em muitos países subdesenvolvidos, observa-se que a saúde é fortemente influenciada pelo baixo nível sócio-econômico da população. Desde os primórdios da história da medicina, reconhece-se a presença marcante do baixo nível sócio-econômico da população como um fator de risco, como um fator determinante ou mesmo agravante para o desenvolvimento de inúmeras doenças. Esses são considerados atualmente excelentes marcadores do estágio atual de desenvolvimento social no país, uma vez que os determinantes do estado de pobreza, as fraquezas de organização do sistema de saúde e as deficiências de gestão limitam a ação da tecnologia e, por conseguinte, inibem a queda sustentada das doenças marcadas pelo contexto social.
Não obstante, o fraco desenvolvimento em saúde torna-se um empecilho ao desenvolvimento econômico do país, uma vez que reduz a renda do indivíduo, a empregabilidade do mais baixo estrato de renda da sociedade, a capacidade de aprendizado da população e a sua expectativa de vida, ajudando a perpetuar os círculos viciosos da pobreza, da desigualdade, da injustiça social e da violência, que acometem desproporcionalmente a população socioeconomicamente desfavorecida.
Observa-se uma complexa interação entre os fatores determinantes das condições de saúde de uma população e uma inobservância do caráter de multidimensionalidade da área social. Nesse sentido, apesar das dificuldades inerentes à ampla gama de condições que possam influenciar a saúde, torna-se imprescindível, na elaboração de critérios que possam direcionar os investimentos em benefício da mesma, a racionalização das ações, a análise precisa das relações de custo-efetividade e a minimização de erros no direcionamento e na condução das políticas públicas.
Esta obra estabelece direcionamentos que permitem a justa alocação de recursos de saúde, baseando-se em padrões científicos, em norteamento político e em parâmetros que permitem a sustentabilidade dos projetos originários do parlamento e das instâncias de governos estaduais e municipais.
Segundo Edmundo Gallo, diretor de investimentos e projetos estratégicos do Ministério da Saúde, espera-se que esse esforço coletivo institucional possa se tornar um importante instrumento para a construção de um cenário em que se observe a justiça social de sorte a reafirmar o respeito à Constituição Federal de 1988, que definiu a saúde como "um direito de todos e um dever do Estado".
O livro é dividido em sete seções. A primeira seção nos traz alguns estudos e conceitos que embasam e justificam a iniciativa do Ministério da Saúde de sistematizar a alocação de recursos em saúde. A segunda aborda as principais características e distorções observadas na alocação de recursos de investimentos; a terceira expõe o processo utilizado pelo Ministério da Saúde na construção de práticas para alocação de investimentos de maneira mais efetiva, eficiente e democrática; a quarta seção explicita o novo fluxograma de análise de investimentos, de modo a tornar o processo mais ágil; a seção seguinte apresenta algumas limitações que esta nova metodologia sofrerá nos primeiros anos de implementação, seguida da sexta seção, que apresenta os critérios para análise de investimentos em saúde; a sétima traça algumas considerações finais, proporcionando ao leitor conclusões objetivas sobre a verdadeira necessidade deste feito e sobre as possíveis repercussões da adoção de critérios para análise de investimentos em saúde.
Os principais critérios para análise de investimentos propostos para a área da saúde, juntamente com as suas respectivas fundamentações, são explicitados a seguir:
1. Critério estratégico para a descentralização: haja vista a importância da descentralização na racionalização da atenção à saúde, este critério almeja a promoção de infra-estrutura física ou humana para a descentralização do sistema;
2. Grupos estratégicos: este item visa a verificar se os projetos têm como público alvo grupos de risco nas periferias de cidades com mais de 300 mil habitantes, em áreas de difícil acesso, além dos demais grupos em situação de vulnerabilidade na sociedade. Priorizam-se projetos voltados para crianças, adolescentes, mulheres, idosos, portadores de deficiências, trabalhadores rurais e urbanos, portadores de transtornos mentais e vítimas de violência;
3. Humanização do ambiente de trabalho: visa à crescente valorização de projetos de construção, ampliação e reforma que possibilitem fluxos lógicos e ordenados de atendimento, otimizando e qualificando as atividades profissionais;
4. Desenvolvimento da força de trabalho: avalia-se se o projeto prevê a capacitação específica da força de trabalho, se há um núcleo de gestão do trabalho e de educação em saúde, promovendo-se a educação permanente inserida nos processos de trabalho;
5. Racionalidade do investimento: esta terá de ser comprovada e fundamentada por meio de indicadores de morbidade e de mortalidade, os quais deverão corroborar com o pedido do investimento. Avalia-se se há consistência entre a proposta de infra-estrutura do projeto, o montante do investimento solicitado e o objetivo central do projeto;
6. Coerência com as prioridades nacionais de investimento no complexo produtivo da saúde: almeja-se erradicar os erros no direcionamento das políticas públicas;
7. Verificação da sustentabilidade do projeto: avalia-se se o investimento favorece ou não a sustentabilidade da infra-estrutura já existente e daquela a ser implantada;
8. Custo-efetividade do projeto: a proposta deve aumentar a potencialidade das ações, apresentando claramente vantagens comparadas de custo-benefício. Essa relação torna-se bastante favorável quando se verificam a intersetorialidade, o controle social e a gestão participativa nos investimentos;
9. Necessidade de incorporação tecnológica: verifica-se se há compatibilidade da incorporação com as diretrizes do governo e com as necessidades regionais, resultando em melhoria da assistência prestada à sociedade;
10. Impacto sobre a promoção da eqüidade da saúde e do sistema de saúde: avalia-se a abrangência do projeto a grupos populacionais que apresentam dificuldades de acesso à assistência em saúde;
11. Impacto sobre a cobertura e a integralidade: estimulam-se ações que aumentem a cobertura dos serviços e integrem conhecimentos e outros recursos necessários para esta cobertura;
12. Modelo de gestão do projeto: verificam-se os aspectos organizacionais e a factibilidade da estrutura de gestão do projeto sob os pontos de vista gerencial, técnico e financeiro;
13. Resultados previstos: almeja-se a exposição clara dos objetivos e metas assistenciais, demonstrando-se a forma e a possibilidade de se comprovar o resultado do investimento por meio de indicadores;
14. Análise do impacto ambiental do projeto: verificam-se as condições do estabelecimento no atendimento às normas em vigor de gerenciamento de resíduos de serviços de saúde, bem como se o projeto respeita o ambiente ou lhe causa danos.
Como se observa, almeja-se, com essas diretrizes para o direcionamento das ações relacionadas aos investimentos em Saúde Pública, a seleção prioritária de ações com grande impacto promocional da saúde, baseadas em caminhos normativos seguros que representem a verdadeira necessidade da população, minimizando-se provavelmente o elevado número de ações isoladas e pouco eficazes, que contribuam para a ineficiência do sistema. Um outro aspecto de extrema relevância na análise sistemática dos investimentos em saúde, consiste na transparência na qual os investimentos serão selecionados, explicitando-se claramente as prioridades macropolíticas para o desenvolvimento do setor da saúde, evitando-se, portanto, subjetividades que possam inferir em erros persistentes e danosos em termos de Saúde Pública.
A transparência dos critérios implementados e vigentes possibilita a atenção e o acompanhamento contínuo da sociedade no que se refere aos fins e meios selecionados para a promoção da saúde. A análise crítica e aberta de atores sociais, políticos e gestores de saúde alberga o essencial e indispensável "feedback" para o progressivo aprimoramento desses critérios, em benefício da certeza da qualidade da saúde prestada à população.