RESENHAS BOOK REVIEWS
Maria Augusta Bessa Rebelo
Faculdade de Odontologia, Universidade Federal do Amazonas, Manaus, Brasil. augusta@ufam.edu.br
SAÚDE BUCAL COLETIVA: IMPLEMENTANDO IDÉIAS, CONCEBENDO INTEGRALIDADE. Lopes MGM. Rio de Janeiro: Editora Rubio; 2008. 208 pp. ISBN: 978-85-7771-015-7
Em função do momento em que vive a Saúde Bucal Coletiva em nosso país, o livro Saúde Bucal Coletiva: Implementando Idéias, Concebendo Integralidade mostra-se extremamente oportuno por apresentar uma discussão abrangente sobre Integralidade e o desafio de vencer os obstáculos para sua inserção na academia e nos serviços. Assim, o livro tem a integralidade como eixo transversal em suas quatro partes que são subdivididas em capítulos.
A primeira é denominada Processos de Construção da Integralidade: Subjetividade e Participação Social em Saúde Bucal Coletiva. O primeiro texto, assinado por Carlos Botazzo, discute, com propriedade, a complexidade da produção do cuidado integral em saúde bucal, tomando, como categorias de análise, integralidade, clínica e clínica odontológica, saúde bucal e bucalidade. O autor aborda pontos que deveriam compor um programa político para a Saúde Bucal Coletiva, entre os quais destacamos "submeter o aparelho formador aos princípios organizativos do Sistema Único de Saúde" buscando ultrapassar o centramento dentário, as concepções tecnicistas e biologicistas que predominam no ensino odontológico. Em seguida, Marco Antônio Manfredini explora a relação entre saúde bucal e cidadania, historiando, de forma clara e concisa, os registros de temas ligados à odontologia e à saúde bucal nas Conferências Nacionais de Saúde e Saúde Bucal, e conclui o texto dizendo: "Para os que se ocupam da luta cotidiana em defesa da vida e da saúde do país, persiste o desafio de se estudarem as causas da contradição entre a necessidade sentida da população por tratamento dentário e a precária organização desta na defesa do direito de cidadania de saúde bucal". Em seqüência, Nilson Santos Beltrame e Paulo Capel Narvai abordam a participação comunitária e como esta poderia se transformar em instrumento propulsor de políticas públicas de saúde que contemplem o princípio da integralidade. Os autores discorrem, de forma esclarecedora, sobre o conceito de "alteridade negada" na avaliação da atuação dos conselhos de saúde e abordam o caso do Conselho Municipal de Saúde de São José dos Campos (São Paulo), apontando seus avanços e fragilidades. Concluindo essa parte, Alexandre Teixeira Trino remete-nos para uma visão mais ampliada da saúde e da doença, bem como para uma reflexão sobre a contradição que ainda vive a odontologia brasileira; abordando ainda o papel da saúde bucal coletiva na saúde suplementar.
Na segunda parte, os autores abordam o Processo de Ensino-Aprendizagem: Integralidade na Formação de Trabalhadores em Saúde Coletiva. Inicialmente, Danielle Mattos discorre sobre a influência do modelo biomédico nas práticas de ensino e como a escola de Odontologia apreendeu o paradigma educacional em saúde com base nos relatórios Flexner e Gies, e problematiza a construção curricular a partir das diretrizes para o curso de Odontologia considerando o princípio da integralidade em saúde. Na seqüência, Leda Maria de Medeiros Hansen discute a possibilidade de inserir a integralidade na formação técnica em saúde. A autora apresenta um rico referencial teórico acerca do conceito de integralidade e ainda o relato de experiência do CEFOPE (uma escola técnica da Secretaria de Estado de Saúde do Rio Grande do Norte, componente da Rede de Escolas Técnicas do SUS - RETSUS), visando a contribuir para a busca de caminhos viáveis para a integralidade. A pós-graduação em saúde coletiva, com foco no conceito de integralidade, é tratada por Samuel Jorge Moysés que, de forma brilhante, introduz o capítulo com nota filosófica e segue apresentando um breve histórico sobre a pós-graduação no Brasil e "as incursões odontológicas nessa trajetória". O autor não questiona a expansão quantitativa da pós-graduação em Odontologia no Brasil, porém faz uma análise crítica quanto aos aspectos qualitativos, uma vez que "seguiu caminhos nem sempre ajustados à realidade brasileira e às necessidades da população em geral". Conclui o capítulo considerando que "as políticas e os programas atuais contemplam alguns dos signos da integralidade como o acolhimento, o cuidado e a transdisciplinaridade" e expressa o pensamento para uma agenda de pesquisa da Pós-graduação em Saúde Bucal Coletiva, o que certamente nos traz relevante contribuição.
A terceira parte, intitulada Processo de Trabalho em Serviços Públicos: Contextualizando a Integralidade na Produção de Saúde, inicia-se com o texto de Ana Paula Meirelles MacCord e Rosiangela Ramalho de Souza Knupp que, face ao consistente e abrangente marco teórico, impulsiona o leitor a uma reflexão quanto à dimensão subjetiva que toda prática de saúde presume e, assim, entender a fundamental relevância da comunicação não-verbal e as relações interpessoais na integralidade. Segue, então, o texto de Michelle Cecille Bandeira Teixeira que expõe, com embasamento e clareza, as concepções multi, inter ou transdisciplinar; justifica a escolha transdisciplinar como uma perspectiva de trabalho de equipe em saúde, porém sem excluir a interdisciplinaridade, e faz uso da tecnologia do trabalho em saúde para instrumentalizar a compreensão do que pode influenciar o processo de trabalho em equipe. Concluindo essa parte, Norma S. Thiago Pontes e Adriana Cavalcanti de Aguiar discutem a Educação Permanente em Saúde (EPS) como uma estratégia transformadora na busca da integralidade no âmbito do Programa Saúde da Família (PSF) e descrevem um estudo qualitativo com cirurgiões-dentistas que atuam no PSF do Município de Petrópolis (Rio de Janeiro), onde identificaram os principais obstáculos para a organização do trabalho, dos quais destacamos, aqui, a demanda reprimida à atenção odontológica e os conflitos a serem superados na construção do trabalho interdisciplinar.
Na quarta e última parte, Processo de Gestão em Programas Pautados na Integralidade: Desafios e Experiências Inovadoras, são analisados alguns aspectos das políticas de saúde bucal. Uma breve retrospectiva da política de saúde bucal no Brasil é descrita por Monique da Costa Sandin Bartole até o surgimento do programa Brasil Sorridente, em 2004, como uma política específica referendada como Política Nacional de Saúde Bucal cuja apresentação faz menção ao documento Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal, publicado em janeiro do mesmo ano, que a autora apresenta com detalhamento, enfatizando a concepção do indivíduo em sua integralidade. Ainda nessa perspectiva, Mônica Guimarães Macau Lopes e Mirella Giongo Galvão da Silva fazem uma análise da trajetória histórica da Odontologia no Brasil - dos movimentos sociais em saúde bucal aos programas de saúde bucal - e seguem ressaltando a utilização da integralidade como base nas formulações políticas e, conseqüentemente, mudança de práxis. No último capítulo, Macau Lopes apresenta um programa de Saúde Bucal na atenção materno-infantil, que vem sendo desenvolvido desde 2004 como resposta a uma demanda reprimida e representou uma oportunidade de desenvolver integralidade e o desenvolvimento de uma nova práxis, de forma especial o acolhimento.
O livro oferece uma relevante contribuição para a formação de profissionais de saúde bucal comprometidos com as perspectivas de ampliação e transformação das práticas neste tipo de saúde.