EDITORIAL
Risco de uma pandemia de influenza pelo vírus A (H1N1)
Em 24 de abril de 2009, a Organização Mundial da Saúde (OMS) comunicou a todos os países a ocorrência de uma emergência de saúde pública de importância internacional, de acordo com o Regulamento Sanitário Internacional, causada pela infecção por um novo vírus influenza A (H1N1). O seu início possivelmente está associado a uma epidemia de doença respiratória febril, que acometeu o México a partir do mês de março de 2009. Essa epidemia apresentava um comportamento inusitado em relação à ocorrência de influenza sazonal, considerando a ocorrência fora do inverno, predominância em adultos jovens e uma maior ocorrência de casos graves, fato este que posteriormente não se comprovou associado à epidemia.
A detecção do vírus se deu baseando-se em exames realizados em duas crianças na Califórnia, Estados Unidos, em 17 de abril (MMWR Morb Mortal Wkly Rep 2009; 58:400-2). A partir de então, começou a ser detectada a disseminação para os demais estados desse país, com registro de transmissão comunitária. Em seguida à disseminação nesses países, foram detectados casos no Canadá, onde também foi registrada transmissão comunitária. Em meados de maio, mais de 40 países, incluindo o Brasil, apresentavam casos confirmados, havendo também registro de transmissão autóctone fora da América do Norte. Esta situação fez com que a OMS elevasse o nível de alerta pandêmico para o nível 5 e adotasse recomendações que visavam a diminuir os efeitos da epidemia, tendo como base a ativação dos planos nacionais de preparação para a pandemia de influenza pelo H5N1, com as devidas adaptações para a presente epidemia. As características dessa epidemia retratam um predomínio em crianças e adultos jovens e uma baixa letalidade (< 1%), com predomínio de casos leves a moderados de síndrome gripal e maior freqüência de óbitos em pacientes com doença crônica subjacente, sendo que grande parte dos casos tem se recuperado sem tratamento específico. A transmissão ocorre por meio de contato direto ou com secreções respiratórias de pessoas infectadas. As primeiras estimativas realizadas com base em análise dos casos do México, indicavam uma transmissibilidade inferior à es-timada para pandemias de influenza anteriores (Fraser et al., Science 2009; Epub 14 mai) e durante a síndrome respiratória aguda grave (SARS).
Considerando que essas informações sejam mantidas ao longo da epidemia, é possível se prever três cenários: (a) a epidemia seguiria seu curso de uma epidemia semelhante ao padrão de influenza sazonal; este cenário é ainda compatível com a ocorrência de transmissão sustentada em outras regiões, mas com tendência autolimitada; (b) após uma diminuição na disseminação da epidemia durante os meses quentes no hemisfério norte, haveria um recrudescimento na epidemia, com maior gravidade dos casos; e (c) a disseminação persistiria ininterruptamente para outros países e regiões, com características de uma pandemia.
Devido ao atual grau de incerteza e - infelizmente - à insuficiência das informações disponíveis de países afetados, é necessário manter o alerta e a ativação dos planos de preparação, com as adaptações necessárias para os possíveis cenários. Mais ainda, devemos sempre relembrar a experiência da SARS, para a qual somente foi possível seu enfrentamento efetivo a partir de quando se compartilhou, de forma transparente, coordenada e solidária, informações e tecnologias que propiciaram conhecer melhor a doença, desenvolver métodos diagnósticos e adotar medidas de controle adequadas. Para a influenza, será necessário ainda estender esses benefícios para a produção e acesso universal às vacinas e medicamentos. Por fim, as medidas que vêm sendo adotadas para o enfrentamento da atual epidemia devem propiciar a estruturação e fortalecimento dos serviços de saúde pública para a detecção precoce e resposta efetiva às emergências de saúde pública.
Eduardo Hage Carmo
Wanderson Kleber de Oliveira
Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde, Brasília, Brasil.
eduardo.carmo@saude.gov.br